Comunicar-se é viajar, mesmo sem sair do lugar

Comunicar-se é viajar, mesmo sem sair do lugar

Imagem de capa: Zev Hoover

Quando a comunicação não funciona, provavelmente, pelo menos uma das partes não está escutando, não está enxergando, não está sentindo. Na verdade, nesse processo de se relacionar com o outro, de se expressar plenamente, os ouvidos e a percepção valem mais do que uma boca cheia de sons.

É que não somos como os animais com rugidos programados para serem instintivamente compreendidos. Há muito mais do que fonemas e palavras entre dois corpos humanos. Os significados sempre se proliferam para além dos conceitos. Se comunicar com um desconhecido é como tentar se fazer entender em um lugar estrangeiro, onde mesmo quando sabemos a língua falada – e até mesmo quando falamos “a mesma língua” –, nosso vocabulário é cheio de “preconceitos”, nossa pronuncia é cheia de vícios, nos faltam as palavras certas e tendemos a rodear para chegar em um simples ponto. –E lugares às vezes são pessoas, como pessoas às vezes são lugares.

Nesse lugar de estrangeiro, é fácil visualizar aquilo que o cotidiano devora: o interesse pelo novo, por sua história, sua cultura, os diferentes pontos de vista; a abertura para ouvir e aprender outras formas de dizer, menos rígidas que a nossa limitada condição alienada do alheio; a atenção aos detalhes para guardar o gosto e o aprendizado de cada novo contato; o respeito polido de quem espera conhecer antes os limites outros para, somente depois, conquistar espaços com mérito: porque para o estrangeiro a imposição nunca funciona bem, é ele quem está “fora do lugar”.

Parece que toda essa magia de ser desconhecido em terra desconhecida, que concebe descobertas internas e externaliza paixões inimagináveis, ficou trancado na fantasia das viagens (turísticas). Essa crença pop virulenta de que a resposta para as descobertas, para a autodescoberta, para o novo, para sair da rotina, está limitada ao deslocamento material, literal, medido por quilômetros e registros filtrados sorridentes.

Porque é realmente mais fácil sair de lugar do que mudar o olhar, é mais fácil lidar com o exótico temporariamente do que viver a diferença integralmente. É mais fácil lidar com o sabidamente desconhecido do que assumir que desconhece o que, por alguma crença absurda, acreditamos religiosamente conhecer. É curioso como tanto do que encanta no passageiro espanta no permanente. – E pessoas às vezes são lugares, como lugares às vezes são pessoas.

Se conseguíssemos transpor para a vida esse espírito de aventura, de quem deseja descobrir o mundo, embora, na verdade, marque apenas alguns pontos turísticos em um mapa, perceberíamos que estamos rodeados de maravilhas. Quando nos damos conta de que cada indivíduo é um universo distinto, com vivências, sentidos, história, ilusões, rotinas, tudo tão diferente de nós, nos interessamos mais em perguntar e em conhecer do que em falar e impor.

Quando olhamos para a nossa própria cidade ou, ainda menos, nosso bairro, nossa casa, com atenção e consideração, corremos o risco de descobrir admirados que por ali há muito do que pode nos espantar – para o bem ou para mal. Podemos descobrir que, realmente, sair do lugar é melhor – não mais apenas pela sedução da onda viajante, pelo medo disfarçado de desinteresse em conhecer o que nos está no entorno, mas por sabermos que não somos dali, que nunca seremos dali, que nunca nos sentiremos à vontade.

É provável que mais descobrem e desfrutam dos seus trajetos aqueles que, ao menos, tentaram esgotar suas paradas e perceberam que é impossível esgotar um lugar, mas esgotar-se sim. E lugares às vezes são pessoas, como pessoas às vezes são lugares.

Ao confundirmos nossa velocidade limitada com a velocidade das descobertas tecnológicas, nos tornamos rasos e arrogantes, enxergando o mundo a partir dos nossos pequenos dramas cotidianos, sempre tão pessoais e tão importantes, que não paramos para olhar para o lado, para ouvir o outro lado.

Atacamos baseados nos nossos preconceitos e estereótipos pré-fabricados em plástico frágil, quebradiço. Porque antes de procurar conhecer, julgamos. Antes de observar, confirmamos o que o ponto de vista pronto já reservava no estoque. Então, é preciso mesmo ir para longe, para bem longe, para cada vez mais longe, mas, se enganam se pensam que é para sair do lugar: é para sair de si e conseguir olhar para fora. Talvez, apenas pela janela do carro, do trem, do ônibus, do avião, seja possível sair desse si mesmo tão denso, concretizando no ato o simbólico “olhar para fora”.

Não surpreende que em tempos de tanta facilidade e meios para se comunicar, a falta de comunicação seja um problema tão constante. As desculpas são frequentes. O silêncio é ainda mais. Ouvimos os ruídos externos já elaborando nosso próprio discurso. Observamos o outro pensando no que os gestos dele nos dizem sobre nós. Todo além do próprio corpo e do que ele reserva parece um obstáculo no qual ecoamos. A solidão é inevitável, ruidosa e superlotada –um cadáver fantasiado para o carnaval.

