Escutar a risada de quem você ama é uma sensação maravilhosa

Escutar a risada de quem você ama é uma sensação maravilhosa

Por Raquel Brito

Escutar a risada de quem amamos é uma sensação maravilhosa que nos enche de prazer, de alegria e de satisfação. Quem não conhece essa sensação que nos faz ficar abobalhados olhando nossos seres queridos apreciando o momento?

Quem nunca pensou: “Que falta lhe fazia um instante de alegria”? Em nosso rosto existem rugas que são criadas para armazenar nelas o mistério da beleza do tempo e as alegrias que vivemos durante anos.

Sorrisos e bons momentos que marcam os cantos do lábios e pregam nossos olhos, nos limpam a visão e nos inundam de um bem-estar nobre e sereno. Aí onde repousam nossos sorrisos se percebe o quão ilimitada é nossa capacidade de sentir, de aceitar e de aproveitar nossas emoções.

Se vamos criar rugas, que seja de tanto dar risada

Quando valorizamos o presente devemos ter em mente que ele é constituído a partir das sementes que plantamos no passado. Por isso não podemos voltar no calendário, e é importante transformar o momento presente numa boa base para o futuro.

Por isso, visto que não podemos viver em plenitude sem tomar cuidado e aproveitar diariamente,somos responsáveis por lidar com as guerras que surgem e contrapor sentimentos e emoções positivas que nos permitem administrar os momento difíceis.

Neste sentido, o importante não é tanto adicionar anos à vida, mas sim vida aos anos. Sentir a felicidade daqueles que amamos é bonito justamente por isso, pois implica encher nossa mochila emocional de alívio, de bons momentos e de liberação.

Quando alguém sorri seu coração deixa de murchar

Depois de momentos de fatalidade emocional uma boa gargalhada desbota o mal-estar e desbloqueia o caminho para a prosperidade. Dessa sensação de placidez mental própria pela felicidade alheia surgem nossas endorfinas, potentes catalisadores dos bons sentimentos.

Rir e sentir que os outros também podem fazê-lo são atos que funcionam como verdadeiro oxigênio psicológico para nosso cérebro. Porque a vida depois de uma boa risada assume outra cor, deixando a mente mais clara e com menos bloqueios.

O estresse desaparece por alguns instantes e as dores são menos intensas quando maquiamos nossa vida com alegria. Conseguimos neutralizar o efeito dos nossos hormônios do estresse (por exemplo, o cortisol) e reduzimos nossos sentimentos e pensamentos negativos desnecessários que nos impedem de seguir em frente.

TEXTO ORIGINAL DE A MENTE É MARAVILHOSA

Quem precisa de segunda chance é porque não deu valor na primeira…

Quem precisa de segunda chance é porque não deu valor na primeira…
Sunrise silouettes of two inlove young people

Vamos aos fatos: você já vivenciou ou conhece alguém que precisou de segundas, terceiras e quartas chances para provar que não merecia nem a primeira.

O ser humano tem dentro de si um poder de recuperação muito forte e, em nome disso, prefere a dor à renúncia. O medo de escutar da consciência “você deveria ter tentado” faz com que pessoas sensatas percam sua sabedoria em segundos e desperdiçam seu tempo, sua saúde e sua paciência em relacionamentos fracassados.

Certa vez li um texto de Caio Fernando Abreu que me fez refletir por anos : “Não existem segundas chances, porque nada volta a ser como era antes. Depois que algo é quebrado sempre vão existir marcas que vão provar que algo esteve errado. Não existem segundas chances quando um coração é magoado. Não existem outras oportunidades para algo que se deixou passar.” E é bem assim mesmo!

Acredito que deva existir relacionamentos que tenham dado certo na segunda vez e que, essas histórias, serviriam de roteiros para filmes de sessão da tarde, mas o preço pago para voltar a ter confiança, é muito alto.

Quando começamos um relacionamento é porque depositamos no outro uma confiança plena. Abrimos nossa vida, nossa alma e nosso melhor para quem julgávamos merecer. Quando esse relacionamento termina, é porque um dos dois não estava inteiro na relação. E o que te faz acreditar que depois de terminar, ficaria? Isso é uma questão de lógica. Dar valor depois que perde é para amadores, adultos gostam de profissionais, que dão valor na primeira e fazem tudo acontecer de verdade.

