Popular é o mito de Narciso, que de tão apaixonado consigo, ao admirar-se no lago, tornou-se uma flor. Dos antigos gregos aos dias de hoje, o narcisismo configurou-se em uma expressão comum, quase banalizada, e tão banalizado talvez, o ato de ser narcisista. As interpretações equívocas sobre a autovalorização acabam por alimentar atitudes pouco assertivas, defensivas e incoerentes, daqueles que temem ser desvalorizados em relação aos outros. O julgamento precipitado é uma das consequências dessa ideologia de amor próprio que se dissemina sem a devida reflexão, levando, neste casos, apenas à hostilidade com todos que não sejam a si mesmo ou que não atendam às expectativas dos “senhores do lago”.
Das mais infelizes reminiscências dessa paixão descomedida que alguns alimentam por si, estão as projeções alienadas dos próprios defeitos nos outros. Não raro munidos de “psicanálise de revista”, tais indivíduos tendem a analisar as pessoas, a examiná-las como se fossem uma peça em exposição, para decidir pela aquisição ou não do que se apresenta. Inconscientes ou não da sua postura de objetificação do outro, impossibilitados de munir-se de fato do autoconhecimento com todas as suas durezas – aquele que nos revela os nossos mais estapafúrdios defeitos – projetam no sujeito objetificado de sua apreciação as suas incertezas, os seus medos, suas inseguranças e falhas. Logo, o outro admirado transforma-se em objeto de deterioração.
É como se Narciso, ao olhar-se no lago, se desse conta de uma qualquer imperfeição – ignorada até então, tão distraído pelos seus encanto consigo. E então, atribuísse essa visão aterrorizante do defeituoso, do grotesco, dos distorcido, ao lago, condenando-o pela visão indesejada de suas falhas. É como os que culpam o espelho pela sua expressão carrancuda em vez de reconhecer o efeito de suas dores e amarguras sobre o seu corpo. É como aqueles que nos culpam por não admitirem que aquilo que nos apontam, na realidade, não passa de uma carapuça sob medida, feita especialmente para si, e não para quem pretendem condenar.
É como a pessoa que comete estupro e culpa a vítima por usar roupas indecentes. É como o ladrão que culpa o lesado por exibir seus pertences em público. É como o político corrupto que atribui sua falta de ética à alienação da população. Em meio a tudo isso, temos atitudes menos condenáveis; banais maus tratos cotidianos se justificam assim, como tanto do que é visto e sentenciado efusivamente quando exibido nos mios de comunicação. Mas quando somos nós estes narcisos invertidos, quando, por ventura, desolados e arrependidos, pelo lago que turvo e minguado já não nos oferece nem um borrão de reflexão, esperamos apenas por condescendência, por compreensão.
Enquanto lagos enturvecidos, resta-nos engolir a carapuça que não nos serve, afoga-la, enterra-la por redemoinhos junto às areias lamacentas e às algas lodosas. Sepulta-la bem fundo, esquecida, deteriorando-se, alimentando a terra, até que volte a ser terra, já que é à terra que tudo retorna. E de retorno em retorno, depois de algum tempo, é certo que o nosso brilho também torna.
Quando olhas para o humano que há por trás do jaleco do profissional da saúde o que vês? És capaz de enxergar nele o potencial para a cura? Percebes sua capacidade de empatia? Consegues detectar seu grau de conhecimento? Assim… só de olhar para ele… quantas coisas passam pela sua mente? Quantas crenças? Quantos julgamentos? Mas, será que quando olhas bem a fundo e bem de perto és capaz de enxergar suas dores, que muitas vezes nem mesmo ele sabe que carrega no jaleco?
Antes de dedicar-me apenas a Psicologia Clínica no consultório me especializei e trabalhei na área hospitalar. Por onde passei conheci pessoas espetaculares, de uma humanindade à flor da pele, de conhecimento e dedicação profunda a tudo o que faziam. Mas, também conheci outros profissionais que um tanto me intrigavam. Estes pareciam indiferentes a qualquer tipo de sentimento alheio e, por vezes, até aos seus próprios. Permaneciam automatizados em suas funções, encapsulados nas couraças de seus papéis de especialistas. Alguns tinham técnica aperfeiçoada, mas faltavam-lhes a destreza para perceber os detalhes, detectar sinais e responder empaticamente às relações com pacientes, familiares e equipe. Outros tratavam todos do mesmo jeito, convertiam pacientes em números, leitos, enfemidades e partes do corpo. Pareciam insensíveis a dor e ao desespero.
Esse último grupo me chamou tanto a atenção que me propus a investigar o que realmente acontecia. O que poderia haver por trás do que se manifestava na forma de sintomas e comportamentos tão opostos ao que se espera de uma pessoa que se dispõe a cuidar do outro?
Para desvendar esse mistério precisei ir para além dos rótulos com os quais muitos de nós também acabamos etiquetando esses profissionais. Não podia considerá-los de antemão culpados, más pessoas, irresponsáveis, frios, insensíveis e charlatões. Carecia compreender do que falavam seus sintomas, assim como a febre nos avisa da infecção.
Foi então que encontrei na descrição dos sintomas da Síndrome de Burnout muitos dos comportamentos que relatei anteriormente. Além da exaustão emocional e da baixa satisfação e envolvimento com o trabalho, uma característica do quadro é a Despersonalização. Esta é marcada pelo desenvolvimento de uma insensibilidade emocional, sendo que o profissional passa a tratar seus clientes e colegas de trabalho como objetos e de forma fria, impessoal e massificada. Há uma intensa negação da subjetividade (do outro e si próprio) e uma diminuição dos contatos pessoais para evitar a angústia.
Mas, o que leva um profissional de ajuda a desenvolver um quadro assim? E porque tantas pessoas desenvolvem os mesmos sintomas e passam pelo mesmo processo?
Existem diversos fatores desencadeantes, que vão da qualidade do ensino e formação do profissional até as caracteristicas do local em que trabalha. Mas, parece que uma delas é essencial: a falta de tempo e preparo que os profissionais da saúde possuem para cuidar da carga emocional inerente às relações interpessoais que desenvolvem com pacientes, familiares e equipe.
Saímos da faculdade imbuídos de uma grande expectativa de ajudar as pessoas e colocar em prática todos os conhecimentos adquiridos durante a formação. Porém, poucos de nós saímos prontos para lidar com os aspectos subjetivos do cuidado e de como eles nos afetarão ao longo dos anos. Desejamos curar, reabilitar, salvar vidas, testemunhar finais felizes. E, com isso, não nos desenvolvemos para lidar com os sentimentos que aflorarão diante dos erros profissionais, das perdas, dos lutos e dos fracassos. E, muitas vezes, também não nos preparamos nem mesmo para o nosso próprio adoecer e para estarmos no lugar de paciente.