E não há saída, se não houver chegada: a comunicação só existe quando o interesse é recíproco. No máximo, quando nos damos conta do desinteresse do outro em nós e percebemos o excesso de interesse dele nele mesmo (através de nós), captamos a única mensagem efetiva do pacote – cheio de vazio. E pessoas às vezes são lugares, como lugares às vezes são pessoas.

Em hora dessas, resta olhar para o lado. Aquele lado que antes não foi visto, que não foi percebido. Sempre há um ponto de chegada. Quase nunca é o primeiro que a-parece. Somos lentos. Somos limitados. Damos um passo de cada vez. Enxergamos deformações organizadas em 180 graus. Enquanto nos desgastamos tentando escalar as muralhas de desentendimento que nos afrontam, com fugas esparsas para dar trégua à labuta e depois retomá-la,perdemos um balé de caminhos que convida nossos pés a serem estrangeiros sempre, vivento tudo como nunca, sentindo cada passo.

Convida nossos olhos a deixarem as janelas para os turistas e encararem face a face. Convida nossos ouvidos a tagarelarem interrogações e silêncios, para descobrirem o desconhecido no conhecido. Nômades da vida, acabamos por assumir que ser estrangeiro é condição de existir com tudo o que está fora de nós.

Nossas excelências

Nossas excelências

Imagem de capa: tommaso lizzul/shutterstock

Acho que eu estava perto dos 50, quando começaram a me chamar de senhora. Acontecia principalmente com gente muito jovem. A atendente da padaria Pioneira, por exemplo: A senhora quer seu pão na chapa? Eu ficava meio chateada e pensava: Quando será que perdi a prerrogativa do você? Mas os anos voaram mais rápidos do que o Super-Homem.

Hoje todo mundo me chama de senhora. Gente dos 5 aos 96. Então não me importo mais. Até quando me perguntam Quem quer falar? Repondo Dona Fernanda. Assumi o senhora e o dona. Mais ainda, aceito idosa, terceira idade, velha, vale-refeição, vale-transporte, assento e filas preferenciais.

Porque tanto faz. São apenas palavras que nos denominam quando temos muito mais passado do que futuro. Não que eu acredite que os nomes sejam inocentes. Ah, isso não! Boa parte da língua portuguesa poderia ir para a operação Lava-Jato.

O fato é que meu tempo é curto para que eu o perca polemizando com o vernáculo, o governo, o síndico, a atendente da padaria. Isso também tem a ver com quebrar o espelho que reflete o outro. Pois na juventude, eu me importava caminhões com a imagem que os outros faziam de mim.

Nessa história de agradar, disse muitos mais sins do que nãos. Traduzindo: entrei em frias monumentais, apenas para garantir que me amassem. É claro que não funcionou! Pessoas nos amam por razões misteriosas. Não pelo que fazemos ou desfazemos. Precisei de meia dúzia de décadas para chegar a essa conclusão.

É evidente que o outro me interessa. Mas mais por ele mesmo. Não pela imagem que ele faça de mim. Outro dia uma amiga de faculdade – que não vejo há 35 anos – escreveu no Messenger que me recordava como uma pessoa pé no chão. Levei susto, porque me sinto sempre com os pés a alguns centímetros do solo.

Daí perguntei para outra amiga – que me conhece como ninguém – Você acha que eu sou um tipo pé no chão? Ela respondeu bate-pronto Acho. Fiquei matutando: Qual imagem é mais real? Aquela que os outros fazem da gente? Ou a imagem que cada qual faz de si mesmo?
Sei lá! Mas tem algumas coisinhas que eu sei. Cabeça na lua ou pé no chão, gosto de andar de carro à toa.

Assim sem destino pelas ruas de Sampa. Também gosto de ler o jornal às 6 da manhã e decidir Amanhã não compararei mais. No outro dia lá estou lendo o jornal de novo. Gosto também de alguns gestos. Sendo o mais divertido deles, o dar de ombros. Dane-se a imagem é a excelência da minha idade.

Considerações sobre um abraço bem dado

Considerações sobre um abraço bem dado

Imagem de capa: Pavel Ilyukhin, Shutterstock

Quando não tenho ninguém por perto para abraçar, abraço o meu gato, o meu cachorro, o meu ursinho de pelúcia. E se tenho alguém para abraçar, abraço, e TAMBÉM abraço o gato, o cachorro, e só deixo de fora o urso de pelúcia. Eu adoro abraço!

Descobri que gostava de abraço depois de grande, porque na minha infância não havia a cultura do abraço gratuito, aquele que se dá e se recebe por nada.

Na minha família de origem, os abraços eram regulados para chegadas e partidas, e mesmo assim, quando se pensava que o abraço estava começando, ele já tinha terminado.

Eram abraços legítimos mas sem consistência, que explodiam como flash no escuro, e desapareciam sem deixar lembranças. Eram abraços desbotados de afeto, corados de vergonha, de direção hesitante, quase como uma senha distribuída com parcimônia e formalidade. Toma lá e vá embora!

