As sombras que carregamos do Malleus Maleficarum

As sombras que carregamos do Malleus Maleficarum

“Todas as malignidades são pouca coisa em comparação com a de uma mulher (…). São Mateus, XIX: Que outra coisa é uma mulher, senão um inimigo da amizade, um castigo inevitável, um mal necessário, uma tentação natural, uma calamidade desejável, um perigo doméstico, um deleitável detrimento, um mal da natureza pintado com alegres cores!

Portanto, se é um pecado divorciar-se dela quando deveria mantê-la, é na verdade uma tortura necessária. Pois ou bem cometemos adultério ao nos divorciar, ou devemos suportar uma luta quotidiana. Em seu segundo livro A Retórica, Cícero diz: “Os muitos apetites dos homens levam-no a um pecado, mas o único apetite das mulheres as conduz a todos os pecados, pois a raiz de todos os vícios femininos é a avareza”.

E Séneca diz em suas Tragédias: “Uma mulher ama ou odeia; não há uma terceira alternativa. E as lágrimas de uma mulher é um engano, pois podem brotar de uma pena verdadeira, ou ser uma armadilha. Quando uma mulher pensa sozinha, pensa o mal”.” – KRAMER & SPRENGER (MalleusMaleficarum)

Antes que o terror das grandes guerras molestasse a toda a humanidade, foram as mulheres o principal alvo de uma guerra que poderia dizer-se mundial, mas completamente covarde. Seus inimigos tinham armas, seus inimigos tinham exércitos, seus inimigos tinham a lei e a fidelidade conquistada a ferro e fogo de todos os cidadãos. Literalmente a ferro e fogo, pois houveram tempos nos quais, explicitamente, aos discordantes era o ferro e o fogo que eram destinados na formado de torturas e sentenças de morte.

Elas (as condenadas bruxas, ou mulheres), o que tinham? Pactos com demônios? Poderes mágicos? Que mal tão grande e poderoso era esse incapaz de reagir a pobres mortais?

Eu diria que uma vez a razão perdeu para o delírio violento dos homens, se não fosse capaz de enxergar que a razão continua a lutar e a perder para o delírio violento dos homens, ainda, em pleno século XXI. Eu poderia dizer que a Idade das Trevas foi um passado longínquo, se não fosse capaz de enxergar as trevas por traz das lâmpadas de led, dos faróis dos carros, das telas coloridas em HD.

Eu poderia dizer que estamos avançando, que estamos evoluindo, se assistisse mais a TV do que conversasse com a realidade. O que posso dizer, apesar de todo o silêncio, é que podemos, e devemos evoluir, mas sem negar o horror que nos circunda, sem deixar-nos enganar pelo circo que nos distrai, sem deixar de ter consciência de que os supostos direitos conquistados andam na corda bamba, principalmente quando se trata de efetivá-los.

O Malleus Maleficarum foi a base erudita utilizada para legitimar inúmeros atos de crueldade contra as supostas inimigas, e alguns poucos inimigos, do deus católico. Quanta massa cinzenta jogada ao lixo para elaboração de um instrumento que, em termos de construção escrita e potencial de convencimento pode ser considerado genial, mas em termos humanos e pelos seus desdobramentos é uma mancha negra na história da humanidade.

O terror e a violência sofrida pelas pessoas que estavam na mira desse instrumento de extermínio e opressão está registrado em livros de história e na ficção como páginas antigas de um momento vivido. No entanto, as sobras desse extremo da humanidade deixaram rastros pegajosos nos quais ainda escorregamos e nos acidentamos diariamente.

Para o Malleus Maleficarum, todas as mulheres eram bruxas em potencial, com exceção daquelas que apresentavam determinadas características de santidade (tipo “bela, recatada e do lar”). Em uma visão ingênua, este poderia ser considerado apenas um instrumento em favor de uma religião poderosa em um momento específico da história.

Mas, não podemos nos esquecer de que, naquele tempo, religião e política eram lados de uma mesma moeda, isso de uma forma assumida e legitimada. Ainda temos em algumas sociedades essa conexão institucionalizada entre estas diferentes esferas, e em outras sociedades temos a conexão veladas entre essas mesmas esferas. Mudam-se os personagens, mudam-se as crenças, mas as vítimas e as atrocidades oriundas dessa aliança preservam traços da mesma natureza.

No Brasil de hoje a caça às bruxas tem ares de guerra fria. Está nas propostas legislativas absurdas que tentam retroceder com os direitos adquiridos pelas mulheres. Está na insegurança de poder andar, se expressar e vivenciar as experiências cotidianas mais banais sem sentir medo. Está na dificuldade em conseguir confiar em uma pessoa do sexo oposto pelo receio da violência que deste pode advir. Está na precariedade de efetivação dos direitos que figuram na constituição e nas leis mais como contos de fadas do que como realidade concreta. Está na hipocrisia de milhões de pessoas que se vestem da fantasia de defensores dos direitos da mulher, mas que diante de uma situação concreta se acovardam em se posicionar, em ajudar, em reagir, pelo medo de serem retalhados junto àquela que foi vítima de uma situação. Não nos enganemos sobre uma suposta evolução do país. O que temos em termos de evolução está mais nos discursos do que na realidade concreta.

A palavra de uma mulher em relação a um crime cometido contra si, inclusive de natureza sexual, não vale nada. O crime acontecido entre quatro paredes, de um homem contra uma mulher, ou em qualquer ambiente isolado, na lei tem garantia de proteção e defesa à vítima, na prática exige testemunhas.

Então, precisaremos voltar a ser bruxas para fazer as paredes, os postes, os objetos falarem sobre o crime que contra nós é cometido, para que a justiça cumpra o seu papel. Ou, melhor, poderíamos voltar a ser bruxas para em um lance de mágica fazer a justiça existir para nós e para todos os outros que dela precisarem.

A situação só piora quando se tratam de crimes de natureza subjetiva, de natureza verbal e psicológica.Precisaremos ainda educar as paredes e estes mesmos objetos para que sejam capazes de explicar à ignorância humana porque aquela situação X é criminosa para que estes seres sejam capazes de cumprir ao texto sobre o qual se baseiam os seus trabalhos públicos remunerados a partir dos nossos muitos impostos.

A qualquer um que deseje enxergar essa realidade, basta considerar o quanto é mais difícil efetivar uma denúncia dessa natureza do que qualquer outra denúncia. Por acaso, quando alguém registra um crime de furto ou roubo, lhe é solicitado algum documento comprovando que o objeto que ele relata ter sido roubado existia? Pedem-se testemunhas que presenciaram o acontecido? É necessário comprovar que o objeto lhe pertencia?

Ele é questionado sobre a relação com o ladrão, sobre a roupa que estava usando, sobre ter facilitado o crime, sobre porque estava passando naquela rua, naquele horário, devendo saber que passar por qualquer rua, em qualquer horário, portando objetos de valor é fator facilitador para ser vítima de um crime de roubo? O que é colocado em dúvida neste caso? A sociedade irá lhe julgar por ter sido vítima de roubo caso este exponha sua indignação publicamente? O autor do roubo, caso identificado, receberá alguma acolhida social por ter problemas mentais ou por não conseguir controlar seus impulsos, porque isso é da sua natureza?

