Um pai que chora não se afoga nas próprias lágrimas.

Um pai que chora não se afoga nas próprias lágrimas.

Imagem de capa: Moonassi

Nasci no Pará, sou filho de gente pobre e com pouco estudo. Neto de cidadãos não civilizados, corre, nas minhas veias, o sangue do índio, negro, caipira, ribeirinho. É tanto sangue correndo que, às vezes, faltam-me veias de chegada.

Surgi num casamento que fracassou antes de eu me dar conta de que existia casamento. Meu pai se embebedava demais, minha mãe fugira comigo e, quando captei essa história toda, eu já era menino maiorzinho.

Na minha infância, chamei meu padrasto de pai. Era o maior homem do mundo, mas ficou pequeno e coube numa morte.

Ele partiu, deixou uma casa e um filho para a minha mãe criar. Meu irmão tinha apenas três anos. Eu sete.  Mamãe, vinte e cinco. Sem o ensino médio, era suprema administradora pessoal (ou empregada doméstica) na casa de uma das vizinhas. Quem mandava no chão e nas louças, preparava os cardápios, uma profissional de alto escalão.

Haveria pessoa mais forte do que esta? Carregando dois filhos, dois lares e um salário mínimo sobre os ombros, com equilíbrio mutante?

Morávamos numa imensa casa de dois cômodos. Eram uns dez metros quadrados e, como eu tinha pouco mais de um metro, sobravam vários pra ocupar. Ali, naquele palácio de madeira antiga (ou velha?), vi minha mãe chorar.

Contida, sugava as lágrimas que desciam. Dormíamos todos na mesma cama. Fingi continuar meu sono. Fechei os olhos, ouvia o soluço dela, com leve dizer baixinho para si mesma.

“Mas vou vencer.”

Eu não sei, até hoje, qual a vitória que naquela madrugada Mamãe queria.  Mas, por vezes que as disputas pareciam me derrubar, eu também deitei no meu quarto sozinho, chorei e disse que iria vencer.

Se um dia eu for pai, quero ser como minha mãe nessa noite.

Um pai que se deita, sente o peso do cotidiano, fala baixinho, enquanto a família dorme. Vive para não interromper os sonhos de quem ele ama.

Na humanidade que tem. Amanhece o dia, levanta-se da cama e, elegantemente, gargalha. Um pai que chora não se afoga nas próprias lágrimas.

 

Inspirado em O Filho Que Quero Ter de Vinicius de Moraes e Toquinho.

 

A vida pede mais abraço que razão

A vida pede mais abraço que razão

A vida pede um pouco mais de você para o outro. Pede que saiba escutar mais e dizer menos. Pede, ainda, que traga partes de você para acrescentar e não diminuir quem quer que seja.

Em todos os momentos que escolhemos dividir, apontar e julgar outras pessoas, na verdade passamos longe de qualquer afeto comum. Porque nem sempre estamos dispostos a entender opiniões diferentes, sentimentos diferentes. As coisas hoje andam tão rápidas e mutáveis e quase não nos sobra tempo para olharmos para dentro de nós e percebemos que, passadas as decepções, gentilezas ainda são o melhor caminho.

Enquanto o mundo obriga mais racionalidade, precisamos manter o espírito acolhedor, livre e sereno. Nada de repelir, instantaneamente, carinhos e sorrisos vindos na direção contrária. Economizar querer para proteção deixa a vida sem sabor. E mesmo nos dias agridoces, existem sim, histórias e relações únicas a serem aproveitadas.

O “não quero” não serve mais. O “daqui a pouco” é muito tarde. Ah, e o “amanhã”, no amanhã tudo pode mudar. Não guarde metade de você se pode ser inteiro hoje. Dê bom dia aos vizinhos, sorria na fila do pão, ofereça um lugar aos que mais precisam. É também, de suma importância, acreditar na felicidade compartilhada. Um estado pleno de cuidado, respeito mútuo e sincronia.

A vida pede mais paciência que urgência. Pede que saiba reconhecer quais os instantes fazem bem para o corpo, para a mente. Pede, ainda, que seja você de verdade todos os dias, sem máscaras.

No fundo, a vida pede mais abraço que razão. E abraçar é tão bom.

Obs: Título retirado da canção homônima do cantor e compositor Tibério Azul

Imagem de capa: A Teoria de Tudo, 2015 – Direção: James Marsh

E se a dedicação evolui para sufocamento?

E se a dedicação evolui para sufocamento?

Imagem: GaudiLab/shutterstock

Era tão fofo aquele cuidadinho inesperado, um bilhetinho no meio dos papéis, o chocolate preferido, a mensagem displicente durante o dia…

Até que começaram as questões. Por que não há reciprocidade? Será que não é suficiente?

Então a dedicação avança mais um passo e passa a tentar controlar horários, porções, conversas, intenções. Quer adivinhar, se antecipar, surpreender, invadir, se apoderar.

Essa é a dedicação que saiu do compasso, perdeu o encanto, virou escrava. Tanto se deu que já nem sabe porque tanto faz. E sufoca, incomoda, constrange.

Dedicação que evolui para sufocamento é resfriadinho que vira pneumonia. O tratamento é longo, agressivo e pode deixar sequelas.

Cuidar do outro é gostoso. Se deixar cuidar é melhor ainda. Mas, se não há medidas, a coisa sai do controle. Sempre haverá um controlador e um mimadinho, um tirano dedicado e um folgado escorregadio. Sem equilíbrio, a dedicação vira obrigação. Ou, sufocamento.

Tem gente que não gosta de mimos. Talvez porque não goste de os oferecer. Tem gente que gosta surpreender o tempo todo. Mas aguarda também a sua vez.

Importante é entender que tipo de relação se tem. E que dose de dedicação soma forças. Muitas vezes, deixar livre é mais saudável do que fazer várias interferências diárias, marcar território, se fazer lembrar.