Olhem para o tempo: não resta muito. E perder tempo com quem já errou uma, duas ou três vezes é assinar um termo de anulação dos próprios sentimentos e de incapacidade para administrar a própria vida. É sofrer até se convencer de que o seu valor não está nas mãos do outro e que, que quando te deixam partir, é porque você não era a primeira opção. Perdoar é uma coisa. Ficar em um relacionamento menos estável que um ioiô é outra.

Entenda que pessoas que, realmente, mereceriam segundas chances nunca a usam. Elas valorizam a primeira…

Aos que não precisam mais de mim

Aos que não precisam mais de mim

Dia desses, enquanto eu andava pela cidade, pela primeira vez em minha vida eu não me senti velha. Não me sentia senhora de nada, nem de ninguém. Não devia respeito ou satisfação. Parei no meio do caos de pessoas surfando suas vidas no passeio, rendendo-me aos tropeços de quem passava e sentia pressa. Entreguei-me ao vazio do céu urbano ferido por edifícios. Parei. E, pela primeira vez, não pedi desculpas, mesmo obstruindo o transito de passantes e pedintes apressados ou entristecidos. Pela primeira vez me senti senhora de mim.

Libertei meu corpo que vivia aprisionado na cozinha, no quarto, na sala de jantar – dos cômodos esvaziados com os anos. Da solidão fedida da pele cedendo. Dos anos perdidos nos sonhos de família. Descobri que cada ano meu tinha 365 dias especiais, não só natal e réveillon, não só celebrações de casamentos e nascimentos. Lembrei-me das pérolas guardadas na caixinha de música da mocidade, dizia Horácio em nosso primeiro encontro que eu era mais linda que elas. Corri para casa, arrebentei o cordão, lancei-as ao espaço. Eram lindas, mais lindas do que eu jamais fui! Mais me valeu o deleite de vê-las quicar pelo chão do que as palavras do amante amortecidas pela realidade do tempo.

Tão logo entrei pela porta e concluí o meu primeiro ato de revolta, saí novamente. Fui à loja de construções. Pintei as paredes de cor-de-rosa, como sempre quis. Veloz como um menino, como uma menina levada, pervertendo as memórias indesejadas. Desejando. Convidei trabalhadores a desmontarem os quartos intocáveis. Troquei os móveis. Fiz mil planos para o futuro breve que me aguarda, mesmo que nesta fase da vida, a morte esteja sempre a porta.

Mas hoje, eu posso sonhar. Como nunca pude enquanto ficava entre prover, alimentar, cuidar, levar, buscar, suportar. Aquela doce vida de dona de casa que eu aprendi a amar ainda na juventude.

Vocês sabem, eu fui de bom grado ao casamento, sem amor, deixando-o nas páginas marcadas dos livros, escondidos, que me levavam noite adentro por universos pecaminosos, enquanto Horácio explicitava seus pecados pelas noitadas afora. Quando um choro rompia do berço, eu fingia que era meu, assim podia conter minhas lágrimas emprestadas nas suas. Minha febre alugada pelas suas viroses. Minha cólera embutida nas suas dores. Eu na carruagem da vida, vocês minhas amadas rodas, Horácio guiando os cavalos, até que, cada um para seu lado, eu fiquei só e perdida, observando a decomposição da madeira curtida, até não poder mais suportar as picadas dos cupins que infestavam a lembrança apodrecida.

Divorciada aos 55, eu que sonhava em completar as bodas de ouro… Não via sentido. Foi revolta o que me tomou, bile amarga insuportável chata, dessas que nos transformam em cobra e destilam veneno em cada palavra. Não pedirei perdão por sofrer amargamente após perder toda a minha juventude cultivando algo que não era nada para ninguém a não ser para mim. Sei que não fiquei solitária pelos caprichos poucos dos anos que sobrevieram à separação: quantos vejo que cuidaram, dedicaram, abrandaram as fogueiras até esgotarem suas últimas forças e agora estão abandonados em suas doenças, em suas loucuras, em suas jaulas solitárias de velhice. A nós, a ninguém, não deveria jamais ser privada a vida.

