“E se Obama fosse africano?”- por Mia Couto

“E se Obama fosse africano?”- por Mia Couto

O texto “E se Obama fosse africano?” foi escrito por ocasião da primeira eleição de Barack Obama à Presidência dos Estados Unidos, momento em que diversas lideranças africanas comemoravam a ascensão de um negro a um dos cargos mais cobiçados e mais poderosos do mundo, chamando-o de “irmão”.

Neste contexto, Mia questiona e coloca à mostra a hipocrisia dessa “irmandade” propagada em terras africanas, onde, segundo o autor, existe muitas vezes a incapacidade de enxergar os seus “próprios racismos e xenofobias”.

Para concluir o texto, Mia afirma que a vitória de Obama é mais do que uma real demonstração de fraternidade: é uma convocação à luta.

Nara Rúbia Ribeiro

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E se Obama fosse africano?

Por Mia Couto.

Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.

contioutra.com - "E se Obama fosse africano?"- por Mia CoutoNa noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.

Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de “nosso irmão”. E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.

Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: “E se Obama fosse camaronês?”. As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.

E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?

1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.

2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.

3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes.

O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente “descobriram” que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado ‘ilegalmente”. Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.

4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um “não autêntico africano”.

O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos “outros”, dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).

5. Se fosse africano, o nosso “irmão” teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais. Pecado mortal para os advogados da chamada “pureza africana”. Para estes moralistas – tantas vezes no poder, tantas vezes com poder – a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos.

6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado – a vontade do povo expressa nos votos. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.

Inconclusivas conclusões

Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.

Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.

A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos – as pessoas simples e os trabalhadores anónimos – festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.

Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.

No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos.

Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política.

Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.

Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente.

É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.

Jornal “SAVANA” – 14 de Novembro de 2008

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Nara Rúbia Ribeiro: colunista CONTI outra

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Escritora, advogada e professora universitária.
Administradora da página oficial do escritor moçambicano Mia Couto.
No Facebook: Escritos de Nara Rúbia Ribeiro
Mia Couto oficial

O choro é o limite!

O choro é o limite!

Por Gustl Rosenkranz

Ontem observei uma cena que mexeu comigo, não por ter sido nova, pois é algo que vejo muito. A cena mexeu comigo porque ela ocorreu em um momento de reflexão sobre o sofrimento que observo em pessoas adultas, que carregam consigo as pedras de sua infância. E foi isso o que vi: uma mãe colocando uma pedra enorme na mochila de seu filho, um menino travesso e robusto com idade entre dois e três anos. O menino queria continuar ali no chão, brincando, mas a mãe queria ir embora. A mãe chamava, o menino corria. E quando a mãe conseguiu segurar o menino, ele se deixou cair, escorregando nos braços da mãe como se fosse sabão. A mãe, já sem paciência, o puxou severamente mais uma vez para cima, sem que isso adiantasse, pois o menino voltou a escorregar para o chão. E a coisa foi se repetindo até a mãe perder totalmente a postura, dando um berro na criança, uma bronca enorme que fez o menino estremecer. Ele parou de repente com a malcriação, assustado, olhou sério para a mãe e começou a chorar. Até aí tudo bem, e até compreendi a reação da mãe, pois menino teimoso pode realmente torrar a paciência de qualquer um, mas o que veio depois foi algo que, em minha opinião, não poderia ter acontecido: o menino chorava, praticamente se rendendo, dizendo à mãe que a bronca doeu (levar bronca da mãe sempre dói!) e pedia na verdade para ser pego no colo e consolado. Mas, ao invés disso, a mãe prosseguiu dando bronca, cada uma mais severa que a outra. Parecia-me que quanto mais a criança chorava, mas perversa a mãe ficava. Ela chegou até a dizer que a criança merecia mesmo chorar e sofrer, já que havia sido desobediente. E lá continuou essa mãe, tascando mais e mais pancadas verbais no menino…

Confesso que me assustei, por mais compreensível que tenha sido o comportamento da mãe, já que ela é humana e limitada como todos nós. É mais que compreensível que ela tenha perdido a paciência e partido para a bronca, tentando educar seu filho num momento de desespero pedagógico, já que o menino não obedecia de forma alguma, mas percebi que o que ocorreu depois do choro deixou de ser natural. O instinto de mãe (isso vale igualmente para o instinto de pai!) deveria tê-la feito parar com a agressão, pegando a criança no colo e consolando no instante em que ela chorou. É claro que existem crianças “tiranas”, que choram para azucrinar e chantagear os pais, mas esse é outro caso. Normalmente uma criança chora porque está com dor, com medo, assustada ou simplesmente pedindo consolo. No caso acima, tive a impressão de que a criança chorou por ter se assustado e porque a bronca da mãe havia doído.

Recordei-me então de outra cena, que observei entre cachorros e que mostra que um comportamento natural é bem diferente do comportamento da mãe na história acima: vi um cachorro adulto interagindo com dois filhotes seus. Os filhotes eram dois “traquinas”, que pulavam em cima do cachorro adulto e aprontavam o tempo todo, sem que ele (o adulto) perdesse a paciência. Mas, certa hora, um dos cachorros foi longe demais, mordendo a orelha do cão adulto, que não gostou da história, rosnando e alertando o filhote sobre o limite ultrapassado. O filhote se assustou e correu, mas, ao invés de parar, voltou e tentou morder novamente, ignorando ainda algumas “rosnadas”, até que o cachorro adulto resolveu encerrar aquilo, levantando-se, pulando em cima do filhote e segurando-os com as patas dianteiras. Nesse momento, o filhote, assustado e provavelmente com dor, deu um grito, chorando. Isso fez com que o cachorro adulto parasse de imediato com a “bronca” e voltasse para seu lugar, deitando-se novamente.

