Livro infantil sobre medos ajuda crianças a lidarem com suas dificuldades

Livro infantil sobre medos ajuda crianças a lidarem com suas dificuldades

O medo faz parte da vida e existe para nos proteger de perigos que podem colocar nossa existência em risco. Quando ele chega, a criança fica assustada, chora, não dorme e tem muita dificuldade para compreender qualquer explicação racional.

Para ajudar pais e crianças a lidarem com os medos, a Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita pela Universidade de São Paulo, Ana Macarini escreveu o livro “O Medo de ter Medo”, pela editora PerSe.

“A criança precisa sentir que tem permissão para sentir-se assustada e amedrontada, diante do que não consegue compreender ou ainda não é capaz de racionalizar. Quando tem seus medos acolhidos pelos adultos, a criança consegue evoluir em suas interpretações do mundo e estabelece comportamento afetivo, baseado na confiança.” – comenta a autora.

Segue a Sinopse:

contioutra.com - Livro infantil sobre medos ajuda crianças a lidarem com suas dificuldades“Dizem por aí que todo mundo tem medo de alguma coisa. Dizem também que tem gente que vive fingindo coragem porque tem medo de admitir que tem medo. Sofia Catarina é uma menininha danada de esperta que foi surpreendida certa manhã por uma “voz do além” que vinha de dentro do armário de seu quarto. E foi por causa desse enorme susto que ela acabou descobrindo um jeito de enfrentar o seu pior medo: O MEDO DE TER MEDO! Isso sem contar o monstro que vivia debaixo da cama, o fantasma da cadeira de roupas e… Ahhhh, nem te conto! Ou será que conto?! Mas, e você? Tem medo de quê?”

 

Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita pela Universidade de São Paulo. Escreve crônicas e artigos de opinião para a revista eletrônica CONTI Outra. Apaixonada por crianças e histórias, acredita que as palavras têm vida própria e que, exatamente por isso, têm essa propriedade mágica de se dissolver no papel e renascer por meio dos olhos de quem as lê.

O livro pode ser encontrado no site da editora Perse e possui preços bastante acessíveis.

E se amor der na árvore, você floresta ou desmata?

E se amor der na árvore, você floresta ou desmata?

A gente, muito engajado, começa uma baita discussão socio-ambiental. Bla bla bla. Horas de argumentos, pontos de vista e refutações. Depois beijamos, abraçamos e raramente pensamos no quanto mudanças globais estão afetando nossas vidas íntimas. Nossa percepção nos engana e nos julgamos observadores distantes do mundo.

Pense em 1900. Não havia internet, celular. Quantas relações jamais existiriam hoje se não fossem essas formas de interação? Não é fácil perceber o quanto avanços tecnológicos transformam nossas vidas afetivas. Mas experimente passar dois anos sem falar com as pessoas por mensagem. Qualquer coisa assim simples já escancara o quanto estamos imersos no contato virtual.

Nada contra, nem a favor. É apenas um meio, cada um utiliza como achar melhor. Tem gente que gosta mais, outros menos e assim vai. Porém, há um porém. Muitas pessoas pensam que amor dá no aplicativo. Que ano que vem, todo ano que vem, vai sair uma atualização.

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Queremos que o amor rode bem, sem travar, dê informações precisas e tenha um layout, uma aparência agradável e funcional. Mas as coisas da natureza são indomáveis. 

Mas esse danado não é prático como o Google, nem é um Uber que você chama e em alguns minutos chega.

Essa lógica de uma vida cada vez mais prática é muito boa quando não transferimos para relações humanas. Tem gente que não vai te amar e nem adianta ficar atualizando sua versão. Tem gente que te ama, mas nem todo dia está com sinal disponível. Tem gente que te ama muito, mas não deixou de ser um humano e possui limitações.

Por isso, o amor é mais como uma árvore, bem grande. Dá coisas que um aplicativo jamais dará; como uma manga grande suculenta de sujar a cara toda e uma sombra acolhedora.

Cabe a você desmatá-lo exigindo que ele se reduza a um aplicativo para servir a todos os seus caprichos, ou floreste sabendo que em troca ele lhe dará um ar mais puro.

E ainda bem que amor não dá no aplicativo, imagine, vai que algum juiz  tira do ar?

Taxi driver – a solidão como condição pós moderna

Taxi driver – a solidão como condição pós moderna

Bauman em um dos seus pensamentos diz: “Estamos todos em uma multidão e em uma solidão ao mesmo tempo”. Frase paradoxal, típica de tempos pós-modernos, em que não se tem certeza de muita coisa.

Contraditória é também a história de TravisBickle (Robert De Niro), um homem perturbado psicologicamente, imerso em sua solidão, paranoia e decadência, buscando algo sólido para apoiar a sua existência frágil.

Taxi Driver, talvez a maior obra-prima do gênio Martin Scorsese, nos apresenta Travis (em uma atuação espetacular de De Niro) um jovem que aparentemente serviu no Vietnã e não consegue se enquadrar na sociedade. Sofrendo de insônia, ele decide arrumar um emprego de motorista de táxi, a fim de que possa, ao menos, lidar de maneira menos desgastante com o seu problema.

No entanto, Travis é um indivíduo imerso em um inferno tão quente quanto o vietnamita. Movido por uma autoanálise perene, ele sente e percebe toda a degradação que existe nas ruas, ao seu redor, em cada pessoa e dentro de si. A degradação que existe na vida e que nos torna tão distantes uns dos outros e solitários, com vidas mergulhadas em depressões profundas, em que temos apenas o nosso próprio eu como companheiro.

O comportamento esquisito e a degradação psicológica sofridas pelo personagem se constroem de forma verossímil (o que é acentuado pela trilha sonora de Bernard Herrmann) já que Travis é um reflexo da própria degradação apresentada nas ruas e da própria solidão que apavora cada um. Não à toa, a obra é uma história urbana, uma vez que são nos grandes centros urbanos que a paradoxalidade apresentada por Bauman faz mais sentido.

Nas metrópoles, como Nova Iorque, embora exista uma maior concentração de pessoas, estas estão submetidas a rotinas desgastantes, vivendo sempre com pressa, resolvendo os seus problemas e lutando contra os seus demônios, obviamente (ou contraditoriamente?), sozinhas.

Isto é, saímos de casa, vamos, voltamos, tornamos a ir e não enxergamos nada, não nos enxergam, somos invisíveis atormentados pelo medo, asfixiados pelo nada que as nossas vidas seguem, esmagados pela sujeira nas ruas, que parece ser a única existência concreta no mundo, completando a nossa solidão.

“A solidão me perseguiu a vida toda. Em todo lugar. Em bares, carros, calçadas, lojas, em todo lugar. Não há escapatória. Sou um homem solitário de Deus.”

Diante do vazio que o permeia, das suas incertezas e do seu desencanto, Travis busca refúgio no seu diário, a fim de que possa afastar-se de toda aquela sujeira que ele tanto repugna, muita coisa, inclusive, fruto do seu preconceito e conservadorismo.

Entretanto, o seu sonho sempre esbarra em si mesmo, porque sabe que o ódio que nutre pela “escória” das ruas, é apenas um reflexo da sua própria exclusão e desenquadramento, da sua esquisitice inapropriada e inaceitável pelo lado “bonito” da cidade, de modo que não há como a chuva limpar as ruas, sem que ele também seja levado para os esgotos.

“À noite, saem animais de todos os tipos: prostitutas, cafetões, corruptos, drogados, traficantes e esquisitos de todo tipo. Um dia uma grande e verdadeira chuva vai limpar as ruas de toda essa escória.”

Mesmo sabendo de toda a sua decadência e do mundo, Travis nutre o desejo de fuga do inferno no qual está submetido. Esse desejo é almejado em Betsy, que representa o contraponto de toda a miséria pronunciada pelo protagonista. A rejeição, todavia, por parte de Betsy, de um romance sequer iniciado, acentua para Travis, a incapacidade de salvação, posto que o seu portal de salvação revelou-se somente mais uma passagem para o inferno.
“Agora eu percebo como ela é como os outros… fria e distante. Muitos são.”