Os crimes cometidos contra as mulheres conquistaram uma lei, conquistaram um texto, conquistaram um status penal, mas não conquistaram as condições para sua efetivação, compreensão e aceitação social dessas situações enquanto criminosas. Isso é verdade particularmente quando esse tipo de crime é de natureza institucional, isto é, envolvendo elementos relacionados aos ambientes de trabalho e educação. Temos ainda a religião continuando a interferir nas decisões políticas, o que apenas faz crescer as dificuldades para que essas conquistas saiam do papel, ou até mesmo para que permaneçam no papel.

Aos que passam a conhecer a realidade de uma situação de violência dessa natureza resta o medo, a desconfiança, a impossibilidade de acreditar que aquilo que uma pessoa do sexo oposto demonstra ser seja de fato o que ela é. As relações mais básicas e naturais que podem se estabelecer entre seres humanos civilizados enfrenta a barreira da dúvida sobre a idoneidade do outro, pois somos obrigados a lidar com uma cultura em que “a ocasião faz o ladrão”.

Cultura que compreende a hipocrisia do silêncio diante da realidade em contraste com a manifestação histérica de supostas atitudes nas redes sociais e conversas informais. Cultura de cultuar atitudes que somos incapazes de colocar em prática. Cultura nenhuma, isso não é cultura, é uma doença social. Uma espécie de paralisia. Aos amigos e simpatizantes das bruxas, cabe se manifestarem discretamente para não serem arrastados e queimados na fogueira junto a elas. E quem poderia culpa-los por isso? Quem deveria pagar de herói para ter sua vida, sua carreira, o seu futuro comprometido por uma atitude correta ou pela luta por conseguir fazer efetivar um direito supostamente garantido?

De obstáculos dessa natureza sofrem todas as minorias. Todas as minorias são bruxos e bruxas sendo caçados sorrateiramente pela esquizofrênica estrutura social e moral que predomina, mesmo que esta não possua uma maioria de adeptos no íntimo: muitos apenas temem a fogueira. Apesar dessa realidade gritante, querem nos convencer de que está tudo bem, de que estamos no caminho, de que as coisas estão melhores.

Não, uma suposta evolução precária não deve nos confortar. Nós apenas não enxergamos com clareza o que está ao nosso redor, pelo excesso de informações conflitantes, pelo excesso de leis que nos convencem por seu texto, mas não nos convencem por sua atuação – mas quem tem conhecimento sobre a sua atuação? -, pelo desconhecimento oriundo do silêncio imposto, das censuras que condenam à exposição e ao isolamento aqueles que se manifestam.

Posso parecer pessimista ao expor dessa forma a situação, mas não é uma questão de pessimismo. Assumir uma realidade ruim, por pior que ela seja, é melhor do que se iludir. Apenas se conseguirmos enxergar o quanto algo está deteriorado temos a chance de saber por onde podemos começar a recuperá-lo, a encaminhá-lo para uma evolução de fato. Nada evolui em um estado de podridão, de doença avançada e progressiva. Nós não evoluímos de fato, a sujeira está embaixo dos tapetes. O que precisamos é começar a expor essa sujeira, a tomar atitude, a mudar de postura, a parar de “postar” e começar a tomar decisões mais coerentes nas situações cotidianas.

Não é preciso fazer parte de um grupo, de um coletivo, ou de uma associação para fazer a diferença. Basta agir de forma consistente a cada pequena situação que nos apareça, que nos exija uma postura, uma decisão. Basta fazer isso com um pouco mais de razão, e com menos hipocrisia. É claro que precisamos nos preservar, é claro que precisamos pensar bem antes de agir. Mas precisamos agir e assumir as nossas dificuldades diante dessas ações: para superá-las.

É irônico, mas é como é, que por vezes tentar fazer efetivar um direito, inclusive no que se refere aos direitos das mulheres, é se expor-se a riscos diversos. É correr o risco de ficar manchado. É correr o risco de tornar-se alvo. Não é simples, não é fácil, não é seguro. Cabe a cada um questionar se quer fazer parte daqueles que assumem uma postura coerente com seus pensamentos e posicionamentos, ou se querem se calar e conviver com a própria hipocrisia.

Se você pudesse jantar com qualquer pessoa, viva ou morta, quem escolheria?

Se você pudesse jantar com qualquer pessoa, viva ou morta, quem escolheria?

Se você pudesse escolher qualquer pessoa, viva ou morta, com quem pudesse jantar, quem escolheria para dividir a mesa com você?

Pais e filhos responderam a essa pergunta nesse vídeo emocionante.

Depois de um minuto e meio de vídeo você vai inevitavelmente refletir sobre sua resposta!

https://www.youtube.com/watch?v=pLMJ0De1m50

Fonte e legenda: Best Of Web

Texto de Vanelli Doratioto – Alcova Moderna

Fotógrafo retrata casais gays ao redor do mundo

Fotógrafo retrata casais gays ao redor do mundo

Relacionamentos homossexuais ainda são um tabu na grande maioria dos países, senão em todos eles. Seja por intolerância, ignorância, preconceito ou ódio, as comunidades LGBT, em geral, sofrem represálias recorrentes de pessoas heterossexuais, em sua maioria, que se consideram fora do desvio da normalidade. Isso não tem cabimento.

Achar-se superior a alguém ou considerar o outro inferior por uma escolha sexual é assinar um tratado de estupidez. De fato, a hipocrisia que acompanha uma atitude de discriminação em reação a gays e lésbicas é tão factual quanto deplorável.

Embora muitas pessoas não assumam a verdade do ódio que sentem por indivíduos homossexuais, no fundo, elas sabem que sua raiva é autoperpetuada.

Mesmo aqueles que aceitam a diversidade sexual como um importante passo para uma vida mais civilizada, ao menos uma vez já duvidaram, ou suspeitaram, desse respeito. Entretanto, há de se concordar que um certo nível de preconceito é praticado por todos nós, independentemente do senso de humanidade e entendimento da sexualidade que se possa ter. Ninguém está totalmente imune à discriminação, seja ela qual for.

Muitas vezes, heterossexuais se sentem desrespeitados ou invadidos quando são abordados por homossexuais, como se tal abordagem, inocente ou não, fosse uma afronta à sua própria sexualidade. Na verdade, os heterossexuais temem ser tratados da mesma forma que costumam tratar as mulheres, em outra dimensão.

Projeto All Love Is Equal

O confronto entre homossexuais e heterossexuais é antigo, e sempre será tema de discussões ferrenhas. Por outro lado, esse é um assunto que incentiva a criação de inúmeros projetos sociais, como, por exemplo, o do fotógrafo americano Braden Summers, que viajou ao redor do mundo para produzir uma bela série de fotos, as quais representam cenas românticas exclusivamente de casais homossexuais.

Esse projeto é intitulado All Love Is Equal (‘Todo Amor é Igual’), e mostra ao público um retrato não estereotipado de casais gays em situações românticas emblemáticas.

As fotografias foram feitas durante um período de seis semanas, em seis países diferentes: EUA, Brasil, França, Inglaterra, Índia e Líbano.

Quando pensamos na imagem de um romance icônico, dificilmente vêm à mente algo que não esteja mostrando um casal heterossexual. Em contrariedade a esta associação evidente, Braden Summers, um gay assumido, montou este projeto fotográfico elogiável. De acordo com ele:

“Uma grande força motriz por trás da criação desta série foi menos sobre afetar a comunidade gay diretamente, e mais sobre dar a população em geral uma forma de se relacionar com o imaginário gay que é desprovido de sexo, vitimização e banalidade: temas que impedem algumas pessoas de se conectarem.”