As pesquisas mostram que a população mais afetada pela Síndrome de Burnout é justamente a com menos tempo de formação e com idade até 30 anos. Neste período ainda estamos envoltos na idealização profissional, não sabemos reconhecer os próprios limites, temos muitas inseguranças e nos faltam recursos internos para o enfrentamento das inúmeras situações de crises que iremos presenciar.
Mas, a relação profissional-paciente não espera que estejamos 100% prontos para nos chamar para a ação. Somos encarregados do cuidado de outros seres humanos fragilizados e de alguma maneira vamos criando defesas para lidar com o custo emocional que envolve cada caso.
E, à cada situação de crise vamos lidando com a dor através das ferramentas que se encontram disponíveis no momento: negamos, nos distanciamos, deslocamos para outros relacionamentos, agimos agressivamente no trânsito, excedemos na bebida, extravasamos na vida, nos congelamos emocionalmente para evitar mais angústia e assim por diante. Mas, em algum momento, a corda que permanece em pura tensão arrebenta e, as dores que estavam camufladas no jaleco transbordam e nossa vulnerabilidade se torna aparente.
Neste momento não há mais o que negar! Estamos adoecidos! Será preciso mudar a postura, se colocar do outro lado da cena, no lugar de paciente e buscar um caminho para a própria cura.
Mas, será possível evitar tal desfecho? Há outro modo de lidar com toda essa dinâmica que parece tão cristalizada em nossa sociedade, em que a dor não tem espaço para elaboração em qualquer canto e muito menos para àqueles que são chamados cuidadores?
Como Psicoterapeuta de abordagem Junguiana gosto de recorrer aos mitos para ver como eles podem nos ajudar a entender simbolicamente as questões da vida. E neste caso há um que nos é capaz de auxiliar a refletir sobre a questão. Trata-se do Mito do Curador-Ferido:
Fruto da união de Apolo com Corônis, Esculápio foi abandonado no monte Títion logo após seu nascimento, onde foi amamentado por cabras e protegido por um cão. Ali foi encontrado por um pastor de cabras e, neste momento, é profetizado que o menino encontraria a cura para todas as doenças e ressuscitaria os mortos. Em outra versão, a mãe de Esculápio comete adultério e é descoberta por Apolo que a mata. Arrependido, Apolo faz uma incisão cesárea em Corônis fazendo nascer Esculápio. Depois disso, o menino é entregue a Chíron ou Quíron para ser educado.
Sob a tutela de Quíron, Esculápio se familiarizou com as plantas e seus poderes curativos, tornando-se um grande curador, chegando ao ponto de conseguir ressuscitar pessoas. Tal fato irritou o deus do mundo dos mortos, Hades, uma vez que as pessoas não morriam e não iam para o seu mundo. Assim, Hades solicitou uma atitude de Zeus, que acabou punindo Esculápio, matando-o fulminado com um raio.
A história de Esculápio traz à tona a questão do poder e da inflação na prática terapêutica. Detentor de um conhecimento específico (ressuscitar os mortos), Esculápio deixa de respeitar as próprias leis da vida, o que acaba despertando a ira dos deuses e causando sua morte.
Muitas vezes, os profissionais da saúde acabam agindo assim. Mobilizados por suas expectativas, por sentimentos de onipotência e auto exigência, e alimentados racionalmente pelo arcabouço de conhecimentos adquiridos, esquecem-se de respeitar aspectos vitais e, por vezes, a própria realidade. Podemos encontrar essa atitude, por exemplo, nos casos de obstinação terapêutica, distanasia, abusos de poder, etc., muitos discutidos nas práticas de saúde atualmente.
No lado positivo do mito de Esculápio, temos a forma como se davam as curas. Nestes casos, a pessoa doente era levada a um templo, o “àbaton” onde ficava aguardando ter um sonho de cura, em que o próprio deus aparecia e intervinha tocando no local doente ou informando como a pessoa deveria proceder para que a cura ocorresse. Muitas vezes, o deus era manifestado por uma serpente, símbolo da capacidade de renovação dado a possibilidade da mesma de trocar sua pele, o que significaria liberta-se da doença e dar lugar a um novo indivíduo. Assim, a cura não ocorria pela intervenção de um médico humano, mas de um médico divino e interior que se manifestava por meio de mecanismos vindos do inconsciente e simbolizados pelo doente no momento em que este se encontrava incubado no templo.
Neste caso, podemos pensar que o paciente tem um papel ativo e importante no seu processo de cura e que precisa compreender qual as mudanças que precisa realizar em sua vida para restabelecer sua saúde. É o que na prática chamamos de processo de conscientização e adesão ao tratamento.
Representando outro aspecto do processo curativo, Quíron era um centauro conhecido por dominar a arte da cura. Um deus grego que combina um aspecto animal e um aspecto humano, trazendo consigo o lado instintivo e o lado racional. Metade homem, metade cavalo, Quíron era portador de uma ferida incurável, provocada por uma flecha envenenada recebida acidentalmente de Hércules. Assim, o deus que promove a cura é também o portador do sofrimento e da doença eterna.
A figura mítica de Quíron nos ensina que aquele que é capaz de promover a cura é também o detentor de uma ferida que é eternamente presente. Isto é, todo curador é também um ferido! E tal observação serve-nos de base para restaurarmos nossa humanidade enquanto cuidadores.
Cada encontro, cada luto, cada perda, cada frustração… desperta no profissional de ajuda sentimentos que precisam encontrar espaço para a elaboração. Estar atento à presença de suas próprias mazelas, sofrimentos e dores é que faz com que o profissional da saúde se conscientize de que cada encontro com os pacientes que cuida lhe toca na alma e o mobiliza emocionalmente.
E assim, ele pode restaurar a empatia que é tão essencial numa relação de cuidado. Desfazer-se das couraças e proteções que criou para se proteger não só da dor do outro, mas das suas próprias chagas. Este é o grande trabalho a se realizar. Pois, aprendendo o caminho para a própria cura e cuidado, o profissional da saúde se torna muito mais apto para compreender, avaliar e auxiliar àqueles que cuida no seu próprio processo de transformação.
Cabe à nossa sociedade cuidar também de quem cuida! Humanizar suas feridas e reconhecer seus sintomas como um quadro que merece tanta atenção quanto o de qualquer outro paciente. Colocar os julgamentos de lado e olhar para o profissional que se encontra dentro do jaleco e para suas histórias, suas dores e necessidades de ajuda e de atenção. Reconhecer que todas as pontas da unidade de cuidado (paciente, família e equipe) são essenciais para que se trilhe o caminho de saúde e bem-estar que tanto almejamos quando nos vemos em uma situação de fragilidade. As mudanças precisam começar no ensino e na formação, mas precisam continuar fora dos muros das universidades e dos hospitais, ou seja, dentro de nossas próprias casas e corações.