Talvez o que Travis precisasse, antes de sucumbir à loucura total, fosse de alguém com que pudesse sair, conversar, fazer alguma coisa. Alguém que pudesse ajudá-lo a tirar umas coisas ruins da cabeça, algo que ele tenta expor, mas sem resultado, a um colega taxista. O que Travis precisava, era o que todos nós precisamos em algum momento da vida: alguém que nos ajude a respirar e sair do mar de lama que estamos mergulhados.

Ele não encontrou essa ajuda, nós, na maioria das vezes, também não encontramos e, assim, quando todas as portas se fecham, a loucura se anuncia como a única saída possível. Para o nosso herói foi dessa maneira.

Após o seu ato de loucura ser praticado materialmente, Travis é condecorado por uma sociedade que antes o excluía. Pior, pelos motivos errados. Nada que fizesse substancialmente diferença para ele, já que o final do filme, assim como o começo, demonstra o mesmo olhar refletido no retrovisor.

O olhar de um homem que sabe que não é herói, que não acredita em heróis, cheio de vazio e solidão, buscando apenas um sentido para a sua vida, embora saiba ao olhar pela porta do carro que: “Os dias passam monotonamente um após o outro, nenhum deles difere do anterior ou do próximo, são como elos de uma longa cadeia, até que de repente surge a mudança.” E, sobretudo, que ao olhar-se no espelho não enxerga nada além de si mesmo, ainda que as duas imagens representem a mesma coisa.

Deusa Iris

Deusa Iris

Deusa grega do arco Iris. Casada com o deus do vento Zéfiro, era considerada uma mensageira entre deuses e homens, principalmente de Hera e Zeus. Os gregos acreditavam que o arco – Iris era uma conexão entre o céu e a terra, por isso esse atributo à deusa.

Essa deusa foi diminuída de posto com o advento do patriarcado, passando a ser a mensageira da deusa Hera – esta uma deusa que perdeu o seu poder para o marido Zeus. O posto de mensageiro oficial foi para Hermes. Ela mencionada na Ilíada, mas nunca na Odisseia, onde Hermes toma seu lugar.

Possivelmente a raiz de Íris é o indo-europeu uei, “dobrar”, donde o latim uiriae, “bracelete”. Íris é a ponte, o traço-de-união entre o Céu e a Terra, entre os deuses e os homens. Comumente é representada com asas e coberta com um véu ligeiro que, ao contato com os raios do sol, toma as cores do arco-íris (Brandão).

É representada por uma bela donzela alada, que se move com muita leveza. Era junto com Hermes a única capaz de se mover entre o mundo humano, o Olimpo, o Hades e os oceanos. Carrega consigo um bastão de mensageiro e às vezes uma jarra de vinho. Também aparece servindo néctar aos deuses. Ela também era a copeira dos deuses.

Iris era bondosa, mesmo tendo ajudado Hera em suas vinganças, principalmente quando Hércules enlouqueceu e acabou com sua família.

Da mesma forma que o arco-íris, ela podia surgir quando menos se esperava e também podia desaparecer discretamente. A parte colorida do olho, a íris, recebeu esse nome por causa dela.

O arco – Iris é um símbolo universal da mediação e dos caminhos. Na Mitologia o Arco Iris é uma ponte para deuses e heróis se deslocarem entre os dois mundos.

Um arco-Iris se forma quando a luz do sol brilha em gotas d’água da chuva. Parte da luz é refratada para dentro da gota, refletida no seu interior e novamente refratada para fora da gota. Esse efeito se deve a gotas suspensas no ar. O espectro de cores que aparece nele são: violeta, anil, azul, verde, amarelo, laranja e vermelho.
O arco-íris não existe efetivamente em um local no céu, trata-se de uma ilusão de ótica cuja posição aparente depende da posição do observador.

Uma curiosidade é que a luz do sol refletida pela lua também é capaz de criar um arco-íris.

Na Escandinávia é a ponte Byfrost; no Japão, a ponte flutuante do Céu; a escada de sete cores por onde Buda torna a descer do céu. A mesma ideia se encontra do Irã à África, das Américas à China. No Tibete, o arco-íris não é propriamente a ponte, mas a alma dos soberanos que sobe ao céu. As fitas usadas por determinados Xamãs simbolizam a ascensão dos mesmos à outra vida.

Na China a união das “cinco cores” do arco-íris é a mesma união de yin e do yang, o sinal de harmonia do universo e o símbolo da fecundidade (Brandão, 1986).

As sete cores do arco-iris representam os sete dias da semana, que também estão associados aos planetas, representando os sete níveis de consciência.

No Tarot Mitológico essa deusa foi associada ao arcano A Temperança, símbolo do equilíbrio e da busca da harmonia entre as polaridades. A alquimia, a transformação, harmonia, circulação de energia.

Como mensageira de Zeus e Hera ela une a chuva (Hera) e o raio (Zeus), simbolizando a união das atividades celestes deles. A união de contrários.

As sete cores do arco-íris no esoterismo islâmico simbolizam a imagem das qualidades divinas refletidas no universo, já que o arco-íris é a imagem inversa do sol sobre um véu inconsistente de chuva (Brandão, 1986).

O arco – Iris é a reunião do alto e baixo, a terra e as águas. É uma resolução.

O arco-íris que surge sobre a Arca de Noé reúne as águas inferiores e superiores, metades do ovo do mundo, como sinal da restauração da ordem cósmica e da gestação de um novo ciclo. Estabelece-se uma aliança entre a Divindade e o homem.

Na cultura yorubá o representante do arco – Iris é o Orixá Oxumare, que representa a mobilidade, a circulação e a atividade. Uma de suas funções é a de dirigir as forças que promovem o movimento. Algumas vezes, é representado por uma serpente que morde a própria cauda.

Oxumarê é um orixá completamente masculino, porém algumas pessoas acreditam que ele seja macho e fêmea. Diz-se que é um servidor de Xangô, que seria encarregado de levar as águas da chuva de volta para as nuvens através do arco-íris.

Conforme Brandão (1986) a associação Chuva-Arco-Íris fez que em muitas culturas essa evocasse a imagem de uma serpente mítica, como Naga, na Ásia oriental. Este simbolismo se encontra também na África e, possivelmente, até mesmo na Grécia, porque o arco, que figura na couraça de Agamêmnon, está representado por três serpentes. Pois bem, tal simbolismo está em conexão com as correntes cósmicas que se desdobram entre o céu e a terra

No Tarot Mitológico, Iris como a Temperança está representada com um arco – iris em forma de circulo, como se fosse uma serpente que morde o próprio rabo,representando assim a Uroboros.

Iris então como arquétipo representa algo espiritual, intangível, um equilíbrio temporário representado pela Uroboros, mas que não é passível de sobrevivência. Ela é a totalidade que tanto almejamos, mas que foi diminuída.

É comum se dizer que há um pote de ouro ao final do arco – Iris.Mas esse final nunca encontramos, porque não é algo objetivo e tangível. É o ouro do nosso inconsciente, que Iris pode auxiliar, como mensageira, a encontramos.

Mas para isso, precisamos ter a humildade dela, para servirmos aos deuses, ou seja, para servirmos de bom grado a forças maiores que nós que se encontram em nossa inconsciente. Precisamos ter a humildade de parar para ouvir suas mensagens, mesmo que não sejam boas de ouvir, mas que servirá para nosso crescimento.

Meu caso de amor é comigo mesmo. Mas de quando em vez eu pulo a cerca.

Meu caso de amor é comigo mesmo. Mas de quando em vez eu pulo a cerca.

Ser alguém que caminha sozinho é bom. Pouca coisa na vida é melhor. Nada nos dá sensação de poder tão grande quanto aceitar nossa condição de seres sós, autônomos, emancipados, livres.

Que privilégio maravilhoso é o sentimento de não depender de ninguém para nada. Que alegria é me dar conta de que não preciso de aprovação nenhuma para fazer o que quero, inclusive fazer nada. Ser só é um presente e eu agradeço todos os dias por isso. Mas confesso: de quando em vez eu saio em busca de outros amores. Tenho comigo mesmo uma relação aberta.

É sempre assim. Por mais longe e mais alto que seja o meu voo em companhia alheia, eu sempre volto para mim mesmo. Eu me pertenço. Não tenho ciúme, não fico inseguro. Não faço cena. Permito-me tomar outros rumos, dormir noutras camas, sonhar outros sonhos, sofrer outras dores.