Agradeço, no entanto, o abandono que me libertou. Podem dizer que estou sendo dramática, e estou, agora eu posso ser o que quero ser e não preciso mais ser o melhor do que me ensinaram que eu deveria ser. Sem minhas rodas ou guia eu ando e sinto o chão. Sem grandes expectativas já não me importo com os rumos do caminho. Não sei até aonde vou ou até quando poderei ir. Mas sei que meu coração ganhou nova vida, quando ao me olhar no espelho, em vez de ver a opacidade do que em mim se foi, eu via a vitalidade do que em mim nasceu. Das fissuras desenhadas na pele do meu rosto e do meu corpo nasceram sementes, brotaram mudas prontas para crescer no mundo.

Já não tenho nenhuma responsabilidade que me prenda, já não tenho nenhuma moral que me pode. Podo-me das folhas adoecidas, das raízes moribundas, expulso as pragas e o peso morto. Cultivo a terra das minhas experiências com o adubo do amor, aquele que eu pensei que havia perdido nas páginas dos livros, mas que encontrei quando me olhei no espelho, olhei bem fundo nos olhos, e vi um brilho tímido, que nunca saiu pela porta, que nunca se permitiu libertar diante de todo o pudor que me cercou desde o primeiro choro – aposto que até ao nascer eu fui discreta. Até eu perceber que eu era, o que só aconteceu há tão pouco.

Vocês me criticam agora, dizendo que eu estou velha para isso. Mesmo que a Horácio não dirijam palavra alguma que questionem sua vida de “jovem guarda”. Eu sofria calada e quase desisti. Mas eu vi que o meu corpo já não pertencia à sala, aos quartos, à cozinha ou ao jardim. Meu corpo jardim, meu quarto, nutre todo o alimento que preciso, faz sala à vida que chega. Meu corpo inteiro: meu! Eu aprendi: com a terapeuta mesma que vocês indicaram. E hoje dou gargalhadas ao receber pedradas daqueles de quem limpei a bunda branca suja de merda e lhes troquei a frauda sempre pontual, e mostrei-me tão boa e correta, conforme o bom e o correto que aprendi que assim o eram, que acreditaram muito mesmo nisso como verdade única.

Não entenderam que era por vocês. Apenas por vocês. Não era o que eu era. Se devo pedir perdão por algum erro é por ter sido tão boa e tão boba, é por ter me esforçado tanto em ser “completa” que pequei no zelo de afeto e de trato, sem me atentar à falta que fazia a falta. Aquela falta que faria com que vocês entendessem que a mamãe é mulher. Mas nem por isso perdão eu peço, pois Horácio nisso não me ajudava e eu não era obrigada a descobrir sozinha tão depressa. E se o fizesse, talvez, hoje fossem vocês cheios de estigmas, carregados das marcas das pedras alheias.

Eu vou seguindo meu fluxo, meu caminho. Não pretendo terminar minha vida ensaiando posar para o caixão. Acostumem-se com isso. O meu casamento é só o início. Mas, tragam caretas ou sorrisos, é com amor e carinho que as paredes cor-de-rosa os esperam para o papo e para o vinho. Aos solteiros, saibam, ainda jogarei um belo buquê.

Eu insisto que venham, eu insisto que se descontruam. Sabem por quê? Vocês, meus anjinhos, sempre serão bebês em meu coração. Só que demonstraram tão bem, inclusive pelo sumiço, que não precisam mais de mãe, que a mãe se foi pelo precipício. Se ainda houver tempo, quem sabe, poderemos ser mais, ser mais do que mãe e filhos: poderemos ser amigos.

Nós, os hipersensíveis

Nós, os hipersensíveis

Sentimentos exacerbados, dores amplificadas, mente borbulhante, angústia com o que não lhe diz respeito, intuição aguçada, espontaneidade inocente. Talvez você também seja um hipersensível.

Para um hipersensível, diagnosticar-se como tal é algo muito importante. Na verdade, um divisor de águas. Enfim, começamos a nos entender. Não somos exagerados, mimados ou dramáticos, como quase nos fizeram acreditar. Somos dotados de uma característica peculiar e determinante, a qual, por não podermos abrir mão, é necessário que aprendamos a manejar da melhor forma possível.

Mesmo com o passar do tempo, é difícil chegarmos a uma conclusão exata de quanto da hipersensibilidade é “defeito” (negativo) e do quanto é “qualidade” (positivo). Mas, é o que nos adjetiva, nos compõe, nos impulsiona. É, de nós, inerente, irretocável e intransferível. Resta-nos aceitá-la.