Não dá para comparar animais com gente completamente e não acho que mãe ou pai deva se comportar como se comportam os cachorros, mas esse exemplo mostra o que quero dizer com comportamento não natural: o cachorro não quis maltratar o filhote. Ele só quis educá-lo e mostrar-lhe o limite. No momento em que o filhote chorou, se rendendo, mostrando que entendeu a bronca, o cão adulto parou imediatamente com a agressão, por saber que o filhote não chora à toa, por saber que ali estaria seu limite de “educador”. Se observamos outros animais na natureza, percebemos: animais às vezes também são duros com seus filhotes, mas nunca mais do que o necessário, buscando educar e não maltratar. E o choro é o limite. Quando o filhote chora, a punição acaba. Já os humanos, pelo menos muitos de nós, agem diferente, prosseguindo com o castigo, com a bronca, com a repreensão, mesmo depois da criança ter chorado, mesmo durante o choro da criança. E tem gente que ainda vai mais longe: apesar de vivermos em pleno século XXI e já sabermos que nada jamais justifica o uso de violência física contra crianças, há quem vá além da bronca verbal e bata nos filhos, continuando a bater mesmo com as lágrimas correndo no rosto da criança.

 

Para mim, tal atitude de uma mãe ou de um pai nada tem a ver com educação. Mesmo que não seja essa sua intenção, esse adulto age com perversidade, projetando na criança seu cansaço, sua frustração e suas limitações. Isso não é justo e só serve para quebrar a alma dessa criança, principalmente quando vira rotina, se repetindo diariamente e marcando a relação entre pais e filhos.

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Não, não se castiga uma criança que chora. Repito: o choro é o limite. Uma criança chorando não precisa de bronca e castigo, mas sim de amparo e de colo. É assim que o pai ou a mãe sinaliza à criança que quer seu bem, que deu a bronca por amor e por querer educar e não para maltratá-la. Mas se a bronca/o castigo continua mesmo depois do choro, isso tem outro significado para a criança: de que não pode confiar no adulto, pois esse não hesitará em pisoteá-la assim que ela mostrar fraqueza, quebrando a confiança entre pais e filho, colocando em sua mochila um peso que essa criança terá que carregar consigo talvez por uma vida inteira. Essa quebra de confiança pode fazer com que a criança se torne um adulto infeliz.

Repito mais uma vez: o choro é o limite! Portanto, tanto faz o que seu filho ou filha aprontou ou deixou de aprontar, na hora em que ele ou ela chorar, pare com a bronca, pare com repreensão e pegue sua criança nos braços, dando amor, carinho econforto. E você verá que isso educa mais que qualquer bronca, por mais bem dada que seja.

Quem matou Odete Roitman?: sobre a vitimização humana

Quem matou Odete Roitman?: sobre a vitimização humana

Por Tatiana Nicz

Se você tem mais de trinta anos deve lembrar-se bem sobre a comoção que a novela “Vale Tudo” causou em torno do mistério da morte de uma das protagonistas a inesquecível vilã Odete Roitman da grande Beatriz Segall. Mesmo sendo televisionados em época de Natal e Ano Novo, os últimos capítulos da novela atingiriam níveis de Ibope nunca vistos. Durante 13 capítulos todo mundo (inclusive os próprios atores) queria saber quem era o assassino, de quem era a culpa.

Acho essa analogia fantástica para entender no comportamento humano um processo muito curioso de vitimização, acho que talvez um pouco mais presente nos brasileiros. Nesse processo, assim como na tal novela, o foco sempre é achar o culpado. Não importa se Odete era vilã, não importa se foi feito justiça, poucos lembram quem a matou e o motivo, mas é importante saber de quem é a culpa. E assim transfere-se toda a responsabilidade e raiva para o culpado.

E ninguém nos ensina que achar o culpado não resolve muita coisa, ou melhor, talvez para um crime desse tamanho até resolva, o culpado deve ir preso, a justiça é feita; mas em uma esfera maior a pessoa continua morta, a dor continua doendo, o luto existe então, a meu ver, não resolve tudo.

E ninguém nos conta que viver à procura do culpado para nossos males e encontrando-o não resolve muita coisa. Aos vivermos à procura de culpados e usando desculpas para nossos atos falhos nos colocamos sempre na posição de coitado. E coitado não resolve problemas. Repare em quantas vezes contamos nossas histórias como se fossemos as únicas vítimas dos fatos, em como somos injustiçados. Dessa maneira a culpa é do governo, o Brasil que é ruim, do fulano que brigou comigo.

Assim gastamos uma vida toda usando desculpas que o nome já diz: des-culpa, aquilo que nos isenta de responsabilidades e justifica nossa posição de vítima. E por fim, ninguém nos ensina que nada de belo germina em campo inundado por pena. As doenças neurológicas, talvez por ser o campo mais “abstrato” da medicina, são um prato cheio de onde brotam as desculpas. Transtornos de personalidades, traumas de infância, nossos pais, nossa família, nossos amores, todos culpados por sermos assim tão quebrados.

Fato é que traumas todos nós temos, dores também. Vou mais além, não existe uma criação cem por cento saudável do ponto de vista da psicologia. Então se quando crianças e adolescentes somos demasiadamente imaturos para entender que podemos aquebrantar qualquer padrão que nos for condicionado; quando adultos deveríamos entender que temos responsabilidade plena e controle sobre nossos atos e sobre como reagimos às pequenas (e grandes) violências da vida.

O papel de vítima é confortável e a sociedade é preparada para te colocar nele todos os dias. Dessa vez, se servir de consolo à alguém, não é (apenas) nossa culpa: não somos instruídos em nenhum momento de nossa vida a construir o outro através de sua dor.

Olhamos para o deficiente como “coitadinho” e o próprio nome já carrega uma conotação totalmente equivocada do que é ser portador de uma necessidade física; olhamos para o miserável como “coitadinho” e novamente o nome traz a condição. Olhamos para o paciente como coitadinho; aquele que deve ficar à espera, à deriva, o pobre coitado.