É importante ser esquecido um pouco. É saudável não estar o tempo todo transitando nos pensamentos alheios. Senão a saudade não vem, o falta que não faz falta.

Todo mundo gosta de marcar seu território, deixar um pedacinho seu, uma assinatura. Porém, isso só funciona se a dose for muito bem calculada e espaçada. Caso contrário, a dedicação perde a paciência e parte para o sufocamento. E essa é uma das mortes mais dolorosas de uma relação.

“Que tempos são estes em que é preciso defender o óbvio?”

“Que tempos são estes em que é preciso defender o óbvio?”

“O mundo não será destruído por aqueles que fazem o mal, mas por aqueles que os olham e não fazem nada. ” Albert Einstein.

Na primeira metade do século passado, Bertolt Brecht lançou um questionamento que parece hoje estar ainda mais atual. A problematização vinha através da seguinte frase: “Que tempos são estes em que é preciso defender o óbvio? ”. Bom, talvez alguém diga que isso só se aplica à época, devido a segunda guerra e ao crescimento do fascismo. Entretanto, os que assim pensam, infelizmente, estão enganados.

Um dos pontos que levam à atualidade das palavras de Brecht está na crise dos refugiados. Fugindo de guerras, da fome, da miséria, da destruição, milhares de pessoas oriundas, sobretudo, da África e do Oriente Médio, se lançam em “aventuras” nada hollywoodianas, na tentativa de chegarem a algum lugar em que possam empreender uma dose de dignidade e humanidade em suas frágeis existências.

Nessas aventuras épicas, principalmente no Mar Mediterrâneo ou “Mar das hipocrisias”, milhares desses sonhos de uma vida melhor caem e imergem no mar, afundando até que não haja mais oxigênio suficiente para mantê-los vivos. Não adianta gritar ou pedir socorro, não há salva-vidas neste território. É preciso seguir à risca a lei do “cada um por si e ninguém por todos”.

Para os que conseguem chegar, existe um aparato afetivo formado por arame farpado, grades e armas em punho para proteger as fronteiras. Esses elementos formam os campos de refugiados, lugar destinado a todos que decidiram fazer uma “trip” pela Europa e conhecer os encantos do velho mundo, ainda que ele não seja o único destino dos turistas, digo, refugiados.

Perdoem o tom irônico, mas não há como ser diferente uma vez que vivemos a pior crise humanitária desde a segunda guerra mundial e, além disso não ser pauta constante de discussões, há ainda o endurecimento normativo em relação à entrada de imigrantes nos principais polos receptores dos mesmos.

Prova disso foi a condenação do fazendeiro francês “Cedric Herrou” ao pagamento de uma multa de aproximadamente 10 mil reais por ter ajudado migrantes a cruzar a fronteira vindos da Itália e recepcioná-los em sua fazenda que fica na região de “Tourrettes-sur-Loup”, na Riviera Francesa. A região é emblemática, pois também foi utilizada por judeus para fugir da perseguição nazista durante a segunda guerra mundial.

De forma corajosa, Cedric não nega as acusações e diz ser seu dever ajudar os migrantes que correm muitos riscos ao tentarem atravessar a fronteira sozinhos. O grande problema é que o ato extremamente humano do fazendeiro é ilegal. No entanto, nem sempre o que é legal é humano. Existem inúmeras provas disso ao longo da história, inclusive, o holocausto nazista.

Desse modo, no momento em que há o desrespeito a leis que tratam outros indivíduos como “lixo humano”, há de se considerar que o mais correto a se fazer é desobedecer às leis, como fez Cedric e como fez Gandhi na sua luta pela liberdade na Índia. Aliás, é de Gandhi a frase que calha bem ao argumento citado: “Quando uma lei é injusta, o correto é desobedecer”.

Outra frase do “Bapu” completa com enorme verdade o raciocínio: “A pobreza é a pior das violências”. Os migrantes fogem da pobreza, seja ela material, seja ela espiritual. Não há humanidade na guerra, na violência, assim como, não há beleza na fome, na miséria, em crianças que morrem por falta de um pedaço de pão.

Apesar de saber disso, o Ocidente vira as costas para esse problema, como se não fosse em nada responsável por vários desses males. Todavia, essas potências que hoje endurecem as suas leis e aplicam sanções a sujeitos que ainda possuem na sua constituição a capacidade de se colocar no lugar do outro, são as mesmas que exploraram e exploram as regiões das quais os migrantes fogem. Ou seja, são responsáveis por roubar o pão, mas não são para dividir os mesmos. Lógica egoísta e desumana para um mundo egoísta, desumano e desigual na mesma medida.

E, dessa maneira, os migrantes, refugiados, “turistas”, chegam do outro lado do mar e embora não encontrem a mesma pobreza material das terras que fugiram, encontram uma pobreza espiritual mesquinha que desnutre ainda mais o sonho de encontrar a humanidade que tanto procuram.

Se na segunda guerra aqueles que escondiam e protegiam os judeus em suas propriedades estavam sob enorme risco de morte por praticar atos ilegais; hoje, pessoas que protejam e ajudem outras que não estão saindo dos seus lares por vontade própria, e sim, por ansiarem por uma vida que seja mais do que não estar preocupadas o tempo inteiro se uma bomba vai explodir nas suas cabeças ou se conseguirão ter mais um dia de vida sem se alimentar, podem ser condenadas ao pagamento de multa ou coisa pior.

E, assim, a história se repete, nós não aprendemos com os nossos erros, novas “Anne Frank” estão morrendo e o nosso mundo cada vez mais globalizado, se torna igualmente mais desumano. Posto isso, eu refaço a pergunta: “Que tempos são estes em que é preciso defender o óbvio? ”

Descrição imagem de capa: Ilha de Lesvos, Grécia – 29 de outubro de 2015. Imigrantes sírios / refugiados chegam da Turquia em barco pelo mar com água fria perto de Molyvos, Lesbos em um bote sobrecarregado, após fugir da guerra na Síria.

