Pensar em alguém que se ama é uma forma de orar por ela

Pensar em alguém que se ama é uma forma de orar por ela

Fechando ciclos, encerrando histórias e permitindo que o tempo faça o trabalho dele, seguimos para mais um ano. Olhando para trás, percebemos que a música nem sempre foi constante, mas aprendemos a dançar conforme o ritmo, acelerando um pouco mais durante os acordes complexos e fluindo suavemente quando a música permitia.

Nem todo movimento foi perfeito. Alguns tons graves também fizeram parte da melodia, e a gente correu o risco de chorar um pouquinho enquanto a música fluía.

Este ano, o marido de uma grande amiga ficou doente. Ela estava triste, desanimada, sem forças. Em certo momento me disse: “não estou conseguindo rezar por ele”. Não era falta de vontade, e sim falta de esperança. Então me deparei com uma frase atribuída à Santa Terezinha: “Pensar em alguém que se ama é uma forma de orar por ela”. E disse isso à minha amiga. Que ela pensasse nele com amor. Que ela carregasse ele em seu pensamento. E assim estaria orando por ele.

Junto me veio à lembrança outra frase, do filme “Comer, rezar, amar”. Em certo momento, um dos personagens diz à Liz: “Mande luz e amor toda vez que pensar nele. Depois esqueça”. A frase me fez lembrar as pessoas que amamos e por alguma razão não estão mais ao nosso lado. Talvez seja hora de orarmos por elas. Talvez seja hora de mandarmos luz e amor a cada pensamento que tivermos acerca delas.

Nem sempre é fácil assimilar o fim de uma relação. Ficamos dependentes, com saudade, com muita vontade de ligar, encontrar, mandar uma mensagem. Temos que lidar com a impossibilidade e com a imperfeição. Talvez seja hora de transformar nosso pensamento e vontade em oração. Hora de mandar energias positivas a essa pessoa e enfim colocarmos a cabeça no travesseiro e dormir.

Seu coração pode ter sido despedaçado, mas uma das formas de você se reerguer é desejando o bem da pessoa que se foi.

Por mais que doa, transforme o pensamento em luz. Por mais que sinta falta, transforme a saudade em oração. Por mais que tenha descosturado as coisas dentro de você, transforme a dor em amor.

O fim do ano nos permite reavaliar a rota e nossos passos com clareza. Permite que ao encerrarmos um calendário e começarmos outro, encerremos também muitas coisas dentro de nós.

Que possamos deixar para trás o que torna nossa bagagem mais pesada: as mágoas, decepções, saudades vazias e dores de um tempo que se extinguiu. Que toda dúvida seja dissipada e toda angústia seja transformada.

Não espere chegar o dia de ferir quem te feriu, de magoar quem te magoou, de estar por cima enquanto alguém se afunda. Em vez disso, transforme seu pensamento em prece. Envie luz e amor toda vez que pensar nessa pessoa e depois esqueça.

Deixemos morrer o frio da indiferença, o silêncio da ausência, o vazio da descrença. Que o telhado de nossas alegrias nos dê abrigo e nos proteja do que não traz conforto e paz. E que, virando a última folha do nosso calendário, possamos pensar no tempo não só como um período de recompensas, mas também de ajustes, perdão, oração e reconciliação _ com quem fomos e com quem queremos ser…

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7 sinais de que seu amor pode ter se tornado patológico

7 sinais de que seu amor pode ter se tornado patológico

Por Maris V. Botari-Psicóloga Clínica

Imagem: bruniewska/shutterstock

Teoricamente, o amor é algo positivo, saudável que visa agregar qualidade de vida às pessoas, colaborando para o aumento do bem estar e da saúde física e mental.

É por meio deste sentimento que muitas coisas boas são construídas.

Infelizmente, em nome deste sentimento, muita destruição e tragédia ocorreram ao longo da história. Podemos citar como exemplo a Guerra de Tróia, que começou em função do fatídico amor de Paris pela bela Helena.

É necessário esclarecer, primeiramente o que se entende por amor doente (ou neurótico). Para Fromm (1973) O amor neurótico é caracterizado pelas “falsas concepções do amor” que levam os indivíduos a desenvolver comportamentos compulsivos e pensamentos obsessivos, bem como relações de dependência.

Este amor neurótico começa quando um indivíduo coloca “a vida nas mãos de alguém”, passando a se comportar em função do outro. Isto pode levar a um comprometimento da própria vida social, uma vez que em muitos casos, o indivíduo que “ama demais” tende a colocar a relação afetiva no centro de sua existência, como se nada mais existisse – lovecentrismo.

Para evitar esta armadilha é importante lembrar sempre que um relacionamento envolve mais de um indivíduo, com semelhanças e diferenças que devem ser respeitadas, portanto não é adequado deixar de viver de acordo com seus princípios para abraçar os princípios alheios. Isto não é amor, é dependência!

Esta dependência tem como desdobramentos: a ansiedade, o pensamento obsessivo e o ciúme patológico, que pode ser definido como manifestações desmedidas de controle sobre o outro.

É caracterizada por alguns pensamentos distorcidos e comportamentos obsessivos característicos:

Pensamentos:

  1. De controle ” Onde ele (ela) estará?”
  2. Leitura Mental: “Será que está pensando em mim”?;
  3. Insegurança: “Será que ele (ela) me ama de verdade?”;
  4. Onipotência: ” Tenho que fazer tudo o que posso para agradar”;
  5. Leitura mental: “ele (ela) deve estar sentindo minha falta”; “não ligou porque eu fiz algo errado”
  6. Catastrófico: ” eu morreria sem ele (ela)”;
  7. Generalização: “ele (ela) é tudo pra mim”, nunca mais vou amar ninguém assim”, “sem ele (ela) nada mais tem sentido”.
    etc.

Comportamentos:

  1. Vigiar o parceiro, aberta ou secretamente; seja fisicamente ou por meio das redes sociais;
  2. Exigir que o parceiro mantenha contato, mesmo quando isto é impossível;
  3. Mandar muitas mensagens via celular, mesmo sabendo que o outro não quer, ou não pode responder;
  4. Perder a capacidade de tomar iniciativas, delegando ao outro a tomada de decisões sobre sua própria vida;
  5. Mesmo quando a capacidade de tomada de decisões está preservada, estas são tomadas visando a proximidade e/ou o bem estar do outro;
  6. Abrir mão de seus interesses particulares para “viver somente para o outro”;
  7. Distorcer o que o parceiro (a parceira) fala e faz;

Se você, ou alguém que você conhece vive este tipo de relação, é o momento de buscar ajuda psicológica, para aprender a amar com mais segurança, em busca de uma relação mais saudável, que possa ser vivenciada com mais alegria e segurança.

Referências

FROMM, Erich. A arte de amar. São Paulo. Martins Fontes. 1971

De morno só aceite banho. Amor tem que ser quente e inteiro, sim!