Olhamos para quem vive a doença ou a morte de um parente ou ente amado com pena, aprendemos a olhar para tudo que nos é diferente como “coitado”. E quanto à nós mesmos: muitas vezes nos sentimos coitados. E enquanto sofremos e nos sentimos injustiçados, assim como na novela, o foco é achar culpados e, quando não conseguimos achá-los entre nós, culpamos um Deus todo poderoso que nos pune.

Colocar-nos e colocar aos outros no papel de vítima não nos engrandece como seres humanos, não nos agrega, apenas nos desconecta. O Universo, ao contrário do que a Igreja diz, não funciona através de sistema de recompensas. Tudo que você quer você precisa buscar e posso ser “a melhor” pessoa do mundo e ainda assim ser assaltada na esquina da minha casa, Deus não vai dizer: ela está se comportando, vamos poupá-la (ou recompensá-la). Pelo menos não da maneira como imaginamos.

Ao analisar os grandes líderes em qualquer área de atuação percebi uma característica em comum: pró-atividade. Não existem lamúrias, não existe processo de vitimização. Um problema não é visto como um obstáculo e sim como oportunidade. Stephen Hawking talvez seja um dos maiores exemplos disso. Suspeito que esses líderes que tanto nos inspiram já nasceram com esse entendimento do que é ser proativo, provavelmente ninguém lhes ensinou porque a sociedade não é preparada para isso, é um talento nato. Conheço gente assim, que não se lamenta, gente que faz. Mas qualquer um pode ser assim, basta querer.

Podemos começar observando e mudando nossos discursos, parando de nos lamentar, de usar desculpas, justificativas, de colocar a culpa no outro. Assumindo a nossa parcela de responsabilidade nos conflitos que vivemos, entendendo que somos menos importantes do que pensamos e que o mundo não está contra nós. Precisamos parar de ser reativo à tudo, esse comportamento é tão recorrente que existem expressões já relacionadas como “empurrar com a barriga” ou “quando a água bate na bunda”. A mudança que queremos ver no mundo depende primeiramente da nossa própria mudança de atitude.

Mas tenha cuidado, pois esse processo pode ser bem doloroso. Ao sair do posto de vítima você terá que entrar em contato com muita coisa que você faz-de-conta que não enxerga, por isso que nos colocamos em lugar de vítima em primeiro lugar. Acredito que é uma defesa nossa. É duro e trabalhoso assumir a nossa parcela de responsabilidade por tudo que acontece em nossas vidas e, principalmente, pelo que fizemos com ela. É muito mais fácil concentrar nossas energias e focar em “quem matou Odete Roitman”.

E esse aprendizado também pode começar colocando nossos dramas em suas devidas proporções. E para isso precisamos de comparativos, que é outro comportamento destrutivo que deveríamos abandonar, mas vamos dar um passo de cada vez. Portanto, enquanto somos treinados para desejar aos outros: alegrias, sucesso, realizações, paz; não contribuímos para seu crescimento como ser humano. A alegria só existe quando sabemos o que é dor; paz, sucesso, realizações são conquistas diárias. E um drama só ganhará proporção quando passamos por situações realmente dolorosas.

Então, você pode me achar meio cruel, mas eu desejo à você leitor e aos demais dor, muita dor. Dramas verdadeiros, daqueles que você deita a cabeça no travesseiro tentando entender como irá vencer o próximo dia, daqueles que você muitas vezes se pergunta como dará conta. Daqueles que já vemos em demasia no mundo, basta olhar com mais atenção. Precisamos aprender a sofrer pelo que é dor de verdade, por nós e pelos outros. Porque o sofrimento puro nos humaniza, nos conecta, nos torna melhores. E para isso primeiramente precisamos saber proporcionar a dor, entender o que é drama “de verdade”. Para mim é o que está relacionado com palavras como morte, doença grave e miséria – de todos os tipos.

Se entendêssemos tudo isso, entenderíamos também como engrandecemos conflitos que na verdade são pequenos, aprenderíamos que um coração partido, uns quilos a mais, a falta de dinheiro para comprar algo que talvez não nos seja tão necessário, a briga com o amigo ou parceiro, tudo isso perde força diante do que realmente nos dói. Aprenderíamos que quando somos proativos e não reativos a vida ganha muito mais valor. Que somos donos de nosso destino e isso é algo realmente grandioso.

Sim, vale tudo, se quisermos seremos sempre Odete, mas ao contrário da personagem ainda estamos vivos e é preciso entender que enquanto vivos podemos escolher com mais cuidado nossas pequenas mortes diárias.

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Jeffrey T. Larson realça a vida e a beleza das “mulheres entre lençóis”

Jeffrey T. Larson realça a vida e a beleza das “mulheres entre lençóis”

“Mulher. Marcas, suores, lençóis amarrotados, vestes ao chão, pele sensível e grande frisson. É tudo que eu tenho a dizer.”  Ana Carolina

Força e delicadeza. Trabalho e sensualidade. O artista americano Jeffrey T. Larson realça a vida e a beleza das “mulheres entre lençóis” e prova que a poesia é o mais rico fruto dos olhos de quem vê, independente do contexto.

 

contioutra.com - Jeffrey T. Larson realça a vida e a beleza das "mulheres entre lençóis"

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Página oficial do artista Jeffrey T. Larson

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Se o amor da minha vida não chegar

Se o amor da minha vida não chegar

Se o amor da minha vida não chegar, vou publicar todos os meus casos de amor. Em de-ta-lhes. E vão ser vários. Vou chorar pitangas com as amigas, fazer brigadeiro, depois vou à academia e pintar o cabelo de loiro. Vou odiar tanto a cagada que o cabeleireiro fez, que nem vai dar tempo de lembrar quem era esse otário que me fez chorar. Vou fazer hidratação e vou voltar a ter meu cabelo castanho de sempre, só que com um pouco menos de brilho, porque não há cabelo que sustente uma água oxigenada. Vou comprar batons de várias cores chamativas e misturar com roupas de cores diferentes. Até azul eu vou comprar. Vai que eu resolvo me fantasiar de alguma coisa…