Crédito de atribuição editorial de imagem: Nicolas Economou / Shutterstock.com

O amor está no ar! Ou melhor, está na rede!

O amor está no ar! Ou melhor, está na rede!

Imagem: dramalens/shutterstock

Você já parou para pensar o quanto a internet mudou a forma como as pessoas se relacionam? E isso inclui os relacionamentos. Hoje são inúmeros os meios para conversar com seu crush, com o seu namorado ou com o seu marido. Diante de tantos meios, a comunicação se torna cada dia mais importante e é preciso manter espontaneidade, sinceridade e paciência em todos os meios em que ela acontece na relação.

E isso muda a forma como a nossa ansiedade aumenta e a nossa expectativa também sempre que há um novo pretendente na área. Ver quem se interessou pelo seu perfil? Esperar por uma mensagem enviada? Verificar se ele está online? Ficar imaginando se ele combinou no site ou no app só com você ou se está falando com muitas outras pessoas? Monitorar o Facebook? Muitas são as ferramentas dessa nova realidade para alimentar inseguranças e ansiedade.

A culpa é da tecnologia? Não! A culpa é de nós mesmas que estamos usando esses meios para buscar evidências e fatos sempre desconfiando das pessoas que estamos conhecendo. Vemos tudo o tempo todo e, ao mesmo tempo, não vemos nada! Nem tudo o que parece é. Criamos evidências e traçamos uma personalidade do crush com base em seu acervo digital. Medimos a atenção e disposição dele para engatar um relacionamento por tempo de resposta das mensagens. E na verdade, o que isso quer dizer? Não quer dizer nada! Muitas vezes, é só o jeito de ser daquela pessoa que talvez tenha uma rotina mais agitada e não fique tão atento às mensagens de quem quer que seja durante o horário de trabalho, mas compense dando a maior atenção do mundo para você quando está em casa ou em algum ambiente mais tranquilo para engatar uma conversa.

Muitas vezes o fato da pessoa ser mais concisa em suas respostas não necessariamente quer dizer que ela não esteja a fim de conversar com você. Talvez ela seja só direta! Ou seja, será que não estamos criando sinais que não querem dizer absolutamente nada? Talvez esse seja um meio de criar defeitos, achar problemas e não dar uma chance para ver com clareza o que a pessoa realmente é e dar tempo ao tempo para ver o que ele realmente quer com você. A tecnologia já nos ajuda a pular uma etapa para começar um relacionamento. Por exemplo, os sites e apps de relacionamento ajudam a encontrar pessoas com interesses em comum, projetos parecidos e isso já facilita muito, mas não ache que isso faz com que você só se depare com pessoas que pensam exatamente igual a você ou que sejam perfeitas, pois nem você e nem ninguém é.

Calibre suas expectativas e, se rolar um bom papo, marque um encontro e vá disposto a achar uma pessoa normal e que se está lá é porque também está interessada em você. Basta fazer esse encontro fluir com naturalidade, ser sincera e estar aberta para o novo. Afinal, como é que você costuma planejar a sua vida? Você sabe exatamente quais são os acontecimentos e as pessoas que entrarão nela? Você conhece todas as etapas do processo para realizar os seus sonhos? E no amor não é diferente. Aliás, é tudo muito menos previsível e é exatamente isso que torna tudo tão especial! Afinal, o que torna uma pessoa importante na sua vida é ser surpreendida e se encantar pelo que ela é e isso tende a acontecer justamente por vocês serem diferentes.

A moça que achava ser feliz por ter um “marido adestrado”

A moça que achava ser feliz por ter um “marido adestrado”

Adoro ouvir rádio no carro. Vou variando entre algumas emissoras de música, notícias e trânsito! Confesso que muitas vezes canto alto, outras tantas falo sozinha, outras muitas tantas dou risada das coisas que ouço e – é claro! -, não faltam momentos em que fico absolutamente indignada com as notícias que chegam.

Outro dia, ouvia eu uma reportagem sobre o comportamento de homens e mulheres nos relacionamentos. Dizia a entrevistada que homens e mulheres têm formas diferentes de se comportar, principalmente no que se refere a expressar afeto.

Lá pelas tantas, foram sendo incluídos comentários de ouvintes acerca do assunto. Foi então que eu fiquei completamente estarrecida por um depoimento que ouvi. Uma moça, de 32 anos, um ano e meio de casamento dava dicas de como havia feito para “treinar o marido”.

Preciso confessar (mais uma vez!), que eu nunca havia pensado em maridos como “seres treináveis”. Na minha incauta cabecinha treina-se cães, cavalos, já vi até boi treinado… Mas marido?!

Fiquei com muita pena da moça que afirmava que depois de três anos de namoro, mais três de casados o tal “marido adestrado” havia aprendido a lembrar das datas importantes, havia aprendido a comprar flores, e – pasmem! –, havia aprendido a levá-la para passear.

Puxa vida! Eu não sou nenhuma especialista em aconselhamento matrimonial. Aliás, acredito sinceramente que essa história de conselho para melhorar a relação é uma coisa bem esquisita.

Penso que, a relação entre duas pessoas é para ser experimentada a quatro mãos, duas almas dispostas e muitos ensaios e erros. É música que se toca de ouvido, por puro prazer. É salada de frutas que a gente vai aprendendo a combinar.

É claro que a vida não é cor de rosa! É claro que há de haver turbulências! É claro que leva tempo para um casal ir encontrando seus próprios jeitos de lidar com as delícias e também com os azedumes um do outro.

O que eu acho – acho não, tenho certeza! – é que se você precisar treinar o outro para que esse outro caiba nos seus sonhos de felicidade, talvez seja mesmo melhor adotar um cachorro.