Segundo o fotógrafo, essas fotos não são documentações, mas sim ilustrações de sonhos e expressões abertas de amor em diferentes culturas, as quais poderão ser, futuramente, mais fáceis de aceitar.

Modelos personalizados da cada país foram retratados nas fotografias, na maioria dos casos, apenas para garantir a segurança dos membros LGBT reais.

Summers está ansioso para continuar o projeto, e viajar ao redor do mundo a fim de expandir nossa compreensão da beleza e da diversidade do amor.

Felizmente, esse trabalho de Summers serve para promover uma perspectiva mais íntima e humana sobre uma questão que tem adeptos irritados e apaixonados de ambos os lados, no mundo todo.

O projeto All Love Is Equal nos lembra que devemos amar o próximo, independentemente de estarmos de acordo com suas escolhas sexuais. Veja então:

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A carta que eu nunca mandei.

A carta que eu nunca mandei.

Tem dias que você é tão presente em mim… São dias bem difíceis, doloridos e largos. Dias como hoje. E sempre que isso acontece eu penso em te escrever. Penso em tudo que gostaria de te dizer, em tudo aquilo que ficou pra ser dito num dia que não chegou. Ou chegou e deixei passar.

Mas não escrevo. Você não iria querer saber tudo que existe aqui. Você nunca teve vocação pra ouvir coisas que mexem e doem em você mesmo. E você, me conhecendo tão bem, sabe como respeito as escolhas alheias.

Mas eu queria muito que você soubesse que meu amor ainda é seu. Sempre foi.

Que meu jeito de amar é meio errado, meio torto e um tanto quanto confuso. Que meto os pés pelas mãos e faço tudo errado, mas que apesar de tudo, sempre te ofereci o que de melhor existia aqui dentro.

Queria que soubesse que sinto muito pelos meus erros. Hoje no futuro, sei onde errei, e sei também como a maturidade ou a falta dela interferiu entre nós.

Eu nunca te disse, mas ainda não me desfiz de tudo seu que ainda existe aqui… Seja lembranças ou alianças, seu sorriso ou seus chinelos, seu perfume ou moletom, e tudo mais que você deixou aqui e em mim… Tudo tão presente quanto você.

Preciso me desfazer de tudo isso, sei bem, mas sempre que me disponho e pego cada uma dessas coisas eu volto a colocá-las no lugar de onde tirei, porque joga-las fora seria perder uma parte de você que ainda existe aqui. E não estou disposta a isso, pelo menos agora. É que nunca gostei de alguém assim. Você despertou o melhor em mim, e sem saber, me fez mais mulher que nunca.

Queria que soubesse que sei o quanto fui covarde cada vez que nos reencontramos. Cada vez que me calei com tantas coisas que eu queria e precisava te dizer. Cada vez que te procurava e emudecia quando precisava falar e falava quando o silêncio era essencial.

Queria que soubesse que tudo que fiz quando nos deixamos, foi pra chamar sua atenção de uma vez por todas e te fazer ter medo de me perder. Mas você não teve. Ou teve e não disse nada. E eu então segui, ou pelo menos tentei. E falhei.

Queria que soubesse como qualquer pessoa que convivi não se compara a você, e que todas as vezes que disse amar alguém era pra me fazer acreditar nesse confusão toda. Menti pra mim mesmo esse tempo todo, afinal, não se tapa o sol com peneira. Hoje, depois de muito queimar, aprendi isso.

Como eu queria que soubesse o quanto eu desejei que ficássemos juntos e continuássemos nossa história… Porque dentro de nós ela ainda existe e é tão presente quanto as memórias.

O grande problema é que somos iguais demais, orgulhosos demais, complicados demais. Perdemos tempo, muito tempo fazendo coisas pequenas, se tornarem enormes. Temos a mania de complicar quando podemos simplificar.

Perdemos tempo afirmando não dar certo, mesmo sem nunca tentar. Achamos mais fácil assim… E seguimos. Cada um como pode, cada qual como consegue. Eu sigo com uma asa só, a outra ficou com você. Por isso estamos sempre perto, mesmo longe.

Seguimos sabendo que não existirá mais ninguém capaz de preencher o lugar do outro, sabendo que não seremos felizes com mais ninguém depois de ter sido tão felizes juntos, sabendo que lá na frente olharemos pra trás e sentiremos que algo ficou. Uma parte de nós ficou. Sempre ficará.

Então volta. Puxa a cadeira e senta sem pressa. Abre o coração, acalma a mente e vamos conversar.

Não posso te garantir que dê tudo certo porque a vida não é feita de garantias, alias, nada é garantido por aqui. O que posso te dar é a certeza do amor que existe em mim, a certeza da sua falta todos os dias, a certeza de que o pior nós já vivemos e que tentarei, enfim, ser o melhor que puder pra que a gente se ajeite.

O teste final já foi feito, o martelo foi batido. O sentimento resistiu ao tempo, às angustias e decepções. Ameniza quando longe, mas basta o reencontro pra que tudo volte.

Eu nunca entendi esse medo todo de nós dois, mas espero que esse tempo longe nos amadureça cada vez mais, e seja, na melhor das hipóteses, uma forma que a vida arrumou de nos mostrar o quanto nos fazemos falta. Por que foi nesse tempo que me dei conta de como amo voce.

Espero que nossa história dure bem mais que isso, e que essa parte seja só uma tempestade que iremos lembrar e rir entre um gole e outro de cerveja juntos, enquanto nossos filhos brincam pela casa.

Eu aceito o seu não, respeito seu direito. Se é essa a sua decisão.

Mas me diz, se isso não é amor o que é então. Me diz. E, sendo assim, te deixo ir. Pra sempre.

Mexa-se! A vida não tolera inércia!

Mexa-se! A vida não tolera inércia!

Espere sentado para não cansar! Quantas vezes já ouvimos essa expressão, ou a dissemos, na intenção de afirmar que nada iria mudar.

E é desse jeito a vida. Esperar sentado não leva ninguém a lugar algum. A vida só responde a ações! De outra forma, ela deixa claro que nada vai mudar, que a única alternativa é sentar e aceitar.

Ação! Se a gente quer a vida tome outra direção, se quer mudar, virar do avesso, contrariar o que se costuma chamar de azar, a resposta está em cada movimento que fazemos na direção desejada. Pequenos, gigantes, rápidos, homeopáticos, agressivos, tímidos… Sejam quais e como forem, são os movimentos que fazem a roda girar.

Mudar de calçada, corte do cabelo, mensagem pessoal, respostas habituais… Tudo é ação e em seguida, virão as reações.

Se o tédio invade a vida e tudo torna-se mais do mesmo, somente uma guinada no ritmo monocórdio será capaz de alterar esse cenário.

Aquele telefonema que era para ser feito há tempos atrás, a pendência de uma promessa ainda não cumprida nem justificada, o conserto da fechadura, os tecidos novos para cortinas… Se a gente não faz, não tem resultado. A inércia paralisa, empoeira e mofa nossas determinações.

Em sentido contrário e em alta velocidade desfilam as respostas da vida a quem se propõe tentar, arriscar, errar, retomar, perguntar, se virar.

A vida gosta de quem anda com ela, sem preguiça, sem medo, sem hesitação. Ou até, ainda com tudo isso, mas sem se entregar à paralisia.

Um cumprimento recebe outro de volta.
Uma tentativa, a resposta possível.
Uma aventura, as emoções correspondentes.
Uma aproximação, o calor do momento.