Foram tantas as inadequações internas entre os membros da nossa família que, apesar do amor que nos unia, vira e mexe, em vez de abraço, a gente trocava cabeçadas, por falta de uma mirada franca, direta, tranquila, por falta de um olhar corajoso e puro que enxergando diretamente o outro, nos assegurasse sem necessidade de palavras: “te abraçar é bom.”

Não me lembro de abraços em datas festivas. Talvez houvessem, mas dada a qualidade do abraço, eles não entraram na minha contabilidade de abraços inesquecivelmente bem dados.

Felizmente, a vida não me impediu de receber outros abraços. Abracei e fui abraçada, e é por isso que nesse dia, em que escrevo sobre abraços, quero exaltar o poder magnético de um abraço.

Dentro de um abraço há uma porção secreta de elixir da vida.
Há cura para a saudade impossível.
Há correspondência para todas as fragilidades humanas.
Há analgésico para as dores da alma.
Há saúde para o corpo cansado, adoecido, abatido.
Há vida para quem está desistindo de viver.
Há inclusão para quem se sente excluído.
Há vontade de ficar.
Há esperança para quem não vê saída.
Há coragem para as horas trágicas.
Há até breve e há adeus.

Eu penso que, se no leito de morte, nos sentirmos abraçados, ao nos desprendermos do derradeiro abraço, teremos coragem para invadir o invisível.

Há algo de Deus na mão que segura a nossa mão, no braço que nos abraça, e nos envolve, sem pressa, sem susto, sem medo, como se a eternidade tivesse chegado e fosse impossível nunca mais deixar de nos abraçar.

Dentro de um abraço cabe muita divindade, mas também cabe a humanidade que ama, que sofre, que chora, que se alegra, que comemora, que se perde e se acha, no exato momento em que o abraço sinaliza a direção.

Não é o beijo quem faz isso, é o abraço. Não é a relação sexual quem restaura a quebra de energia, é o abraço. Não há a exigência de ser abraçado por pessoas de sexo diferente, ou do mesmo sexo.

Dentro de um abraço não cabe homo ou hétero. O abraço é vibração de cura sem discriminação sexual. O abraço é tão divino que prescinde de orientação sexual.

Abraço é sinal verde para a saúde. Por falta de abraço as pessoas entram no modo espera e ali ficam, estagnadas e carentes, até adoecerem, e dali não saem, até que um abraço as resgate. Não um abraço molengo qualquer, mas AQUELE abraço.

Ontem, vi um filme um pouco antigo, que achei maravilhoso: “O encantador de cavalos”, interpretado pelo extraordinário Robert Redford. Talvez por isso, me senti impelida a escrever sobre o poder do abraço.

No filme, Robert faz um vaqueiro que tem a missão de aproximar uma mãe e uma filha, desconectadas pela falta de contato físico, no momento em que a menina se encontra bastante traumatizada por um acidente que a deixou com sequelas físicas e emocionais.

Mas ele também faz o mesmo com o cavalo que a menina montava no momento do acidente, e que em decorrência do trauma, se tornara um animal extremamente arredio e perigoso.

O filme distribui abraços. Abraços óbvios e não tão óbvios.
Abraços entre o vaqueiro e a menina.
Abraços entre a mãe e a menina.
Abraços entre o vaqueiro e o cavalo.
Abraços entre a menina e o cavalo.
E como não poderia deixar de ser, em se tratando da sétima arte: abraço entre o vaqueiro e a mãe da garota.

O filme é uma história de cura pelo abraço. E se até o cavalo se cura dos traumas e se revela uma criatura dócil, imagine o que o contato físico faz pelos seres humanos.

Então é isso: abrace e seja abraçado. Faça do abraço um ritual de extrema criatividade. Venha abraçando de longe, com os olhos, com o sorriso, com o corpo que se entrega. E ao chegar perto, não tenha pressa de fechar os olhos. Olhe diretamente, até o último momento em que o ser abraçado saia do seu campo de visão.

Nessa hora, feche os olhos, e… abrace.
Abrace com força, mas sem quebrar a costela.
Abrace com a força do sentimento. Embora os braços precisem da força, ela não pode ser maior do que a força do seu coração. Abrace com tudo o que um abraço significa para você.

E não tenha pressa de desabraçar.
Desabraçar é uma ciência, tanto quanto abraçar o é.
Desabrace lentamente, levemente, quase em slow motion.
E assim como o olhar foi o primeiro a abraçar, ele também deve ser o último a desabraçar.

É desse jeito que eu, você, e todas as pessoas, merecem ser abraçadas. Dispense abraços sem substância. Deseje, queira, e promova abraços de qualidade curativa infinita.

Se for para dar – ou receber – um abraço mal abraçado é melhor nem abraçar.

O que destrói o relacionamento é a falta de respeito, não de amor

O que destrói o relacionamento é a falta de respeito, não de amor

Os relacionamentos chegam ao fim por diversos motivos. Alguns por excesso de ciúmes, outros por exagerados cuidados, outros por falta de respeito, mas, dificilmente, acabam por falta de amor.