Vou alugar um apartamento só meu. E vou pintar uma das paredes de vermelho. Vou começar a decorar pelos quadros. Vão ser fotos do Oprisco por todos os lados. E fotos das minhas diversões ao longo da vida. Eu vou ter uma cama de casal para poder levar quem eu quiser. E o lençol tem que ser branco. Não vou precisar decidir se vou casar ou comprar uma bicicleta. Eu vou comprar uma bicicleta e pronto. Minha casa sempre vai ter gente, mas, alguns dias, eu vou preferir ficar sozinha lendo um livro e tomando um bom vinho. Em outras noites, vou tomar leite com Nescau, vestida com meu casaco de lã. Vou ver “Como perder um homem em 10 dias” pela décima vez e dormir antes de chegar ao final, que é a parte mais previsível. Outras noites, eu vou ficar no redbull, porque vou ter alguns textos para entregar e outros para decorar. Vou chegar sempre por volta das 23h, porque eu estarei envolvida com vários projetos artísticos e sempre com várias pessoas. A noite é feita para aqueles que ainda não encontraram o amor da vida, então, eles vão distribuir esse amor com um monte de gente por aí. Vou continuar tendo meus inúmeros casinhos, mas sempre vai ter um que tira minha noite de sono, seja rolando na cama ou porque estou desabafando sobre ele com uma amiga ou com o Word. Depois vai passar e eu vou me apaixonar de novo e de novo. E eu não vou ter problema em conhecer outro cara incrível em uma viagem que eu fizer sozinha, porque meu coração vai ser só meu.

Eu vou viajar quinta à noite, sem avisar ninguém (só meu chefe), porque um amigo conseguiu alugar uma casa aqui pertinho. Eu vou juntar grana, fazer um mochilão pela América Latina, porque Europa já está batido, por mais que eu nunca tenha conhecido a Europa. Eu vou querer me mudar pra Ásia quando eu conhecer o cara dos meus sonhos que vai se mudar pra lá. Vou fazer todos os planos, até que um dia, sem querer, eu vou ter uma noite maravilhosa com outro rapaz e aí a Ásia pode ficar para depois.

Todos os dias vão ser diferentes, porque nunca fui muito de rotina. Sexta, eu vou chamar minhas amigas pra fazer uma comida diferente em casa, enquanto a gente espera a cerveja gelar. Domingo, eu vou fazer um almoço para aqueles de quem eu mais gosto, depois vou ao cinema assistir a um filme cult que eu não entenda nada. Em outro fim de semana, eu vou sair para dançar, tomar uns drinks diferentes e voltar para casa sozinha, mas com o coração cheio, porque sair só para dançar é uma das coisas que me deixam mais completa. Por mais que nenhum cara acredite, uma das coisas que as mulheres mais gostam de fazer é sair SÓ para dançar. A gente gosta de se sentir bonita, viva, feliz e desejada, mas isso não quer dizer que queremos sair de lá com um cara qualquer. Um cara qualquer não substitui a felicidade de dormir sozinha até meio dia, porque passou a noite dançando suas músicas preferidas junto com suas amigas preferidas. Isso também não quer dizer que a gente não ligue para sexo. Até porque eu ligo bastante. Mas entre sexo meia-boca e uma boa noitada suando a camiseta, eu fico com a segunda opção. É muito bom se sentir desejada, mas, ao mesmo tempo, não sentir desejo por ninguém.

Em outros fins de semana, eu vou para a praia cedinho, vou fazer suco verde e fingir para mim mesma que agora eu virei saudável. E, já que um grupo de amigos legais é tudo de que uma pessoa solteira precisa, é com eles que vou dividir meus dias, por mais que todos comecem a se casar. Vou estudar fora. Em qualquer lugar em que pintar uma oportunidade de fazer arte. Depois vou passar um tempo morando em Sâo Francisco, porque dizem que lá é a minha cara – eu quero me entupir de conhecimento, cerveja e de pessoas que aquecem o coração.

Enfim, vou descobrir que de nada vale encontrar o amor da vida se eu não viver o melhor da vida comigo mesma. Então, se ele não chegar, eu vou viver minha vida como eu sempre vivi, sem esperar um “feliz para sempre”, mas investindo no “feliz agora”. Vai ter espaço para muito amor, por mais que eu me sinta sozinha em alguns dias, por mais que me olhem com cara de pena, por mais que achem que eu me envolva com várias pessoas para preencher esse vazio. Mas não tem vazio nenhum, é só muito amor para dar e pouca vida para ser desperdiçada.

E se, por um acaso, isso de amor da vida existir, eu vou saber quando ele chegar, porque eu não vou precisar abrir mão de nada disso.

Mãe, tem brinquedo no céu?

Mãe, tem brinquedo no céu?

Por Adriana Vitória

Quando minha filha estava com cinco anos não queria mais ir à creche. Não estava muito feliz, então decidi mudá-la de escola. Ainda faltava um ano pra que fosse alfabetizada, mas quando fui a uma reunião de avaliação para a matricula, me disseram que ela iria para o primeiro ano, antigo CA ou classe de alfabetização.

Achei que ainda era muito cedo, mas me disseram que como ela já conhecia todas as letras e contava ate sei lá quanto, estava pronta.

Minha intuição, que sempre foi minha melhor amiga na criação da minha filha, me dizia que deveria esperar, mas a diretora parecia tão segura que concordei.

O ano começou, e o mundo lúdico de aprendizado com pinturas, colagens e música se extinguiu do dia pra noite.

Eram toneladas de deveres de casa todos os dias. Se uma palavra fosse mal escrita, teria que ser reescrita em casa vinte vezes.

Ela chorava e aquilo me fazia mal. Eu sempre procurei respeitar o desenvolvimento dela, físico, mental, emocional e espiritual. Eu a observava cuidadosamente: deixou a fralda, a mamadeira e a chupeta em seu tempo. Nem mais, nem menos. Ia se transformando de acordo com sua necessidade.