De morno só aceite banho. Amor tem que ser quente e inteiro, sim!

Relacionamentos não são fáceis. Mantê-los com a paixão em alta, então, parece tarefa para gigantes, pois além de envolverem pessoas diferentes, a rotina torna tudo mais calmo e comum. Mas, acredite, é possível fazer da rotina uma aliada do romance e aumentar a cumplicidade do casal no convívio diário.

O amor permite que convivamos diariamente com uma pessoa educada diferente dos nossos costumes. Aprendemos a entender (e a respeitar) todas as diferenças. Desde sentarmos à mesa, à forma de escovarmos os dentes. Começamos a entender que o amor é feito de detalhes e que, mesmo que não dê para fazer um jantar à luz de velas todos os dias, nem mandar rosas todas as noites, dá para ser gentil nos detalhes. E isso é o que importa!

A rotina, diferente do que muitos pensam, nunca foi um problema para o relacionamento. Aliás, é somente através dela que os laços do amor se criam e se fortalecem. O convívio diário permite a construção de uma relação forte, segura e com planos em comum. O problema é que alguns confundem rotina com comodismo, frieza com estilo de vida e descaso com normalidade.

A gente tem dessas mesmo de se acomodar. De não tomar iniciativa em terminar. De aguentar humilhação com medo da solidão. E a pergunta é: para quê? A vida é uma só! E passa tão rápido! Tanta gente bacana disposta a entrar na nossa vida para nos fazer feliz e a gente preenchendo espaços com gente vazia. Amor não é isso. Amor é entrega. É oito ou oitenta. É tudo ou nada!

Não dá para viver um amor meio termo. Na verdade, nada “meio termo” serve: gente que vive em cima do muro irrita, água morna não serve nem para fazer chá e amores rasos só servem para gente carente. Amor foi feito para pessoas inteiras!

Compartilho da mesma ideia de Martha Medeiros ao escrever que as coisas mornas são perda de tempo: “Sempre desprezei as coisas mornas, as coisas que não provocam ódio nem paixão, as coisas definidas como mais ou menos. Um filme mais ou menos, um livro mais ou menos. Tudo perda de tempo. (…) O que não faz você mover um músculo, o que não faz você estremecer, suar, desatinar, não merece fazer parte da sua biografia.”

Amor não é servido em fatias, em metades. Amor é plenitude. Chega uma hora em que é preciso ultrapassar as mensagens de whatsapp, os textões do Facebook e as fotos do Instagram e provar por A+B que amor é rotina sim! Amor de verdade dá frio na barriga, mas também da vontade de acordar juntos todos os dias. Dá borboletas no estômago, mas dá vontade de planejar a casa nova. Dá alvoroço nos pensamentos, mas dá vontade de buscar os filhos na escola.

Isso é amor inteiro. A partir do momento em que você começa a não ver o seu relacionamento dessa forma, é hora de repensar se ele já não acabou, há muito tempo, e você nem percebeu. Para Proust: “Para quem ama, não será a ausência a mais certa, a mais eficaz, a mais intensa, a mais indestrutível, a mais fiel das presenças?”

Amor morno é a maior crueldade a qual podemos nos submeter. Quando não há mais saudade, quando a presença não é mais motivo para romance, quando as desculpas para não se encontrar são as mais esfarrapadas possíveis, não há porque insistir.

Metades aceitamos de um pedaço de bolo, de uma melancia, de um queijo. Não de um amor. Como dizia Clarice Lispector: “Não sei amar pela metade. Não sei viver de mentira. Não sei voar de pés no chão. Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma para sempre”.

Não dá para aceitar um sentimento raso por comodismo ou pelo fato de você ter cansado do ciclo: conhecer alguém- trocar mensagens- conquistar- namorar. Se não está disposto a amar com tudo, nem entre em um relacionamento. Amar é coisa de gente forte mesmo!

De gelada deixa a cerveja, de metade deixa a conta do bar e de morno deixa o banho. O restante tem que ser quente e intenso, sim!

Imagem: solominviktor/shutterstock

Gênio Indomável: A cura por meio da empatia

Gênio Indomável: A cura por meio da empatia

A vida nesta terra é dura. Somos expostos ao sofrimento, a dor, a feridas e a angústias. Alguns sofrem mais, outro menos, mas todos sofrem.

Como lidar com algo que nos machucou e nos fez sofrer? Qual a importância de ter alguém disposto a nos ajudar? Alguém que se preocupe de fato conosco e queira nos entender? Alguém disposto a decifrar um Gênio Indomável?

Essas questões são apresentadas no filme “Good Will Hunting” (Gênio Indomável) escrito pelos amigos Matt Damon e Ben Affleck, com direção de Gus Van Sant. Na trama, Will (Damon) é um garoto problemático, que facilmente se envolve em confusão e com problemas comportamentais.

Além disso, Will tem dificuldade em criar vínculos, na verdade não os cria. Antes que possa estar ligado a alguém, desfaz a relação, a fim de evitar frustrar-se com o abandono e, consequentemente, com o fim da relação.

Will tem esse comportamento em função de traumas ocorridos na infância, quando sofrera maus tratos e fora abandonado por aqueles que deveriam tratá-lo com carinho e ter estado ao seu lado. No entanto, apesar da infância traumática e conturbada, além dos problemas de comportamento, Will é um gênio e, assim, acaba chamando a atenção do renomado professor Gerald Lambeau (StellanSkarsgård) que passa a acompanhá-lo, após o jovem se envolver em mais uma confusão. Nesse acompanhamento, Will deverá ter aulas de matemática, fazer terapia e arrumar um emprego no campo matemático, obviamente.

A partir de então se inicia o cerne da história, a saber, a análise psicológica de Will, um jovem extremamente genioso, mas genial, sob duas perspectivas diferentes. A primeira é a do professor Lambeau que vê Will apenas como um gênio da matemática, o qual deve aproveitar esse talento para trabalhar em uma grande empresa e se tornar conhecido pela sua genialidade.

Lambeau não consegue enxergar o jovem como uma pessoa totalmente frágil que precisa de ajuda. Ele enxerga tão somente um gênio da matemática e para ele não há outra possibilidade para Will a não ser torna-se esse gênio.

Com uma perspectiva totalmente diferente aparece Sean (Robin Williams), um terapeuta que está acompanhando Will. Sean enxerga o jovem como um humano, assim como outro qualquer. Reconhece a sua genialidade, mas também vê as suas fraquezas. Aliás, percebe que por trás de um sujeito autossuficiente e arrogante, esconde-se um garoto frágil e com medo, que precisa desesperadamente de ajuda. E ele é essa ajuda.