Dificuldades enfrentadas até os seis anos de idade, como doença na família, separação dos pais, mudança de bairro, entre outras, estão relacionadas à internalização de sintomas de depressão e ansiedade que geram alterações na massa cinzenta no fim da adolescência (dos 18 aos 21 anos). Esta conclusão foi publicada em um estudo divulgado no jornal científico JAMA Pediatrics, que analisou um grupo de 494 garotos e suas mães de 1991 a 2010.
“Devemos lembrar que se trata de uma escala de estresse. É normal ter um pouco de estresse na infância, o que medimos é um acúmulo de vários fatores estressantes”, afirmou ao UOL a coordenadora do estudo e pesquisadora do King’s College, em Londres, Sarah Jensen.
“Problemas de internalização, como depressão, estão extremamente ligados a eventos que aconteceram no início da vida”, explica. A equipe usou como referência 37 tipos de estresse, desde os citados acima até a violência física e emocional contra as crianças e contra as mães.
Segundo os autores, o estudo é importante porque mostra que é possível prevenir diversos problemas, em vez de achar que depressão e ansiedade são causados apenas pela genética. “A descoberta de que as experiências da infância podem afetar o cérebro mostra que a primeira infância não é só um período de vulnerabilidade, mas também de oportunidade”, conclui. “Intervenções contra a adversidade podem ajudar a prevenir que crianças internalizem sintomas e as proteger contra o desenvolvimento anormal do cérebro.”
As mães também apresentaram níveis de internalização de sintomas (depressão e/ou ansiedade) quando os garotos tinham 7, 10 e 13 anos. Os dados foram coletados por meio de imagens de ressonância magnética.
Criança chora enquanto caminha na varanda do jardim de uma escola que abriga pessoas desalojadas pelos ataques aéreos no Iemên liderados pela Arábia Saudita, na capital do país Sana. A foto é de agosto de 2015
Sarah e Edward Barker, outro autor do estudo, explicam que existem duas maneiras de reagir à adversidades, uma é a internalização de sintomas, que é o caso da pesquisa, e a externalização, que se reflete no comportamento das pessoas. A equipe observou três partes do córtex associadas à internalização de sintomas. “A ideia é que algumas partes do cérebro que eram associadas com a internalização de sintomas na verdade estão associadas à adversidade”, diz Barker.
Nas crianças que internalizaram sintomas de depressão e ansiedade, o giro frontal superior apresentou um volume inferior de massa cinzenta. “Isso vai de encontro com estudos anteriores que mostram que regiões frontais do cérebro estão implicadas na depressão”, diz Sarah.
Em relação ao volume do precuneus (região do lobo parietal), houve uma surpresa. Existe uma associação positiva entre adversidades e aumento de volume. “Normalmente, o estresse tem um efeito tóxico sobre o cérebro e a massa cinzenta é menor, mas neste caso, foi maior. Pode ser uma proteção, uma compensação, ou quer dizer que algum nível de estresse tenha um efeito positivo nesta área, mas não sabemos ao certo”, explica Sarah. Essa região já havia sido associada a experiências adversas como maus tratos.
O estudo foi feito apenas com meninos por ter sido feito juntamente com outra pesquisa que observou apenas crianças do sexo masculino. A coordenadora avalia que trata-se de uma limitação e que seria interessante repeti-lo com meninas também.
Em 30 de janeiro de 2014, aconteceu no TEDxJardins- Sao Paulo, Brasil a palestra de Helder Kamei que separamos para nossos leitores.
Helder Kamei
Pesquisador e professor de Psicologia Positiva.
Psicólogo, mestre em Psicologia Social e do Trabalho pela USP, pesquisador em Ciências do Bem-Estar e Relações na Natura, professor de Psicologia Positiva no programa de MBA em Desenvolvimento do Potencial Humano na Franklin Covey Business School. É autor do blog www.flowpsicologiapositiva.com. Desde 2006 dedica-se ao estudo de temas da Psicologia Positiva, tais como: felicidade, bem-estar, flow (estado de fluxo), motivação, engajamento, emoções positivas, forças e virtudes do caráter, sentido de vida e desenvolvimento do potencial humano.
Depois de uma noite mal dormida, toda a gente não gosta de nós. O sono ido levou consigo qualquer coisa que nos tornava humanos. Há uma irritação latente connosco, parece, no mesmo ar inorgânico que nos cerca. Somos nós, afinal, que nos desapoiámos, e é entre nós que se fere a diplomacia da batalha surda.
Tenho hoje arrastado pela rua os pés e o grande cansaço. Tenho a alma reduzida a uma meada atada, e o que sou e fui, que sou eu, esqueceu-se de seu nome. Se tenho amanhã, não sei senão que não dormi, e a confusão de vários intervalos põe grandes silêncios na minha fala interna.
Ah, grandes parques dos outros, jardins usuais para tantos, maravilhosas áleas dos que nunca me conhecerão! Estagno entre vigílias, como quem nunca ousou ser supérfluo, e o que medito estremunha-se com um sonho ao fim.
Sou uma casa viúva, claustral de si mesma, assombrada de espectros tímidos e furtivos. Estou sempre no quarto ao lado, ou estão eles, e há grandes ruídos de árvores em meu torno. Divago e encontro; encontro porque divago. Meus dias de criança vestidos vós mesmos de bibe!
E, em meio de tudo isto, vou pela rua fora, dorminhoco da minha vagabundagem folha. Qualquer vento lento me varreu do solo, e erro, como um fim de crepúsculo, entre os acontecimentos da paisagem. Pesam-me as pálpebras nos pés arrastados. Quisera dormir porque ando. Tenho a boca fechada como se fosse para os beiços se pegarem. Naufrago o meu deambular.
Sim, não dormi, mas estou mais certo assim, quando nunca dormi nem durmo. Sou eu verdadeiramente nesta eternidade casual e simbólica do estado de meia-alma em que me iludo. Uma ou outra pessoa olha-me como se me conhecesse e me estranhasse. Sinto que os olhos também (…) com órbitas sentidas sob pálpebras que as roçam, e não quero saber de haver mundo.
Tenho sono, muito sono, todo o sono!
“REFLEXÕES SOBRE A ARTE DE VIVER” [TRECHO]
Por Joseph Campbell
Se você quer um título universitário para compensar um complexo de inferioridade, abra mão do complexo, pois ele é algo artificial.
Quando você cursa uma universidade, não faz aquilo que você quer fazer. Você descobre o que o professor quer que você faça para receber o diploma e faz isto. Se você quer o título para dar aulas, o ideal é fazer o curso da maneira mais rápida e fácil. Tendo recebido o diploma, aí você expande a sua educação.
Recebi uma bolsa de estudos na Europa, e fui cursar a Universidade de Paris. Estava dedicando-me ao francês e ao provençal medievais e à poesia dos trovadores. Quando cheguei à Europa, descobri a Arte Moderna: James Joyce, Picasso, Mondrian – toda aquela turma. Paris, em 1927-1928, era outra coisa. Depois, fui à Alemanha, comecei a estudar Sânscrito e me envolvi com o hinduismo. Depois Jung enquanto estudava na Alemanha. Tudo estava se abrindo – deste lado, daquele lado. Bem, a minha dúvida na época foi: “Devo voltar para aquela garrafa?” Meu interesse pelo romance celta se fora.