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Muitas vezes abandonamos o barco amando muito, mas a relação sofreu tantos maus tratos que não há como continuar. Constate: as relações são afetadas pela forma como o outro nos trata, seja de forma boa ou ruim. Se bem cuidado o amor dura uma vida, se maltratado dura semanas.

É interessante comparar o começo ao fim do relacionamento. No começo as pessoas são gentis, educadas e se mostram preocupadas com o outro. Deixam até aquela sensação de eternidade na história. Mas, na primeira briga, desrespeitam o companheiro de forma cruel, como se não tivesse nenhum sentimento entre eles.

Em algum momento a sociedade pregou que basta amar para uma relação durar. E as pessoas acreditaram. E o cuidado? E o afeto? E o respeito? Engole com gelo? A verdade é que as pessoas perderam o respeito pelos outros e, no calor das emoções, usam as ofensas como quem usa uma metralhadora com a intenção de matar. E matam mesmo. Matam o respeito, o amor, a vontade de continuar.

“O Lobo da Estepe”, de Hermann Hesse é um dos livros mais incríveis sobre o tema. Através dele, conseguimos entender o que acontece na alma humana diante dos conflitos e como podemos lidar com eles. Segundo o próprio Hesse: “o livro trata, sem dúvida alguma, de sofrimentos e necessidades, mas mesmo assim não é o livro de um homem em desespero, mas o de um homem que crê”.

Nesse livro, em um certo momento da narrativa, Hesse apresenta o conflito do homem entre a vontade de viver e de morrer, já que a segunda atitude parecia ser a solução de todos os problemas: “apesar de nunca querer morrer de verdade, sonhávamos com a morte do sofrimento. Queríamos matar aquilo que nos doía: um remorso, um pavor, uma ausência.

Entretanto, nos cantos mais sutis da alma, sempre houve uma espécie de clamor pela existência. Morte e vida eram a fúria e a calma de um animal que nos habitava”.

Alguns relacionamentos, ainda que não levem à morte nem sirvam de reportagem para os noticiários sensacionalistas, deixam marcas profundas na alma das pessoas.

Entenda, de uma vez por todas, que ciúme doentio não é manifestação de amor, que onde prevalece a dor e a humilhação, não pode haver relacionamento. Simples assim!

Sabe, você pode ter a infelicidade de ser vítima da primeira ofensa ou da primeira agressão, mas não precisa aceitar a segunda. Respeite-se e não precisará exigir isso dos outros. Lembre-se que violência começa com desrespeito e, desrespeito, começa com a sua aceitação.

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Imagem de capa: iiiphevgeniy/shutterstock

Valioso mesmo é o que não custa nada

Valioso mesmo é o que não custa nada

Imagem de capa: Dmytro Zinkevych/shutterstock

Eu sei. Sei o quanto você trabalha pelo que tem. Reconheço seu esforço diário, seu merecimento por tudo quanto é seu. Valorizo as suas conquistas materiais. Todas elas. Admiro o cuidado com que você cuida do seu patrimônio, seu carro, sua casa, seus brinquedos de gente grande. Suas coisas. Mas, aqui pra nós, são só coisas. E por maior que seja seu valor financeiro ou sentimental, não valem mais do que aquilo que não custa nada.

Eu só acho que nenhum carro do ano vale mais do que pará-lo no farol vermelho e aceitar o folheto publicitário da moça que passa o dia lidando com cara feia, indiferença e vidro fechado. Não custa nada.

Toda casa se faz mais rica quando abre a porta na hora certa a quem precisa. Toda fortuna se multiplica se dividida. Todo amor se consolida quando se espalha em atitudes amorosas que valem tanto e não custam nada.

Ahh… como valem os gestos gentis! Olhares de afeto, sinais de compreensão, delicadezas à toa, essas coisas que a gente faz pelo bem do outro sem mais o quê. Valem tanto e também não custam nada!

Tratar os outros com respeito é de graça. E tudo que não custa nada vale mais que todo o dinheiro do mundo.

Sonhar é assim também. Não custa nada um sonhozinho bom aqui e ali. A gente sonha grande e muda o mundo devagar. Sonha com as pessoas cuidando umas das outras. Sonha com toda gente reaprendendo o valor grandioso das coisas que não custam nada. Sonha tanto que uma hora acontece.

Sei não. Mas eu acho que não custa nada pensar sobre isso.

A gente não pode ajudar, com as próprias mãos, uma borboleta a sair do casulo

A gente não pode ajudar, com as próprias mãos, uma borboleta a sair do casulo

Imagem de capa: Iuliia Khabibullina/shutterstock

Esses dias eu tive a sorte de presenciar a linda e forte cena de uma borboleta saindo do casulo.

Já havia visto antes um passarinho saindo do ovo. E, em ambas as situações, o sentimento que me surgiu ao assistir assim tão de perto foi dor, a dor da transformação, a dor do nascimento. Uma lagarta não vira borboleta de uma hora para outra, uma borboleta não sai de um casulo com a facilidade e a leveza que suas asas simbolizam. Vendo assim de perto, noto que é um processo longo e doloroso.