Mas naquele momento, o que eu via era que sua natureza estava sendo violentada. Ela tinha que correr para acompanhar um processo imposto que não era o dela.

Dois meses se passaram e, um dia, durante a volta da escola ela me perguntou: Mamãe, quando morremos podemos levar nossos brinquedos pra brincar no céu?

Essa foi a deixa. Tínhamos chegado ao limite. No dia seguinte fui a escola e disse que ia tirar minha filha de lá.

A coordenadora não tinha argumentos. Me pediu que a deixasse. Ao mesmo tempo, ela não queria deixar as amiguinhas. Decidi deixá-la terminar o ano mas ela não teria que fazer nenhum dever de casa.

Continuei observando. Ela aproveitou o resto do ano e finalmente nos mudamos de cidade. Agora ela esta tranquila em uma escola que ainda esta longe de ser a ideal, mas que acompanha seu desenvolvimento com respeito.

Esta na hora das escolas reverem seus conceitos. Nós, como pais, devemos estar atentos ao que nos chama a atenção e não parece natural. Nossa intuição é uma grande conselheira. Basta ouvi-la.

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Os cinco começos de livro mais bonitos de 2014 (e que continuam lindos em 2015)

Os cinco começos de livro mais bonitos de 2014 (e que continuam lindos em 2015)

Por  Wendel Valadares

Outro dia vi uma entrevista com a escritora Nélida Piñon, onde ela comentava os inícios de livros mais bonitos que ela já tinha lido. Isso mesmo, a primeira frase, o primeiro parágrafo, o primeiro capítulo, o ponto de partida de cada leitura.Achei genial e é claro que fui conferir todos os livros que ela citou. Então, resolvi adaptar a ideia e listar para vocês os cinco começos de livros mais bonitos que eu li em 2014.A escolha foi super difícil, porque esse ano eu li muita coisa bacana, então tentei buscar os que mais me marcaram, mas é claro que houveram outros tão lindos quanto.

Vamos lá:

1) Lavoura Arcaica – Raduan Nassar

“Os olhos no teto, a nudez dentro do quarto; róseo, azul ou violáceo, o quarto é inviolável; o quarto é individual, é um mundo, quarto catedral, onde, nos intervalos da angústia, se colhe, de um áspero caule, na palma da mão, a rosa branca do desespero, pois entre os objetos que o quarto consagra estão primeiro os objetos do corpo…”

2) Antes de Nascer o Mundo – Mia Couto

“A primeira vez que vi uma mulher tinha onze anos e me surpreendi subitamente tão desarmado que desabei em lágrimas. Eu vivia num ermo habitado apenas por cinco homens. Meu pai dera um nome ao lugarejo. Simplesmente chamado assim: “Jesusalém”. Aquela era a terra onde Jesus haveria de se descrucificar. E pronto, final…”

3) Tempo das Frutas – Nélida Piñon

“A bondade de proteger os viajantes, todo homem que passava pela sua porta. Agora que finalmente afugentara o medo, ou o que o representasse,ofertava-lhes o corpo, só depois restaurando a preocupação do pão, e a comida necessária. Era o seu jeito tímido de seriamente se orientar passageira na vida dos outros. Em verdade, compreendia a serenidade das coisas, sobretudo os viajantes que nem formulavam exigências que ela já não as tivesse cumprido…”

4) O Discípulo da Madrugada – Pe. Fábio de Melo

“Os descaminhos também nos fazem chegar. Ainda que nos falte discernimento para perceber, a natureza da vida é paciente com os debilitados. E não poderia ser diferente. Ela está atada ao inesgotável coração de Deus, origem de toda compaixão…”

5) A Confissão da Leoa – Mia Couto

“Deus já foi mulher. Antes de se exilar para longe da sua criação e quando ainda não se chamava Nungu, o atual Senhor do Universo parecia-se com todas as mães deste mundo. Nesse outro tempo, falávamos a mesma língua dos mares, da terra e dos céus…”

Nota da CONTI outra: o texto acima foi reproduzido com a autorização do autor.

contioutra.com - Os cinco começos de livro mais bonitos de 2014 (e que continuam lindos em 2015)

Wendel Valadares

Nascido e criado no interior de Minas Gerais, me deixei apaixonar pela poesia e percebi que o sentimento foi recíproco, ela também amou-me. Minha poesia é simples, livre do compromisso de se encaixar em algum gênero, ela simplesmente quer acontecer…É feita de essências e descompromissos, é pura e foi intensamente vivida antes de ser escrita… Sou inconstante e imediatista, mudo o tempo todo e quero tudo agora…
Conheça o blog de Wendel Valadares

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Morar no campo e a “qualidade de vida”

Morar no campo e a “qualidade de vida”

Por Luis Gonzaga Fragoso

Moro numa chácara. Lugar com verde exuberante. Tucano, beija-flor, quero-quero, e mais uma infinidade de pássaros fazem o pano de fundo musical.

Para terem uma ideia do sossego, escrevo em pleno dia de Carnaval. O praticumbum-bungurundum do vizinho durou meia hora, se muito.

Volta e meia, um visitante solta o comentário: “Aqui, sim, vocês têm qualidade de vida!”.

Ao ouvir isso pela primeira vez – há seis anos –, pensei, todo pimpão: “É verdade!”.

Da segunda vez em diante, comecei a ficar encafifado. Cada vez mais, a frase me cheira a slogan publicitário. Lenga-lenga de anúncio de condomínio fechado.

Que diabos significa ter “qualidade de vida”? Respirar ar puro? Viver sem estresse? Poder desacelerar o ritmo de trabalho?

Em tese, isso tudo acontece. Mas… a decisão de deixar a metrópole para morar no campo fará de mim um cara zen, com uma rotina também zen? Ora, a própria natureza do meu trabalho pode me transformar, fácil, num “workaholic”.

A mera mudança de paisagem, estar rodeado de verde em vez de concreto, pode muito bem ser inócua. Exemplo disso: nosso ex-vizinho, da primeira chácara em que moramos, era a antítese da imagem que se faz do homem do campo. Estressado como só ele. E já morava ali há 15 anos!