A vida não deixa quem se mexe sem resposta.
Ainda que não seja a resposta sonhada, num próximo movimento será possível entender o porquê, e assim por diante, numa dança de ritmo individual e contínuo.

Faça o amor viver mais. Morra de rir com quem você ama.

Faça o amor viver mais. Morra de rir com quem você ama.

Sabe o que é? De repente o mundo fica sisudo demais. Carrancudo, sombrio, taciturno, macambúzio. Mergulha numa escuridão danada. Não é sem razão, não. Cada coisa que acontece! Tanta maldade que ninguém aguenta. É mau humor em todo canto. Agora mesmo as coisas andam assim. A gente entende, aceita.

Mas ainda agorinha, do nada, ouvi aqui perto alguém rindo gostoso que só. Imagine uma gargalhada incontrolável, imperiosa, irresistível. Dessas que rasgam o silêncio da noite e acendem uma coisa aqui dentro da gente. Risada franca, absoluta. E não veio de uma pessoa só. Foi risada de duas bocas, alegria de duas almas juntas. Não posso garantir, mas tenho uma quase certeza mansa que me faz bem: isso é um casal morrendo de rir juntos!

Fico aqui imaginando o que foi que fez essa gente cair assim no riso. Foi uma piada? Não pode ser. Piadas provocam um tipo previsível de reação. A gente já sabe que vem um chiste e vai ensaiando uma risada. Ela sai tranquila, estável. Não foi o caso. O que eu ouvi foi uma explosão de graça! Um estouro de alegria a dois. Nem a piada mais engraçada do mundo seria capaz de provocar esse efeito. Eu não tenho mais dúvida! Foi um casal rachando o bico um com o outro. Cúmplices, aliados, parceiros implicados numa traquinagem qualquer.

Será que assistiam juntos a uma série na TV e o protagonista foi capaz de um momento luminoso, uma frase perfeita, um gesto imprevisto, uma sacada que pegou a audiência de surpresa e quase os matou de rir?

Teria um dos dois disparado um comentário maldoso sobre um desafeto do casal e provocado a risada do outro.

Talvez o estrado da cama tenha quebrado na hora mais tórrida do amor e o orgasmo tenha sido uma descarga incomparável de gozo e riso!

Nada disso. Foi uma lembrança! Sim, uma recordação antiga e engraçada da vida em comum que mexeu com eles lá dentro, provocou associações com seus dias de hoje e arrancou de suas tripas uma risada colossal. Será que foi isso mesmo?

Talvez tenha uma terceira pessoa na cena. Um bebê que começa a fazer gracinhas, morder o próprio pé, imitar motor de carro com a boca. Quem sabe essa criança, na hora do jantar, cuspiu a comida, atirou a colherzinha longe e ela acertou a cara do cachorro que passou a lamber o focinho, desesperado com o sabor diferente, os bigodes lambuzados de papinha. Afogueado, o cão disparou a correr pela casa, bagunçou o tapete, provocou no bebê uma vontade louca de virar a papinha sobre a própria cabeça. Tudo assim, tão inesperado e tão bonito, que os pais da criança caíram na gargalhada.

Ou quem sabe seja um casal sem filhos, sem grandes perspectivas, discutindo a relação. De repente, um deles levanta mal humorado e escorrega de bunda no chão. O outro gargalha mais de nervoso que de graça. E os dois deslizam juntos numa risada enlouquecida de perder o fôlego. Até que um pergunta ao outro: “do que é que a gente falava mesmo?”, e os dois decidem fazer pipoca e assistir a um filme bobo no sofá, até dormirem cansados da lida, restabelecidos, reatados. Amantes, amados. Felizes.

Tudo isso eu imagino aqui comigo, a risada desses desconhecidos ecoando dentro de mim, fazendo feliz também este homem sozinho do sexto andar. Sabe Deus por que motivo eles riram de repente, riram com força e com graça. Por quê?

Verdade é que isso não faz a menor diferença. Mas eu torço por eles, com eles, para eles. Torço para que seja o riso de um casal que se ama, que tem problemas como qualquer pessoa mas que faz de tudo um pouco para resolvê-los. Um casal que se quer, se respeita, se ajuda, se estima. Um casal que vive bem. E que assim, do nada, de vez em quando, morre de rir juntos e faz o amor viver mais.

Libertando-nos das expectativas que colocamos no outro

Libertando-nos das expectativas que colocamos no outro

Quantas expectativas criamos sobre alguém que acabamos de conhecer? Sobre nossos amigos? Nossos familiares? Sobre as pessoas do trabalho? Os chefes? Quantas expectativas temos em alcançar aquelas metas? Para aqueles sonhos bem elaborados na nossa mente? Para aquele momento com determinada pessoa?

Analisando essas perguntas e a nossa vida, uma coisa é certa: o ser humano é uma fonte interminável de expectativas. Criamos histórias irreais na nossa mente para mcom tudo e com todos. Criamos papéis para nossos pais, amigos, colegas, namorada(o) e para quem acabamos de conhecer. Imaginamos logo que a pessoa deva ser de uma forma e que deve agir, pensar e falar nesses limites que a impomos.

Traçamos trilhos para cada um à nossa volta e queremos profundamente que sigam esses caminhos de qualquer maneira. Qualquer deslize pode ser motivo de frustração, arrependimentos, brigas, tristezas e por aí vai (nada bom, né?).

Criar expectativas é abrir mão de sua liberdade e também da do outro, para que se siga um roteiro fixo criado em nossa mente. É uma tentativa sempre frustrada de ser o roteirista da vida do outro.

Se conheci você hoje, já traço uma imagem baseada em préconceitos na minha mente. Imagino, logo, como você deve ser 24h por dia e espero - quase que convicto - que você siga esse perfil junto com os limites que imaginei para você.

É como se, para cada pessoa que conhecêssemos, tivéssemos que plantar uma semente no nosso jardim. Nós lhe damos um lugar, dizemos que tipo de planta será e, de tempos em tempos, vamos podando seu crescimento, para que ela possa se tornar a árvore que um dia imaginamos. Entretanto, quando não se torna, ficamos zangados e culpamos aquela planta por isso.

A árvore é uma bananeira, mas nós queríamos uma mangueira. Tentamos, de todas as formas, que a bananeira se tornasse mangueira, mas isso está além do nosso desejo. Nesse ponto, ou aceitamos que temos uma linda bananeira, ou ficamos tristes com o que não aconteceu. Muitas vezes, decidimos pôr um fim na bananeira para novamente tentar plantar um pé de manga.

Fazer com que a outra pessoa se torne a mãe ou pai com que você sempre sonhou, o amigo ou amiga com que você sempre sonhou, o namorado ou a namorada com que você sempre sonhou, o marido ou esposa com que você sempre sonhou, o colega de trabalho com que você sempre sonhou, ou o líder com que você sempre sonhou, é uma grande infantilidade. É pensar que o mundo e todas as pessoas nele estão aqui para servi-lo, servir às suas vontades. Você quer ser rei de um reino que nunca existiu. Isso é tirar a liberdade do outro. Isso é aprisionar o outro no molde que você fez para ele. Não há dúvidas, isso é sinal de puro egoísmo.