Devagarzinho a borboleta vai se despindo do casulo, com as maõzinhas cria uma fresta e vai sentindo o ar de fora, vai abrindo uma janelinha, e vai empurrando o próprio corpo ainda encolhido para fora de seu confortável abrigo. É tudo muito lento, com pausas no percurso, um passo de cada vez para se acostumar com o novo. E quando o corpo todo deixa o casulo, a borboleta ainda está toda encasulada, seu corpo comprimido, suas asas dobradas, mesmo fora da casca, sua estrutura ainda está apegada. É devagar que as asas vão se esticando, se abrindo, revelando o colorido e as dimensões.

Quanta coragem e força precisou ter esse ser intermediário entre lagarta e borboleta para poder encontrar o mais pleno de si? Quanta luta consigo mesma precisou a borboleta desempenhar para entender que mesmo que tão quentinho, confortável, familiar era a sua situação de lagarta no casulo, era menos do que ela veio ser neste mundo? Chega uma hora de maturação que as leis do universo nos impulsionam a rompermos nossos casulos. Vai haver dor? Sim, mas ficar já não é mais uma opção.

Ah, mas e essa persona de lagarta que a gente já sabe ser? E esses territórios já tão conhecidos, os ambientes conquistados, essa facilidade de ficar nos galhos?… E essa hibernação do casulo, é tudo tão confortável (e duro!)? É mais fácil continuar sendo o que se é… Não é? Como podemos querer abrir frestas para uma nova versão da gente mesmo? E deixar para trás as nossas firmes verdades, e reaprender a andar (ou a voar!), e nos olhar no espelho e nos desconhecermos por completo?!

contioutra.com - A gente não pode ajudar, com as próprias mãos, uma borboleta a sair do casulo
Arte: Charlie Davoli

Como podemos querer abrir em nós mesmos uma nova versão de ser no mundo? Se essa que eu uso hoje já me cai bem, já conhece os caminhos (e os esconderijos). Pra que passar por uma dolorosa transformação, se eu não mais serei eu, se eu vou perder o chão que com tanto custo cultivei?! Que monstro é esse que mora em mim e que quer ser eu em meu lugar? Como eu vou deixar? Como vou parar para escutar esses ecos que vão me matar?!

Não! É melhor a gente ligar alto a televisão, é melhor se afundar no trabalho, e chegar em casa cansado pra não ter que encarar nada disso. É melhor tomar um comprimido, reclamar o tempo todo como um disco riscado e não parar para olhar o que realmente está errado e martelando na nossa alma. É melhor acreditar nessas paixões que nos machucam, nessa solidão como destino, nessa nossa condição de vítima. É melhor curvar as costas, reprimir a alma, fazer vista grossa para o que na gente quer ser grande! É melhor não escutar o silêncio e não encarar-se no espelho por muito tempo.

É melhor mesmo?

A gente não pode ajudar, com as próprias mãos, uma borboleta a sair do casulo…

Está nas mãos dela, está na ousadia de suas asas.

Morro de preguiça de gente sonsa

Morro de preguiça de gente sonsa

Tem gente que já nasce sonsa. Ou aprende a ser sonsa desde muito pequenininha. É aquela criança que fala assim “Professora. Pode comer lanche na aula?” ou “Professora. A prova é com consulta?”. Só para poder dedurar o amigo que não aguentou esperar o recreio para comer ou o outro que está tentado dar uma coladinha na prova.

Ahhh sim, gente dedo duro é de lascar também. Mas gente sonsa é ainda pior! O dedo duro autêntico se orgulha de ser dedo duro. Prefere ferrar os outros e ser odiado a assistir passivamente o sucesso ou a paz alheia.

O dedo duro é falso explicitamente. É aquela parte do texto grifada em neon, com aquelas canetinhas verde–limão. Você só atura o dedo duro se quiser, porque esse tipo realmente não faz questão da sua aprovação. Seu prazer reside em outro tipo de satisfação.

Agora… o sonso… Virgimaria! O sonso não mostra a cara, não assume o que faz e é capaz de acabar com a sua alegria, com um sorriso angelical estampado nos lábios.

Por isso, não vá achando que a sua inteligência é pouca, ou que a sua inocência beira a idiotice, caso você já tenha caído na lábia e desgraça de algum sonso, ou sonsa. Afinal de contas, se você ainda não passou por isso, vai passar… É uma questão de tempo.

E quanto mais esperto você for, mais sofisticada será a estratégia do sonso para te engabelar. Sim!!! Porque se tem uma coisa que faz parte do “modus operandi” dessa gente é a vaidade exacerbada. Gente inteligente é um desafio para gente sonsa. É assim, tipo um troféu, uma iguaria, a sobremesa mais cara do cardápio.

O sonso tem inveja de tudo. Até das dificuldades. E quer o que é seu, mesmo que não tenha nenhuma serventia para ele. Seu negócio é subtrair, enganar, prejudicar, minar relacionamentos. E ele não mede esforços para conseguir o que quer. Pode passar muitos anos se fazendo de seu melhor amigo, sem que você sequer desconfie de suas intenções.