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Sou livre para trazer amores novos à minha casa, apresentá-los a mim mesmo, um de cada vez, em encontros alegres de corações felizes. Por serem livres como eu, partem quando queiram, sem culpa, sem mais. E se esquecerem uma saudade aqui e outra ali, serão bem-vindas nas lembranças que celebro comigo mesmo de tardinha, quando o sol já se escorrega e a lua se insinua encantadora, linda, sozinha como nós.

Ao meu lado, sou alguém com quem adoro fazer a feira, jogar na loteria, jantar o que há na geladeira. Alguém com quem esperar o atendimento na fila do pronto-socorro, fazer contas, viajar junto revezando a direção do carro.

Sou alguém que tem amor por si mesmo. E que não se importa de dividi-lo com quem vier numa conversinha embriagada, um filme bobo, uma pia cheia de louça, um passeio no sol do parque ou no ar-condicionado da livraria. Essas coisas todas que, normalmente, faço comigo. Mas que às vezes também é bom fazer na companhia de quem vive do lado de fora de mim.

Ternura e um pouco de sacanagem

Ternura e um pouco de sacanagem

Imagem de capa:  nd3000/shutterstock

E foi crescendo, a cada toque e sabor, uma tempestade. Os lençóis arremessados, as roupas caoticamente distribuídas pelo chão e, como se não bastasse, melodias distintas podiam ser identificadas além das paredes. Fora feito um templo dionisíaco, onde, no mais tardar das horas, eclodiria a síntese daquilo que chamamos de amor. Mas era tesão, também. Porque sem esse tremor do lado de fora, o que fica dentro não aquece.

Digam o que quiserem, mas entre quartos silenciosos e janelas acinzentadas, existe tanta vida para dois corpos do que numa multidão eufórica à luz do dia. Trata-se da intimidade no seu mais puro consentimento. Não é para qualquer um, certamente. Construir essa aproximação excitante demanda, não apenas tempo, mas uma entrega desgovernada. Começa com carinhos amenos. Mãos sobrepostas, respirações tranquilas e olhares serenos. Conforme os sentidos ganham intensidade, lábios são tocados, odores reconhecidos e, não muito depois, paladares expostos.

Relacionamentos regidos por doses desmedidas de desprendimentos. Não há tabus, receios e possíveis morais para o transcorrer do acontecimento. Apenas sinestesia que não desafina, impede ou amedronta. Descrevo sobre confiança. É a cumplicidade pedindo passagem e carregando a sinceridade no colo, com ternura e um pouco de sacanagem.

Após intensos goles de prazer, o êxtase natural. Ofegantes, exalaram satisfação pela metamorfose ocorrida. Saúdam ambos. Com as pernas trocadas, os braços confundidos e os dedos desenhando na superfície da pele, curvam-se aos céus – e nem precisariam. Afinal, a libido dançou a noite inteira vestida de amor.

10 filmes Para Refletir Sobre a Complexidade das Relações

10 filmes Para Refletir Sobre a Complexidade das Relações

Todos nós passamos por momentos delicados em nossas relações. Seja pela falta de diálogo, pela insegurança que nos assalta hora sim hora não ou pela dificuldade de decifrar o que realmente se passa dentro da gente. Às vezes não estamos usando as ferramentas certas, os óculos certos, o microscópio ou telescópio certos e não conseguimos enxergar bem o que o outro quer ou mesmo o que nós queremos.

Ainda bem que existe a arte para nos ajudar nisso, para transmitirmos e para recebermos aquilo que não conseguimos dizer nem explicar. Seja literatura, pintura, teatro e por aí vai, a arte nos fornece equipamentos de ponta para a interpretação daquilo que já de mais profundo.

O cinema faz parte desse conjunto e o que apresento aqui é uma lista de filmes que colocam em xeque tudo o que acreditarmos saber sobre o relacionamento afetivo e amor romântico. Confira:

Cenas de Um Casamento (1974)

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Lançado originalmente como uma minissérie para a TV sueca, o filme trabalha bem os aspectos da aparência social e externa do relacionamento – neste caso, do casamento entre Johan e Marianne. Ambos aparentam ser o exemplo de casal feliz, bem resolvido e bem sucedido, até que a visita de outro casal de amigos em crise expõe as rachaduras que Johan e Marianne fingiam não existir.

Este longa-metragem possui a densidade característica de Bergman e é um mergulho profundo nas águas do ressentimento e das intenções ocultas.

Amor Pleno (2012)

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O diretor americano Terrence Malick pode ser considerado descendente direto de Andrei Tarkovsky. Quase sem diálogos e filmado inteiramente com luz natural, o filme segue a proposta de construir narrativas por fluxo de consciência, iniciado em “O Novo Mundo” e aprimorado em “A Árvore da Vida”. Intercalando imagens da natureza, que funciona como espécie de dramaturgia paralela, “Amor Pleno” ensaia um olhar demorado na relação de um homem do interior dos Estados Unidos que leva a namorada francesa e a filha dela para morarem com ele. A partir daí, acompanhamos os lapsos de afeto, decepção, solidão e questionamento existencial que cerca cada um de nós.

A todo momento, somos impelidos a questionar intimamente os aspectos que caracterizam o amor romântico. Além disso, há também na história um padre que passa a questionar outro tipo de amor, convidando-nos a assistir sua discussão particular com o divino.

Latitudes (2014)

 

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Olívia e José são pessoas profissionalmente realizadas, viajando de uma parte para o outro do mundo, sempre a negócios. Depois de um primeiro encontro em Paris, eles passam a se encontrar sempre em um país diferente e aos poucos vamos conhecendo aspectos de suas vidas que voluntariamente omitem um do outro. O Filme foi lançado primeiro com uma websérie com oito capítulos, cada um com um destino diferente. Depois foi compilado e lançado em um único filme. Em cada um desses capítulos somos apresentados também à vida individual de cada um, decifrando melhor suas personalidades. O capítulo sete, de longe o melhor, é uma aula de roteiro que proporciona o momento mais significativo e catártico da trama.

Infiel (2000)

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Um filme arrebatador! Com grandes doses autobiográficas do explosivo e genial diretor sueco Igmar Bergman– que deixou o roteiro aos cuidados de sua discípula Liv Ullmann, responsável pela direção do mesmo depois da morte de Ingmar. O filme retrata o trágico caso entre Marianne, uma atriz bem sucedida e com um ótimo casamento, e David, o melhor amigo do também bem sucedido maestro Markus, marido de Marianne (sim, Markus e Marianne se amam e sim, eles são felizes no casamento).

Expondo de maneira dolorosa e angustiante afetos como desejo e culpa, o longa é uma verdadeira lição sobre a natureza trágica do amor romântico e também sobre a insuficiência da nossa condição humana.

Transylvania (2007)

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Este drama francês é sobre uma garota italiana que viaja com sua melhor amiga para a Transilvânia em busca daquele que ela acredita ser o amor da sua vida. Acompanhamos sua jornada e somos presenteados com imagens estonteantes de festas e lugares culturalmente ricos. Apesar de algumas surpresas ruins, a moça acaba por descobrir que pode estar no lugar certo e na hora certa. Afinal, o acaso também faz parte das relações.

Hiroshima, Meu Amor (1959)

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Atingindo o limite entre literatura e cinema, o filme precursor do movimento Nouvelle Vague conta a história de um caso amoroso entre uma atriz francesa e um arquiteto japonês em plena Hiroshima dos anos 50. Primeiro filme a usar cenas de flashbacks, a produção é também uma profunda reflexão sobre o tempo e sobre a memória.

Dois grandes riscos aos assistir o “Hiroshima, Meu amor”: amar Nevers incondicionalmente e, se você for escritor ou roteirista, ser contaminado por um longo tempo pelo conjunto de relações formais do filme dirigido por Alain Resnais e com roteiro da escritora Marguerite Duras,  que mais tarde viria a ser laureada com o Prêmio Goncourt.

Closer (2004)

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“Closer” mostra a instabilidade emocional de quatro personagens. É um tapa na cara em muitos momentos, pois evidencia muitas das neuras, inseguranças e questionamentos que nós temos e que não somos capazes de expor ou admitir em nossos próprios relacionamentos. Muitos dos nossos próprios medos e desejos são eviscerados fria e calculadamente neste ótimo drama.