Imagem de capa meramente ilustrativa: cena do filme “Sr e Sra. Smith”

 

Se você não aprender a dizer não, a vida dirá não para você

Se você não aprender a dizer não, a vida dirá não para você

Quantas vezes você disse sim querendo dizer não? Não precisa responder agora, mas acredito que muitas vezes. Eu posso responder por mim que já fiz bastante isso e me arrependi amargamente por cada não que calei em mim.

Eu, assim como você, fiquei com medo de magoar pessoas queridas, de decepcioná-las. Fiquei aflita pensando na reação de alguns ou na represália que poderia sofrer por ser fiel a minha verdade.

Muitas vezes eu disse sim, pois não queria me sentir culpada pela frustração, estresse ou tristeza do outro. Não queria ser a responsável pelo pesar de uma pessoa querida, mas ao chegar em casa quem estava se sentindo frustrada, triste e estressada era eu.

Às vezes, dizer um não é tão difícil que parece que dentro da gente acontece uma luta entre o que a gente quer realmente dizer e o que a gente acha ser o mais bonito a dizer.

Então, é comum que a gente caia na tentação de dizer sim só para agradar. De aceitar o que vai contra nossos valores, pela simples razão de achar que esse sim fará com que o outro nos aceite e ame mais.

Não, o outro não vai nos amar mais pelos nossos sins. Eu diria que é o contrário. Quem nos ama de verdade continua a nos amar pelos nossos sins e, especialmente, pelos nossos nãos.

O oportunista, o falso, o manipulador, o aproveitador, baterão em retirada quando suas vontades não estiverem mais sendo satisfeitas. Quando nosso sim deixar de alisar seus inflados egos. Apenas eles, os que fingem se importar, deixarão de ter qualquer  estima por nós quando não formos coniventes com suas vontades. E isso não é mal.

Quem nos ama de verdade busca compreender nossas razões. Nos respeita e entende que temos nossos limites e que abusar deles é abusar do que há de mais íntegro em nós.

Um ótimo exemplo de alguém que não soube dizer não pode ser encontrado no filme “Na Natureza Selvagem”. Nele, Christopher McCandless, um jovem filho de pais ricos, se forma na universidade de Emory como um dos melhores estudantes e atletas de lá. Porém, em vez de embarcar em uma carreira prestigiosa e lucrativa, ele escolhe livrar-se de seus pertences e parte para o Alasca.

O caso de Christopher é emblemático. Ele disse não para si repetidas vezes durante a vida (para agradar aos pais), até que não aguentou mais e, literalmente, decidiu sumir. Pegou suas coisas e foi para o Alasca. No entanto, não teve lá a orientação ou experiência de vida necessária para se manter. Talvez, se Chris tivesse dito sim para si muitos anos antes, ele pudesse ter tido um contato mais íntimo com a natureza e, munido de conhecimento prático, o desfecho de sua história fosse outro.

Não permita que os outros digam o que é certo ou errado para você. Respeite seus valores. Negue o que te parece incorreto, incerto, suspeito, de mau gosto ou não apropriado.

Diga sim para você e aprenda a dizer não para os outros, sem medo e sem culpa. Do contrário, como no caso de Christopher, pode ser que em determinado momento, lá na frente, a vida diga não para você.

Atribuição da imagem: pixabay.com – CC0 Public Domain

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A única coisa que muda na vida é a mudança

A única coisa que muda na vida é a mudança

Imagem: Zastolskiy Victor/shutterstock

Quanto você está disposto a arriscar para fazer da vida algo verdadeiramente novo? Essa resposta determina o lugar em que você estará no futuro. Se você não estiver disposto a arriscar nada, o futuro te encontrará no mesmo lugar em que o presente te encontra hoje.

Não há outra maneira de mudar, senão aceitando o risco da mudança. Eu sei disso e você sabe. Mas escrever e ler sobre isso não muda absolutamente nada. A única coisa que muda a vida é a mudança. A mudança pede atitude de quem percebe a oportunidade de virada, encara o desafio, e faz o que precisa ser feito, correndo os riscos que nela estão embutidos, mesmo sabendo que pode, eventualmente, quebrar a cara. Ou não.

Essa incerteza só se transforma em certeza quando pagamos para ver, mas muita gente prefere se manter na ignorância, e lá na frente, no meio das suas histórias de vida, relembrar “daquela vez” que teve a chance de fazer algo revolucionário e optou por não fazer absolutamente nada.

Por que é tão difícil mudar mesmo quando não estamos satisfeitos com a nossa trajetória?

Porque sabemos que a mudança, por pequena que seja, em alguma medida, não tem volta. Nenhum relacionamento, profissional ou sentimental, ficará aberto, aguardando a volta daquele que decidiu experimentar a mudança. No momento em que se tira o pé de um terreno, fica um espaço que será imediatamente preenchido por alguém que estava de olho naquilo que era seu.

Você entrega, ele pega. Você abre a mão, ele fecha em torno daquilo que te pertencia. Você desiste, ele decide tentar. E ai, acabou-se o que era doce. Ou amargo. Melhor nem olhar para trás e seguir em frente, de maneira estoica e resoluta porque se titubear, e quiser voltar, será apenas para descobrir que não tem volta.

A vida tem uma engrenagem própria que depende de nós para ser colocada em movimento, mas, uma vez que o movimento tenha sido deflagrado, as consequências são automáticas porque envolvem todo o conjunto de possibilidades humanas à nossa volta.

Ninguém consegue ser alguém sozinho. Cada cargo, cada função, cada prerrogativa, cada papel que desempenhamos relacionam-se indiretamente com outras pessoas, com outras instituições, que se introduzem na história segundo as suas conveniências, e por causa disso, a partir do primeiro momento da nossa mudança, podemos esperar uma reação em cadeia que fecha o espaço que ocupávamos de forma irreversível.