Fui à universidade e disse: “Olha, não quero voltar para aquela garrafa”. Tinha feito todas as matérias necessárias para o título; só precisava redigir a maldita tese. Não me deixavam ir para outro lugar e dar prosseguimento aos estudos, e por isto eu disse, vão para o inferno. Mudei-me para o campo e passei cinco anos lendo. Nunca tirei meu Ph.D. Aprendi a viver com absolutamente nada. Estava livre e não tinha responsabilidades. Foi maravilhoso.
É preciso coragem para fazer aquilo que você deseja.
Outras pessoas têm um monte de planos para você.
Ninguém quer que você faça o que você quer fazer.
Eles querem que você embarque na viagem deles, mas você pode fazer o que quiser.
Eu fiz isto. Fui para o mato e li durante cinco anos.
Foi entre 1929 e 1934, cinco anos. Fui para uma pequena cabana em Woodstock, Nova York, e mergulhei. Tudo que fazia era ler, ler, ler, e tomar notas. Foi na época da Grande Depressão. Eu não tinha dinheiro, mas havia uma importante distribuidora de livros em Nova York chamada Stechert – Hafner, e eu escrevia e pedia livros para eles – os livros de Frobenius eram caros – e eles me mandavam alguns exemplares, e eu não pagava. Era assim que as pessoas agiam durante a Depressão. Eles esperaram até eu conseguir um emprego, e então eu os paguei. Foi um gesto muito nobre. Fiquei realmente grato por eles.
Li Joyce, e Mann e Spengler. Spengler fala de Nietzsche. Vou a Nietzsche. Então, descubro que não se pode ler Nietzche sem ter lido Schopenhauer, e por isso vou a Schopenhauer. Descubro que não se pode ler Schopenhauer sem ter lido Kant. Então, vou a Kant.- bem, concordo, você pode começar daqui, mas é bem difícil. Depois Goethe.
Era excitante ver que Joyce estava na verdade, lidando com o mesmo material. Ele nunca menciona o nome de Schopenhauer, mas posso provar que esse foi uma figura importante na forma como Joyce construiu seu sistema.
Depois leio Jung e vejo que a estrutura de seu pensamento é basicamente a mesma de Spengler, e fico reunindo todo este material.
Não sei como passei esses cinco anos, mas estava convencido de que ainda sobreviveria a mais alguns. Lembro-me de uma ocasião em que tinha uma nota de um dólar na gaveta de uma cômoda, e eu sabia que enquanto ela estivesse ali, eu ainda contaria com meus recursos. Foi bárbaro. Eu não tinha responsabilidade, nenhuma. Era excitante – escrever meus comentários no diário, tentar descobrir o que eu queria. Ainda tenho tudo isto. Quando leio esse material hoje, não consigo acreditar. Na verdade, houve momentos em que quase pensei – quase pensei – “Caramba, gostaria que alguém me dissesse o que eu tenho de fazer”, algo assim Ser livre, implica tomar decisões, e cada decisão é uma decisão que altera o destino. É muito difícil encontrar alguma coisa no mundo exterior que se ajuste ao que o sistema dentro de você tanto anseia. Hoje, sinto que tive uma vida perfeita: aquilo de que precisava apareceu justamente quando eu precisava. Na época, eu precisava viver sem emprego durante cinco anos. Isso foi fundamental.
Como diz Schopenhauer, quando você analisa sua vida em retrospecto, tem a impressão de que seguiu um enredo, mas, no momento da ação, parece o caos: uma surpresa atrás da outra. Depois, mais tarde, você vê que foi perfeito. E tem uma teoria: se você estiver seguindo seu próprio caminho, as coisas virão até você. Como é seu próprio caminho, e ninguém o percorreu antes, não existe um precedente; logo, tudo que acontece é uma surpresa, e na hora certa.
Trecho do livro”Reflexões sobre a Arte de Viver” publicado pelo site Terra Místicae reproduzido pelo blogDharmalog.
Como é que você sabe se os seus pais idosos sofrem da doença de Alzheimer ou de outras demências? Se eles se esquecem onde colocam as chaves de casa ou se confundem os dias da semana? Isso não é suficiente, existem outros sinais de aviso que podem ser determinantes na descoberta da doença. Conheça 10 sinais de aviso da doença de Alzheimer e de demência e observe-os com a máxima atenção.
A demência e a doença de Alzheimer são desordens que afetam o correto funcionamento do cérebro e provocam uma deterioração lenta e progressiva de diversas funções do conhecimento. Os médicos são as únicas pessoas que conseguem diagnosticar estas perturbações, mas os cuidadores podem exercer um papel muito importante ao detetar os sinais de aviso principais. Dos mais importantes, destacam-se os 10 seguintes:
1. Esquecimento e perda de memória
Dos vários sintomas que a doença de Alzheimer apresenta, um dos mais comuns é a perda de memória. No entanto, se a pessoa idosa não se recordar onde colocou os seus sapatos, isso não quer dizer que sofra de Alzheimer ou de demência. Qualquer pessoa pode, por vezes, esquecer os detalhes de uma conversa, isso faz parte do processo natural de envelhecimento. Porém, o que não é normal, é esquecer-se de uma conversa inteira quando ela teve lugar há momentos atrás. A doença de Alzheimer e a demência são perturbações que afetam, em primeiro lugar, a memória de curto prazo, o que significa que a pessoa afetada se esquece de toda a informação recente que aprendeu. Por outro lado, também existe uma enorme dificuldade em fixar datas, aniversários ou outros eventos importantes. As pessoas afetadas estão constantemente a fazer as mesmas perguntas e, muitas vezes, esquecem por completo os rostos dos amigos e dos familiares mais próximos.
2. Falta de concentração e confusão
Ficar confuso sobre os tempos e os lugares é um sinal de demência e da doença de Alzheimer. Geralmente, as pessoas afetadas têm muitas dificuldades de concentração e demoram mais tempo a tomar medidas e decisões. Como consequência dessa situação, esquecem-se frequentemente do local onde se encontram e de como lá foram parar. Têm muitas dificuldades em perceber e distinguir um evento passado de um presente ou de um futuro, pois não conseguem ter a noção e a consciência do espaço e do tempo em que vivem.
3. Perder as coisas e trocar-lhes o lugar
Uma pessoa que sofre deste tipo de desordens pode colocar as coisas em locais incomuns. Por exemplo, pôr as chaves de casa fora do seu local habitual pode acontecer a qualquer um, mas colocá-las no interior do forno na cozinha pode ser um dos sintomas da doença de Alzheimer. Um paciente com demência ou Alzheimer pode perder um objeto e ser incapaz de refazer os passos dados para o tentar encontrar. Também é muito comum acusarem outras pessoas de roubo quando determinados objetos estão perdidos ou fora do seu local habitual.