Sean é sensível para perceber que o gênio forte do garoto é uma autodefesa, já que quando criança Will sofrera muito e isso causou traumas psicológicos, como a sua violência e, acima de tudo, a sua incapacidade de se ligar a alguém, pois na sua cabeça o abandono é algo iminente, visto que todos aqueles que deveriam cuidar dele na infância o abandonaram.

Ao assistirmos ao filme podemos achar que qualquer um seria capaz de perceber a complexidade da vida de Will, mas, a bem da verdade, isso não é tão simples, uma vez que diante da sua genialidade, poderíamos como fez o professor Lambeau, desconsiderar o que ele sofrera. Contudo, Sean tinha a sensibilidade necessária para ir além do gênio, duplamente, e chegar ao homem.

Através da empatia, Sean consegue se colocar no lugar de Will e busca sentir a sua dor para que possa compreender o que leva o garoto a agir daquele modo tão agressivo e defensivo. Sean não se esconde atrás de uma capa, mostra quem é de fato, o que gosta, suas feridas, suas dores, suas realizações e com isso, pouco a pouco vai conseguindo ganhar a confiança do jovem, bem como, conectar-se a ele.

Essa conexão só é possível por Sean se abrir com Will, por não forçar a barra querendo ser simpático o tempo todo ou ficar puxando o seu saco pelo fato do jovem ter um intelecto fantástico.

Tampouco, levou fórmulas prontas, teve paciência para esperar o momento certo em que Will se sentisse confortável para falar, ou seja, o viu como um indivíduo autônomo e único que precisava ser olhado dessa forma e não somente com um futuro Nobel da matemática.

Infelizmente, tanto na vida quanto no filme, faltam pessoas capazes de se desprender de si para ouvir e olhar o outro, pessoas corajosas para ficarem vulneráveis com as outras, permitindo ser tocadas, confiando que o outro corresponderá, ainda que não corresponda. Talvez por isso o personagem de Williams seja tão cativante e emocionante, pois ao nos depararmos com aquele indivíduo, percebemos que somos e/ou estamos muito mais parecidos com o professor Lambeau que com ele.

A relação desenvolvida entre Will e Sean demonstra o quão importante é ter uma relação de verdade, com alguém que se preocupe conosco, que esteja disposto a nos ouvir, nos entender e nos ajudar. É demonstrada também a importância dos sentimentos e de não ser sempre tão racional, de se deixar levar pelo que faz o coração terno, pois só assim são construídas experiências de verdade, que podem ser guardadas com carinho na memória.

Como Sean vê Will como um ser humano, também não pressiona o garoto para que ele aceite os inúmeros empregos em maravilhosas empresas que lhes são oferecidos. Sean não quer determinar o que o Will deve ser, ele não tem esse poder, nem quer ter. Ele quer conhecer o garoto e ajudá-lo a descobrir o que de fato quer fazer. Reconhece o valor por Will não querer ser um babaca, mas não desconsidera a sua genialidade e a sua capacidade de poder fazer coisas grandiosas, no entanto, quer que o próprio Will decida o que quer fazer.

Sean sabe o real valor das coisas e quer passar para Will. E passa. Um coração aberto a Will para que ele se sinta protegido; uma mão que quer ajudá-lo a sair do quarto escuro onde se esconde; e ouvidos para que quando fale, saiba que não está sozinho e que por mais dores que sinta e feridas que sofrera, pode confiar nele e nos outros, mais que isso, precisa confiar se quiser conhecer alguém de verdade e ter alguma conexão com alguém além de si mesmo.

A beleza do filme não é transmitida por uma grande fotografia ou um belo cenário, e sim pela forma como ele deixa claro que não há nada que substitua sentimentos verdadeiros sendo trocados entre duas pessoas, conectadas, em que uma interfere na vida da outra. Não há ninguém perfeito e não há problema, pois a maior beleza de uma relação é a vontade de duas pessoas que querem ser perfeitas uma para outra.

Para isso é preciso estar disposto a ter trabalho, a ouvir, a se colocar no lugar do outro e ficar vulnerável, assim como Sean fez com Will, ajudando-o a fazer algo com o que os outros fizeram dele, como disse Sartre. Se não estivermos dispostos a fazer isso, deixo com que Sean, através do saudoso e irretocável Williams, vos diga que isso é uma superfilosofia, em que você poderá viver a vida inteira sem conhecer ninguém profundamente.

A mãe quer um médico, o pai um juiz, e o filho só quer ser feliz

A mãe quer um médico, o pai um juiz, e o filho só quer ser feliz

Imagem: altanaka/Shutterstock

Filho é um ser em construção, não nasce pronto de jeito nenhum, o que significa que desde a embalagem até o conteúdo, tudo se processa lentamente e só adquire a forma mais próxima da definitiva quando atinge a maturidade. E olha lá! Mesmo assim não há definitivos e nem irrevogáveis que condicionem os nossos pensamentos e as nossas decisões em embalagem fechada, à prova de mudanças.

No transcurso da vida, tudo muda. Mas é na adolescência que ocorre o pico de mudanças máximas, e é também nessa fase que a criança –oh tragédia das tragédias- precisa decidir o que será quando crescer. Porque ainda não cresceu, mas já precisa se decidir.

Temos aqui um caso hipotético muito comum, que pode ser encontrado em qualquer família brasileira: a mãe quer um filho médico. Assim, sem nenhum motivo especial, porque afinal toda mãe quer um filho médico. Ou quase todas.

O pai quer um filho juiz, por um bom motivo: é advogado. E já que ser só advogado não basta, ele deseja para o filho uma toga de juiz.

E o filho, esse protótipo de médico misturado com juiz, vivendo a idade mais oscilante em termos de “o que eu quero ser na vida” não quer nada.

Na dúvida, ele só quer ser feliz.

Os três elementos sofrem o encaixe e o atrito dos sonhos divergentes, mas compartilhados. Conversam amigavelmente sobre o assunto, ou se estranham, caso a conversa seja mais demorada.

No final de semana, por exemplo. Bem na hora do almoço.

Depois de uns minutinhos de bate-boca percebem o insólito da discussão destituída de poder, e encerram a conversa sem futuro recorrendo ao único que conhece, e tem poder sobre o futuro: “Seja feita a vontade de Deus.”

E eu acrescento: “Já que a sua não tem poder de decisão.”

Nesse processo de espera, os pais observam que para quem irá enfrentar um vestibular de medicina – claro, o pai é voto vencido, e Direito será a segunda opção no formulário de inscrição -, o menino (ou a menina) está muito folgado, muito ausente, sem foco, sem método, sem disciplina para estudar, e o mais grave: dependente psicológico da tecnologia e dos games eletrônicos.

Acontece nas melhores famílias. O garoto diz sem muita convicção: “vou prestar vestibular para medicina, e se não entrar, vou para o Direito.”

 

Ele nem menciona a magistratura, já que depois de entrar para a Faculdade de Direito terá que passar na OAB, e enfrentar concurso para ser o juiz dos sonhos do pai, corrigindo todas as injustiças que o pai pensa ter sofrido como advogado.