No entanto, sem sombra de dúvidas, essa é a vida em plenitude. Vida é risco. Não um risco bobo, mas calculado, inteligente, cheio de planos, de projetos, de tensões que nos impulsionam para a frente, e que nos mantém vivos e não apenas sobreviventes.

Conversando com um amigo médico, ele me disse que, de acordo com uma dessas pesquisas sobre saúde mental, para manter-se saudável o indivíduo precisa deflagrar pequenas iniciativas ao longo da vida, mesmo que elas não pareçam desejadas.

Muitas vezes entramos num círculo vicioso, numa vida acostumada que não nos faz felizes, mas nos imobiliza, por absoluta falta de vontade de tentar algo novo.

Se estamos de férias, vamos sempre à mesma praia. Se frequentamos um restaurante, pedimos sempre o mesmo prato. Se trocamos de carro, adquirimos o mais novo, da mesma marca. Se fazemos um programa de domingo, escolhemos o circuito que tão bem conhecemos e optamos pelas mesmas tarefas que já nos fizeram tão bem, mas que hoje são apenas banais.

E assim, a vida fica engessada em torno de escolhas que, há muitos anos, nos trouxeram alegrias novas, mas hoje se configuram de maneira automática, sem o brilho da novidade de vida.

Nessa hora, a pesquisa mostra, é preciso inovar nas pequenas coisas. Apenas uma pequena mudança de rumo, já é suficiente para arejar e trazer um pouco de frescor a uma rotina embolorada por atitudes velhas.

Thoreau foi um filósofo americano que combatia com ousadia todas as vidas mornas. É dele esta frase: “ É só quando esquecemos todos os nossos conhecimentos que começamos a saber.”

Esquecer os nossos conhecimentos envolve coisas tão simples como desistir do macarrão chinês que você come há mil e oitocentos anos, sempre que vai ao mesmo restaurante, e pedir um prato diferente, em outro restaurante chinês que você nunca frequentou.

Ou deixar de jogar futebol na tarde de sábado para pescar com aquele amigo que te convida sempre, e você nunca aceita. Vai que você gosta. Vai que a paz em torno do riacho te seduz. Vai que pescar seja a sua praia, e você nunca soube. Sem tentar, você nunca saberá.

Entre mudanças radicais e mudanças sutis, fique com aquelas que não te aleijam, que não te matam, que não te paralisam.

Se você tem medo, pavor, desespero, quando pensa em mudanças, talvez seja melhor optar por mudanças sutis, mas perceba que em todas há um risco calculado. E mesmo assim, mude, porque mudar é a única maneira de viver. Bem pode ser que pequenas mudanças te preparem para grandes mudanças.

Quem não muda nada, vive pouco, ou quase nada. Come dos mesmos sabores, sente os mesmos cheiros, vê as mesmas paisagens, ouve as mesmas melodias, sente os mesmos sentimentos, experimenta os mesmos tatos e contatos. Sempre há tempo para mudar.

Quanto mais avançada for a idade de um homem, mais ele deveria introduzir mudanças em sua vida. Afinal, na morte que espreita os nossos últimos dias, os cheiros não existem, os sabores não são percebidos, a paisagem não nos afeta, a alegria e o prazer não nos alcançam, e, portanto, a mudança não cabe. E se cabe, não dependerá mais de nós. Teremos outra capacidade de percepção. Mas enquanto temos esta, vamos buscar a mudança porque ela é a característica mais marcante dos seres vivos.

Almas hospedeiras se sustentam da essência alheia

Almas hospedeiras se sustentam da essência alheia

Ela era uma dessas árvores antigas, de galhos retorcidos, firmeza nas raízes, absorvendo essências subterrâneas desconhecidas e trazendo-as para o mundo em forma de seivas, folhas, força das cascas do tronco e na delicadeza dos galhinhos verdes recém-nascidos.

Era uma árvore autossustentada na poesia de si mesma e nas que pousam em seus galhos que sabem admirar e receber. Ela era circuito de amor, geradora de energia, mãe – dava de comer e beber a tantas outras vidas. Insetos, pássaros, orquídeas. Um pouquinho pra cada.

Mas tinha também uma outra existência entrelaçando-se com a sua.

Era uma espécie de trepadeira sinuosa que lhe abraçava e circulava do chão ao céu, uma planta hospedeira que foi crescendo e existindo nessa relação de dependência. Uma planta que não buscava por si mesma, sua raiz de essência. Ela sugava a substância que ia fluindo nas veias da grande árvore. A grande árvore, mãe, acolhedora, amparava-a e devagar e sempre ia doando mais do que podia. Vivia, mas sem energia para flores, permanecia grande, ereta, mas sem conhecer a plenitude de suas primaveras.

Até que um dia, dentro dessa apatia do mundo, um olhar de fora, observador, de um passante notou a beleza reprimida, a sabedoria bloqueada, a possibilidade de crescimento suprimida. E, num gesto empático, cortou a conexão da trepadeira e deu um respiro desconhecido à grande mãe. As marcas dessa ligação antiga ficaram ainda na derme ressentida da grande árvore.

No começo, ela sentida uma espécie de falta, uma espécie de desconhecimento de si mesma. Quem ela seriam, assim solta na vida? Quem poderia ser, até onde poderia crescer? Qual era o limite do céu?

Deixou-se apenas sentir…

E mal bem despontaram os primeiros raios de primavera, a grande mãe, quase que sem querer, cobriu-se de florzinhas amarelas brilhantes.

O floreio amarelo ouro nasceu por todos os cantos, cobriu as dores passadas, curou os medos inventados, trouxe o alívio da liberdade. Flores que choviam pelos ares, se esparramavam pelo chão, inundavam os olhares, despertavam atenção.

O grande e velho ipê amarelo, enfim, pôde sê-lo.

Quem te pede tempo, jamais devolverá

Quem te pede tempo, jamais devolverá

Imagem: Rawpixel.com/shutterstock

Quem precisa dispor, além do seu próprio tempo, do tempo alheio para pensar, decidir, ponderar, comparar, se encorajar, jamais devolverá ou compensará o tempo dedicado.