Aliás, não é incomum que, engatado à frase que louva nossa “qualidade de vida”, apareça o comentário: “Bendita hora que vocês saíram daquele inferno que é São Paulo”.

Pigarro. Pigarro duplo. Pois o que me levou a deixar a metrópole nada tem a ver com estar farto dos problemas da cidade. Aconteceu de estarmos disponíveis para os movimentos do universo. Bela manhã, Mulher e eu viemos visitar uma chácara, e nossa intuição sussurrou: “Este lugar é pra vocês, e este é o momento, venham pra cá!”. Em dois meses mudamos, de mala e cuia.

Saí em paz com a metrópole, e nela voltaria a morar, caso necessário. Adoro o lufa-lufa de São Paulo. Mas também adoro as várias pausas que cultivo aqui. Movimento e repouso, essa dança me faz muito bem.

O problema básico na busca da “qualidade de vida” me parece ser a crença do indivíduo, de que um fator externo – paisagem física, silêncio, distância considerável de vizinhos etc – pode operar uma mágica em sua vida. Bobagem. E nesta crença está embutido um condicionamento nocivo: o hábito de culpar as circunstâncias externas e a paisagem física por suas frustrações. Com isso, evita-se assumir uma responsabilidade que demanda energia e empenho – mudar o que não lhe agrada, e que o faz infeliz.

Mas, da próxima vez que me deparar com o louvor à tal “qualidade de vida”, posso poupar meu visitante deste discurso verborrágico que você, paciente leitor, acaba de aturar. A ideia é sair à francesa, e colocar o CD de Gilberto Gil pra tocar baixinho, nesta faixa abaixo, cujo refrão sintetiza isso tudo.

LUIS GONZAGA FRAGOSO

Tradutor e Revisor

[email protected]

Nota da CONTI outra: A publicação do texto acima foi autorizada pelo autor.

Conheça as obras da artista inglesa que já pintou a rainha e que retrata interiores como mais ninguém

Conheça as obras da artista inglesa que já pintou a rainha e que retrata interiores como mais ninguém

Susan Ryder é uma artista inglesa internacionalmente conhecida tanto por suas pinturas de família (chegou a pintar tanto a princesa de Gales, em 1981, quando a própria rainha da Inglaterra em 1997) quanto por suas pinturas de interiores que explodem em cores e detalhes de luz e sombra.

Nessa seleção, trago uma coletânea de suas pinturas de “Interiores”.

Site oficial de Susan Ryder.

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“Só queria dizer que estou feliz”

“Só queria dizer que estou feliz”

Por Patrícia Pinheiro

Na noite de réveillon, após jantar, esperar o relógio marcar meia noite e abraçar os que me rodeavam, por morar relativamente perto da praia, decidi que seria bom ir até lá. Busquei o chinelo de dedo mais confortável que tinha e fui caminhando lentamente pela madrugada chuvosa, enquanto observava tudo o que acontecia ao meu redor: os fogos ainda explodiam no céu e uma multidão se encaminhava para o mar.

Em meio a diversas pessoas trajando branco, falando alto, bebendo e tirando fotos, notei que uma menina, com seus, no máximo, 6 anos, puxava incessantemente o vestido da mãe, na tentativa de ter a atenção que precisava para dizer-lhe algo. “Mãe, mãe!”, ela gritava, e, quando a mãe finalmente voltou os olhos para a criança e perguntou o que ela queria, veio a resposta: “Só queria dizer que estou feliz”.

Desde então, a fala daquela criança me acompanha. Será que, como ela, somos capazes de reconhecer – e, principalmente, em voz alta – os momentos de felicidade? Mas, o mais importante: sabemos que ela reside em momentos?

Acho que, nessa busca pelo “felizes para sempre”, acabamos, muitas vezes, perdendo a capacidade e sensibilidade para buscarmos e reconhecermos os momentos felizes. Ocupados construindo nossa felicidade, esquecemos que ela não é um estado a ser alcançado somente quando concluirmos nosso doutorado ou comprarmos um carro, é, sim, embriagante e passageira como o otimismo e fé que nos preenchem na noite de ano novo.

Além disso, penso no quanto é positivo para os que nos acompanham – seja por breves momentos ou por uma vida – esse pronunciamento de felicidade. Um “eu estou feliz por estar aqui contigo” é gostoso demais de se ouvir. A certeza da alegria de quem eu amo é capaz de renovar a minha.

Assim como sentimos necessidade de externalizar e compartilhar nossas tristezas, que possamos, também, estar receptíveis para todas as doses de felicidade que se encontram espalhadas por aí, sem medo de gritá-las. Naquela noite, antes de dormir, fui ao quarto da minha mãe, e disse: “Só queria dizer que estou feliz”.

Documentário “I AM” – Você tem o Poder de Mudar o mundo.

Documentário “I AM” – Você tem o Poder de Mudar o mundo.

Do diretor de O Mentiroso, O Professor Aloprado, O Todo-Poderoso e Ace Ventura: Um Detetive Diferente, chega um surpreendentemente poderoso e inspirador filme. I AM é a história de Tom Shadyac, um diretor de sucesso em Hollywood, que após um perigoso ferimento na cabeça e experimenta uma jornada para tentar descobrir e responder duas questões bem básicas: “O que está errado no mundo?” e “Que podemos fazer sobre isso?” Com uma equipe de quatro pessoas, Tom visita algumas das grandes mentes dos dias de hoje, incluindo escritores, poetas, professores líderes religiosos e cientistas (Howard Zinn, Lynn McTaggart, Desmond Tutu, Thom Harmann, Coleman Barks), buscando descobrir o fundamental problema endêmico que causa todos os outros problemas, refletindo simultaneamente em suas próprias escolhas de excesso, ambição e possível cura. E se a solução para os problemas do mundo estivesse bem na nossa frente o tempo todo?