Então, eu imagino algo em minha mente, que, por sinal, só existe aqui dentro, e tento moldar o mundo para que tudo saia conforme planejei. Sinais disso são quando falamos: Fulano não deveria falar assim; Fulano agiu de forma errada; Fulano pensou besteira; Fulano não pode fazer isso, Fulano me irrita, Fulano não tem jeito. É quando rotulamos o que o outro não pode e não deve fazer. É quando exigimos que o outro só faça algo que nos agrade e que nos trate da melhor forma ou como nós o tratamos.

Mas se ele sempre agir assim como eu gostaria, onde irá o livre arbítrio dele? Cadê sua liberdade ao seguir conforme os meus gostos? Para onde foi a sua vida, se ele tiver que seguir a minha?

Nos relacionamentos, acontece muito isso: queremos tanto que o outro seja igual a nós, que não toleramos, muitas vezes, algumas diferenças. Entramos em discussões, brigas e verdadeiras guerras, por não aceitar que o outro tem o direito, e por que não o dever, de ser diferente de nós.

Deus não gosta de uniformes, Ele não fez nada nem ninguém igual. Quem gosta de fazer igual somos nós, homens e mulheres, que criamos clones, robôs, computadores, celulares, máquinas, roupas e outros produtos de consumo que são padronizados de acordo com um “perfeito” planejamento, de fábrica.

O que fazer para diminuir esse tornado de expectativas?

Veja isso em você:

  • Sobre quem, na minha vida, ou qual situação eu tenha imaginado como deve se portar ou como se tornar?
  • O que me irrita ou me chateia por não ser conforme eu gostaria? Essa pessoa ou essa situação será o seu mestre, isso mostrará como passar por esse obstáculo e aceitar as pessoas e as situações como elas são.
  • O que eu quero que mude? Mais um mestre.

Imagine você falando para aquela pessoa ou situação: eu o aceito da forma que você é. Pense numa voz interna que sai pelo seu coração. Isso é amor, isso é transcender a mente (ego), isso é se iluminar, isso é se espiritualizar, isso é ser livre do comportamento do outro.

Quando você faz isso, você tira aquele laço que está ligado ao movimento do outro. Qualquer coisa que a outra pessoa fizer já não irá incomodá-lo tanto. Perceba que você pode brincar de fazer planos, mas permita também que eles se quebrem. Qualquer fato que aconteça, procure aceitar.

Não se adiante para o futuro. Abandone as expectativas. Uma vez que você tenha abandonado as expectativas, você aprendeu a viver. Então, tudo que acontece o satisfaz, o que quer que seja. Você nunca se sente frustrado, porque, em primeiro lugar, você nunca esperou. Dessa forma, a frustração é impossível. A frustração é uma sombra da expectativa.

Uma vez que não mais existam expectativas, você está livre para mover-se no desconhecido e aceitar o desconhecido — o que quer que ele traga. E aceitá-lo com profunda gratidão. As lamentações desaparecem; as queixas desaparecem; seja qual for o caso, você sempre sente-se aceito, em casa. A segunda coisa: quando tudo acontece sem você esperar, tudo se torna novo. Isso traz um frescor para sua vida; uma brisa fresca está continuamente soprando e isso impede que poeira se acumule sobre você. Suas portas e suas janelas estão abertas: os raios de sol entram, a brisa entra, a fragrância das flores — tudo inesperado. Você nunca pedi, e a existência continua se derramando sobre você. A pessoa sente que Deus É. OSHO

Cada um tem a sua própria história, evite criar roteiros para os outros. Todos somos livres para pensar, falar e agir. Não conhecemos profundamente, na pele, a história do outro e qualquer forma de julgamento é sempre prematuro.

Não é necessário deixar de sonhar ou de imaginar sobre a sua vida, mas não se ocupe tanto em criar papéis para os outros.

Que sejamos flexíveis, que nos moldemos como a água e que sejamos um templo de amor.

“SCHADENFREUDE”: o prazer silencioso na desgraça do outro

“SCHADENFREUDE”: o prazer silencioso na desgraça do outro

“Schadenfreude” é uma palavra da língua alemã que designa um sentimento de alegria ou satisfação perante o dano ou infortúnio do outro, ou seja, trata-se do prazer que se sente com a desgraça alheia. Em maior ou menor grau, todos somos atraídos por acontecimentos trágicos que envolvem terceiros, o que pode se exemplificar pela multidão que se aglomera em torno de acidentes de carro.

Muitas situações de desastres naturais, de acidentes e de crimes hediondos destacam-se por si só, tamanha a amplidão de suas consequências, tamanha a dor dos envolvidos, levando-nos a nos interessar pelos desdobramentos do fato. Como tudo isso vende muito, a mídia não se furta de veicular massivamente eventos trágicos, aplicando-lhes o devido sensacionalismo.

 

Somos atraídos pelas tragédias que acometem alguém de fora muito provavelmente porque o que foge à normalidade que se espera causa curiosidade, além de nos provocar certa sensação de alívio íntimo, por não termos sido nós as vítimas daquilo. O ser humano muitas vezes lança mão do expediente que consiste em comparar-se com quem passa por situações bem piores, tentando se conformar com as próprias desgraças.

Outras vezes, olhamos aquilo tudo com empatia, colocando-nos no lugar de quem sofre, de quem vê sua vida devastada por uma tragédia sem precedentes, exercitando nosso lado mais humano e solidário. Assim, enviamos donativos a vítimas que perderam tudo o que tinham, depositamos dinheiro para ajudar entidades beneficentes, dessa forma nos sentindo melhor e mais aliviados.

No entanto, há quem sinta um prazer clandestino em assistir a fatos desagradáveis, como se estivesse se divertindo com aquilo. Isso fica muito claro quando vemos pessoas torcendo para que o governo ao qual elas se opõem aja lesivamente, mesmo que os cidadãos como um todo saiam perdendo; quando ouvimos alguém dizendo “bem feito” ao saber de algo ruim ocorrido com um desafeto, mesmo que se trate de fofoca sem comprovação; quando se deseja o pior ao “ex”, mesmo que ele seja pai ou mãe de filhos em comum.

Se faz parte de nossa natureza nos sentirmos atraídos pela desgraça do outro, cabe-nos direcionar esse sentimento de forma positiva, adotando uma postura empática e solidária, para que, caso não ajudemos, também não atrapalhemos, tampouco fomentemos a maldade. É preciso, afinal, muito cuidado com o que sentimos e com o que desejamos, pois os desejos às vezes se realizam, inclusive aqueles inconfessáveis.

Relacionamentos descartáveis: a verdadeira paixão do nosso mundo

Relacionamentos descartáveis: a verdadeira paixão do nosso mundo

Curtir, compartilhar, conectar-se ao Wi-Fi, começar uma amizade, terminar uma amizade, descurtir. A vida contemporânea inexoravelmente também se passa na rede, de modo que é imprescindível para o entendimento do mundo que nos cerca a compreensão do que significa uma vida ligada por uma rede wireless, assim como de que modo esse estilo de vida interfere nas relações interpessoais.

A despeito disso, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman nos oferece um manancial de conhecimento, através do seu olhar crítico e atento do mundo contemporâneo. Para ele, o grande sucesso da vida “online” reside na facilidade de desconectar, isto é, de fazer e se desfazer dos laços construídos, sem o dispendioso trabalho que possuímos na vida “off-line”.

Dessa maneira, as relações são pautadas pela extrema fluidez e velocidade, uma vez que o grande atrativo da vida online é poder estar em constante movimento, desfrutando livremente da tecla “delete”, assim que uma relação acene com possibilidades melhores.