4. Dificuldade em realizar tarefas familiares
Uma pessoa que sofre de demência ou da doença de Alzheimer tem muitas dificuldades na realização das tarefas mais básicas do dia-a-dia, como cuidar da sua higiene pessoal, saber que roupa vestir ou que alimentação seguir. As pessoas podem ter problemas em lembrar-se de como conduzir um automóvel, como cozinhar o seu prato favorito ou como jogar às cartas. Podem começar a confiar mais no cônjuge ou num membro da família para fazer as coisas por eles.
5. Problemas de fala e de linguagem
A repetição frequente de palavras, frases, perguntas ou atividades é uma característica da demência e da doença de Alzheimer. Uma pessoa que sofre destas perturbações tem muita dificuldade em se lembrar do nome correto das coisas e da maneira como elas são apelidadas. Por exemplo, é normal utilizarem expressões como “aquelas coisas de ver” quando se querem referir aos óculos ou “aquilo que dá música” quando falam do rádio.
6. A não resolução de exercícios simples de matemática
Quando as pessoas estão num estágio inicial de demência e da doença de Alzheimer podem ter muitas dificuldades em trabalhar com números e não conseguem resolver exercícios simples de matemática. Podem existir muitos problemas na realização de operações bancárias e no pagamento de contas e de prestações. Além da matemática, a doença de Alzheimer também pode agravar os problemas de visão de uma pessoa, nomeadamente a perceção de profundidade e de distância e a nitidez das cores.
7. Incapacidade de julgar corretamente
Uma pessoa que sofre de demência ou da doença de Alzheimer tem tendência a tomar decisões menos racionais. No entanto, isso não significa que uma pessoa que tenha seguido determinadas opções erradas sofra necessariamente destas perturbações. A incapacidade de julgar corretamente é visível quando alguém ponderado começa a decidir de uma forma mais impetuosa e radical. Por norma, as primeiras mudanças que ocorrem no julgamento de uma pessoa estão relacionadas com a má gestão das suas próprias finanças.
8. Mudanças de personalidade e de humor
As pessoas que sofrem da doença de Alzheimer ou de demência podem apresentar mudanças repentinas de personalidade e fortes alterações de humor. Podem ficar com medo, desconfiadas, deprimidas, medrosas e até ansiosas. Uma pessoa autoconfiante pode tornar-se hesitante e tímida e rejeitar qualquer tipo de interação social. Elas podem ficar aborrecidas ao sair de casa, pois sentem-se fora da sua zona de conforto.
9. Alterações na higiene pessoal e na limpeza da casa
A súbita falta de atenção para a higiene pessoal e o descuido nas limpezas gerais da casa podem ser um dos sinais de aviso mais evidentes da doença de Alzheimer ou de demência. Todos os pacientes que sofrem destas desordens têm tendência para serem desleixados com a sua aparência e higiene, e esquecem-se, na maioria das vezes, de escovar os dentes, cortar as unhas, tomar banho e até utilizar a casa de banho/banheiro para a realização das suas necessidades. As atividades de limpeza de uma casa também ficam comprometidas, uma vez que não existe qualquer tipo de interesse na sua realização.
10. O afastar-se de amigos ou de familiares próximos
De uma forma geral, as pessoas esquecem-se e afastam-se de amigos ou familiares próximos e de todo o tipo de atividades que faziam em conjunto. Mais do que chamar a atenção para as falhas de memória ou para as dificuldades de comunicação, as pessoas afetadas evitam qualquer tipo de interação e convívio social. Elas ficam embaraçadas e constrangidas quando estão na presença de outras pessoas, especialmente quando têm de comunicar ou realizar algum tipo de tarefa social. Este é um dos sinais de aviso de uma depressão que conduz à solidão e ao afastamento da vida social.
A doença de Alzheimer e a demência só são diagnosticadas quando o relatório médico determinar que existem duas ou mais funções do cérebro afetadas como, por exemplo, a memória e a capacidade de comunicação. Contudo, se detetar que a pessoa que está a seu cargo apresenta algum dos sinais de aviso apresentados, é preciso contactar o seu médico de família imediatamente para fazer um exame mais detalhado.
Sofrimento, problemas familiares e financeiros, traumas e até desemprego são fatores que podem desencadear a depressão. No entanto, sentir-se deprimido não se restringe apenas a esses fatos. Há uma série de outros motivos que podem desencadear o quadro e são pouco conhecidos. Confira cada um e fique atento:
1. Mudanças no clima
Muitas pessoas são afetadas por mudanças de clima, principalmente quando há mudanças drásticas na estação, como entre o verão e o inverno. As pessoas demoram para se adaptar à nova estação. De acordo com Alfred Lewy, Professor Doutor de Psiquiatria da Oregon Health and Science University, em Portland, o nosso corpo pode encontrar dificuldades para se ajustar e o motivo pode ser a um desequilíbrio químico no cérebro e na produção do hormônio melatonina.
2. Uso de cigarro
Já sabemos o quão prejudicial o cigarro é para nossa saúde. Ele traz uma série de problemas graves e contribui e muito para a depressão. Como suas substâncias alteram a química do cérebro, o fumante sente as mudanças constantes de humor. Então, não caia nessa armadilha. Por que muitos acabam se viciando quando estão em quadro depressivo, e na verdade o cigarro por si só leva você a desenvolver depressão, pois altera o controle do seu cérebro sobre as emoções, tornando-o vulnerável.
3. Problemas na glândula tireoide
Essa glândula localizada na região do pescoço é responsável entre outras coisas por regular os níveis de serotonina no corpo. Quando o hormônio não é produzido corretamente, desenvolve-se o hipertireoidismo. Se você sentir um desses sintomas, sensibilidade ao frio, constipação e fadiga, juntamente com depressão, deve então procurar um endocrinologista e fazer os exames necessários.
4. Dormir pouco
O cérebro precisa descansar e seu corpo repor as energias. É durante o sono que o cérebro repõe suas células e se isso não acontece, o cérebro não funciona bem e sua irritabilidade aumenta, levando ao risco de depressão.
5. Overdose de Facebook e outras redes sociais
Estudos já sugerem que passar muito tempo na internet está associado a depressão. Geralmente são pessoas que têm dificuldade para relacionar-se e preferem uma interação virtual ao invés de uma interação na vida real. Essas pessoas apresentam quadro depressivo de moderado a grave. Nenhum estudo chegou ainda a uma conclusão, mas podemos notar que pessoas deprimidas são mais propensas a se fecharam no mundo virtual.
6. O final de um filme ou programa de TV
Emily Moyer-Gusé, PhD, Professora Assistente de Comunicação na Ohio State University, em Columbus, afirmou que as pessoas se envolvem nas histórias a tal ponto que se esquecem de sua realidade. E esse envolvimento intenso pode torná-las depressivas quando percebem que a vida real não é como no mundo ficcional que elas acompanharam.