E, não, não é uma patologia. É fraqueza de caráter mesmo. Às vezes tem jeito, às vezes não tem. Tem gente que nasce sonsa e morre sonsa, vai sacanear os colegas idosos no jogo de dominó até o fim de seus dias, exatamente como sacaneava os amiguinhos na hora de bater figurinha.

Morro de preguiça de gente sonsa, exatamente porque já aprendi a farejá-las a quilômetros. E compreendi que o único jeito de derrotá–las é se fingir de sonso por algum tempo. E isso cansa! Cansa mas compensa. Porque cair nas malhas da falsidade de uma pessoa sonsa não é raro, nem trabalhoso, mas pode ser fatal.

Imagem de capa meramente ilustrativa: cena da série Downtown Abbey

Se o parceiro não muda, muda de parceiro

Se o parceiro não muda, muda de parceiro

Parece impossível saber com exatidão o momento exato em que nada mais adiantará, em que tudo já foi feito, dito, revisado, explicitado, em que é hora de sair de um relacionamento que expirou de vez. Queremos dar certo na vida, no trabalho, no amor, por isso nos custa demais terminar com algo definitivamente, porque dói falhar assim, dói demais.

Nós nos apegamos com certa facilidade a coisas, a pessoas, tomando como parte de nossa vida muito do que nem deveria estar junto, mantendo o que machuca, por medo, covardia, por ter que dar satisfações aos outros, ao mundo, enquanto ficamos a cada dia menores, acumulando o vazio de um relacionamento de mão única, amando por dois, pedindo, clamando, doando sem retorno, sem guarida, sem volta.

E os dias vão se passando como nuvem, fugidios, superficiais, carregados de uma ausência doída de afeto e de atenção. E vamos como que nos arrastando, trabalhando, agindo mecanicamente, carentes de ao menos um olhar que retorne sentimento, carentes de abraço, de beijo, de “bom dia” e “boa noite”. A cada dia, ficamos menos gente, vivemos menos amor, ao passo que nutrimos uma falsa e tola esperança de o outro vá mudar – porque a gente já mudou tanto por ele…

Inevitavelmente, chegaremos a um ponto em que já teremos tentado de tudo, já teremos avisado repetidamente, mostrado, já teremos gritado exaustivamente, até terem sido esgotadas todas as forças, todas as possibilidades, todo e qualquer caminho, toda e qualquer tentativa. Sem ânimo, alquebrados, aniquilados emocionalmente, sem ter onde agarrar, tomaremos, então, consciência de que é chegada a hora de sair daquilo tudo, de praticar o adeus, o nunca mais.

Quando ainda amor houver, quando o sentimento ainda estiver ali, sufocado pelo cotidiano, mas disposto a reavivar-se, sempre deveremos tentar e lutar pela manutenção do que já construímos a dois. Entretanto, se somente existe vida de um lado, mesmo após as súplicas e insistências de um só, ali o amor não mais florescerá, pois não há mais cor que se instale em terreno infértil, onde não se semeia reciprocidade.

Não esquecer: ainda há muito pela frente a ser vivido com alguém que realmente lhe dê as mãos e volte os olhos para você. Acredite!

Imagem de capa: Matthew Nigel/shutterstock

A maturidade nos ensina a reordenar as prioridades e colocar cada coisa em seu devido lugar

A maturidade nos ensina a reordenar as prioridades e colocar cada coisa em seu devido lugar

Imagem de capa: XiXinXing/shutterstock

O tempo passa e inevitavelmente algumas coisas não têm mais importância nem espaço em nossas vidas. Percebemos que é uma grande perda de tempo revitalizar o que desbotou.

Depois de algum tempo, compreendemos que o mundo não acaba por razões tão pequenas. Por situações que fugiram do controle. Por tudo aquilo que não era para ser.

Os infortúnios, os desencontros, as decepções e as perdas sempre vão acontecer, é inevitável. O que muda é a forma de lidar com as rupturas, com os nãos que a vida impõe.

A vida tem ritmo próprio, que segue indiferente ao caminho desenhado por nós. O que acontece fora do planejamento, não deve nos roubar a paz e a esperança no futuro, é apenas uma parte que não se encaixou naquele momento. Que não girou conforme a mirabolante engrenagem que montamos. Que não entrou em sintonia com aquela expectativa que regamos durante tanto tempo.

Há um ponto onde a engrenagem para, e isso não está mais relacionado ao que fizemos ou deixamos de fazer. É da ordem do que não se explica. Não convém debulhar para entender. Não significa que estagnamos ou desistimos. Significa que mudamos o comportamento em relação àquele fato, e agora, mais plenos e conscientes, descobrimos que algumas coisas escapam e não dependem mais dos nossos esforços, da nossa entrega.

O tempo passa de qualquer maneira, e frequentemente, somos modificados por tudo que nos cerca. O que não deu certo não deve ganhar autoridade para nos atormentar com o fantasma da culpa. Deve ficar no passado. A maturidade nos ensina a reordenar as prioridades e colocar cada coisa em seu devido lugar.

A quem você tem confiado suas dores?