Nota da CONTI outra: O documentário também consta no catálogo de filmes da Netflix.

Recomendamos também o documentário Eu maior.

“O corvo”: animação baseada no conto de Edgar Allan Poe (narração Guto Russel)

“O corvo”: animação baseada no conto de Edgar Allan Poe (narração Guto Russel)

The Raven (“O Corvo”) é um poema do escritor e poeta norte-americano Edgar Allan Poe. Ele foi publicado pela primeira vez em 29 de Janeiro de 1845, no New York Evening Mirror. É um poema notável por sua musicalidade, língua estilizada e atmosfera sobrenatural provenientes tanto da métrica exata, permeada de rimas internas e jogos fonéticos, quanto do talento singular de Poe, um dos maiores expoentes tanto do romantismo quanto da própria literatura americana. Neste poema, que apresenta uma temática típica do romantismo, a figura do misterioso corvo que pousa sobre o busto de Pallas (ou Atena, na maioria das traduções feitas para o português como a de Fernando Pessoa) representa a inexorabilidade da morte e seu impacto sobre o personagem, o qual, no seu papel de arquétipo correspondente às tendências da geração literária de Poe, lamenta e sofre profundamente com a perda de sua amada Leonora (Lenore, no original). No final do poema, o corvo, o qual representa, como dito acima, a inexorabilidade da morte, repousa sobre o busto de Pallas simbolizando o pesar eterno que se abateu sobre a alma do protagonista. – Wikipédia.

contioutra.com - "O corvo": animação baseada no conto de Edgar Allan Poe (narração Guto Russel)

O animação traz a interpretação do Locutor Guto Russel

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A literatura é um denominador comum da experiência humana, Mario Vargas Llosa

A literatura é um denominador comum da experiência humana,  Mario Vargas Llosa

De Mario Vargas Llosa

Do original: A importância da Literatura

Precisamos ler bons livros e incitar à leitura os que vêm depois de nós.

Em feiras de livros ou mesmo livrarias, frequentemente alguém se aproxima pedindo-me autógrafo. “É para minha mulher, filha ou mãe”, explica. “Ela adora ler!” De pronto pergunto: “E o senhor? Não gosta de ler?” E a resposta é quase sempre a mesma: “Gosto, mas sou muito ocupado.”

Já ouvi essa explicação dezenas de vezes. Esse homem – e milhares outros como ele – tem tantos afazeres importantes, tantas obrigações e responsabilidades, que não pode perder seu precioso tempo mergulhado num romance.

Segundo esse raciocínio, a literatura seria uma atividade dispensável, uma diversão que somente pessoas com muito tempo livre poderiam se permitir.

Gostaria de apresentar alguns argumentos contra a ideia da literatura como passatempo e em prol de considerá-la, além de uma das ocupações mais estimulantes e enriquecedoras do espírito humano, uma atividade insubstituível para a formação de cidadãos na sociedade moderna e democrática. Por essa razão, ela deveria ser semeada nas famílias desde a infância e fazer parte de todos os programas educacionais.

Vivemos numa era de especialização em virtude do extraordinário desenvolvimento da ciência e da tecnologia, e da conseqüente fragmentação do conhecimento em incontáveis avenidas e compartimentos.

A especialização traz benefícios. Possibilita pesquisa e experimentos, e é a força motriz do progresso. Mas também destrói os denominadores comuns culturais que permitem a coexistência, a comunicação e a solidariedade. E leva à separação dos seres humanos em guetos culturais de especialistas, confinados – pela linguagem, por códigos de conduta e pelo conhecimento particularizado – a uma especificidade contra a qual um antigo provérbio já nos advertia: não se concentre tanto na folha, a ponto de esquecer que ela é parte da árvore e esta, da floresta.

Em grande medida, a noção da existência dessa floresta depende do senso de conjunto que une a sociedade e não a deixa se desintegrar numa centena de especificidades. A ciência e a tecnologia, portanto, já não podem desempenhar esse papel unificador da cultura.

A literatura, por sua vez, foi e, enquanto existir, continuará sendo um denominador comum da experiência humana. Aqueles de nós que leram Cervantes, Shakespeare, Dante ou Tolstoi entendem uns aos outros e se sentem indivíduos da mesma espécie porque, nas obras desses escritores, aprenderam o que partilhamos com seres humanos, independentemente de posição social, geografia, situação financeira e período histórico.

Nada nos protege melhor da estupidez do preconceito, do racismo, da xenofobia, do sectarismo religioso ou político e do nacionalismo excludente do que esta verdade que sempre surge na grande literatura: todos são essencialmente iguais. Nada nos ensina melhor do que os bons romances a ver nas diferenças étnicas e culturais a riqueza do legado humano e a estimá-las como manifestação da multifacetada criatividade humana.

Ler boa literatura é ainda aprender o que e como somos – em toda a nossa humanidade, com nossas ações, nossos sonhos e nossos fantasmas -, tanto no espaço público como na privacidade de nossa consciência. Esse conhecimento se encontra apenas na literatura. Nem mesmo os outros ramos das ciências humanas – a filosofia, a história ou as artes – conseguiram preservar essa visão integradora e um discurso acessível ao leigo, pois também eles sucumbiram ao domínio da especialização.

O elo fraternal que a literatura estabelece entre os seres humanos transcende todas as barreiras temporais. A sensação de ser parte da experiência coletiva através do tempo e do espaço é a maior conquista da cultura, e nada contribui mais para renová-la a cada geração do que a literatura.

O que a literatura deu à humanidade, então?

Um de seus primeiros efeitos benéficos ocorre no plano da linguagem. Uma sociedade sem literatura escrita se exprime com menos precisão, riqueza de nuances, clareza, correção e profundidade do que a que cultivou os textos literários.

Uma humanidade sem romances seria muito parecida com uma comunidade de gagos e afásicos. Isso também vale para o indivíduo. As pessoas que nunca lê, lê pouco ou lê apenas lixo pode falar muito, mas vai sem dizer pouco, porque dispõe de um repertório mínimo de palavras para se expressar.