7. O local onde você mora
É comprovado que pessoas que moram na zona urbana são mais propensas a desenvolverem transtornos psicóticos, ao contrário daquelas que vivem na zona rural. E isso porque nosso cérebro fica mais ativo quando moramos nas cidades, na parte que regula o stress. E além dessa questão, quadros depressivos variam entre países e estados. E também a altitude influencia muito, com riscos altos quando o assunto é homicídio.
8. Perfeccionismo
Entrar num supermercado e ao se deparar com uma grande oferta de opções de um mesmo produto pode parecer uma tarefa fácil. É fácil se você consegue definir o que realmente atende suas necessidades. Mas, para algumas pessoas, isso torna-se um grande desafio e demanda uma sobrecarga, e pode deixar o cérebro exausto ao tentar buscar o melhor item. Pessoas perfeccionistas apresentam quadros comportamentais que podem levar ao estresse.
9. A falta de peixe na alimentação
Nosso corpo precisa de ômega-3. Os ácidos graxos regulam neurotransmissores como a serotonina. A falta de peixe no organismo pode estar associada ao aumento de risco de depressão. Um estudo finlandês, em 2004, revelou que mulheres que consumiam menos peixe apresentaram quadros depressivos.
10. O relacionamento entre irmãos
Todo relacionamento infeliz pode tornar-se um causador de depressão. No entanto, estudos mostram que a relação entre irmãos pode influenciar o desenvolvimento de depressão na vida adulta. Quando os irmãos não constroem uma boa relação na infância e adolescência, os adultos tendem a desenvolver depressão antes dos 50 anos.
11. Pílulas anticoncepcionais
Nenhum estudo chegou a uma conclusão ainda. Mas, é fato que essas pílulas apresentam efeitos secundários. Algumas mulheres apresentam depressão ao fazerem uso de pílulas enquanto outras não. É preciso avaliar bem os efeitos no organismo e se houver alterações, optar por um contraceptivo que não apresente uso de hormônios, como o diafragma.
12. Medicamentos
Há uma série de medicamentos que apresentam entre seus efeitos colaterais, a depressão. Alguns podem levar até a pensamentos suicidas. Então sempre confira na bula do medicamento as reações que ele pode ocasionar no seu organismo e consulte seu médico sobre os riscos.
A depressão é algo para ser levado a sério. Quando se está deprimido é indicado procurar ajuda de um profissional que conseguirá orientar a melhor forma de tratamento. Em tempos de grande correria e no qual o estresse tem sido um companheiro diário de muitas pessoas, precisamos ficar atentos, para que o cansaço e estresse não se tornem uma doença incapacitante como a depressão.
Segundo Jiddu Krisnhamurti – um dos maiores filósofos e pensadores do século 20 – uma pessoa que está próxima de um despertar da consciência, experimenta alguns desses sintomas.
O blog Yogui.co inspirou-se em seres especiais que são conhecidos por inspirar milhões de pessoas ao longo da história e ilustrou os “sintomas” com suas fotos numa justa homanagem.
#1 – Uma tendência crescente de deixar as coisas acontecerem ao invés de tentar controlá-las;
Jiddu Krisnhamurti
#2 – Ataques frequentes de alegria, sorrisos sem explicação e explosões de risos a qualquer momento;
Chico Xavier
#3 – Sensações de estar intimamente conectado aos outros e à natureza;
Chico Mendes
#4 – Episódios frequentes de apreciação e admiração das coisas simples;
Leon Tólstoi
#5 – Uma tendência de pensar e agir espontaneamente com amor, no lugar do medo baseado na experiência passada;
Amma
#6 – Uma nítida habilidade de viver cada momento;
Dalai Lama
#7 – Uma perda da habilidade de se preocupar;
Nisargadatta Maharaj
#8 – Uma perda do desejo por conflito;
Ghandi
#9 – Uma perda de interesse por tomar as coisas como pessoais;
Nelson Mandela
#10 – Uma perda de apetite em julgar o outro;
Yogananda
#11 – Uma perda de interesse em julgar a si mesmo;
Sri Ramana Maharshi
#12 – Uma inclinação em dar sem esperar nada em troca.”
Pensamentos estranhos, atitudes incomuns… mas ainda assim é você.
Pode ter sido um sonho bom, um pesadelo terrível, o jantar que não caiu bem, ou simplesmente, você amanheceu diferente. Não outra pessoa, mas uma versão sua até então desconhecida.
Hoje eu amanheci assim. Acordei no horário certo, sabia o que tinha para fazer, estava tudo organizado mas… resolvi fazer diferente, ou melhor, não fiz nada.
-Gente, essa não sou eu. O que está acontecendo?
Incrível como a gente se espanta com a espontaneidade. Perdemos o costume quando somos espontâneos. Assustamos e nos assustamos.
Mas, voltando aos dias diferentes, quem nunca acordou com uma vontade irresistível de arrumar uma mala e sair no mundo? Quem nunca se vestiu diferente do jeito habitual, trocou o café da manhã por um pastel com caldo de cana, chegou tarde no trabalho porque sentou no banco do parque e fez nada por meia hora? Quem nunca acordou diferente, fez tudo diferente, pensou diferente e enxergou a vida de modo diferente? Isso é pura mágica!
Como se ao abrir os olhos, enxergasse de primeira uma placa dizendo: Lamentamos, mas hoje você não pode ser a mesma pessoa de sempre!
E gente se assusta, mas deveria aproveitar. Certamente é uma chance e tanto de se reinventar, se variar, se experimentar fora do quadrado habitual.
Tão bom sentir que brotam ideias e ações diferentes das que estamos acostumados a selecionar dos arquivos rotineiros! Tão gostosa a sensação de novas sensações, gostos, preferências… Talvez sejamos assim todos os dias, talvez uma vez ou outra, mas tem dias em que isso é tão gritante que por pouco não vira lenda: O dia em que eu acordei diferente.
De repente é alguma variação energética, não entendo muito disso, mas também não ouso duvidar. E ninguém pode negar que existem aqueles dias em que a gente se sente na onda verde, tudo fluindo, sem contrariedades, portas se abrindo, os mais difíceis até sorrindo! Ai de nós se não soubermos aproveitar!
Como tenho mania de comparar, diria que os dias diferentes são aquelas estradas impecáveis, de paisagem perfeita e nenhum trânsito para empatar.
Diferente dos dias comuns, onde nos atropelamos e ficamos por muito tempo estacionados e engarrafados na própria rotina.
Se amanhã você amanhecer diferente, não ouse não desfrutar!
O pai, a um segundo de se despedir do filho e voltar correndo ao trabalho como todos os dias, escuta o apelo de seu pequeno como uma revelação. De olhar seu menino ali, os joelhos no chão, os olhinhos úmidos rastreando espaços sob a mesa em busca de um pedaço de seu brinquedo de plástico chinês, o homem estremece sobre as pernas.