Annie Hall (1977)

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Embora tenha sofrido com uma tradução quase dantesca de tão ruim (o título foi traduzido e lançado no Brasil como “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa”), este talvez seja o retrato mais divertido e ainda assim sincero de uma relação amorosa de que se tem notícias. O curioso é que Woody Allen nunca quis fazer humor com o filme. Nele, acompanhamos o comediante neurótico Alvy, que começa a refletir sobre sua vida depois de terminar com Annie, ao mesmo tempo em que se envolve com uma garota muito mais jovem que ele.

Separações (2002)

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A comédia romântica de Domingos de Oliveira é outro exemplo de profundidade e bom humor. Cabral e Glorinha (nomes pra lá de rodrigueanos) resolvem dar um tempo do casamento, mas Cabral não cabe em si de revolta e ciúmes quando descobre que Glorinha se apaixonou por outra pessoa. Arrependido, ele faz de tudo para ter a esposa de volta e envolve em sua trama uma gama de outros personagens curiosos e interessantes. A questão aqui é: é realmente melhor se arrepender de ter feito algo do que de não ter feito?

Ela (2013)

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Sei que é lugar comum colocar este filme em listas deste tipo, mas creio ser necessário assim mesmo. É que não são todas as pessoas que conseguem captar a imensa solidão que permeia toda obra. Não é apenas sobre um homem que se apaixona e se relaciona por seu sistema operacional, é também sobre como estamos cada vez mais solitários no meio da multidão, sobre o desespero que silenciosamente toma conta de nós. Mesmo a tecnologia – com a qual nos relacionamos constantemente ou da qual fazemos uso para nos relacionarmos com outra pessoa que pode estar a quilômetros ou a metros de distância – pode agravar o isolamento antes de nos abandonar. Antes temíamos a solidão, hoje temos medo de companhias reais.

Cuide da sua vida que da minha cuido eu

Cuide da sua vida que da minha cuido eu

A maneira como lidamos com as críticas que recebemos diz muito sobre como somos. Não para quem nos observa através da crítica, mas para nós mesmos.

Se nos incomodamos profundamente com uma crítica, se sentimos raiva e desconforto é porque talvez, em nosso íntimo, concordemos com a crítica, mas não gostamos de admitir.

Quem está plenamente seguro de suas habilidades, potencialidades, personalidade, aparência e escolhas, ou seja, quem está com a consciência tranquila não costuma se abalar ao ouvir algo que não seja compatível com o que pensa de si mesmo e com o que faz. Simplesmente ignora o que ouviu, não sente necessidade nem de argumentar. Não sente necessidade de se explicar. E em alguns casos, até ri.

Ao passo que quem se incomoda com a crítica que recebe e tende a discutir, brigar, argumentar, chorar, pensar obsessivamente no que ouviu e/ou reproduzir a conversa para outros amigos – buscando apoio em sua causa! – demonstra temer que a crítica tenha algum fundamento.

Aprendemos com o senso comum que existem críticas construtivas e críticas negativas. Eu, particularmente, não acredito nisso. Acredito que toda crítica é construtiva quando feita por pessoas próximas, que nos amam e querem o nosso bem.

A diferença está na maneira de falar, no jeito de dizer, na abordagem e na capacidade de sentir empatia.

Se somos cuidadosos e elegantes com nossas palavras em todos os momentos de nossas vidas, se demonstramos (sentimos) empatia com o problema do outro, saberemos criticar com carinho. Mas se formos afeitos à violência, à deselegância, à total falta de empatia, o que teremos para oferecer será violência verbal.

Muitas pessoas confundem crítica com violência verbal. A violência verbal, sim, é negativa, pois visa denegrir, agredir, machucar, ferir. A crítica, não! Se usarmos a crítica a nosso favor – e ignorá-la, muitas vezes, é uma forma de usá-la a nosso favor, uma vez que reforça, ratifica o que pensamos sobre nós mesmos e nossas escolhas – poderemos extrair dela bastante aprendizado e crescimento.

No dicionário, uma das definições de crítica é “arte de criticar ou censurar”.

E quem é que gosta de ser censurado? A censura, de cara, sugere que estamos errados, não? Daí o desconforto! Errar não faz parte do nosso plano original (ser perfeito).

Ao sentirmos raiva de um amigo, irmão, namorado (a), tia, mãe, pai, papagaio ou chefe por uma crítica recebida, muitas vezes estamos sentindo raiva de nós mesmos, raiva por não termos sido suficientemente bons para ocultar o erro que eles teimam em esfregar em nossas fuças.

O mais proveitoso seria refletir, pensar nos motivos que despertaram o nosso incômodo, mas o que fazemos? Adotamos a filosofia do “mate o mensageiro”. Afinal, é muito mais fácil dizer (pensar) que o outro é injusto, grosseiro, perverso e invejoso, se afastar dele (ou travar uma batalha), reclamar do outro para os amigos, do que mergulhar no nosso medo de estar errado – quando mergulhamos nesse medo somos obrigados a repensar nossas escolhas, repensar nossa responsabilidade e, quem sabe, até, a mudar de atitude.

É preciso, sim, passar uma peneira em tudo o que ouvimos a nosso respeito, ao nosso estilo de vida, às nossas escolhas. Mas é preciso, também, saber ouvir o que (aparentemente) não nos convém – inclusive para ter a certeza se não nos convém mesmo ou não.

Quem se magoa, se decepciona, se frustra e se enraivece em demasia com uma crítica, não percebe que está reforçando para o outro e para si mesmo que existe fundamento na crítica. Matar o mensageiro não vai resolver o problema. Observar, avaliar, refletir, aceitar, enfrentar o medo e mudar, talvez.

Os cães ladram e a caravana passa, certo? Certíssimo! Mas para a caravana passar ela precisa estar com as carroças em dia, rodas fortes, e ter um bom condutor de cavalos segurando as rédeas: você.  Portanto, para não se abalar com possíveis latidos é bom mandar a carroça emocional para a revisão e ajustar as rodas da autoestima (autoimagem) antes de colocar o pé na estrada.

E para aqueles com quem não temos intimidade e não conhecem a nossa história de vida, nossas motivações, dores e alegrias, porém mesmo assim insistem em meter o bedelho onde não foram chamados, que tal sorrir e apenas dizer: “Você não está credenciado para falar sobre esse assunto”?…

Sou senhor do meu destino

Sou senhor do meu destino

“Todos nós morreremos um dia. Não podemos escolher como ou quando, mas podemos decidir como vamos viver. Então faça, decida, escolha. É esta a vida que você quer viver? É esta a pessoa que quer amar? É este o melhor que consegue ser? Você pode ser mais forte? Mais gentil? Mais compassivo? Decida. Inspire. Respire. E decida.” Meredith Grey

Nunca antes na história tivemos tanta opção e liberdade para escolher. Em um universo de inúmeras possibilidades e oportunidades escolher muitas vezes é complexo, e é comum que sejamos inundados e até paralisados pelas dúvidas. Acredito que isso acontece porque racionalizamos demais nossas escolhas. Talvez então a razão nem sempre seja a melhor ferramenta na hora de escolher.

O peso de nossas escolhas e nossa maneira de escolher muda muito conforme vamos amadurecendo. As crianças dominam a arte de escolher com o coração. Quando crescemos passamos a racionalizar toda e qualquer escolha, a pesar as consequências, a ter muitas dúvidas, a sentir culpa e remorso. Claro, não é uma boa ideia escolher sempre tão impulsivamente como uma criança, a maturidade é de fato um acervo valioso, mas é preciso sim aprender a equilibrar melhor essa balança.

A palavra coragem vem do latim “coraticum”, que literalmente significa “a ação do coração”. Muitas vezes coragem é aprender a escutar nossos desejos mais profundos, aquilo que nos faz bem mesmo que não tenha lógica alguma, ter coragem é aprender a escolher com o coração. Geralmente as escolhas mais autênticas são aquelas feitas pelo coração.