Não se trata de uma limitação somente verbal, mas também intelectual, uma indigência de idéias e conhecimento, porque os conceitos pelos quais assimilamos a realidade não são dissociados das palavras que nossa consciência usa para reconhecê-los e defini-los.

Nenhuma disciplina substitui a literatura na formação da linguagem. O conhecimento transmitido por manuais técnicos e tratados científicos é fundamental, mas eles não nos ensinam a nos exprimir corretamente. Ao contrário, com freqüência são mal escritos porque os autores, às vezes expoentes indiscutíveis em sua profissão, não sabem transmitir seus tesouros conceituais.

Outro motivo para se conferir à literatura um lugar de destaque na vida das nações é que, sem ela, a mente crítica – verdadeiro motor das mudanças históricas e melhor escudo da liberdade – sofreria uma perda irreparável. Porque toda boa literatura é um questionamento radical do mundo em que vivemos. Qualquer texto literário de valor transpira uma atitude rebelde, insubmissa, provocadora e inconformista.

A literatura apazígua essa insatisfação existencial apenas por um momento, mas nesse instante milagroso, nessa suspensão temporária da vida, somos diferentes: mais ricos, mais felizes, mais intensos, mais complexos e mais lúcidos. A literatura nos permite viver num mundo onde as regras inflexíveis da vida real podem ser quebradas, onde nos libertamos do cárcere do tempo e do espaço, onde podemos cometer excessos sem castigo e desfrutar de uma soberania sem limites. Como não nos sentirmos enganados depois de ler “Guerra e Paz” ou “Em Busca do Tempo Perdido” e voltar a este mundo de detalhes insignificantes, obstáculos, limitações, barreiras e proibições que nos espreitam de todo canto e em cada esquina corrompem nossas ilusões?

[quote_box_right]Nada nos protege melhor da estupidez do preconceito, do racismo, da xenofobia, do sectarismo religioso ou político e do nacionalismo excludente do que esta verdade que sempre surge na grande literatura: todos são essencialmente iguais.[/quote_box_right]

Quer dizer, a vida imaginada dos romances é melhor: mais bonita e diversa, mais compreensível e perfeita. Talvez seja esta a maior contribuição da literatura ao progresso: lembrar que o mundo é malfeito, e que poderia ser melhor, mais parecido com o que a imaginação é capaz de criar.

A sociedade livre e democrática requer cidadãos responsáveis, críticos, independentes, difíceis de manipular, em constante efervescência espiritual e cientes da necessidade de examinar continuamente o mundo em que vivemos, para tentar aproximá-lo do mundo em que gostaríamos de viver.

Sem insatisfação e rebeldia, ainda viveríamos em estado primitivo, a história teria parado, o indivíduo não teria nascido, a ciência não teria alçado vôo, os direitos humanos não teriam sido reconhecidos e a liberdade não existiria. Tudo isso nasce dos atos de desafio a uma vida que se mostra insuficiente ou intolerável. Para esse espírito que despreza a vida como ela é – e, com a insensatez de Dom Quixote, tenta tornar o sonho realidade -, a literatura serve de magnífica espora. A verdade é que o desenvolvimento da mídia audiovisual – que ao mesmo tempo que revoluciona as comunicações monopoliza cada vez mais o tempo que dedicamos ao lazer, relegando a leitura a segundo plano – permite-nos imaginar para um futuro próximo uma sociedade moderníssima, repleta de computadores, telas e microfones, mas sem livros.

Temo que esse mundo cibernético seja profundamente incivilizado, sem espírito, apático – uma resignada humanidade de robôs.

Evidentemente , é muito improvável que essa terrível perspectiva venha algum dia a se concretizar. Não existe um destino que decida por nós o que vamos ser. Depende de nosso discernimento e de nossa vontade que essa utopia macabra se realize ou se apague.

Se queremos evitar o desaparecimento dos romances – ou sua restrição ao sótão dos objetos inúteis – e com isso o desaparecimento da própria fonte que estimula a imaginação e a insatisfação, que refina nossa sensibilidade e nos ensina a falar com eloquência e precisão, que nos torna livres e nos garante uma vida mais rica e intensa, então devemos agir. Precisamos ler bons livros e incitar à leitura os que vêm depois de nós.

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Pablo Neruda: poema XX

Pablo Neruda: poema XX

POEMA 20

Pablo Neruda

Vinte poemas de amor e uma canção desesperada

Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Escrever por exemplo:
A noite está fria e tiritam, azuis, os astros à distância
Gira o vento da noite pelo céu e canta
Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Eu a quiz e por vezes ela também me quiz
Em noites como esta, apertei-a em meus braços
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito
Ela me quiz e as vezes eu também a queria
Como não ter amado seus grandes olhos fixos ?
Posso escrever os versos mais lindos esta noite
Pensar que não a tenho
Sentir que já a perdi
Ouvir a noite imensa mais profunda sem ela
E cai o verso na alma como orvalho no trigo
Que importa se não pode o meu amor guardá-la ?
A noite está estrelada e ela não está comigo
Isso é tudo
A distância alguém canta. A distância
Minha alma se exaspera por havê-la perdido
Para tê-la mais perto meu olhar a procura
Meu coração procura-a, ela não está comigo
A mesma noite faz brancas as mesmas árvores
Já não somos os mesmos que antes havíamos sido
Já não a quero, é certo
Porém quanto a queria !
A minha voz no vento ia tocar-lhe o ouvido
De outro. será de outro
Como antes de meus beijos
Sua voz, seu corpo claro, seus olhos infinitos
Já não a quero, é certo,
Porém talvez a queira
Ah ! é tão curto o amor, tão demorado o olvido
Porque em noites como esta
Eu a apertei em meus braços,
Minha alma se exaspera por havê-la perdido
Mesmo que seja a última esta dor que me causa
E estes versos os últimos que eu lhe tenha escrito.
(Pablo Neruda)

Fonte: Arabe

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