De repente, nada mais faz sentido. As crises econômicas, a violência urbana, as guerras civis, a ameaça da inflação, as taxas de juros. Nada pode ser mais importante que resgatar a rodinha perdida. Parem o mundo! Chamem a SWAT, o Serviço Secreto, a Legião Estrangeira. Tem um carrinho quebrado paralisando o trânsito da vida.
Um minuto antes, o menino acelerava seu veículo voador sobre a terra grandiosa dos homens, saltava abismos intransponíveis, flutuava sobre estradas infinitas e amansava a velocidade dolorosa do universo até fazê-lo girar em câmera lenta, preenchendo de sonho o vazio concreto do mundo. Agora, tudo se reduz à frustração da perda e à procura objetiva do que se perdeu.
O pai abandona seus afazeres práticos e mergulha na busca implacável ao lado de seu filho. Arrasta o sofá, levanta cadeiras, se enfia sob a mesa. Sem um único sinal da roda extraviada. Então, submerso em sua expedição doméstica, pensa em contar ao pequeno sobre as tantas coisas que ele ainda haverá de perder. Porque, como todos os seres que caminham sobre a terra, seu menino também há de deixar muito mais coisas do que será capaz de lembrar. Ali, farejando como um cão de caça o assoalho da casa, o pai se perde em uma corrente violenta de pensamentos sobre quanta coisa já perdeu por aí.
Desde seus primeiros brinquedos desaparecidos na terra do quintal e as figurinhas engolidas pelos vãos do sofá, ele relembra suas perdas da vida inteira. Pensa em cada lugar esquecido, revisita planos abandonados, acena para amores passados, desculpa-se com amigos preteridos. E outra vez se dá conta de que, muito mais do que seus ganhos poucos, um homem se constrói a partir de suas tantas perdas.
Perde tempo e perde a chance. Perde a força, a saúde, a sanidade. Perde a vergonha, os ímpetos e os pudores. Perde o dinheiro, a paciência, o caminho de volta para casa, perde a conta, a vez, a linha e o fio da meada. Perde o jeito, a mão e a classe. Companheiros e parentes. Perde peso e perde amores. Perde, enfim, as rodas de seus carrinhos pela vida.
Ali, ao lado do filho, o homem se dá conta de que só não perdeu uma única coisa: o medo que o acompanha desde sempre. Ele tem medo. Como tantas outras vezes, o homem tem muito medo de perder barato o que lhe é mais caro.
Então, o menino interrompe sua busca sem mais o quê.
“Papai, tudo bem. Eu perdi a roda do meu carrinho pra sempre.”
Pronto. O filho aprendeu a lição. O pai já pode voltar ao trabalho. O trânsito da vida retoma seu fluxo.
Essa noite, cada um em sua cama, pai e filho vão perder o sono pensando na aventura da tarde, pouco antes de reencontrá-lo entre um canto e outro da casa. Depois vão dormir profundos, pesados como dois cargueiros descendo o oceano, até perder a hora de acordar na manhã seguinte. Assim eles caminham pela vida. Perdendo, ganhando.
E um dia, daqui a muitos anos, quando um e outro já tiverem concluído seus caminhos por aqui, um arqueólogo haverá de achar, nos escombros de uma antiga construção, a pequena roda de um carrinho de brinquedo. Girando a relíquia entre os dedos, ele anotará em sua caderneta do futuro que, em alguma hora distante, ali terá existido o que os antigos chamavam de lar. Um canto suspenso do mundo onde um filho brincava de carrinho na companhia de seu pai sem jeito.
O arqueólogo será um homem de visões generosas, e das folhagens alaranjadas de sua imaginação há de saltar a figura de um menino lindo e feliz em seu carro voador. Fazendo o som do motor com a boca, o pequeno piloto acelera sobre a terra grandiosa dos homens, salta abismos intransponíveis, flutua sobre estradas sinuosas e amansa a velocidade dolorosa do universo até fazê-lo girar em câmera lenta, preenchendo de sonho o vazio concreto do mundo, sob o olhar dolorido de um pai cheio de pressa, de amor e de medo de perder barato o que lhe é mais caro.
‘Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje.’
Acho engraçado como esta frase geralmente possui uma conotação prática, comercial, protocolar. Ela parece significar: não deixe para amanhã o trabalho extra que você pode fazer hoje, a caixa cheia de e-mails que você pode responder, a ligação chata, o treino na academia, a visita ao salão de beleza, a aula de alemão, as contas a pagar, as burocracias e papeladas, a lista de compras, o sapato para a festa, a cerveja rápida no fim do dia, as mensagens no whatsApp, a foto no Instagram. Não deixe para amanhã as atividades que cabem neste dia, muitas vezes elas entram espremidas – num intervalo de almoço, numa sobreposição com outra tarefa – mas cabem. Nos tornamos maratonistas, quase sem fôlego, com tempo para tudo, mesmo que seja um tempinho curto e sem qualidade, mas com tempo para tudo o que devemos fazer, e muitas vezes sem tempo para o que poderia ser chamado de ‘nós mesmos’ ou ‘o que realmente importa’.
As milhares de atividades, que insistimos em não deixar para amanhã, consomem o nosso tempo por inteiro.
Mas para mim existe nesta frase ‘não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje’ uma ideia totalmente diferente. A ideia de que a vida é hoje, de que o tempo é curto, de que não quero gastar meus dias correndo, provando para mim mesma ou para o mundo que dou conta de fazer um monte de tarefas, se eu tenho em minhas mãos a possibilidade de escolha. E até certo ponto eu posso sim escolher o que eu posso fazer hoje e o que não quero deixar para amanhã. É como disse Rubem Alves ‘(…) é preciso escolher. Porque o tempo foge. Não há tempo para tudo (…). É necessário aprender a arte de ‘abrir mão’ – a fim de nos dedicarmos àquilo que é essencial.’
Eu sei que posso deixar para amanhã a conta que não vence hoje, as compras que vão entulhar ainda mais o meu guarda-roupa, as mensagens bobas de um grupo do whatsapp, a irritação de um e-mail pouco importante. Mas não posso deixar para amanhã um poema que me surge quando perco (ganho!) 10 minutos olhando para uma árvore da janela. Não posso deixar para amanhã a conversa por telefone com minha mãe, a leitura de um livro, a vontade de um sorriso. Não dá para deixar para amanhã um sonho, um amigo que precisa de apoio, um texto bem escrito, uma refeição bem feita. Não posso deixar para amanhã o que quero que a vida seja, hoje!
Eu não deixo para amanhã o que eu posso SER hoje. Na medida do meu possível, hoje eu abro mão de atividades não essenciais, de bagagens pesadas, de encontros superficiais. Hoje eu abro mão de tudo que preenche essa minha curta existência neste mundo com coisas que não acrescentam e que me fazem estagnar. Hoje eu lapido meus dias e limpo minhas horas.