Todos os dias fazemos pequenas ou grandes escolhas que aos poucos vão escrevendo nossa história “a vida é ligar os pontos, mas só conseguimos ligá-los olhando para trás” disse Steve Jobs. Nesse processo, precisamos acreditar em nossos instintos, desenvolver segurança e confiança de que sabemos o que é bom para nós e escolher. Precisamos também conhecer nossas prioridades, segurança, amor, reconhecimento, dinheiro. Escolha a sua.

Para a psicologia, a chave para escolhas saudáveis está em ampliar nosso mapa mental. Temos que incluir nele um leque maior de possibilidades, para que exista mais flexibilidade na hora de decidir. Quanto mais “estreito” o mapa mental de uma pessoa, menos possibilidades caberão nas suas escolhas e mais limitadas elas serão.

Outro fato comum é acharmos que porque algo nos aconteceu no passado como consequência de uma escolha, todas as vezes que escolhermos parecido sofreremos as mesmas consequências. Tudo isso parece fácil de resolver na teoria, o problema é que temos “amarras” em nossos mapas mentais que nem sempre são conscientes. O esforço vem em desconstruir crenças engessadas e aumentar o campo de visão. Para fazer escolhas mais completas e saudáveis é preciso ampliar o mapa mental e aprender a analisar os fatos como eles se apresentam, com os recursos que existem no momento da escolha.

Conta a história que Thomas Edison falhou inúmeras vezes antes de inventar a lâmpada elétrica, quando questionado como se sentia por ter errado tantas vezes, ele respondeu “Eu não falhei, apenas encontrei 10 mil maneiras de como não se fazer uma lâmpada”. Por mais parecida que seja, nehuma escolha é exatamente a mesma, nenhum erro ou aprendizado são iguais. Cada situação, pessoa, cada escolha é única.

E na hora de escolher temos que levar em conta que não existem escolhas que tragam apenas boas consequências, tampouco existe uma escolha ideal ou perfeita. Aliás, o perfeccionismo pode ser muito prejudicial na hora de escolher. Escolher, na maioria das vezes nada mais é do que um ato de coragem, do que um grande jogo de sorte ou azar.

Escolher é abrir uma porta e fechar muitas outras, é ganhar oportunidades e perder tantas outras, é arriscar e apostar as fichas em algo que pode ser muito bom, ou não. Mas, de qualquer forma só existe uma maneira de saber. A sabedoria na hora de escolher vem ao lembrarmos que nada na vida é estático, permanente, e que podemos sim mudar de ideia, a qualquer momento; tomar novos caminhos, escolher diferente, melhor, pior. Arriscar. Errar. Acertar.

Liberdade para mim tem muito a ver com a proatividade ao escolher, pois se você não escolher, alguém fará suas escolhas por você. Quem não escolhe, é escolhido. Assim, caminhará pela vida passivamente, e me parece um desperdício de energia vital deixar que nosso destino seja traçado pelos outros. O poema “Invictus” termina com um trecho que levo como mantra e que me convida a fazer minhas próprias escolhas: “Eu sou o senhor do meu destino, eu sou o comandante da minha alma”.

Sejamos todos senhores e senhoras de nossos destinos e comandantes de nossas almas.

Decida. Inspire. Respire. Escolha.

Por um mundo com menos reclamação e mais gratidão

Por um mundo com menos reclamação e mais gratidão

Se te perguntarem como você está, mesmo com tanta coisa indo mal, diga que está bem, sinta que está tudo bem até que o céu fique azul, até que a simplicidade do olhar dissolva seus problemas.

Quando te perguntarem como vai o amor, a saúde, os planos, as finanças, não pense no seu bolso, nos seus desenganos, nos seus medos. Apenas diga e sinta que está tudo bem, sorria antes dos pensamentos virem vomitar os dilemas da vida. Acredite ou não, isso é uma revolução!

Acho que reclamar demais faz mal à saúde e contamina tudo em volta.

Reclamar demais pode ser um ato comodista e nada político. Prefiro aquelas pessoas que sempre sorriem e dizem que está tudo bem, apesar de todas as mazelas que as circundam. Eu acho que ver o peso e as sombras da vida cotidianamente, reclamando e empurrando os dias com a barriga, sem fazer nada para mudar é uma atitude que gera energias negativas no mundo. Reclamar demais corrompe nossas mentes, nos tornamos seres rabugentos, sem cor, cansados, andando pela vida como se ela fosse um fardo.

Acho que reclamar um pouco de vez em quando é bom, desabafar é importante para desacumular o que ficou preso no corpo, sem possibilidade de expressão, chorar e xingar pode ser ótimo para acalmar o coração.

Mas reclamar demais, todos os dias, é um comodismo, é um vício de alguém que não quer vasculhar o profundo de si mesmo, não está a fim de empreender grandes mudanças internas, fica nessa de regurgitar nos ouvidos alheios as mesmas chatices, as mesmas frases e histórias , fica nesse enredo manjado de falar mal da vida, de colocar a culpa em tudo e em todos. São pessoas que inventaram essa lente cinza de ver o mundo, e têm mania de nunca estarem satisfeitas, mas também não ousam fazer nada para mudar.

É mais fácil reclamar, falar dos problemas do que encontrar e colocar em prática soluções. É mais fácil despejar nos outros as culpas e ficar na posição de vítima. É mais fácil dizer que a vida não tem sentido do que tentar mudar a estrutura do próprio pensamento e encontrar por aí belezas acessíveis. É mais fácil se adaptar a uma realidade, se ajustar aos roteiros predestinados, do que ter criatividade e coragem para trilhar outros caminhos.

Falta gratidão, flexibilidade e deslocamento no olhar! A gente tende a cuspir no prato que comeu ou a fazer descaso com a vida, sem perceber os tantos presentes que recebemos, os aprendizados, as sabedorias. Focamos nossa atenção na dor, na falta, no que ainda não veio, no que ainda não somos e não temos. Esquecemos de perceber que a vida não precisa ser um caminhar sem sentido, esquecemos de perceber que não são os grandes acontecimentos que colorem nossos dias, esquecemos de olhar nossas tristezas com carinho, e as nossas realizações com ritos e festas, esquecemos de dizer bom dia para o vizinho e agradecer os encontros inusitados, o motorista do ônibus, a flor que nasceu no asfalto…

Eu acho que falta gratidão, falta paixão, falta amor. Não necessariamente você precisa sair nas ruas e mostrar sua voz e seus descontentamentos. Manifestação começa por dentro. Acho que a gente pode fazer grandes revoluções internas que vão inundar e atingir as pessoas à nossa volta. Eu acho que a gente pode escolher ser feliz agora, sorrir, gostar mais de si mesmo, cuidar do corpo e da mente.

Acho que a gente pode escolher tratar uns aos outros com carinho e não com raiva e frustração. Acho que a gente pode assumir a responsabilidade do nosso próprio estar no mundo. A gente pode dizer ‘não’ para os excessos no trabalho, para os abusos nos relacionamentos, para estilos de vida que acabam com os nossos bons sentimentos.

A gente pode escolher dançar a própria dança, aquela que vem da alma e que foge do que os olhos dos outros vão dizer.

A gente pode escolher ser mais feliz, ser menos julgado, mandar um foda-se para o recalque alheio.

E assim, a gente pode viver mais sereno, pleno e consequentemente fazer mudanças na nossa alma e no nosso mundo. É isso que eu chamo de micropolítica: o autoconhecimento em prol de uma sociedade mais harmoniosa.

Espero que a gente aprenda a reclamar menos e a agradecer mais, pois a vida está aí para ser degustada pelos sentidos de quem sabe apreciá-la.

Nossa vida não é um livro aberto. Tem coisa que ninguém precisa saber.

Nossa vida não é um livro aberto. Tem coisa que ninguém precisa saber.

Ahh… eu tenho tanta inveja de quem se envaidece de não ter o que esconder. Gente que bate no peito e declara: “minha vida é um livro aberto”, como um salvo conduto para alardear o que faz de certo e o que não faz de errado. Eu tenho muita inveja dessa gente impecável.

Quem dera minha vida fosse um conjunto de fatos louváveis, perfeitos, exemplares. Gestos lapidares comentados com admiração em todo canto. Mas não é, não. Eu tenho muito o que não mostrar. Meus preconceitos e intransigências, minhas ranhetices e mediocridades. Minhas pequenezas inevitáveis, minhas vergonhas e meus pecados.Tem coisa que só interessa a mim. No máximo, a uma ou outra alma disposta a folhear minhas páginas e depois fechar o livro de novo, com fastio ou com repulsa.