Em razão da sensibilidade exacerbada, a dor, para nós, é – de fato – muito mais intensa. Tanto a física, quanto a emocional. A recuperação de uma cirurgia é muito mais penosa e demorada, por exemplo. Os exercícios físicos nos desgastam mais que aos demais. Alguns procedimentos estéticos são um tanto doloridos para nós. Uma gripe tem o poder de nos incapacitar. Entendemos, então, que não podemos servir de parâmetro para muita coisa.

Os sentimentos, da mesma forma, são elevados ao cubo. Efetivamente, uma “brincadeira-verdade” pode nos fazer sentir muito mal. Indiferenças nos entristecem bastante. Grosserias nos destroem. Outrossim, Barulhos excessivos afetam bastante os que sentem demais. Podemos ficar desconcertados com músicas muito altas, máquinas trabalhando ou pessoas gritando.

Muitas coisas que podem não ter grande relevância para a maioria das pessoas, para nós são essenciais, e seria interessante que os que conosco convivem soubessem medir as palavras usadas, lembrar datas marcantes, atentar ao tom de voz, evitar “zoadas-inocentes”, repetir declarações, evitar estressores desnecessários.

Evitamos conflitos ao máximo. Não apenas os que nos envolvem, mas qualquer conflito. Presenciar uma agressão entre estranhos, por exemplo, pode nos fazer sentir muito mal, mesmo. Sentimos os golpes quase como se fossem dados em nós.
Inclusive, qualquer espécie de constrangimento, para nós, reflete-se de forma exacerbada. Presenciar uma pessoa sendo colocada numa saia justa, ou sendo xingada, exemplificamente, nos deixa desconfortáveis também. Os evitamos, então, a todo custo.

Presenciar injustiças nos faz estremecer. Podemos não ter nenhuma relação com a situação, mas não conseguimos nos manter neutros. Se, por alguma razão, não nos envolvermos – de fato – no ocorrido, certamente ficaremos com aquilo “matutando” por tempos dentro do nosso ser.

Empatia também é uma palavra que nos define. Moradores de rua, crianças carentes e pessoas doentes nos fazem murchar. Ver um animalzinho morrer pode acabar com o nosso dia. Até mesmo as tristes e violentas histórias passadas cotidianamente nos noticiários nos fazem muito mal. Melhor manter distância.

O sofrimento alheio nos atinge diretamente. Faz doer nosso coração. Queremos ajudar a todos que vemos necessitar. Não entendemos como podemos viver leve e alegremente em um mundo onde muitos estão passando por grandes dificuldades, das mais diversas ordens. Nossa compaixão, desta forma, é imensa. Às vezes, pode até nos causar transtornos.

Temos a vantagem, por outro lado, de ficarmos bem quando sozinhos. Na verdade, um pouco de solidão é essencial para um hipersensível. Precisamos acalmar a mente, colocar a casa em ordem, dar uma aliviada. O silêncio, nesse ponto, é fundamental.

Expressamos nossos sentimentos com mais facilidade do que os demais. Se estamos tristes ou emocionados, chorar não é problema. Aliás, choramos bastante, às vezes até sem saber exatamente por quê. Talvez, excesso de informação (que nos embaralha, diga-se de passagem). É um alívio, enfim. Uma forma de extravasar o que não cabe mais dentro de nós.

Contudo, também rimos sem fazer cerimônia. Quando algo é engraçado, divertido ou excitante, ora, não vemos porque reprimir nosso sentimento. Somos espontâneos. Nos envolvemos e nos empolgamos com facilidade. Às vezes passamos por inocentes demais.

Também somos intuitivos e, não raro, captamos emoções e sensações dos ambientes. Sentimos quando não somos bem vindos, quando a situação é forçada, quando a intenção não é tão boa assim. Deveriam dar mais crédito aos nossos insights.

Um dos pontos negativos, outrossim, é não esquecermos tão fácil as coisas. Temos uma boa memória. Lembramos por tempos humilhações, desfeitas, indelicadezas, desconsiderações. Não que as fiquemos remoendo, mas, em algum momento, sua ocorrência será recordada (ainda que não necessariamente manifestada).

Somos pensadores profundos. Nossa mente, efetivamente, borbulha (ainda que saibamos que isso nos consome). Procuramos explicações, soluções, inovações. O comportamento humano nos fascina. A dinâmica da vida – e da morte -, igualmente. Vivemos tentando entender o mundo. Buscar o sentido das coisas. Encontrarmo-nos. Conhecermo-nos. Desenvolvermo-nos.