O garoto até que é razoável na avaliação da realidade, mas há um problema nesse raciocínio: quem quer ser médico não pode querer outra coisa, além de ser médico. Porque a medicina exige não apenas muito conhecimento para vencer a concorrência perversa dos vestibulares, como também o desejo irresistível de ser médico.

A pessoa pode ser qualquer coisa sem querer ser, e claro, terá prejuízos de ordem emocional a vida toda, mas ainda assim conseguirá dar conta da profissão na qual se graduou.

Menos na medicina. Não dá para ser mais ou menos na medicina. Mais ou menos mata. Mais ou menos aleija. Mais ou menos paralisa. Mais ou menos corta de mais, ou corta de menos.

Tenho visto, nessa vida comprida, muitos jovens casais equivocados e bem intencionados, prospectando sonhos para os filhos de maneira fantasiosa e irreal.

Você acha mesmo que o seu filho tem condições para enfrentar um vestibular de medicina! Para ser médico? Não estou nem falando de QI, mas de disciplina, de afinco, de dedicação, de muitas horas debruçadas sobre livros, de renúncias a filmes, passeios, jogos, paqueras, festas e vídeo games, estou falando de evidências maduras acerca da intenção que não acaba quando ele recebe o canudo, mas começa a partir daí.

Você tem certeza de que é isso o que ele quer ser na vida, ou às vezes, lhe parece estar viajando na maionese, antes mesmo de colher a batata?

Se você não vê tais intenções, e não tem certeza dessa vocação, é bem provável que o seu filho não consiga passar no vestibular mais concorrido nas estatísticas brasileiras. E o mais grave: é bem possível que o menino perca um tempo considerável em cursinhos preparatórios que não o levarão a lugar algum, por um único motivo: inconscientemente, ele não deseja ser médico.

Tenho alguma experiência nesse assunto: com um marido médico, nenhum dos meus três filhos fez Medicina.

Eu era a mãe que queria a medicina para as crianças. Mas o pai das crianças só queria o que elas queriam, e me fez compreender, pela vida ralada que leva, que a verdadeira medicina é um sacerdócio e não a profissão glamourosa que todo mundo imagina.

Meus filhos cresceram vendo a vida difícil de um médico social do interior, que ama o que faz, e que recebe o reconhecimento de seu trabalho não apenas através do vil metal, mas também de formas alternativas. Ontem, recebemos mandioca e limão. Antes de ontem, um queijo. E na semana passada, um frango caipira mortinho da silva.

Dias desses, assistimos juntos a um documentário realizado pela TV Globo que contou a vida do Dr. Eugênio Sacannavino, um médico que na década de 80, recém formado, oriundo de família de classe média paulistana, decidiu gastar a vida entre os ribeirinhos do Amazonas. Vive lá até hoje, deve viver para sempre.

Esse é o modelo de profissional que nasceu para ser médico, no Amazonas, na Avenida Paulista, ou em qualquer outro lugar do Planeta: o médico que se fez médico porque tinha como meta ajudar as pessoas em suas necessidades físicas, mentais, e emocionais, e para elas se disponibilizou.

Ele foi onde a sua presença era mais necessária. Onde havia mortes de crianças por verminose, e falta de saneamento básico. Ele interveio na saúde através da cultura. Ele sepultou ideias de enriquecimento, de conforto, de acúmulo de patrimônio e de bem estar pessoal. Que figura admirável! Se você não o conhece, procure no Google.

Se eu pudesse arrematar esse artigo de maneira agradável, de forma a não causar rupturas entre o seu sonho e a sua realidade, eu o faria. Temo não poder.

Mas posso terminar usando uma frase de Confúcio que provavelmente amenizará algum inevitável e momentâneo desencanto que o meu artigo possa lhe causar:

“A melhor maneira de ser feliz é contribuir para a felicidade dos outros.”

Seja feliz contribuindo para a felicidade do seu filho.

Seu filho quer ser feliz? Ele está certo. Ajude-o a descobrir onde habita a felicidade, e dê-lhe uma passagem com bilhete de ida.

Garanto que ele não lhe pedirá o bilhete de volta.

Quando a gente cansa de doer sozinho é hora de ir embora

Quando a gente cansa de doer sozinho é hora de ir embora

Imagem: Maria Mikhailenko/Shutterstock

Um dia, a gente, finalmente, se despede. Descobre que ir embora não é mais difícil do que ficar onde não é bem-vindo. A gente se veste de coragem, cata os verbos soltos pelo chão, as juras de amor e as promessas de ocasião.

Um dia, a gente compreende que, estar por estar onde quer que seja, não leva a lugar nenhum. É como ser qualquer coisa num cenário abandonado. E ser qualquer coisa em qualquer lugar não é ser nada.

Um dia, a gente descobre que se despedir é olhar de relance para tudo o que fica, para todas as coisas nascidas da comunhão de um instante que já foi eterno. Mesmo com essa lembrança, a gente não quer ficar porque não se sente mais em casa. O coração está adormecido e não se emociona com a risada do outro que antes era sol e abrigo.

Um dia, a gente, simplesmente, cansa de tentar arrumar a casa, ajeitar a mobília quebrada. A gente cansa de doer sozinho e sofrer por tantas ausências premeditadas. No fundo, a gente quer que tenha reciprocidade, a gente quer ser lar em beira de estrada, mas também quer ser luz acesa no coração do outro.

A gente não quer ser só passagem, travessia e meio pelo qual alguém faz alguma coisa. A gente quer ser o desfecho daquela história bonita, sonhada com laços e arranjos de fita. Mas, a gente se dá conta que era só rascunho e sombra no caminho do outro. A gente percebe que era só um nome avulso numa folha qualquer, um ancoradouro para abrigar alguns cansaços. Um estepe. Um talvez.

A gente se despede quando percebe que não faz mais sentido ficar se o coração do outro só se ressente, não perdoa e não ama mais. A gente se resgata indo embora sem olhar para trás, sem tentar lembrar que partir pode ser um erro imperdoável, mas que ficar não pode ser mais nada.

Viver com pena de si mesmo só serve para torná-lo fraco e afastar as pessoas

Viver com pena de si mesmo só serve para torná-lo fraco e afastar as pessoas

Uma coisa é reconhecermos que não somos nenhum super herói ou super heroína; entender que há coisas que escapam do nosso controle ou que temporariamente não têm solução.

Outra coisa é viver choramingando, penalizado da própria condição ou dificuldade e não procurar sair da posição de vítima.

Ninguém aguenta conviver por muito tempo com um eterno coitadinho, ou coitadinha. Porque há pessoas que são refratárias a qualquer tentativa de ajuda ou sugestão que dependam do seu esforço ou iniciativa para sair da situação em que se encontra.