Ainda que a perfeição me fosse franca, Deus me livre de exibi-la por aí como quem busca um prêmio. Contar pra quê? Guardo comigo. Bem diziam a minha avó e a sua: em boca fechada não entra mosca. E de lá também não sai o que não tem de sair.

O universo que me perdoe, mas gente autorreferente e cabotina, sempre afeita a repetir elogios a si mesma, me dá náusea. Vão me desculpar os falastrões, mas quem divulga de graça o que faz de bom, quem se orgulha de uma canalhice e quem começa uma frase dizendo “eu costumo dizer que…” não merecem um pingo de confiança. Dão em mim uma vontade imensa de sair correndo até bem longe, para fora do alcance de quem se acredita tão importante a ponto de citar a si mesmo e a relevância do que “costuma dizer” por aí.

Nossa vida não é um livro aberto, não. Tem coisa que ninguém precisa saber. Contar em todo canto o que ninguém perguntou, para agradar ou atacar, é nada senão uma medonha chatice. Diferente do que pensa sobre si mesmo, um linguarudo não é alguém interessante e admirável. É uma criatura antipática e enfadonha. Um livro que, embora escancarado, ninguém quer saber de ler.

Por uma vida com mais motivos para achar graça e perder o fôlego

Por uma vida com mais motivos para achar graça e perder o fôlego

A rotina em excesso pode configurar uma droga lícita com altos poderes viciantes e até letais. Tudo em nome de uma tal de “excelência”. Mas que porcaria é essa, afinal?
Vivemos sendo assediados por “métodos para melhorar a performance”; “coaching para turbinar a vida financeira”; “bônus para bater as metas no final do mês”; “treino de crossfit para derreter todas as gorduras do corpo”; sem falar naqueles “métodos infalíveis para ser popular, desejável e exercer seu magnetismo pessoal”.

Ufa! Não há quem aguente um bombardeio desses, sem sair com alguns pedaços – físicos, mentais, e espirituais – perdidos por aí, enquanto se tenta infrutiferamente ganhar o prêmio de: o maior, o mais rápido, o mais bem-sucedido, o mais forte, o mais bonito, o mais foda.

Tem, por exemplo, o caso daquele cara que se matou de trabalhar para ter uma casa chique com piscina naquele bairro super classe alta da cidade, onde o metro quadrado é mais caro que uma viagem à praia (ah, sim essa comparação procede). Acontece que o cara comprou a tal casa. Mora lá há dez anos, e nunca, NUNCA deu um único mergulho na maldita piscina. Por quê? Porque não tem tempo nem de se coçar, imagine de nadar.

Se o cara obcecado pela casa com piscina tivesse dado a si mesmo o direito a alguns fins de semana na praia, numa pousadinha despretensiosa mesmo, muito provavelmente não teria conseguido adquirir a citada propriedade, mas também, muito provavelmente, seria mais feliz.

Sim, é claro que algum tipo de rotina é indispensável, ou inevitável. A maior parte de nós, responde pelo próprio sustento. Alguns de nós, responde, além do próprio, pelo sustento de outros. E, é bem verdade, que quase tudo nessa vida custa dinheiro. E também é bem verdade que dinheiro ainda não dá em árvore. Logo, temos hora para acordar, horas a trabalhar, temos que comer, dormir, tomar banho, atender necessidades físicas inadiáveis. Só aí, já se vai quase o nosso dia inteiro, percebe?

Portanto, seria no mínimo algo a se considerar, trabalhar em algo que nos trouxesse alguma coisa além de apenas dinheiro; que a gente pudesse acordar tendo o prazer de um “bom dia” amoroso e gentil; que a gente tivesse a delicadeza de levar à boca algo que seja mais do que alguma “gororoba pronta e processada”; que ao dormir, tivéssemos a leveza psíquica necessária para sonhar e deixar vir à tona, nossas inúmeras vontades reprimidas; que o banho fosse um momento de lavar o corpo e o peso invisível das cobranças e obrigações; e que as nossas necessidades físicas fossem atendidas, porque tem gente que – PASME! –, segura o cocô e o xixi, porque não teve tempo de ir ao banheiro! Como assim?!

Mas, de verdade, tudo isso pode ser revisto, revisitado e transformado. Se no meio de toda essa pressão, a gente achar um jeito de viver, apenas viver. Isso já é alguma coisa. E viver, passa por permitir-se aquelas coisas lindas que fazem a gente achar graça em estar vivo.

Sim! Rir ainda é um dos remédios mais milagrosos deste mundo. E além de um sorriso no rosto, quem sabe a gente não arranje coragem para uma extravagância, algo que nos tire o fôlego… tipo um beijo dado na curva da orelha, sem nenhuma pressa, sabe?

Ahhhh… você sabe! Você sabe. E eu também sei. Que a vida que a gente leva, é a vida que a gente acredita merecer. E, sim haverá momentos difíceis. E crises. E alguma doença que nos tire o sono. Não há como evitar as dificuldades e as más surpresas. Mas, é nosso dever e direito, cuidar para que nossa vida não se resuma a isso. Viver é maior! É mais bonito, quando esperamos da vida o presente que mais secretamente desejamos, e acreditamos que somos merecedores de recebê-lo!

As diferenças entre ser solitário e estar sozinho

As diferenças entre ser solitário e estar sozinho

Não importa com quantas pessoas nos relacionamos, diariamente ou sazonalmente, todos nós nos sentimos sozinhos, em várias circunstâncias da vida, por períodos curtos ou prolongados, com menor ou maior intensidade.

Mudanças de residência, alterações no estilo de vida, novos hábitos, trocas de emprego, rupturas de relacionamento, transferências de escolas ou universidades. Por algum tempo, nós caminhamos com determinadas pessoas no curso da vida. Porém, quando fazemos desvios de rota durante o caminho, muitas delas não nos acompanham, ou delas nos afastamos, por incontáveis motivos: longa distância, desinteresse, perda de afeto, falta de comprometimento, indiferença, ódio, ressentimento, inveja. Que seja.

Parece que, quando passamos por certas transformações, para o bem ou para o mal, para benefício ou prejuízo, somente em seguida conseguimos identificar as pessoas que realmente sentem nossa falta e, dentre essas, aquelas especiais que, naturalmente, permanecem em nossas vidas de forma incondicional.

Cedo ou tarde, bem resolvidos ou não, descobrimos que somos indignos da lembrança da maioria de quem já nos relacionamos, mas honrados pela minoria que nos é preponderante.

O grupo de pessoas que se mantêm próximo a nós – apesar dos ocasos da vida – será maior ou menor dependendo da nossa capacidade de diferenciá-lo dos grupos restantes.

No curso da existência, e para seguir em frente, muitos devem ser deixados para trás, quando não prosseguem por própria deliberação. O problema é que alguns acabam acometidos pela solidão, ao invés de compreender que as suas melhores companhias são só reconhecidas, de fato, após diferidas das piores. É como um processo de eliminação, ao final do qual se sente sozinho quem julga que quantidade vale mais do que qualidade.

Não que devamos ser prepotentes ao selecionar apenas aqueles que pensamos ser menos ruins do que nós, mas sim abraçar quem aceita integralmente as nossas diferenças e não nos crucifica apesar de todas as piores considerações possíveis.

É fácil gostar de alguém quando os interesses são iguais, os costumes e valores são parecidos e os objetivos são os mesmos. Difícil é gostar de alguém apesar das escolhas e ações confrontantes. Em geral, as pessoas agem por próprio interesse. Engraçado como uma grande massa da população evita a solidão, mas age como se a superestimasse.

Há pessoas que se sentem solitárias apenas quando estão sozinhas, e aquelas que se sentem solitárias o tempo todo. Algumas personalidades são inclinadas à introversão extrema, enquanto outras vertem à extroversão aguda, mas a grande maioria delas não é propensa a uma coisa nem outra, e sim à ambiguidade da ambiversão, em que ora desejamos estar sozinhos, ora ansiamos por contato com outros, estando isolados ou acompanhados (para mais informações).