Apreciamos as sutilezas. Um céu estrelado. Um toque leve na nossa mão. Um aroma que surge inesperadamente no ar. Um por do sol multicolorido. Um som que toca o nosso coração. Um poema que parece nos traduzir. Um olhar que nos desnuda. Tudo isso nos fascina.

É trabalhoso. É sofrível. É, muitas vezes, exaustivo. Mas é gostoso. É encantador. Na verdade, essencial. Não saberíamos viver de outra forma, com outra intensidade. Nosso tom é esse. A hipersensibilidade.

Não me intimide, não me assedie! Seja você quem ou o que for!

Não me intimide, não me assedie! Seja você quem ou o que for!

Seja por autoridade, por excesso de intimidade, seja por pura maldade ou somente por vaidade… Não me imprense na parede, nas suas neuroses, carências e crenças.

Eu sou livre por natureza, submeto-me somente a mim e, acredite, foram inúmeras as vezes que eu mesma me intimidei. Me intimidei quando tentei agradar sem ser natural, me coagi quando me coloquei em lugares e situações que não desejava, me violentei quando aceitei regras e condições das quais discordava.

E o caminho para reparar e recolocar a vida no lugar é pedregoso, escorregadio. Nesse tabuleiro, a gente anda quatro casas e antes de comemorar, volta duas.

Portanto, não me ameace! Não imponha condições, não me chantageie, não apele para a pena nem para a admiração teatral. Não me force a não ser espontânea.

Não me constranja exigindo escolhas que não tenho intenção de fazer.
Não me culpe nem me responsabilize por eventuais decepções.
Não me assedie com padrões e formatos.
Não me amedronte, não apele para nenhum tipo de covardia…

Lidar com as questões pessoais já é pressão suficiente para qualquer um, e nem todos os dias são iguais; nem sempre estamos dispostos a matar leões, enfrentar depressões, sufocar reações.

Portanto, nem por um minuto me intimide. Não perca seu tempo tentando me acuar, seja você uma pessoa amada, uma amizade considerada, uma parceria de trabalho, um familiar mais autoritário, um sonho acalentado, uma ambição descontrolada.

Não me empurre contra o nada, não me tire da estrada, não seja você a embaralhar as peças do meu jogo.

Assédio, só o da vida me intimando a não recuar!

Os padrões aprisionam a nossa verdadeira beleza

Os padrões aprisionam a nossa verdadeira beleza

Você não precisa de pernas finas, barriga chapada, cabelo liso e pele perfeita. Você precisa de amor próprio e felicidade.

O que você precisa é se olhar no espelho e gostar do que vê, mesmo sem precisar vestir um 36 porque a garota do instagram postou uma foto nova com a cintura desenhada. Você não precisa fazer dietas malucas e tentar se enquadrar em padrões, porque a tua beleza é singular.

Aprenda a se olhar no espelho e a gostar do seu desarrumado, do seu jeito desastrado de ser e das suas piadas sem graça. Não tenha medo de ser a garota da risada escandalosa e do coração sincero. Não hesite em usar aquele vestido que você comprou há tanto tempo e deixou guardado, porque acredita que “não ficou bom em você”.

Valorize as suas curvas, mas lembre-se, sempre, de que o seu sorriso é a curva mais bonita que há em você. Lembre-se que o seu abraço é confortante e que você sabe ajudar alguém como ninguém.

Não esquece a sua força e a sua coragem, não esqueça a sua história e tudo o que você já suportou para chegar até aqui. Não deixe de lado a sua alma bonita, deixe para trás os medos e todas aquelas palavras que a feriram.

Ame o seu cabelo, seja ele liso, enrolado, crespo, curto, longo ou bagunçado. Ame o seu corpo, sem se importar com os quilinhos a mais, porque isso não define quem você é. Resgate a sua força e a sua coragem, veste a sua melhor roupa, que é a sua alma bonita, e vá desbravar o mundo com sua ousadia.

Você não precisa se comparar com o outro, isso é um erro, e nos leva à frustração. Compare você com o melhor de si, com aquilo que pode melhorar a cada amanhecer. Compare com aquilo que você tem de mais bonito e que de alguma forma se perdeu com o tempo devido ao medo ou às feridas.