Vivem esperando por alguém que as salve de sua própria falta de coragem para assumir riscos, compromissos ou situações de evolução. Acreditam que foram escolhidas por Deus, ou sabe-se lá por quem mais, para padecerem isoladas e sozinhas nesta vida tão difícil.

Muitas vezes são pessoas que tiveram pouca atenção dos pais na infância, cresceram com aquele buraco afetivo, um real estrago de abandono familiar. É fato, isso existe. E se essas pessoa não tiverem oportunidade de tratar essas questões emocionais, de forma terapêutica, podem arrastar-se ao longo da vida, aprisionadas num padrão de comportamento que as impedirá de estabelecerem laços com outras pessoas.

Também é fato que não há acesso à terapia para todos. Mas, também é certo que quando a pessoa quer mesmo dar um outro rumo para sua vida, ela acaba arranjando um jeito: procura um serviço público, alguma entidade que organize atendimentos por preços simbólicos, um grupo de apoio, ou, até mesmo, um aconselhamento religioso.

E é bom que se esclareça: esse texto não trata de questões relativas a indivíduos acometidos por doenças psíquicas e transtornos afetivos; neste caso, não há intencionalidade no comportamento, não há vontade de chamar a atenção. Este texto trata daqueles que usam o lugar de vítima para manipular o afeto alheio.

E essa postura de pobre coitado não atinge preferencialmente os desafortunados. Muito ao contrário; há indivíduos que, apesar das inúmeras dificuldades emocionais, acabam se desenvolvendo nas outras áreas da vida e sendo bem-sucedidas. São pessoas que receberam educação formal, algumas até em níveis superiores; estabeleceram-se profissionalmente; alcançaram meios de se sustentar. E, mesmo assim, vivem estacionadas, escondem-se por trás de desculpas padronizadas como “não ter sorte com amizades e amores” ou “não ser atraente”, ou “não ter nenhuma habilidade social”.

Aquele que se acomoda de forma obstinada ao papel de vítima, pode desenvolver uma espécie de relacionamento sério com esse padrão de comportamento. Não raras vezes até começam relações amorosas ou de amizade, mas não as conseguem manter.

A ansiedade por sentir-se amado e aceito, faz com que essas pessoas de auto estima rebaixada, reajam a qualquer aproximação qual uma esponja. Esgotam os parceiros afetivos com lamúrias de menos valia e intermináveis queixas de falta de atenção.

É preciso estar disposto a afetos que libertam para que se estabeleça um processo de cura para essa carência afetiva que, em última análise, ninguém dará conta de suprir. Viver com pena de si mesmo só vai torná-lo fraco e afastar as pessoas.

Se você se reconheceu neste texto, pode acreditar, nem tudo está perdido! Em verdade, tudo pode ser encontrado, inclusive um lugar iluminado para você nesse mundo. O primeiro passo você até já deu, mesmo que não tenha percebido.

Faça algo de extraordinário por você mesmo: redescubra o que há de bonito aí dentro e compartilhe com alguém, ou “alguéns”… Quem sabe onde é que se encontra a felicidade, não é mesmo? Mas… Para que a felicidade seja encontrada, antes de tudo, a gente precisa querer procurar por ela.

Imagem de capa meramente ilustrativa: cena do filme “Encontros e Desencontros”

Gosto de ficar em casa no sábado à noite e não vejo problema nisso

Gosto de ficar em casa no sábado à noite e não vejo problema nisso

Imagem: maradon 333/Shutterstock

Cada um é que decide se ficar sozinho em casa em um sábado à noite é solidão ou liberdade, porque ninguém tem nada a ver com as escolhas do outro. Não se intrometa quando não tiver sido convidado para isso.

As redes virtuais estão abarrotadas de pessoas viajando, comendo fora, partindo para baladas, para o exterior, para o barzinho da esquina. Ao mesmo tempo, poucas postagens dizem respeito a um livro que se está lendo, a um programa televisivo que se está vendo, ou a um nada para fazer, principalmente se estivermos no fim de semana.

A muitos, parece que a falta de opções de lazer na sexta ou no sábado é algo do que se envergonhar, ou assunto para memes e tuitadas que focam o assunto com ironia. É mais ou menos assim: “não tenho dinheiro para sair de casa”; “ninguém me convidou para nada”; “só um ‘loser’ para ficar em casa num sábado à noite”, e por aí vai. É como se não querer sair no fim de semana equivalesse a fazer papel de trouxa, a ser um derrotado, um ponto fora da curva.

Sim, existem aqueles que preferem o recolhimento acompanhado ou solitário nos dias de folga, feriados, e atualizam seu status com fotos de livros, seriados, filmes, músicas, sem nunca fazer um “check-in” em bares, restaurantes ou em aeroportos internacionais. Mas, em proporção aos baladeiros e viajados, sua quantidade é bem inferior. Trata-se, ao que parece, de uma tribo bastante diminuta e praticamente prestes a entrar em extinção.

Na verdade, cada um que viva à sua própria maneira, de acordo com o que lhe faça feliz, pois é isso o que importa. Infelizmente, porém, muitos passam a condenar e a ridicularizar quem adota estilos de vida que não condizem com o que consideram normal e desejável. Quando a gente quer ficar em casa, quando a gente não quer viajar, quando a gente prefere ficar sozinho, tem que ficar dando explicações por sermos cobrados por pessoas enxeridas.

Cada um é que decide se ficar sozinho em casa em um sábado à noite é solidão ou liberdade, porque ninguém tem nada a ver com as escolhas do outro. Que atitude irritante de certas pessoas que se incomodam com os outros, com quem está feliz do seu jeito, com quem não pediu opinião alguma, com quem está feliz no seu canto. Não se intrometa quando não tiver sido convidado para isso.

Tudo seria tão mais simples, seria tão mais fácil viver, caso respeitássemos as escolhas que não são nossas, caso não nos incomodássemos com o que não é nosso, caso vivêssemos a nossa vida e deixássemos de cuidar da vida de quem não precisa de nossa opinião. Sair, madrugar e pular de balada em balada pode ser uma delícia. Ficar em casa ouvindo música, bebendo sozinho ou acompanhado, não importa, também é uma delícia. É cada um com seu cada qual, como diziam nossos avós.

A depressão é um transtorno psiquiátrico grave e deve ser tratada como tal

A depressão é um transtorno psiquiátrico grave e deve ser tratada como tal

Imagem: Srijaroen/Shutterstock

A depressão é um transtorno psiquiátrico grave e acomete boa parte da população. Segundo o ex-secretário geral das nações unidas, Kofi Annan, cerca de 400 milhões de pessoas (7% da população) padecem da doença.

A fala ocorreu durante a abertura do seminário “The Global Crisis of Depression” (A Crise Global da Depressão), realizada em 2014, em Londres. O evento foi patrocinado pela revista britânica The Economist.