Esse modelo de relacionamento, portanto, parece ter, como fonte principal de prazer, o ato de se desfazer das relações, já que o sucesso dos relacionamentos não é medido pela profundidade e sim pela sua capacidade rotativa, que transforma tudo em uma grande rede descartável.

“A alegria de livrar-se de algo, o ato de descartar e jogar no lixo, esta é a verdadeira paixão do nosso mundo.”

Sendo assim, qualquer tempo investido em uma relação mais profunda e, sobretudo, fora de uma tela, é tido como sinônimo de desperdício, afinal, com tantas opções, qual a razão para estar preso em apenas algumas delas? A associação de tempo investido com desperdício ganha contornos ainda piores, ao analisarmos o contexto no qual estamos inseridos, em que o tempo tornou-se um artigo de luxo e, portanto, o “sucesso” do indivíduo está diretamente relacionado ao modo como abandona antigas preferências e desliza com agilidade e leveza por novas.

“Fazer contato visual ou permitir a aproximação física de um outro ser humano é sinônimo de desperdício, pois equivale a dedicar algum tempo, escasso e precioso, a aproximação: decisão que poderia interromper ou impedir o surfe em tantas outra superfícies convidativas.”

Há de se considerar, dessa forma, que, no mundo online, a quantidade exerce maior importância que a qualidade, de tal maneira que se deve buscar a maior rotatividade possível, a fim de contemplar um maior número de conexões. Para facilitar tantas conexões, as relações devem ser ausentes de contradições e contrastes que tornam as relações reais mais trabalhosas, levando, assim, a uma padronização das relações e, consequentemente, das pessoas presentes nessas relações.

“A capacidade interativa da internet é feita sob medida para essa nova necessidade. É a quantidade das conexões, mais que sua qualidade, que faz a diferença entre as possibilidades de sucesso ou fracasso.”

Essa padronização talvez seja o traço mais destrutivo do modelo de vida online que levamos, já que há uma despersonalização do individuo, que é despido de suas características próprias, para que possa ser integrado pela grande rede. Em outras palavras, ao seguir esse modelo, há uma automatização, que transforma os humanos em ciborgues e, pior, de forma espontânea e livre, posto que já estamos biologicamente programados, como revela uma pesquisa, a qual diz que recebemos um fluxo de dopamina (produto químico que negocia o prazer no cérebro) quando ouvimos o aviso da caixa de entrada.

Entretanto, é inocência pensar que a vida off-line esteja tão diferente; diria que está englobada pela vida online ou, no mínimo, segue os seus ditames, ou seja, busca fugir da dispendiosidade que relações verdadeiras possuem, bem como do tempo que é necessário ser investido nas mesmas. Nesse ponto reside o cerne da questão, uma vez que uma relação verdadeira, seja real ou virtual, necessita de tempo e da capacidade de o indivíduo estar aberto às dificuldades inerentes a qualquer tipo de relacionamento. Apesar disso, não estamos dispostos a nos esforçar tanto por uma relação, já que, como disse, existem milhares o tempo inteiro acenando com possibilidades mais atraentes.

Essa grande rede de conexões, no entanto, é apenas uma ideia ilusória, posto que, ao estar inserido em tantas relações, não há envolvimento com nada, de tal forma que o indivíduo se encontra em um meio termo em que não se envolve verdadeiramente com o que acontece com os amigos virtuais, mas também não está envolvido com o que acontece nas relações reais, inclusive pelo fato de estas estarem cada vez mais parecidas com as relações virtuais.

Obviamente, nem todas as relações são pautadas da forma supracitada, bem como não há problema em usufruir a internet, afinal, esse texto chegará até você por meio dela. Sendo assim, o problema está no modo como utilizamos essa ferramenta e como temos aplicado o seu modus operandi na vida off-line, revelando, ao mesmo tempo, uma solidão imensa que cria a necessidade de estar o tempo inteiro “conectado” e a incapacidade/falta de vontade/preguiça de estar inserido profundamente em uma relação que não seja equipada com a tecla “delete” e “antispam”, “[…] mecanismos que protegem das consequências incômodas (e sobretudo dispendiosas em termos de tempo) das interações mais profundas”.

Como dizia Millôr Fernandes, “o importante é ter sem que o ter te tenha”, de modo que, ao estarmos inseridos na grande rede, é preciso lembrar que a pessoa humana real precede e é mais importante do que um perfil em uma rede social. Mais que isso, é preciso lembrar que pessoas reais não sorriem o tempo inteiro e não “seguem” as mesmas coisas que nós, de forma que, impreterivelmente, haverá problemas que não poderão ser resolvidos com a tecla “delete”, assim como existem emoções e sentimentos que jamais poderão ser sentidos através de uma tela, já que, por mais que a internet tenha avançado, nada substitui a conexão de dois corações em sintonia.

Para aonde?

Para aonde?

por Fernanda Pompeu

imagem: Régine Ferrandis

Sempre me fascinou a imagem da encruzilhada. No fundo não se trata de uma imagem, mas de uma concretude! Qual o caminho a caminhar é questão que nos envolve da infância à velhice. O curioso – e gracioso – é que nunca estamos 100% seguros da trilha, picada, atalho que pegamos.

Aquele que se casou com Maria, não se casou com Arlete. Quem viveu uma vida com o Marcus, abriu mão de uma existência com o Eduardo. Para ser engenheira, ela sufocou a carreira de desenhista. Pela carteira assinada, ele abandonou o violoncelo. Para se sentir mais livre, ela deixou o emprego promissor.

Caminhos! Melhor, decisões. A poeta Cecília Meireles (1901-1964) traduz a encruzilhada das decisões nos seus deliciosos versos: “Ou guardo o dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e gasto o dinheiro. Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo e vivo escolhendo o dia inteiro! Mas não consegui entender ainda qual é melhor: se é isto ou aquilo.”

As dúvidas do poema Ou isto ou aquilo dizem respeito ao universo infantil. Doce, anel, brincar, fazer lição de casa. Mas sua essência ganhar algo perdendo algo nos perseguirá em todas as idades. Ontem mesmo na Praça Pôr-do-Sol – na atualidade, a mais filmada das praças de Sampa – observei um senhorzinho, para lá de seus oitenta, decidindo se ele e seu andador tomavam o rumo à direita ou à esquerda.

Pude por alguns segundos flagrar a dúvida em seu rosto. Com certeza, esse homem viveu uma vida inteira tendo que escolher caminhos a seguir. Pois é isso que todos fazemos, todos os dias, desde o momento em que saímos da cama até voltarmos a ela. Talvez só o estado inconsciente escape do nosso arbítrio. Ninguém escolhe um pesadelo ao sonho.

De qualquer maneira, e por conta de ter que escolher, sempre teremos um sentimento de nostalgia por aqueles caminhos que não trilhamos. Aquela vida que não vivemos. Como teria sido com a Arlete e não com a Maria? Com Eduardo e não com o Marcus? O emprego chato me permitiria a gostosa varanda daquele apartamento próprio?

Quem cobra juros mais altos? A liberdade ou a adequação? A constância ou a mudança? Quantas vezes pude escolher? Quantas vezes escolheram por mim? Ou isto ou aquilo. Única certeza é que andamos o tempo todo, seja atrás do porto seguro ou do mar aberto. O ponto de chegada é só no último suspiro.

30 fotos espetaculares da aurora boreal

A aurora boreal é um fenômeno realmente fascinante de se ver. Múltiplos formatos de cores diferentes dançam pelo céu e nos presenteiam aqui embaixo com visões extraordinárias.