Esqueça os seus fracassos e recorde-se da sua coragem em enfrentar qualquer obstáculo. Ame a sua loucura e defenda aquilo em que você acredita. Alimente o seu ego sem precisar de elogios, goste da sua roupa sem precisar que alguém diga que “ficou bom em você.” Extrapole nas cores e combinações, sem ninguém precisar dizer que você “acertou” no quesito estilo.

Autenticidade faz parte do amor próprio; é preciso ousadia para sermos nós mesmos em um mundo de tantas cópias, em uma sociedade que valoriza os padrões e que tenta, a todo custo, encaixar-nos neles. Seja você e aprenda a gostar disso, aprenda a valorizar os seus traços e a realçar a sua beleza, em vez de tentar mudá-la o tempo todo.

Você não precisa de roupas caras para ter estilo, não precisa vestir um 36, ter a cintura fina, o cabelo liso e a barriga chapada. Você não precisa ser alta e ter inúmeros likes nas suas fotos para ser bonita. Você precisa gostar de si e ter amor próprio, que é o caminho mais certo para o outro nos amar, é a porta para não aceitar pouco. É a chave para não desmoronar com as bobagens que escutamos todos os dias de quem não entende nada quando o assunto é “ser você mesmo”. De quem tenta nos derrubar a todo custo com os seus discursos prontos.

Você precisa de amor próprio, de felicidade, sorriso sincero, abraço acolhedor e gente que valorize os detalhes que compõem a tua beleza singular. Você pode ter pernas finas, barriga chapada, pode querer perder uns quilinhos, ter o cabelo enrolado, liso e até querer fazer uma dieta, mudar o corte de cabelo ou comprar uma roupa nova com aquela estampa ousada da moda, mas que todas essas mudanças sejam por você, unicamente por você.
Gostar daquilo que contemplamos no espelho sem precisar se ver pelos olhos dos outros é dessas belezas da vida que dinheiro algum compra e flash nenhum consegue captar e traduzir em uma fotografia.

Pode chorar no meu ombro, mas não se esqueça de mim quando essa dor passar

Pode chorar no meu ombro, mas não se esqueça de mim quando essa dor passar

Faz um bem imenso podermos ouvir, acolher e ajudar a quem esteja precisando de um ombro amigo, de ouvidos atentos ou de palavras de ânimo. Isso nos fortalece e nos torna mais aptos a enfrentar as próprias dificuldades. Mesmo assim, também nos deixa felizes quando se lembram de nós nos momentos de alegria, visto que tanto no fracasso quanto no sucesso podemos ser úteis – isso é reconhecimento, gratidão.

É verdade que devemos praticar o bem de maneira espontânea e desprendida, sem esperar obter algo em troca, para que possamos exercitar nossa capacidade de doação incondicional. No entanto, humanos que somos, também temos prazer em poder ser alguém com quem os amigos dividem alegrias, ou seja, quem nos procura para chorar as dores não deve nos esquecer quando tudo estiver bem.

Nem sempre estaremos sendo egoístas ao pensar em nosso bem estar, em nosso equilíbrio, em nós mesmos, enfim. Caso apenas nos doemos, nos entreguemos, sem receber retorno algum, acabaremos nos cansando, perdendo as forças. Sim, amor que vai se multiplica e alimenta a nossa alma, porém, ninguém foge à necessidade da troca, do vai e volta, da reciprocidade. Nada se sustenta em terreno que somente cede, sem ser reposto, sem ser cuidado, sem ser terreno cheio.

Temos que ter esse cuidado em valorizar as pessoas por tudo o que são e não somente pelo que nelas nos interessa em determinados momentos, pois isso equivale a usar o outro como um objeto qualquer. Quem nos consola também sabe sorrir junto. Quem nos aconselha também sabe contar piadas. Procurar a pessoa apenas quando estiver por baixo poderá acabar culminando na ausência dela quando você mais precisar, porque a gente cansa de ser usado, mesmo que demore.

Tudo tem seu tempo, tudo requer equilíbrio, os excessos nada produzem de positivo, ou seja, sempre será necessário ponderar sobre a intensidade com que nos dispomos a agir, em todos os setores de nossas vidas. Fechar-se ao outro, sem se permitir entregar um nada, é uma das piores coisas a se fazer contra si mesmo, porém, apenas se doar, sem repor as energias com as trocas de que se constituem os relacionamentos saudáveis, nos impedirá de completar a nossa essência com a felicidade a que todos temos direito.