Levando em conta que já se passaram dois anos desde então, é normal que estes números tenham subido consideravelmente – hoje se fala em uma média de 416 milhões (10% da população) de pessoas afetadas. E eles continuam a crescer.

As cifras, é claro, não ficaram de fora: US$ 800 bilhões de gastos diretos e indiretos só em 2010 (custo que deve dobrar nos próximos 20 anos, segundo Annan).

De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, até o ano de 2030, a depressão será a doença mais comum entre a população mundial.  A OMS também diz que ela já é a mais incapacitante das doenças.

A síndrome depressiva se caracteriza por um conjunto de sinais e de sintomas que duram a maior parte do tempo, durante pelo menos duas semanas, e debilitam a pessoa doente. Ela acomete o organismo como um todo e causa alteração em importantes sistemas que regulam o funcionamento do corpo.

Entre as causas mais comuns estão o uso de drogas (lícitas e ilícitas), doenças cerebrais, estresse contínuo e fatores genéticos – responsáveis por 40% dos casos.

As mulheres são as mais afetadas pela depressão. A proporção é de 2 para 1, em relação aos homens. Isso se deve às flutuações hormonais que as acompanham em diversos momentos durante a vida (menstruação, parto e menopausa).

contioutra.com - A depressão é um transtorno psiquiátrico grave e deve ser tratada como tal
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TRATAMENTO

O escritor americano Andrew Solomon é autor de O Demônio do Meio-Dia, um best-seller sobre o assunto. Em sua famosa palestra para o TED, Solomon toca em um ponto crucial da discussão: o uso de medicamentos no tratamento.

“Tanto a cura química como a psicológica têm seu papel”, foi a conclusão a que chegou, depois de se dar conta de que a ciência ainda não avançou muito nessas áreas.

“Os tratamentos que temos para a depressão são lamentáveis”, criticou. No entanto, deixa claro que o que temos hoje é melhor do que há 50 anos atrás, quando nada podia ser feito para ajudar pessoas com quadros depressivos.

Com anos de experiência na área, o psiquiatra Ricardo Alberto Moreno acredita que as perspectivas para o tratamento são boas. “Uma nova era de medicamentos antidepressivos, com um novo mecanismo de ação, está em estudo e deve ser comercializada em breve”, contou em entrevista exclusiva à CONTI outra.

“Os medicamentos antidepressivos são fundamentais no tratamento. Mesmo para depressões leves, são necessários”, disse. “É claro que intervenções psicológicas associadas são importantes, assim como psicoeducação e, em alguns casos, mudança no estilo de vida”, completou.

Ao falar em depressão, diversos equívocos são cometidos. Um deles é confundi-la com tristeza, descontentamento ou infelicidade. Ricardo aponta para um dos erros mais comuns: a de que existe uma cura. “Na maioria dos casos, a predisposição para deprimir se mantém ao longo da vida.”

Um passo importante no tratamento é o diagnóstico correto. Por ser de grande complexidade, este só pode ser feito por um profissional, que se utiliza de critérios específicos para cada caso.

“Estes critérios são revistos periodicamente nos manuais internacionais e nacionais de diagnóstico. Utilizando estes critérios, aumenta-se a confiabilidade diagnóstica (o diagnóstico pode ser corroborado por outros especialistas, confirmando-o) e a sensibilidade (identificação de casos positivos afetados pela doença)”, esclareceu Ricardo.

APRENDENDO A LIDAR

Ana Macarini é psicopedagoga e até hoje encara o problema bem de perto.

Diagnosticada com depressão em 2013, Ana teve que aprender a superar os empecilhos da sua então nova condição.  “A maior lição que a depressão me ofereceu foi aprender a reconhecer meus limites”, disse.

O preconceito também é algo a ser enfrentado diariamente por quem tem a doença. “A maioria das pessoas acha que isso é ‘coisa da cabeça’, que a pessoa precisa se esforçar para melhorar. Essa cobrança dá um desespero!”, confessa Ana, que aponta para a necessidade de quebrar paradigmas.

“Quando o indivíduo está deprimido, ainda sem diagnóstico, ele não tem nenhuma condição de tomar decisões e procurar ajuda. Se não houver alguém que o enxergue, não haverá alguém pra ser enxergado, muito provavelmente.”

A condição de uma pessoa com síndrome depressiva é bastante complexa e compreender esta condição parece exercer um papel fundamental para seguir adiante.

“Aprender a lidar com a depressão é condição de sobrevivência e a única saída possível para se ter uma vida bacana, produtiva, afetivamente satisfatória”, conclui Ana.

Pais bonzinhos, filhos folgados, adultos relaxados

Pais bonzinhos, filhos folgados, adultos relaxados

Imagem: Venera Salman/Shutterstock

O que é mais importante para os pais: manter a casa em ordem, ou deixar os filhos à vontade, sem disciplina, e sem ordem? A resposta adequada seria: manter a casa em ordem, e esperar que os filhos fiquem à vontade  sob disciplina e  ordem. Basta que eles sejam educados para isso.

O que é mais importante para família: um marido satisfeito, feliz, relaxado, à custa de cuecas jogadas pelo banheiro, e toalhas molhadas sobre a cama, ou um parceiro ordeiro e colaborativo? A resposta adequada  seria: um marido feliz, satisfeito, ordeiro e colaborativo, que ajude a manter a casa longe do caos. E para esposa, o que seria?

A verdade é que há situações que não se excluem, pelo contrário, se complementam.

Esse é um tema nada excludente. Filhos, esposas e maridos  devem colaborar com a mínima ordem reinante sob pena de se tornarem abusivos fora do convívio familiar. Não há felicidade na desordem. Não pode haver tolerância com a desordem organizada sistematicamente como se a desordem fosse a ordem.

A criança que cresce sem envolvimento com a ordem, aprenderá a envolver-se com a desordem. O adulto que foi criança e não guardou o brinquedo que usou, terá grandes possibilidades de vir a ser  pouco colaborativo, daquele tipo que levanta da mesa na casa da tia sem retirar e lavar o seu prato, ou sem arrumar a sua cama.

Não é de nenhum tratado filosófico que retirei essas conclusões; é da vida, da experiência, da análise prática.

Todas as crianças que são deixadas sem a disciplina da ordem criam uma desordem amplificada, depois de adultos. As casas que habitam são uma bagunça. As tarefas que deveriam ser resolvidas diariamente passam a ser desempenhadas em prazos dilatados por semanas, meses, e anos. A louça é lavada quando não há mais lugar sobre a pia e embaixo da pia. As roupas vão para a máquina, quando a última calcinha vai para o corpo. Tudo é abusivamente acumulado.

Não há regras que possam valer para quem foi criado sem regra alguma.