Quem te pede tempo, te rouba momentos. Quem te coloca na fila de espera, não te tirará de lá. Quem alega confusão e desorientação, rouba um tempo que não lhe pertence.

Quem pede ao seu tempo que se converta em paciência e compreensão, busca segurança que jamais oferecerá de volta.

O tempo controlado é o tempo escravizado, aguardando uma decisão, um veredito, um rompimento definitivo.

Não disponibilize seu tempo como moeda de troca, crendo nos pontos extras que poderá obter. Quem te pede tempo, pede na verdade um meio de deixar esfriar o que ainda está quente e é mais difícil de lidar.

Não aposte suas fichas no tempo que se arrasta enquanto a espera esmaga uma esperança após a outra. Tempo é separação homeopática. É uma tentativa infantil de despertar uma decisão sem maiores explicações.

Quem te pede tempo, pede mais do que isso. Pede espaço, pede distância, pede silêncio.

E, se quem te pediu tempo voltar, não trará consigo o tempo mastigado e mal digerido. Trará sim uma atmosfera de incertezas e insegurança. Talvez outro tempo seja necessário em breve. E o tempo vai passando…

Quem te pede o que não pode te devolver, te pede que faça concessões em vão, por egoísmo, vaidade ou covardia. Tempo para refletir. Tempo para decidir. Tempo para se encontrar. Tempo para esfriar.

Cuide do seu tempo com carinho. Não o ofereça a ninguém, não se coloque em posição passiva, não aceite condições de passatempo.

A tentativa de viver o tempo do outro é a mais triste forma de matar o tempo que se tem para viver em plenitude! Não dê tempo, dê um até qualquer dia! E a vida segue no ritmo do tempo que lhe pertence.

O tempo coloca cada rei no seu trono e cada palhaço no seu circo

O tempo coloca cada rei no seu trono e cada palhaço no seu circo

Por mais que a vida nos prove que não existe mal que dure para sempre, tampouco caráter que não se desmascare ao longo dos dias, teimamos em focar nossa atenção somente no hoje, no agora, querendo que as coisas se resolvam para ontem, que as pessoas sejam conhecidas o mais rápido possível, que tudo se ajeite rapidamente. E, enquanto ruminamos o que ainda não ocorreu, vamos perdendo chances preciosas de desfrutar tudo o que já é, já está, já acontece.

Em primeiro lugar, nem tudo aquilo em que acreditamos é real, é o correto, é o merecido. Nossas verdades não são absolutas, ou seja, poderemos estar criticando alguém através de suposições infundadas, bem como poderemos estar esperando acontecer alguma coisa que jamais terá condições de se concretizar. Nem sempre estaremos certos, nem sempre nossos julgamentos terão fundamento, nem sempre mereceremos obter o que pensamos ser nosso por sei lá qual direito.

Criamos expectativas muitas vezes inalcançáveis, à medida que não movemos uma palha para realizar nossos desejos, não saímos de nossa zona de conforto, nem oferecemos algo que possa vir a retornar algo em nosso favor. Nesses casos, muitos continuam agindo da mesma forma, esperando resultados novos; permanecem se sentindo injustiçados e inutilizados, sem nem ao menos tentar mostrar o potencial que pensam possuir.

Estamos tão presos ao que o outro tem, inebriados que somos pelos apelos midiáticos que atrelam o sucesso ao acúmulo de bens materiais, dissolvendo valores éticos em meio a valores de mercado, que mal olhamos para nós mesmos e ao que fazemos de nossas vidas. Esperar pelos ajustamentos que o tempo sempre traz não significa, portanto, que seremos agraciados caso não mereçamos, ou que o outro não receberá o que nós achamos que ele não mereça.

Caso estejamos seguros quanto ao que vimos fazendo, caso tenhamos pautado nossas ações pela retidão e pela ética, obviamente colheremos bons frutos futuramente, pois uma coisa que a vida possui é gratidão. Da mesma forma, todos aqueles que agirem de forma vil, semeando discórdia e vendavais, acabarão encontrando as consequências com as quais arcarão às duras penas.

O tempo, a vida, o universo, tudo concorre ao ajustamento das ações e das omissões de cada um. E assistir a isso sempre será um prazer inenarrável.

Imagem: Ollyy/shutterstock

Estamos sabendo agradecer por aquilo que temos?

Estamos sabendo agradecer por aquilo que temos?

Imagem:  Photographee.eu/shutterstock

Provavelmente, muitos de nós, em algum momento de nossas vidas, perguntamo-nos e buscamos dentro de nós entender qual é a nossa missão, para tentar entender a nossa jornada e o que estamos fazendo aqui.

Imagino que nos questionamos isso porque acreditamos que as nossas vidas têm um significado, que elas têm sentido, que têm algum propósito que seja maior que nós mesmos, que tudo é mais profundo do que a superfície que estamos vendo.

Desejamos tantas coisas, temos tantos planos e sonhos para o nosso futuro e sobre a vida que queremos construir para nós mesmos. Não nos fazemos de rogados e queremos ter logo o pacote completo. A nossa casa com a cerca branca, um casamento perfeito, aqueles filhos lindos, com cachorro e tudo. Teremos o nosso ‘felizes para sempre’, afinal, não é aí que o filme termina?

Acreditamos que podemos atingir um estágio, em nossas vidas, onde a felicidade é plena, onde ela é um destino, um lugar estático. Aprendemos, no nosso mundo materialista, que ter ambição é uma coisa boa, pois é assim que chegamos a algum lugar, afinal de contas. Então, queremos, além disso, bastante dinheiro, tipo ganhar na mega-sena da virada, sabe, mais do que poderemos gastar em uma vida. Queremos isso, só isso.