Sinto assim, como disse o poeta Mario Quintana:
‘Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio. Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas. (…)’. Pois ‘a única falta que teremos será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará’.
Então, espero que nossas vidas sejam compostas de ‘hojes’ repletos de coisas essenciais e ‘amanhãs’ (que nunca chegam) guardando as sobras inúteis dos dias.
E que não deixemos para amanhã o que podemos fazer A VIDA ser hoje.
Inúmeras vezes vemo-nos expostos a situações limítrofes na vida as quais revelam facetas de nossa alma que jamais suspeitávamos possuir. A rejeição é um poderoso combustível inflamável; primeiro incendeia; depois, transforma tudo em cinzas, frias e mortas. Frias?! Mortas?! Nem sempre. A rejeição pode provocar o surgimento de alguém que sobreviveu às cinzas e age por conta própria, à revelia da nossa lógica. A rejeição é a ressaca moral da traição. A traição é o golpe pelas costas no que há de mais nobre em qualquer relação, a confiança.
Quando nos envolvemos amorosamente, é inevitável que projetemos nessa pessoa o nosso ideal romântico. No momento em que nos interessamos por alguém, é porque algo naquela pessoa veio ao encontro de nossas expectativas e necessidades emocionais, sejam elas conscientes ou não. No período inicial de um relacionamento, ocorre uma espécie de encantamento. Como num truque de mágica, nossos olhos ganham um misterioso e invisível equipamento que nos impede de enxergar no outro qualquer traço de imperfeição ou fraqueza. Caso isso não fosse verdade, a maioria dos relacionamentos amorosos não passaria do primeiro encontro.
Ocorre que o aparato genial não dura muito tempo. No decorrer da relação, nossa visão apaixonada vai voltando a adquirir a antiga capacidade de ver. E, diante de nossos perplexos olhos, vai se descortinando um ser desconhecido. Aquela aura aventureira que nos atraiu no início, agora parece mais com um comportamento infantil e irresponsável. Aquele jeito irresistível de “animalzinho sem dono” que derreteu nosso coração, agora soa apelativo e lamurioso, revela uma pessoa frágil e dependente. Aquela capacidade de atrair a atenção de todos sem fazer esforço, que nos pareceu tão sedutora, agora nos magoa; parece que estamos sempre em segundo plano. Sim, somos todos nós seres muito estranhos!
Até que ponto, fazemos escolhas racionais quando se trata de nossa vida amorosa? Difícil saber. A verdade é que fica muito evidente que apaixonar-se não tem nada de racional. É um acontecimento físico, químico e biológico que dispensa a participação da razão. Manda o bom senso dar uma volta e se joga!
O fato é que, algumas pessoas ao experimentarem a inebriante experiência da paixão, ousam dar um próximo passo na estrada das relações amorosas e se dispõem a compartilhar alguns momentos, espaços e vivências de suas individuais existências com o outro. Assim nasce um casal; cheio de expectativas, projeções, sonhos, borboletas no estômago, projetos e desejos concretos. Os casais iniciantes veem coisas que nem existem. Coincidências, sincronismos, planejamentos dos astros. Alguns se arriscam a dizer que encontraram sua “alma gêmea”. Mas, afinal, por que diabos alguém iria ser feliz com sua alma gêmea?! Por definição, alma gêmea é uma coisa recortada; é a outra metade de nós. Acontece que nós não somos metades. Somos inteiros. E inteiros procuramos nos encaixar com outro ser inteiro. Nós sonhamos que o outro seja metade e o outro sonha que nós sejamos metade. Ou seja, esperamos que o outro abra mão de metade dele para que a nossa metade possa caber. É uma loucura! É um absurdo! Mas, fazemos isso o tempo todo.
O mito do amor perfeito é auto-explicativo: é um mito! O alvo do amor perfeito é visto, de forma consciente ou não, como o principal responsável pela satisfação dos nossos desejos e necessidades mais íntimos. Sonhamos com um parceiro que seja quase um vidente, uma pitonisa que tem o poder de adivinhar nossos anseios e sonhos mais secretos. E corremos o risco de passarmos a tratar o alvo de nosso afeto como algo descartável, caso não corresponda às nossas projeções.
No mito do amor romântico, só há espaço para o sofrimento no início do encontro, na fase da conquista. Na sua continuidade, só pode haver beleza, felicidade e contemplação dos desejos. A expressão “felizes para sempre” encerra a história; desconsiderando que, é a partir daquele momento que virão os desafios da relação. A idealização da felicidade a dois, ignora o empenho de ambos para continuar a ser inteiro, e não metade, e a partir disso dispor-se a acolher o outro sem aglutiná-lo, anular seus desejos ou moldá-lo à sua imagem e semelhança. O processo humano na busca pelo amor é doloroso, requer abrir mão da fantasia, tirar o outro do altar e descer do pedestal.
A vida nos mostra que as transformações mágicas não acontecem. Abóboras não se transformam em carruagens. O outro não se transforma naquilo que idealizamos como par ideal. O outro é quem ele é. Com suas imperfeições e áreas fascinantes, com seus medos e coragens, com suas mazelas e virtudes. O tempo é que vai tirando o brilho do que era fascinante e colocando luz de holofote nas imperfeições. À medida que o outro não corresponde ao nosso ideal, ficamos magoados e amargos. O pior é que, muito provavelmente, o nosso viço também pode ter se perdido no tempo aos olhos do outro.
E é nesse limiar do desencontro que já foi encontro que corremos o enorme risco de jogar fora a maior virtude que podemos oferecer e esperar de um parceiro: a lealdade. Em nosso precário senso de justiça, nos sentimos ludibriados pela fantasia que não se realizou. Vamos deixando a nossa história virar passado quando ela ainda é presente. Queremos de novo a emoção. Queremos sentir outra vez a expectativa de encontrar o amor perfeito. Abrimos a guarda e fechamos os olhos para o que é ético. Nossa satisfação precisa ser contemplada acima de tudo, afinal! É nesse cenário que, muitas vezes, acabamos embarcando numa outra história e acreditando em um novo “felizes para sempre”, sem nos lembrarmos de avisar ao outro que ele não é mais o personagem principal.
Aquele que trai, nunca vai ser capaz de mensurar a dor daquele que foi traído. A traição é a saída fácil para o mito do amor perfeito que não se concretizou. É uma escolha covarde, desonesta e vil. O fim de uma relação não pode acontecer aprisionada numa cela fria, úmida e mal cheirosa como essa. O fim de uma relação merece a presença inteira de duas pessoas que um dia ousaram viver uma experiência de amor. Não éramos metades antes, não somos metades agora. E, precisamos estar inteiros para compreendermos que não somos perfeitos. Somos seres possíveis à procura de outros seres possíveis, que estejam dispostos a se aventurar pela vida conosco na difícil missão de construir uma relação verdadeira.