Há nos desordeiros domésticos uma forte tendência para  se tornarem acumuladores, aqueles indivíduos que guardam todo tipo de lixo fora e dentro deles. Começam por não catalogar objetos que, sem lugar definido, se misturam sob as mais diversas categorias. Livros no chão fazem companhia a chinelos jogados, documentos espalhados, travesseiros abandonados pelo caminho. As mais diversas coisas e coisinhas cujo destino é incerto, somam-se às coisas maiores que se acumulam na superfície.

A Teoria do Caos prevê a grosso modo que, se uma casa for deixada limpa, arejada, arrumada, com todos os objetos em seus devidos lugares, basta um tempo relativamente curto para que o abandono se encarregue de instalar o caos.

O que quero dizer com isso? Quero dizer que todas as forças do Universo decaído trabalham a favor do caos.

Não é preciso que eu e você façamos coisa alguma para que o caos se instale. Basta que não o façamos.

Dentro de pouco tempo, a poeira fina se depositará sobre a superfície em camadas sedimentadas, as aranhas farão suas teias, o mofo se expandirá sobre as áreas que guardam algum vestígio de umidade e tudo- absolutamente tudo- entrará em processo de desintegração e morte.

A vida cobra a sua e a minha colaboração para que o universo se mantenha em cadência de ritmo, harmonia,  e perfeita intencionalidade da ordem.

Alguns pais parecem ignorar essa necessidade e não colocam os seus filhos na cadeia da ordem. Preferem que eles se juntem à cadeia da desordem.

É a pior coisa que os pais podem fazer.

Pais muito “bonzinhos” se tornam incubadores de adultos porcalhões e relaxados. Pais muito “bonzinhos”, inconscientemente, esperam que seus filhos oss amem mais por isso, e, no devido tempo, cobrarão que esse “amor” lhes seja devolvido.

Pais “muito bonzinhos” são um dilema existencial  para carregar, mais tarde. Choramingam o tempo todo dizendo quãobons foram para os seus filhos, e exatamente por terem criado filhos irresponsáveis, bagunceiros e relaxados,  não receberão de volta nem o amor, e nem a ordem minimamente necessária, que a última etapa de vida pede, para que se morra em paz.

Dia desses,  fui testemunha de um fato bastante humano e convincente: Diante do quarto do menino que apresentava um cenário bagunçado,  a mãe o mandou tomar banho, e enquanto ele tomava o banho, ela entrou no quarto e confiscou o Ipad.

Ao sair, o menino perguntou:

– Mãe  você pegou o meu Ipad?

– Peguei. O Ipad só volta  quando o seu quarto estiver tão organizado como você o recebeu pela manhã.”

Assim aconteceu por dois dias. Não foi preciso mais do que dois dias para que o hábito se instalasse.

Haveria três caminhos: fazer tudo pelo filho; repetir todos os dias a mesma cantilena, elevando a voz;  exercer autoridade acompanhada do seqüestro de um privilégio ao qual ele se acostumara: o uso do Ipad.

Penso que ela fez uma ótima escolha.

Então, é isso: pais eduquem os seus filhos para a manutenção da ordem. É um benefício que fará grande diferença na vida adulta e  é tão importante que até o ar, o céu, o sol, o mar, as árvores, as plantas, os rios, os peixes, os animais, os homens de boa vontade, a Terra, e o Universo agradecem.

Nota: Pais são aqueles que criam e podem ser mães, pais, avós ou qualquer outro responsável que esteja a frente da educação da criança.

Existir é pouco. Viver é a arte de resistir.

Existir é pouco. Viver é a arte de resistir.

Imagem: Vadim Vexler/Shutterstock

A gente resiste. O tempo passa, a idade chega, uns vão, uns ficam, outros voltam, outros não. E a todas essas a gente insiste, sobrevive, suporta. Resistir é a nossa aptidão mais honesta, nossa vocação mais admirável.

Não há ser vivo neste mundo que não guarde em si a disposição de lutar pela vida. Um dia há de perdê-la por aí, dobrado pelo cansaço e pela dor. Mas até que esse dia chegue, todo bicho que vive resiste a tudo, perdura, persiste, vai em frente.

Enquanto há vida e há vontade, resistir é o trabalho mais bonito da gente, do recém-nascido ao velho mais velho. Quem já viu um bebê prematuro brigando para viver, sabe. Sozinho na incubadora, impõe sua vontade inconsciente, reage, enfrenta, espera. Paciente, dedicado, supera um dia depois do outro, ganha peso, ganha força e vem ao mundo.

Aqui, entre bilhões de outros seres iguais a ele, vai lutar e resistir à infância, engasgar com a comida, perder os dentes, bater a cabeça, enfaixar o braço. Vai inalar e engolir tantos vírus, viroses e bactérias e arder de febre em tantas noites de hospital sob o olhar aflito de quem o ama.

Vai superar a juventude, enfrentar hostilidade, insegurança, rejeição. Vai amar e ser amado, deixar e ser deixado.

Sozinho como na incubadora da maternidade, vai reagir e ganhar força. Vai aprender a se guardar das investidas e ofensivas de toda parte, inclusive aquelas que vêm de nós mesmos. Vai se ferir e se curar sozinho, vai pedir ajuda e oferecer auxílio. Vai envelhecer e perder os pais, irmãos, amigos, parentes, um depois do outro.

Lá no fundo da alma, vai sentir que o amor é só o que fica, o que vale e o que nos salva quando a saudade aperta.

E a tudo isso vai resistir, ora com bravura, ora tomado de medo. Vai sobreviver! Até que lhe reste o último grama de força, até o limite de seu tempo vai lutar e persistir e viver para sempre na lembrança dos que o amaram.

Porque a vida, ahh… a vida é um poderoso exercício de amor. Quanto mais a gente ama, mais resiste a tudo. Ao tempo, ao abandono, à falta de afeto. A vida é uma linda teimosia, uma bela insistência, um empenho sublime. E os que resistem praticam o seu ofício mais bonito.

Reciprocidade, mais do que receber de volta, é receber o que merecemos

Reciprocidade, mais do que receber de volta, é receber o que merecemos

Muito se diz, hoje em dia, sobra a necessidade de mantermos junto a nós quem corresponde, quem devolve o que damos, o que lançamos, o que somos. Quem entende e pratica a reciprocidade. Mais do que isso, no entanto, é necessário que tenhamos clareza quanto àquilo tudo que queremos e merecemos receber, ou poderemos ficar do lado errado da balança.

Se o que nos dispusermos a ofertar for amor de verdade, transparência, carinho, sorrisos e inteireza, nada do que andar na contramão de nossa doação afetiva poderá ser aceito de volta. Não podemos nos contentar com retornos frios, vazios, dissimulados, sem verdade, sem vontade, sem prazer. Nada do que não for correspondido carregará carga de sentimentos afetivos que nos bastem, que nos sosseguem os sentimentos.