A quem você tem confiado suas dores?

Imagem de capa: Ollyy/shutterstock

Conselheiros são pessoas iluminadas. São pessoas que escolhemos para dividir nossas dores com a certeza que não seremos julgados e, de quebra, receberemos uma solução para aliviar a alma.

Pedir conselhos é demonstrar afeto e respeito. Somos conselheiros e aconselhados o tempo todo. Nossos erros servem de exemplos para que outros não cometam os mesmos e nossa postura, diante das adversidades, uma inspiração para os indecisos. O problema é que nem sempre isso acontece.

Tem gente que incorpora um personagem quando alguém lhe pede conselhos. Parecendo mais um juiz do que um amigo disposto a ajudar. As frases do tipo “eu te avisei” ou “ se eu fosse você, eu faria…” estão impregnadas em todos os diálogos. Logo depois, claro, das frases prontas de autoajuda. Dão conselhos passando a mensagem entrelinhas de: “Com licença? Me permite fazer um comentário, que além de derrubar gravemente sua autoestima, não acrescentará nada de positivo a sua vida?”

Só há um detalhe em comum nessas pessoas: aconselham mas nunca vivem o que pregam. Você escuta um “o mar está agitado para surfar” de quem não sabe nem nadar. Escuta um “você vai esquecer essa traição” de quem nunca foi traído. Escuta um “esse remédio é bom para o estômago” de quem nunca teve uma azia. E, se não resolve seguir os conselhos, ainda escuta um “você não faz nada do que eu digo”.

É difícil acreditar em um conselho onde a prática esteja longe da aplicação, simplesmente, porque a consciência nos define, mas nossos atos nos revelam. Em o Lobo da Estepe, de Hermann Hesse há uma citação que afirma bem essa situação: “ninguém pode ver nem compreender nos outros o que ele próprio não tiver vivido.”

Claro que tudo tem dois lados. Existem (ainda bem) pessoas maravilhosas que, realmente, se preocupam conosco, mas não podemos ser ingênuos em acreditar que todos querem nosso bem. A verdade é que estamos recebendo conselhos demais e vendo exemplos de menos. Confúcio dizia que não há coisa mais fria do que o conselho cuja aplicação seja impossível.

É tão fácil usar o discurso para encantar, encorajar, superar a dor, esquecer o ex, mas quando vivenciamos a dor do outro parece que estamos com uma faca cravada no peito e morrendo de forma cinematográfica. Resumindo pregamos a lei: para os outros o rigor, para nós a misericórdia. “Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente”. (William Shakespeare).

Às vezes quem busca seu conselho, não quer a sua opinião. Quer seu ombro, sua companhia, um amigo para desabafar… apenas isso! Rubem Alves dizia que “buscamos, no outro, não a sabedoria do conselho, mas o silêncio da escuta; não a solidez do músculo, mas o colo que acolhe.”

Conselho bom é daqueles que nos amam. Daqueles que vivem a nossa dor e se preocupam conosco. Daqueles que, indiferente, da distância se fazem presentes. Quanto aos outros, releve. Há conselhos que revelam as ações que as pessoas gostariam de ter realizado, mas o medo não permitiu.

Coringa e Arlequina: quando o amor extrapola

Coringa e Arlequina: quando o amor extrapola

Ninguém pode negar que Coringa e Arlequina, mesmo que por poucos minutos, roubam a cena em “Esquadrão Suicida”. Ainda que sejam personagens bastante populares nas HQs ou que os atores tenham elevado à excelência suas performances, certo é que o romance entre os dois antagonistas carrega um amor com o qual muitos de nós nos identificamos, guardadas as devidas proporções.

Arlequina representa o parceiro que se doa além do razoável, entregando-se incondicionalmente a um sentimento que, na verdade, mais machuca do que cura, mais entristece do que alegra. Obscuro, selvagem, insano, o que ela sente acaba por transbordar os limites morais e éticos que são aceitáveis e desejáveis socialmente, tornando-a alguém teoricamente pior, alguém que transgride as regras e normas convencionais.

E é assim nos apaixonamos por ela, por sua beleza, por suas habilidades e personalidade forte. Arlequina, afinal, representa a libertação de amarras por que muitos de nós ansiamos: ela se torna mais bela, mais desejada, mais perigosa, ágil e proibida. Trata-se, pois, daquilo que nos atrai, mesmo quando sabemos que é errado, simplesmente porque todo mundo já desejou, alguma vez na vida, ultrapassar algum limite, perigosamente.

Coringa, por sua vez, em si carrega todas as características de um anti-herói, de um fora-da-lei, de alguém que fascina, lidera, que é temido e, por isso mesmo, atrai vários olhares femininos. De início, ele percebe, na Arlequina, um meio de atingir os seus objetivos, um mero joguete, porém, acaba por ser vítima do próprio ardil, ao se apaixonar por quem menos esperava. Ah, o amor e suas armadilhas…

Na verdade, o casal de antagonistas simboliza nada menos do que os desejos inconfessáveis de muitas pessoas, quando idealizamos e imaginamos um outro nós, desarticulados das regras e convenções que muitas vezes nos sufocam e questionamos. A grande maioria das pessoas jamais excederá nestes terrenos obscuros e indesejáveis, logicamente, mas assistir a isso tudo como espectadores é fascinante e, até certo ponto, consolador, visto que catártico.