Ao pintarem os céus de cores do verde ao roxo, as luzes da aurora boreal revelam retratos encantadores.

A origem histórica da aurora boreal não chega a ser um mistério. Sabe-se que, por milênios, essas luzes têm sido fontes de especulação. Pinturas rupestres na França datadas de 30.000 anos atrás já continham ilustrações desse fenômeno.

Em tempos mais supersticiosos, as luzes do norte eram pensadas como sendo prenúncios de guerra ou destruição, antes de as pessoas entenderem o que lhes causa. Muitos filósofos clássicos, incluindo Aristóteles, Descartes, Halley e Goethe, além de vários outros autores e astrônomos referem-se às luzes da aurora boreal em seus trabalhos como inspiração.

Em meados de 1616, Galileu Galilei usou o nome “aurora boreal” para descrever esse fenômeno, tomando emprestado o nome da deusa romana mítica do amanhecer, Aurora, e o nome do deus grego para os ventos do norte, Boreas.

Toda vez que as partículas solares eletricamente carregadas entram na atmosfera, é possível ver esse fenômeno, que acontece em regiões próximas ao círculo polar ártico: Islândia, Noruega, Groenlândia, Estônia, Alasca, Rússia, Canadá e Finlândia.

A melhor época para observar a aurora boreal é no inverno, quando as noites são mais longas. No extremo hemisfério norte, a estação mais fria do ano dura quase o dobro do que os três meses habituais.

Viajantes do mundo inteiro compartilham o desejo de ver de perto essa maravilha natural. Porém, visitar os países nórdicos em busca das auroras boreais não é um empreendimento fácil. Devido à baixíssima temperatura, as vias de acesso são restritas e limitadas, e a câmera fotográfica (ou o celular) podem facilmente congelar durante o caminho. É preciso aguardar os momentos certos para se tirar uma fotografia nítida, o que pode demorar horas ou dias a fio. Mas quem teve essa experiência costuma dizer que é um sacrifício compensatório.

“Registros fotográficos da aurora boreal não faltam. A seguir, seguem 30 das mais espetaculares fotos escolhidas em parceria com o site https://netcombos.net desse fenômeno único:

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Um presente especial aos nossos filhos: A realidade

Um presente especial aos nossos filhos: A realidade

Minha filha está chegando nos 27 anos. Eu desejo que ela seja ainda mais feliz do que já é. Eu desejo que a asma dela não fique agressiva e a faça sofrer. Eu desejo a ela que as frustrações sejam toleráveis e os traumas não façam ninho. Desejo que ela trate o amor com carinho e a dor com respeito. Eu desejo que ela seja companheira e amiga da realidade da vida, com suas maravilhas e mazelas.

Minha filha nunca teve uma fantasia de princesa quando era criança. Na adolescência, comprou uma coroinha prateada e usou duas ou três vezes. Matou a vontade. Nunca mais quis a realeza por perto, preferiu a vida plebeia, ainda bem.

Eu fui mãe de uma criança que voltava da pracinha pronta para ser jogada na máquina de lavar. Não havia uma roupa sem a menor manchinha. Mas minha criança brincou, abraçou cães gatos, voltou para casa com um carrapato atrás da orelha e o caso foi resolvido sem nenhum susto nem drama.

A diferença entre o mundo encantado e a realidade é mínima, é ridícula. Basta que saibamos cortar sem piedade os exageros que separam nossos filhos do mundo onde eles respiram e vivem.
O lúdico é encantador, o faz-de-conta é mágico, mas, como nos livros e filmes, tem hora para começar e acabar. A realidade vive em nós, nos nossos filhos inocentes, na relação que eles terão com o mundo.

Minha filha fez cara feia muitas vezes por eu não permitir que o mundo de mentira sentasse à mesa e jantasse conosco. Não sei se perdi a mão, posso ter perdido algumas vezes, confesso, mas sempre tentando fazer o certo e o justo.

Nunca consegui concluir qual é o melhor método para se educar um filho, mas, quase 27 anos depois, olho para ela, depois para mim, e então para nós duas, e sinto que consegui dar a ela um presente genuíno que não se encontra em um prateleira ou site de compras. A realidade. E ela é suave quando constato o caminho por onde minha cria passa.

O fim chegou, e agora?

O fim chegou, e agora?

Período pós-término é barra! Que atire a primeira pedra quem nunca procurou um ombro amigo pra sujar de meleca de nariz fresquinha depois de levar, ou até mesmo de dar, um belo pé na bunda.

Em tempos assim, é como se a gente subisse a bordo de uma montanha-russa emocional. As memórias se alternam. Uma hora, o ato de pensar no gosto do primeiro beijo gera nostalgia e no outro, vontade de cometer um homicídio doloso. Todo fim é como uma negação do que quase aconteceu. As viagens não feitas, os sonhos não realizados, os presentes não comprados. Essa ausência futura pesa feito chumbo em nosso itinerário de projeções.

A bagagem inexistente, os beijos adiados e as brigas não realizadas. Tudo isso ganha imenso valor nos momentos que sucedem o término de uma relação. Eu sei como é. Tem horas que dá vontade de rodar o mundo, fazer amigos poloneses, adotar um guri do Senegal, falir o mercado de drogas de Amsterdã e dar uma passada no Haiti pra fazer aquele voduzinho básico. Mas aí vem a conta bancária com um sorriso malicioso e diz: nope!

Mas nada se compara aos impulsos de ligar para o recente-ex-amor-da-vida-toda durante uma madrugada de porre, mandar mensagens com trechos de músicas do Só Pra Contrariar ou mensagens de voz com Kenny G tocando ao fundo. É, meus amigos e amigas, falar que não faz isso é fácil. Difícil mesmo é segurar a emoção quando começa a rolar aquele pagodão 90, aí não tem cuore que aguente.

É que, às vezes, lembrar do outro depois da separação torna-se um martírio, um suplício que nós, eternos devotos da saudade do que não foi, gostamos de nos infligir. Afinal, o que é uma dúzia de chibatadas nas costas em comparação com todos os planos de “eu, você, dois filhos e um catioro” não realizados?

Existem também momentos em que a gente se sente metade. Da laranja, do copo, da bolacha, da vida, do paralelepípedo (palavra que costumo usar pra preencher os números de caracteres necessários para um artigo como esse) ou só metade da gente mesmo. Esperamos que outra pessoa venha nos completar – do mesmo modo como se faz com aqueles quebra-cabeças de um zilhão de peças e que normalmente formam alguma paisagem que de tão bucólica chega a ser broxante, em algum lugar do mundo que meu bolso jamais me dará permissão de ir.

No entanto, é preciso lembrar que não somos nada disso. Se você ainda se apoia nessa ideia de alma gêmea, é bom pensar com mais carinho no assunto. Porra, Fábio Jr. canta isso faz um século e a dele ainda não chegou e olha que ele já deve estar cometendo o décimo quinto casório.

No fim de tudo, o senhor Raimundo Fucking Fagner, ou Fagnão para os mais íntimos, é quem estava certo. O cabra (mulheres inclusas) pode ser forte, valente, nadar em rios de dinheiro ou de jujubas de tutti-frutti, mas basta a lembrança de um simples beijo pra se debulhar em lágrimas. Não escapa um!

A loucura em Cisne Negro

A loucura em Cisne Negro

Obras de arte podem ser interpretadas de várias maneiras, dependendo do conhecimento e experiência de cada espectador. Existem maneiras diversas de interpretar de fato o enredo do filme.