Nós compramos a ideia de que estar sozinho é um mal a ser evitado a todo custo. No entanto, não existe uma alma viva que não precise solicitar ao menos alguns instantes de solidão. A socialização também sufoca se não for aliviada.

Uma vez disse o excelentíssimo escritor Charles Bukowski:

“A solidão é algo que nunca me incomodou, eu sempre tive essa coceira terrível por ela […] Solidão real não está necessariamente limitada a quando você está sozinho.”

Há obstáculos demais ao reconhecimento do valor da solidão. Em 1654, o cientista e filósofo francês Blaise Pascal escreveu:

“Todos os problemas da humanidade resultam da incapacidade do homem de sentar-se calmamente em uma sala sozinho.”

Ora, o desejo de estar sozinho acompanha a si mesmo. Mas, como o prazer decorre da falta, a satisfação da própria companhia nunca é duradoura – na verdade, é sempre menor do que se pensava –, e por isso deve ser constantemente renovada.

Estar sozinho é, antes de qualquer coisa, uma escolha, e essa deve ser feita tendo-se a consciência de que a solidão é uma provável consequência.

É ridícula a atribuição popular de que uma pessoa que escolheu estar sozinha deve ser solitária, ou, então, deve ter algo de errado: essa estupidez do senso comum é infestada em uma sociedade que enfatiza casais como símbolos de satisfação final.

Muitos não se sentem sozinhos quando estão sozinhos, pois estão repletos de uma vida suficientemente enérgica, a sua própria, na qual permanecem conectados de várias formas. Para esses, há um forte senso interno de autoestima, vitalidade e esperança. É claro que é necessário e prudente se reforçar na coletividade, mas a verdadeira força motivacional advém de si, uma vez que não pode ser ajudado ou inspirado aquele que não quer ser ajudado ou inspirado.

Passar o tempo sozinho é mais divertido se for por opção. Quando se está realmente ligado a si mesmo, percebe-se uma potência internalizada tão forte que repercute para muito além da interioridade.

 

Em suma, há pessoas que se sentem solitárias quando estão sozinhas, e há aquelas que optam por estar sozinhas, mas não são necessariamente solitárias.

Atualmente, em um mundo digital globalizado onde, diariamente, há 24 horas de conectividade, é surpreendente saber que muitas pessoas sofrem de solidão? Não. Essa solidão se torna cada vez mais evidente com a influência da tecnologia. Há desculpas suficientes para se evitar contato presencial, e motivos o bastante para se buscar mais conexões líquidas.

O advento tecnológico possibilita inúmeras oportunidades de relacionamento em vários espectros – social, romântico, profissional – mas elas não são mais aproveitadas hoje do que em outrora, salvo exceções. A interação online menos aproxima semelhantes do que os divide.

Hoje em dia, a ânsia por interatividade social esbarra na necessidade de autocentrismo. Para algumas pessoas, experimentar a solidão é como assistir a um filme de terror: procura-se o medo como método de prazer e entretenimento.

Enquanto a solidão pode estimular a criatividade, imaginação e promover maior capacidade de foco e concentração, também pode gerar consequências mortais. Uma pesquisa de 2013, publicada na revista Psychological Science, revelou que pessoas que preferem isolamento social a interatividade presencial têm probabilidade de morte 26% maior do que aqueles que preferem estar cercados de outras pessoas. Isolamento social e viver sozinho foram dois fatores considerados como mais devastadores para a saúde do que ser solitário. Isso é óbvio. A mortalidade é solitária. Mas e se a vida também for, qual o problema?

Sozinhos, não temos ajuda em situações de necessidade emergencial, não compartilhamos experiências, não maximizamos oportunidades, não procriamos, não desenvolvemos. Somos passíveis de definhar. Tudo bem que, independente de nosso grau de convívio social, morremos sozinhos. Entretanto, essa sina pode ser esquecida, se em vida tivermos a sabedoria para aceitá-la, o que requer desprendimento do ego. Isso faz com que a solidão deva ser justificada socialmente, do contrário é vista como sinal de anormalidade.

A solidão é tão demonizada que a escolha de estar sozinho é percebida como uma apologia à decadência.

A escritora Olivia Laing, em sua obra The Lonely City: Adventures In The Art Of Being Alone, diz o seguinte:

“A solidão é difícil de confessar, difícil demais para categorizar. Assim como a depressão, um estado com o qual muitas vezes se cruza, a solidão pode ser encontrada no fundo do tecido de uma pessoa, constituindo uma grande parte de nosso ser, como rir com facilidade ou ter o cabelo vermelho. Então, novamente, pode ser transitória, cíclica e reacionária às circunstâncias externas, como a solidão que segue na esteira do luto ou na mudança de círculos sociais. Da mesma forma que a depressão, tristeza ou inquietação, a solidão também está sujeita à patologização, de ser considerada como uma doença.”

Na espécie humana, depende-se de outros para sobreviver, desde muito antes do nascimento. Somos criaturas sociais que necessitam de outras para prosperar, inevitavelmente, por mais que existam relacionamentos degradantes.

Além das diferenças entre ser solitário e estar sozinho, muitas pessoas também alegam interesse em saber as distinções entre solidão e solitude, se por um erro de cálculo acharem que são a mesma coisa.

Paul Tillich, um filósofo da religião, afirmou em seu livro The Eternal Now:

“A linguagem criou a palavra ‘solidão’ para expressar a dor de estar sozinho. E criou a palavra ‘solitude’ para expressar a glória de estar sozinho.”

Solidão é o afastamento que vem de uma expectativa não atendida. Solitude é encontrar um senso particular de autonomia e liberdade a partir de um sentimento não correspondido. Solidão é uma forma de abandono emocional. Solitude é estar física e emocionalmente livre. Solidão é querer buscar distrações para suportar o vazio das horas. Solitude é esquecer as distrações. Solidão causa culpa e arrependimento. Solitude cultiva amor próprio e deleitamento. Solidão provoca uma sensação de desconexão. Solitude é um efeito da autoconexão. Solidão é chorar sem ninguém ouvir. Solitude é sorrir em silêncio. Solidão depende de alguém para felicidade. Solitude encontra felicidade em si. Solidão é desejar o inexistente. Solitude é aproveitar o que existe. Solidão gera medo e pavor. Solitude promove paz e tranquilidade. Solidão é desencontro. Solitude é encontro. Solidão é corrosiva. Solitude é reparadora. Solidão é tédio. Solitude é entretenimento. Solidão é angústia. Solitude é serenidade. Na solidão, acuamo-nos. Na solitude, exaltamo-nos.

Em seu livro Alegria: A Felicidade Que Vem de Dentro, o orador e escritor indiano Osho afirma que, quando estamos sozinhos, insistentemente costumamos procurar alguém ou alguma atividade para preencher o vazio do tempo. Ansiamos por algo que não existe mais ou, em alguns casos, nem mesmo existiu. Esperamos que uma pessoa, uma empresa, um lugar fará silenciar os gritos de viver apartados. Essa solidão configura um estado de espírito negativo, em que buscamos mais do que precisamos, e queremos nos sentir mais significativos do que achamos ser. Agimos, assim, como eternos insatisfeitos.

A solitude, por outro lado, é um estado de espírito positivo, uma condição muito gratificante de estar. Há uma regularidade de prazer, mesmo que não seja intenso. Basicamente, é não saber explicar por que se está feliz.

Digamos que, para uns solitários, o preço de investir em si mesmo é maior do que suportam. Se os riscos não compensam os benefícios, a solitude passa a ser solidão.

Segundo a editora do site Psychology Today, Hara Estroff Marano:

“Como o mundo gira cada vez mais rápido – ou talvez ele só pareça assim quando um e-mail pode viajar ao redor do mundo em frações de segundos – nós, mortais, precisamos de uma variedade de maneiras para lidar com as pressões resultantes. Precisamos manter uma aparência de equilíbrio e algum sentido de que estamos a governar o navio de nossas vidas. Caso contrário, nos sentimos sobrecarregados, reagimos de forma exagerada a pequenos aborrecimentos e pensamos que nunca podemos alcançar nada. Uma das melhores maneiras de lidar com tudo isso é procurar, e aproveitar, a solitude.”