O amor pode se transformar em tudo, até mesmo no que machuca e fere, da mesma forma nos transformando em pessoas melhores ou piores, mais felizes ou mais tristes, somando ou subtraindo. Caberá sempre e somente a nós lidar com um sentimento tão nobre, a ponto de aninhá-lo confortavelmente em nossos corações, sem dor, sem demora, sem espera, com verdade e conforto na alma.

Imagem de capa meramente ilustrativa: cena do filme Esquadrão Suicida.

É impossível conviver com a dor de abandonar um sonho

É impossível conviver com a dor de abandonar um sonho

Imagem de capa: pathdoc/shutterstock

Às vezes penso que é fácil desistir. Olhar para tantos sonhos coloridos e desviar o rosto. Não sorrir. É que tudo fica tão chuvoso por dentro, e olha que eu amo tanto a chuva, mas ela amedronta às vezes. Quando é forte demais e a janela parece que vai despencar com tantos bombardeios de trovões. O tempo lá fora entra em consonância com a bagunça aqui dentro e custo achar um pente fino que ponha ordem nessas ideias embaraçadas.

A vida é muito louca mesmo. Um dia a gente acorda e quer engolir o mundo porque o peito está queimando em sonhos. A gente quer levantar, fazer tudo certo e até faz. Até certo ponto. Mas no outro dia, compreende que é pouco. Que precisa de mais. É um desalento, porque nem sempre a gente tem esse “mais” para dar, aquele gás na subida. Aquela alavanca que segura as pontas e nos protege de tudo.

Parece que a gente murcha com o acúmulo de expectativas. Porque é preciso mover muitas peças para movimentar o tabuleiro, bem mais do que a gente pensava. É mais complexo. É mais duro. É mais fundo. É além. A gente se sente sozinho, despencando no túnel vazio da descrença, caçando o “mais” sem ter.

É quando penso que deixar para lá é a coisa mais sensata a fazer. Mas deixar para lá é se abandonar e isso significa se esquecer. Ninguém quer viver esquecido de si mesmo, porque é isso que acontece quando a gente abandona um sonho. É mais que isso, é acordar com aquele oco imenso doendo que nem ferida recente, onde tudo bate em cima, e qualquer coisa é motivo para lembrar que não sonhar é o fim.

É quando penso que eu não sei desistir. É inviável. Impossível. Porque jamais conseguiria conviver com a dor de abandonar um sonho e não poder vê-lo crescer gradualmente. Ganhar forma e engatinhar mesmo com passos lentos e titubeantes para o futuro realizável. Brincar na varanda dos meus pensamentos com as peças de encaixe de uma vida inteira a construir.

Sei que essa transição às vezes parece uma eternidade. ‘’Somos instantes’’. Instantes cheios de luzes e explosões, porém instantes de reflexão e pressa. Descemos até o interior, aos confins de nós mesmos para planejar cada detalhe, como se pudéssemos gerenciar o rumo das coisas. Ilusão de controle… que circo! Não controlamos absolutamente nada. Que graça teria se não recebêssemos a visita do acaso?

Se somos instantes, efêmeros pontos de luz que, às vezes, se apagam para consertar as instalações da luz própria, devemos ter a plena consciência da falha e finitude. E isso não deveria assustar tanto. A luz que oscila, às vezes é só um detalhe, um embaraço provisório nessa imensidão de instantes futuros.
Quantos?

Não sabemos.

Frieza alguma justifica um coração partido

Frieza alguma justifica um coração partido

Não aconteceu como você queria. Um amor que deveria ficar e logo foi embora. É triste. Cansativo até. Mas tão breve perceber que quer arriscar de novo, entregue-se. Seja fogos de artifício para ter o mesmo em troca. Porque frieza alguma justifica um coração partido.

Quem está chegando não pode carregar tristezas de amores passados. Para ser assim, fique na solidão. Aprenda. Amadureça. Pratique autoconhecimento e saboreie quantos momentos forem necessários para que, quando a hora de finalmente conhecer alguém chegar, você saiba quais carinhos despertam aconchegos. Sair entrando de cabeça no primeiro relacionamento após ter o coração partido e oferecer inseguranças, poucos sorrisos e uma mão frouxa, é simplesmente afastar quem escolheu estar com você.

Daí, depois não adianta lamentar e tampouco cobrar. Reciprocidade é um sentimento espontâneo. Você não escolhe como e de que forma ele será manifestado. É egoísmo enxergar o amor com formas próprias.

Portanto, siga. Se não for para ser mais, se não for para estar ali, de querer inteiro, apenas vá. Convoque os seus medos e mágoas e bata um papo com eles antes de permitir-se cativar outra pessoa. Porque, mais uma vez, frieza alguma justifica um coração partido.

Imagem de capa: Depois de Maio (2012) – Dir. Olivier Assayas

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