Será que a gente se escuta? Nutrimos tantas ideias, tantos sonhos, tantas projeções de uma vida que, infelizmente, é completamente irrealista, pois não tem nenhuma ligação com a realidade e com o que é possível alcançar em uma história, em uma trajetória de vida.

Sendo assim, por que ainda traçamos uma trama, um enredo, na nossa cabeça, fadado ao fracasso, a naufragar antes mesmo de sair do porto? Por que nos animamos dessa forma com uma decepção anunciada, eu realmente não sei. Mas construímos, sim, às vezes sem nos darmos conta disso, castelos na areia, que apenas uma onda abala e leva.

Há uma diferença colossal, há um abismo entre querer e realmente precisar. Sim, grande parte das pessoas, da humanidade, aliás, desejou, em algum momento, isso ou alguma dessas coisas. Somos humanos e podemos nos deixar levar com certa facilidade pela nossa mania de grandeza, nosso desejo de não sermos pessoas comuns, de sermos famosos, conhecidos, de não vivermos uma vida no anonimato ou vazia de significado.

Queremos tanto e tanta coisa, que não sabemos por onde começar, mas, vamos ser honestos? Por mais que a gente queira, nós não precisamos disso tudo para nos sentirmos plenos, felizes e realizados com a vida que criamos. Não mesmo.

A gente gasta tanta energia tentando ser algo que não somos, buscando uma perfeição que não existe, atrás de um ‘modelo’, de uma lista imaginária que (achamos) temos que fazer para alcançarmos a felicidade, a realização, para termos uma vida bem sucedida. Perdemos tanto tempo tentando ser absolutamente tudo, tudo menos aquilo que nós somos.

Acredito que, mais importante do que nos prendermos a algo que não existe, estarmos presos a uma miragem, a uma ideia fora da realidade, é começarmos a investir as nossas fichas, a focar em algo que podemos trabalhar dentro de nós, algo sobre o que podemos ter algum tipo de controle, pois depende única e exclusivamente de nós.

Temos que nos desviar das cascas de banana, do autoengano, da negação, e aprendermos a nos sentir plenos, a nos sentir contentes com a vida e as escolhas que fizemos para chegar até aqui. Só quando nos permitimos nos sentir gratos pelo que colhemos é que conseguimos trazer mais abundância para as nossas vidas.

Reconhecer e agradecer pelo que se tem, pelo que fomos agraciados, é um movimento, um ato fundamental de humildade e, sem ela, não chegamos muito longe.

Veja, sentir-se pleno é um exercício, é mudar o mecanismo sobre o qual estamos acostumados a pensar, em que medimos o nosso sucesso e o nosso fracasso de acordo com as coisas que temos, de acordo com o dinheiro que possuímos, com apenas realizações materiais.

É começar a ver as coisas de uma outra forma, é aguçar o seu olhar para compreender o que realmente tem algum valor e isso não necessariamente anda junto com dinheiro – na maioria das vezes, não anda.
Sentir-se pleno é aprender a se sentir grato, aprender a se sentir agradecido por tudo aquilo que você tem, por aquilo que você construiu até aqui, pelas pessoas que você tem ao seu redor, pelas oportunidades que a vida lhe deu e por aquelas que foram negadas também. Mas é aí que somos testados, que somos convidados a refletir, a aprendermos um pouquinho mais sobre o que é ser paciente, a vermos até onde vai a nossa fé, até onde estamos comprometidos com os nossos propósitos.

Gratidão de verdade, sem hashtags, sem legenda para o pôr do sol, é algo muito difícil de alcançar, é um processo. É agradecer diariamente pelas pequenas coisas que a vida nos dá, pelas pequenas conquistas.

É acordar pela manhã e agradecer por estarmos vivos, por termos saúde, por termos mais uma oportunidade, um dia novo, mais uma folha em branco para poder (re)começar.

É tomar banho e agradecer por termos um emprego para irmos todas as manhãs, onde podemos desempenhar um trabalho, onde temos a oportunidade de servir e ser útil.

É tomar café e agradecer pelo nosso alimento na manhã e continuarmos agradecendo mentalmente, ao longo do nosso dia, pelas graças que recebemos, por cada momento, todos os dias.

E, um dia, iremos nos dar conta de que não estamos apenas agradecendo, mas que a gratidão, em si, já faz parte da gente, já está não só incorporada ao nosso dia a dia, como na nossa rotina, mas que realmente a sentimos dentro da gente, agradecidos, gratos diariamente pela vida que temos, pelo mundo que criamos para a gente.

Gratidão pela vida que escolhemos, pelos caminhos que nos trouxeram até aqui, pelos amigos que temos ao nosso lado, pela família com que a vida nos presenteou e pela que criamos também.

É uma força que revoluciona as nossas vidas, que põe as coisas em perspectiva e na medida certa, pois ela traz aceitação daquilo que somos, de quem nos tornamos. Que faz com que nos sintamos, gradativamente, dia após dia, realizados, com a sensação de plenitude, por nos sentirmos satisfeitos com a vida que nos foi dada, confiada e com o que conseguimos fazer, com o que conseguimos realizar com essa oportunidade oferecida.

Pequena Miss Sunshine: O bom e velho FODA-SE para os padrões da sociedade

Pequena Miss Sunshine: O bom e velho FODA-SE para os padrões da sociedade

Deleuze falava que o verdadeiro charme das pessoas consiste nos seus traços de loucura. Ou seja, somente quando há uma ruptura com a estrutura é que o indivíduo consegue ser verdadeiramente atraente, de tal maneira que não há interação e sentimento, para ele, onde não há a percepção dos traços de loucura presente nas pessoas.