Muitas pessoas acham que mandar um simples oi pelo celular, trabalhar e vir para casa, dormir na mesma cama e prover o lar economicamente são comportamentos suficientes para manter vivo um relacionamento a dois. Apegam-se às aparências e às necessidades tão somente materiais, esquecendo-se de que somos muito mais do que isso tudo. Temos um mundo a ser preenchido também dentro de cada um de nós.

E, caso aceitemos com resignação silenciosa as esmolas alheias, passando por cima das carências sentimentais que abriga a nossa essência, estaremos fugindo cada vez mais às reais possibilidades de podermos nos sentir completos, felizes e realizados. Estaremos cada vez mais vazios de sonhos e de esperanças, de amor e de essência humana, pois teremos, a pouco e pouco, desistido de lutar pela completude que caracteriza o estar junto, com ida, volta, reviravoltas, lá e cá, dentro e fora.

Ninguém, mais do que nós mesmos, sabe com precisão o que somos, o que queremos, quais são as nossas necessidades, nossos sonhos, nossas escuridões. Certamente, não conseguimos nos enganar, mesmo que queiramos, tampouco poderemos nos sentir confortáveis tentando nos conformar com uma vida em que tudo sai da gente, mas nada nos chega inteiro, nada nos retorna completo, nem ninguém nos devolve verdades.

Não desistamos, pois, de nos entregar de forma total, por conta dos ecos vazios que tentarão nos empurrar de volta. Continuemos firmes em nossas verdades, para que repousemos nossa essência junto a quem há de nos receber com o abraço apertado de uma alma iluminada, mesmo que demore, pois é isso, nada menos do que isso, o que merecemos.

*O título deste artigo baseia-se em citação de Mayckon San.

Imagem: Pitiya Phinjongsakundit/Shutterstock

De quantos “eu te avisei” se constrói um arrependimento?

De quantos “eu te avisei” se constrói um arrependimento?

Imagem: Matej Kastelic/Shutterstock

Uma das maiores inverdades que pregam na sociedade é a teoria de que não devemos nos arrepender de nada do que fizemos. Geralmente, ela vem mascarada pela famosa frase: “não me arrependo de nada do que fiz, arrependo-me do que não fiz”.

Nessa linha de pensamento, as pessoas estão vivendo sem pensar nas próprias atitudes e sem questionar o que estão aprendendo com os próprios erros.

Admita: não foram poucas as vezes em que você se arrependeu de atitudes que realizou. Quantas coisas que, se pudesse voltar no tempo,você apagaria da sua vida? Quantas palavras ditas ao vento? Quantos erros? Quantos romances tumultuados? Quanto arrependimento!

A verdade é que ninguém carrega dentro de si um GPS com o mapa da felicidade. Erramos, caímos, levantamos e continuamos o caminho. Disso é feita a vida. O problema está nos arrependimentos que carregamos na bagagem e o que fazemos deles.

Você sabia que o amor havia acabado, mas preferiu acreditar que era apenas rotina. Sabia que ele não iria mudar, mas preferiu dar uma segunda chance, para não se arrepender depois. Sabia que ele não estava de corpo e alma ali, mas preferiu acreditar que era cansaço do trabalho.

Você sabia, você sempre soube. Sua intuição avisou que aquele relacionamento não deveria nem ter começado, mas você abafou a voz da consciência para ouvir a do coração, já que na época, era o que parecia mais sensato fazer. O fim foi inevitável e o arrependimento resolveu te esfregar na cara o que a intuição tentou avisar.

Se soubéssemos dar mais valor às ações do que às palavras, pouparíamos nosso tempo e nossa alma de sofrimentos banais. Pouco importa o “eu te amo” se as ações não comprovam isso. Pouco importa se a pessoa diz que está com saudades, mas parece o mestre dos magos: aparece quando quer e some na velocidade da luz. Palavras não suprem atitudes!

Chega uma hora na vida em que a maturidade cobra uma nova postura e o arrependimento leva-nos à nocaute. E isso é ótimo! Arrepender-se significa dar uma nova chance para a própria história.

É nesse momento que quebramos as algemas do passado e começamos a nos envergonhar dos amores platônicos, das insistentes ligações não atendidas, dos pedidos dramáticos para que o outro ficasse em nossas vidas.

É através do arrependimento que aprendemos a nos responsabilizar pelos próprios erros. Aprendemos a nos culpar por não termos terminado a faculdade, por termos nos sabotado, por não termos tido amor próprio. Por não termos vivido os nossos sonhos e, a partir daí, mudamos. Como dizia Voltaire “Deus fez do arrependimento a virtude dos mortais.”

Encare seus erros como oportunidade de mudança e de poder de transformação e mude sua história. Porque, embora o arrependimento seja doloroso, permanecer em estado de inércia e ser espectador da própria vida é muito, muito mais…

É covardia despertar o amor sem intenção de ficar

É covardia despertar o amor sem intenção de ficar

Imagem: KIRAYONAK YULIYA/Shutterstock

É covardia dizer palavras bonitas e depois agir feito criança que não sabe o que quer e o que diz. É covardia dizer que pretende ficar quando, na verdade, irá partir a qualquer momento.

Quantas histórias já ouvi de enganos e daquela dor terrível de recomeçar. Quantos corações partidos que deixam de acreditar no amor e, quando alguém aparece, já é descartado, com medo de doer novamente.

É covardia conquistar, ser gentil, só para inflar o ego e parecer o Don Juan. Ter prazer em saber que alguém “morre” de amores pela gente é dessas coisas bizarras da vida que eu nunca vou entender.

Não entendo o gosto de “pisar” o outro, dos joguinhos e de fazer promessas, quando as atitudes demonstram o contrário. Quando o príncipe vai logo virando sapo.

Covardia é quem chega de mansinho, vai logo ocupando um espaço em nosso coração, doma os nossos medos e, todas as vezes em que pensamos em dar um passo para trás, esse alguém segura a nossa mão e nos faz darmos um passo à frente. Então, esse alguém vai embora, sem ao menos dizer adeus, sem ao menos dizer o porquê do sumiço.

Covardia é despertar sentimentos, oferecer abraços, filmes no sábado à noite, no Netflix, quando, na verdade, irá inventar uma desculpa qualquer para nos deixar em casa sozinhos, pensando no que fizemos de errado.

Enquanto o outro curte a vida, você tenta entender onde falhou; enquanto o outro descobre outros risos, outros beijos, outros enganos, você se acha problema.

Bonito mesmo é quem fica, até quando não merecemos; quem entende as nossas pausas e os nossos medos; quem sabe dos nossos segredos e, mesmo assim, decide não partir.

Bonito é quem não promete, mas prova, todos os dias, o quanto gosta da nossa companhia. Quem não mente, não engana e não se alegra com a dor do outro.

Bonito é quem desperta o amor e fica, quem conquista e cultiva, quem não apenas planta como rega, cuida, protege, como quem deseja não perder aquilo que cativou.

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