Através do uso de símbolos e significados, no entanto, o filme alude claramente ao lado escuro e oculto da fama, a dualidade, o controle mental baseado em trauma, a criação forçada de um alter persona e muito mais. O personagem principal, Nina, passa por uma mudança metafísica – por entrar em contato com o seu “lado negro” – a fim de ter um melhor desempenho.

Essa mudança é imposta a Nina pelo seu manipulador, neste caso, seu diretor de balé. Cisne Negro tem neste artigo uma interpretação junguiana devido à riqueza do arquétipo da sombra sobre a jovem que se identifica com sua sombra, por pressão materna e inveja de outra bailarina.

Os chamados arquétipos,são originários da espécie humana e se encontram em toda psique. O inconsciente coletivo é o grande reservatório da libido, ou seja,a energia psíquica e está muito ligado à nossa fonte biológica.

Deste estado germinal infantil é que se desenvolve o ser adulto completo; por isso, o estado germinal é não menos exclusivamente sexual do que a psique do adulto. Nesse estado, estão escondidos não só os inícios da vida adulta, como também toda a herança que nos vem da série ancestrais, e é de extensão ilimitada.

Nina, uma mulher jovem tímida e frágil é escolhida para desempenhar o papel de a Rainha dos Cisnes e deve, portanto, incorporar tanto o Cisne Branco puro e o Cisne Negro. Sua busca pela perfeição como uma bailarina leva à experiência, em seu cotidiano, a transformação experimentada pelo Cisne Branco na história do balé.

Os acontecimentos da vida diária de Nina, portanto, espelham a história do personagem que ela assume como uma bailarina, levando à confusão e, enquanto borra a linha entre realidade e ficção à insanidade.

O filme de Darnen Aronofsky (2011), considerado um thriller psicológico, é um tanto conturbado, e tenso; até mesmo enlouquecedor já que os dois cisnes representam dois personagens diferentes, mas ao mesmo tempo, os dois lados de uma mesma pessoa; mostrando que nem todos são bons ou maus por inteiro.

Todos têm os dois lados. Mas no caso da protagonista, ela não sabe lidar com esse outro lado, e por isso acaba enlouquecendo. Ao ver em sua rival, tudo que ela gostaria de ser, ela acaba conhecendo um lado que não conhecia: competitivo, agressivo, e até mesmo cruel em alguns momentos. Assim ela vai se transformando e incorporando o personagem mais difícil que ela já teve que interpretar; afinal podemos ver isso, como um reflexo dela

O uso de espelhos e reflexos em inúmeras cenas são um lembrete constante da percepção alterada da realidade de Nina. Espelhos no filme são muitas vezes enganosos e os reflexos de Nina parecem ter uma “vida própria”.

Enquanto Nina fica assombrada pelo Cisne Negro, essa persona suplente toma uma vida própria e age fora do controle consciente de Nina. A infância, por conseguinte, é importante, não somente porque várias atrofias dos instintos dela se originaram, como também porque ela é o tempo em que surgem, terrificantes ou encorajadores, diante da alma da criança, aqueles sonhos e imagens da ampla visão, a condicionar-lhe a procura no inconsciente envolve o confronto com a sombra, a natureza escondida do ser. A anima/animus, um gênero oposto escondido em cada indivíduo é o arquétipo do significado. Esses arquétipos são suscetíveis de personificação.

Os arquétipos de transformação que expressam o processo de individuação são manifestos. Como os arquétipos penetram a consciência, eles influenciam a experiência percebida de pessoas normais e neuróticas.

Um arquétipo é sempre muito poderoso e pode totalmente possuir o indivíduo e causar psicose. No caso de Nina há uma quebra e ela desenvolve a psicose não aceitando ser o Cisne Branco nem se reconciliando mais com sua sombra.

É observável que, desde que o ser humano moderno tem uma habilidade altamente desenvolvida para dissociar e para diminuir dissociação, procura se reconciliar com os aspectos da personalidade que foram negligenciados. Mas Nina não consegue unir-se com seus opostos.

Nina, para conseguir o papel principal no Ballet, começa a fazer de tudo, desesperadamente, para consegui-lo, e com isso começa a enlouquecer e confundir a vida real, com o personagem. Ao mesmo tempo em que ela quer se manter correta, certa, pura, perfeita como o Cisne Branco; ela acaba aprendendo a se soltar, ser livre, e conhecer um lado dela que nem sabia que existia, um lado que quebra regras, vive, e não se importa, faz o que quer e o que bem entende, e o que é bom somente para ela, sem se importar com os outros, como o Cisne Negro.

Aqui tem-se uma ruptura em sua psique que se identifica com a personagem, revelando sua sombra – a parte da personalidade que foi reprimida em benefício do ego ideal. Como tudo inconsciente é projetado, encontramos a sombra na projeção, i.e., na visão de outra pessoa. A sombra representa o que consideramos indesejável em nós e/ou o que ainda não temos consciência dentro de nós.

Através da identificação com a sombra podemos verificar sua bipolaridade, passando a reintegrá-la para o desenvolvimento como também procurando confrontá-la pois ela também pode guardar nossas melhores qualidades. Mas a ruptura de Nina é psicótica e ela começa acreditar que Lilly, sua rival, esteja perseguindo-a em todos os lugares, ficando completamente desorientada.

Além disso, existe toda aquela pressão por parte do Thomas Leroy (o diretor da companhia de ballet), que cobra mais dela espontaneidade, agressividade e sensualidade para a interpretação do cisne negro. Nina só queria ser perfeita, percebemos que toda a fantasia que Nina monta e cria na sua cabeça, é por que na verdade Lilly é tudo aquilo que ela não é, pois ela tem tudo aquilo que o cisne negro precisa, ela é uma perfeita personificação(representação) do cisne negro.

Pode-se perceber uma forma de esquizofrenia pós-moderna, condutora a uma forma de integração criativa. Este caminho é induzido nitidamente pelo professor ao beijá-la e ser mordido por ela, mas como a integração autoerótica não estava pronta, ele lhe sugere que ela se masturbe.

Outra lembrança importante é a dificuldade de integrar a sensualidade devido à ação repressiva da mãe quanto à sexualidade. É interessante registrar que a condição básica para ser a escolhida foi sua agressividade ao papel do cisne negro. Neste momento, a criatividade intuitiva do diretor do filme faz essa integração passar para nível homossexual.

Estamos, portanto, diante de outra situação que dificulta muito o entendimento geral devido à trama complexa do preconceito basicamente moral. Entretanto, se deixarmos de lado as tramas morais preconceituosas, essa passagem fica bem clara, com a poderosa cena da relação homossexual da bailarina com a rival, o que a leva a um orgasmo integrador como descrito acima.

Neste caso específico podemos entender melhor essa poderosa vivência como uma experiência de integração com o duplo anímico erógeno que nela existia apenas como potencialidade.

Mas no caso da protagonista, ela não sabe lidar com esse outro lado, e por isso acaba enlouquecendo. Ao ver em sua rival, tudo que ela gostaria de ser, ela acaba conhecendo um lado que não conhecia: competitivo, agressivo, e até mesmo cruel em alguns momentos. Assim ela vai se transformando e incorporando o personagem mais difícil que ela já teve que interpretar; afinal podemos ver isso, como um reflexo dela mesma, que para ela era inexistente.

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