Corroborando com a visão do filósofo francês, Jonathan Dayton e ValerieFaris nos apresentam o filme “Pequena Miss Sunshine” (Little Miss Sunshine). O filme narra a história de uma família pra lá de excêntrica, marcada pelo dilema entre o sucesso e o fracasso. Nesse universo familiar somos apresentados a Olive (Abigail Breslin), uma garotinha que sonha em ganhar um concurso de beleza. Para tanto, ela treina com seu avô (Alan Arkin), um velho viciado em heroína. A fim de realizar o sonho da garota, a família se desloca em uma Kombi velha (mas, muito maneira) para chegar ao tal concurso, embarcando em um dos melhores Road Movies do cinema.

A excêntrica família passa por uma série de problemas, que vão do cômico ao dramático com perfeição, criando situações ao mesmo tempo nonsense e verossímeis. O grande problema dos personagens é que eles vivem esmagados pela pressão de serem vencedores, buscando cada um ao seu modo a fuga para os fracassos das suas vidas. Até que chegamos à cena final, em que Olive, a criança, promove a libertação dos personagens, mostrando-lhes que independente do que esperam dela no concurso de beleza, ela jamais vai conseguir ser bela sendo alguém que ela não é, isto é, escondendo os seus traços de loucura. A sua coragem promove a catarse que liberta todos dos padrões da sociedade e da ditadura da felicidade que nos obriga a vencer sempre.

A vida é cheia de nuances e complexidades, de coisas ocultas que jamais conseguiremos descobrir, tampouco, dominar. E nós, como protagonistas dessa vida, temos que vivenciá-la com dignidade, aprendendo a lidar com as nossas vicissitudes e, acima de tudo, sendo aquilo que nós somos essencialmente, sem estarmos preocupados o tempo inteiro em atender os padrões impostos por uma sociedade hipócrita, que foi erigida sob o pilar da liberdade, mas que desrespeita esta a todo tempo.

Deleuze é perfeito ao considerar os traços de loucura como a maior beleza que um ser humano possui, já que são esses traços que nos possibilitam a criatividade, a reinvenção, o renascimento. É ela que determina a nossa excentricidade, os nossos maneirismos e, por conseguinte, as nossas idiossincrasias, aquilo que somente nós possuímos e que não encontramos em mais ninguém. Aquilo que nos torna seres singulares e que é guardado na memória daqueles que nos amam.

São os traços de loucura de Olive que a tornam uma personagem tão cativante e apaixonante. É a sua apresentação maluca que deixa ao mesmo tempo sua família e nós vibrantes, que nos faz querer dançar e ser inadequados, sem medo do ridículo e sem medo dos olhares que retiram o brilho da felicidade sincera.

Olive nos ensina a sermos pássaros que voam livremente, fora das gaiolas que a vida adulta e a pressão da sociedade nos colocam, transformando-nos em indivíduos pragmáticos e chatos, sem qualquer tipo de charme, mergulhados no reino da mesmice. Como o avô maluco beleza ensina: “Perdedores são pessoas que têm tanto medo de não ganhar, que nem sequer tentam” e para tentar, antes é preciso ser honesto consigo mesmo, dando o melhor de si, mesmo que as pessoas esperem outras coisas. Ser vencedor é ter coragem para perder com dignidade sendo quem se é, sem máscaras e adequação, com loucura e beleza, dando o bom e velho “FODA-SE” para os padrões da sociedade.

Não somos iguais para estarmos todos em uma mesma forma, bem como, a vida não é uma competição que visa distribuir medalhas para quem chega em primeiro lugar. A verdadeira medalha se ganha quando cruzamos a linha de chegada e ao olhar para trás conseguimos nos enxergar em cada pegada que deixamos, sendo o que quisermos ser em cada situação, fazendo o que amamos independente do que os outros queiram ou achem.

Ninguém precisa ser admirado por todos, nem bem aceito, tampouco, deixar de fazer o que gosta para pertencer ao “grupo”. A verdadeira felicidade consiste em estar livre para voar em qualquer céu e fazer a corrida do jeito que melhor lhe apraz. Olive ensina isso para a sua família, que percebe que os fracassos que possuem também fazem parte da pessoa que são e daquilo que estão se tornando. Ensina, sobretudo, que isso não os torna perdedores, porque o que torna alguém perdedor é desistir de tentar e, principalmente, esquecer o que se é, os seus traços de loucura, para ser vencedor de uma plateia falsa e sem vida.

A vida passa muito depressa para ser um vencedor que voa apenas em uma gaiola. Felicidade, como Olive e Deleuze nos ensinam é voar livremente, enfrentando as dificuldades e as quedas que inevitavelmente sofremos, porque não adianta ser vitorioso de uma vida amarga e sem loucura, já que, lembrando Bauman: “Loucos são apenas os significados não compartilhados. A loucura não é loucura quando compartilhada”, e o compartilhamento só é possível para quem está livre, para que como Olive, consiga dançar na cara dos padrões mecânicos e falsos de uma sociedade chata e hipócrita.

E eu que nasci para o amor

E eu que nasci para o amor

Imagem de capa: Kseniya Ivanova, Shutterstock

E eu que não sei sentir em meias palavras.
O mais ou menos me incomoda.
O quando a gente se vê, também.
Gosto mesmo é de corações entregues.

Saber do hoje é o que interessa.
Tenho pressa para viver beijos inteiros.
Tenho fome de abraços apertados.
Gosto mesmo é de gentilezas sinceras.

Não acredito em promessas em cima da hora.
Quem quer, arruma um jeito de jurar de mãos dadas.
Porque felicidade é encontro com vontade.
Gosto mesmo das conversas na cama.

Mas uma dose sempre cai bem.
Daquelas que deixa o sorriso frouxo.
Daquelas que faz o corpo ficar em sintonia.
Gosto mesmo da garganta soltando versos.

Você é a minha favorita.
Não é difícil de entender.
Não é difícil de explicar.
Gosto mesmo do sentido que isso dá.

E eu que não sei como terminar.
A falta é a janela da saudade.
Quem sabe tropeço no amanhã.
E eu que nasci para o amor.

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