Muitos se sentem envergonhados por sentir-se sozinhos, especialmente quando esse sofrimento é comparativo com o dos outros. Essa vergonha nasce no reconhecimento de que isolamento social é prejudicial à saúde física e psicológica, mas também de uma compreensão errada sobre solidão, a de que é uma ameaça iminente. Também é comum (e precipitado) associar que uma pessoa solitária seja mais distante, estranha, egoísta, frívola ou insensível do que aquela que mantém vínculos afetivos altruísticos.

Sentimentos de solidão costumam emergir principalmente após término de relacionamentos: amizade, trabalho, romance. Não mais existe o contato que se tinha, e queremos que retorne. Queremos tanto que isso nos afeta catastroficamente. É uma falha de desapego. Assim, solitários, esperamos que o próximo passo seja superar essa triste sensação insuportável de isolamento.

Todavia, antes de iniciar um novo relacionamento, seja qual for, devemos estrategicamente reconhecer a felicidade em nós mesmos. Se não a identificamos, é porque faltaram três coisas: autoconhecimento, gratidão e desejo de vontade.

Se, solitários, procuramos alguém só e somente só para suprir um vazio existencial da perda ou da falta, estamos investindo numa relação fadada à derrocada final: solidão.

Não há nada que possa fazer evitar o vazio da existência, a não ser que se conviva com isso sem se enganar. Ninguém deveria começar um relacionamento enquanto está solitário: essa é uma receita para o desastre.

Uma vez que estamos sozinhos e sinceramente felizes em estar sozinhos, sem sentirmo-nos solitários, curtindo a solitude, somos capazes de construir (e manter) relacionamentos com irmãos e amados.

Por estarmos sozinhos, às vezes sentimos carência, e então pensamos que outro alguém poderá suprir a falta. Essa possibilidade é tão atrativa que as pessoas se agarram a ela com unhas e dentes. Mas não deixa de ser um perigo. Ao buscarmos suprir um vazio interno em outra pessoa, através de uma relação amorosa, por exemplo, talvez tornemo-nos dependentes dela a um nível que, passada essa relação de dependência, ampliamos o vazio. Dessa maneira, é mais sensato que dois inteiros se aliem do que duas metades se complementem.

A cura para a solidão não está em encontrar alguém, não necessariamente. Muitas das coisas que nos afligem, como ser solitários, são, na verdade, resultados de forças maiores do que estigma, carência e exclusão, que podem (e devem) ser resistidos. A solidão é pessoal e filosófica.

Em seu livro Loneliness: Human Nature And The Need For Social Connection, William Patrick e John Cacioppo discutem suas descobertas a partir de pesquisas sobre pessoas que se subvertem à solidão. Um achado é que as pessoas solitárias não discriminam direito enquanto estão fazendo comparações sobre o que é verdade entre elas e o resto do mundo. Suas lentes são subjetivas como a de qualquer um, mas também distorcidas. Não reconhecem beleza, valor e competência em si próprias da mesma forma que percebem tais atributos nos outros.

Outro achado dos autores é que uma pessoa acometida pela solidão por extensões consideráveis de tempo tem sua capacidade de empatia e autocompaixão prejudicada; a dor da solidão as priva disso ao consumirem-nas silenciosamente. A solidão dirigida se transforma em entendimento humano precário. Necessitamos de conexões sociais, do contrário, cedemos à selvageria. Segundo Patrick e Cacioppo:

“Qualquer que seja a sensibilidade individual, o bem-estar sofre quando a nossa necessidade particular de conexão não é cumprida.”

Bom, não é preciso estar sozinho para se sentir assim. Alguém sozinho num deserto há 200 dias obviamente perderá a noção de que é preciso se isolar. A necessidade de solitude aparece em meio à multidão, mas é suprida fora dela.

A dor de ser solitário ressoa no peito de forma consistente. São sensações que perduram por mais tempo do que se espera. Normalmente, esses sentimentos são mais proeminentes quando perdemos alguém ou algo que nos oferecia uma razão de viver. É excepcionalmente importante lembrar o seguinte: o fato de uma pessoa ser solitária não quer dizer que ela vá deixar de o ser quando reencontrar essa razão de viver. A solidão é pessoal e filosófica.

A escolha de estar sozinho acompanha uma responsabilidade deletéria por sustentar essa condição, do que se percebe que independência pode ser ilegítima. Na realidade, o indivíduo que se considera (ou é considerado) independente nunca poderá negar que dependeu da ajuda de outros, poucos ou muitos, para construir seu império. Ele até pode se convencer com a ideia de pertencimento total, contudo, essa ilusão pesará na sua consciência, até que deixe um legado significativo o bastante para se julgar merecedor do que lhe foi legado.

Evidentemente, existem aqueles momentos em que estar sozinho cruza o caminho de ser solitário. Esse caminho se divide em vários trechos, nos quais precisamos decidir para onde seguir. E nos confundimos, muitas vezes, ao fazer essas escolhas.

Há múltiplas pessoas que absolutamente adoram a ideia de permanecer sozinhas, valorizando seu silêncio e admirando suas introspecções criativas. Uma autora britânica chamada Sara Maitland escreveu um livro, How To Be Alone, no qual relatou:

“Eu me tornei fascinada pelo silêncio; pelo que acontece ao espírito humano, a identidade e personalidade quando a conversa para, quando você pressiona o botão de desligar, quando você se aventura nesse enorme vazio. Eu estava interessada no silêncio como um fenômeno cultural perdido, como uma coisa de beleza e como um espaço que havia sido explorado e usado uma vez ou outra por diferentes indivíduos, por razões diferentes e com resultados radicalmente diferentes. Comecei a usar minha própria vida como uma espécie de laboratório para testar algumas ideias e ver o que senti. Quase para minha surpresa, descobri que amava o silêncio. Ele me convinha. Eu estava ávida por mais dele. Na minha busca por mais silêncio, eu encontrei este vale e construí uma casa nele.”

Maitland ressalta que, em geral, a palavra “solitário” implica em infelicidade. É como se o contrário – ser sociável implicar em felicidade – fosse verdadeiro, e sabemos que nem sempre é. De acordo com a autora, “vivemos em uma sociedade que diz que quem está sozinho é, de alguma forma, uma pessoa que falhou como humano”. Mas é preciso falhar para ser humano, não uma, duas, mas infinitas vezes.

A grande maioria talvez discorde, mas estar sozinho pode ser uma das experiências mais poderosas de uma vida inteira. Só que, se deixarmos a solidão nos consumir, perderemos a chance de experimentar desse poder. E, ao perder essa chance, nos tornamos mal acostumados à singularidade.

Apesar de a solidão nos forçar a encontrar um sentido existencial em outras pessoas, sempre seremos capazes de encontrar tal sentido em nós mesmos, se estivermos dispostos a encontrar-nos, o que envolve sofrer e aprender.

Ter tempo para estar sozinho não significa que se estará sozinho para sempre. Quanto mais tempo trabalhamos a confiança na solitude, menos dependente estaremos de fontes externas.

Em seu livro Em Busca de Sentido: Um Psicólogo no Campo de Concentração, o médico, psicólogo e psiquiatra austríaco Viktor Frankl relata suas tocantes experiências de trabalho como escravo nos campos de concentração nazistas, compreendidas por três longos anos. No ínterim desse tempo, ele conta que nunca se sentiu tão sozinho na vida. Para sobreviver, no entanto, Frankl reuniu uma força motivacional tão extraordinária que foi capaz de encontrar significado a partir de um sofrimento inimaginável (saiba mais).

Nietzsche, por exemplo, acreditava que abraçar a dificuldade é indispensável a uma vida cheia de sentido, e pensava que a solitude, se bem aproveitada, nos permite galgar a existência até o fim. Segundo o filósofo:

“Ninguém pode construir uma ponte sobre a qual você, e somente você, tem que atravessar o rio da vida. Pode haver inúmeras trilhas, pontes e semideuses que de bom grado o ajudam a atravessá-lo, mas apenas ao preço de penhora e renúncia a si mesmo. Não há um caminho no mundo que alguém pode andar além de você. Aonde isso vai levar? Não pergunte, ande!”

Imagem de capa: Warpboyz/shutterstock

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