Amigos invejosos

Amigos invejosos

Tendemos a confundir inveja com cobiça. Inveja é não querer que o outro tenha, seja lá o que for: inteligência, amor, dinheiro, um corpo bonito, um cabelo bonito, namorado (a), sorte, sucesso, roupas bacanas, viagens, etc. Cobiça é querer o que o outro tem.

Mas ambas as emoções se misturam porque são frutos do mesmo engano: a ideia de que o outro não merece o que tem e/ou não o fez por merecer.

Outro engano? Negar a presença dessas palavras no vocabulário de nossa própria vida, porque todos nós sentimos inveja e cobiça em algum momento, elas fazem parte da condição humana.

Perceber que um amigo tem o que (supostamente) nos falta mexe com o nosso sentimento de impotência e ninguém gosta de se sentir impotente.

Então, para não lidar com a impotência-nossa-de-cada-dia tiramos o foco de nós mesmos e botamos no outro! Sentimos raiva – ainda que veladamente – do outro e do que ele possui, pois é mais aceitável sentir raiva do outro do que de si.

Seria muito bacana se conseguíssemos refletir sobre as nossas faltas quando a inveja e a cobiça nos assaltam. Seria proveitoso. Quem sabe não conseguiríamos, através de um mergulho pra dentro, transformá-las em ganhos?

Olho grego, pimenta dedo de moça e figa podem ajudar? Podem, mas não impedem que sintam – ou sintamos – essas emoções.

Quem se sente vítima de inveja constantemente também deve experimentar uma pausa para reflexão: será mesmo que “aquela amiga” tem inveja de você ou simplesmente você está com a autoestima baixa e precisa acreditar nisso para se sentir bem?

Acreditar que alguém nos inveja, em alguma instância, é acreditar que somos “merecedores” dessa inveja, que temos algo valioso que o outro não tem. Será que temos mesmo? Se temos, por que precisamos da inveja alheia para validar nosso status?

Sentir-se invejado não deixa de ser um ato narcísico. Mas tudo nessa vida serve como matéria-prima para o autoconhecimento, basta querer! Basta estar atento. Basta estar disposto. Eis a nossa labuta diária: transformar lixo (emoções baratas) em luxo (oportunidade de crescimento).

Mas, pelo sim, pelo não, acredito que um punhado de sal grosso atrás da porta, um patuá no pescoço e um beijinho no ombro para quem anda querendo secar a nossa pimenteira não fazem mal a ninguém.

Tem amor de sobra? Escoe para onde falta.

Tem amor de sobra? Escoe para onde falta.
Buddy bear

Amor é fonte generosa. Multiplica-se, propaga-se, encontra caminhos e maneiras de tocar seu objeto de afeição.

Amor em demasia sempre vem acompanhado daquele apego que gruda, do ciúme que intimida, da dependência que aprisiona. Se há amor sobrando, é preciso escoar, descobrir alternativas, manter saudável o nível e o humor deste amor.

Amor mau humorado resmunga.

Amor em exagero sufoca, afoga, asfixia.

Se já é tarefa árdua tentar equilibrar as trocas de amor, impossível avaliar o que fazer com o amor excedente, o que transborda, que, longe de ser recusado, simplesmente sobra numa relação que não o comporta.

Amor que sobra tem que ser escoado. É imperioso encontrar um caminho diferente, uma forma de distribuição mais justa e coerente, o resgate de afeições esquecidas e carentes desse amor.

Somos seres cercados de amor por todos os lados. Família, amigos, colegas, companhias eventuais, personagens da rotina diária, exemplos, admiradores. Em tudo colocamos ou esperamos amor. Do mais rasteiro ao mais profundo, guardadas as escalas e proporções.

Canalizar para apenas um afeto é sentença de morte e transformação desse amor em outro sentimento, quase sempre oposto. É preciso distribuir, escoar, deixar fluir, sem retenções nem exceções.

Ninguém dá conta de um amor exclusivo e integralmente seu. A oferta faz bem somente para a vaidade, porque na real, esse amor vira um grande e pesado fardo, terminando por ser jogado de lado e trocado por um amor mais leve.

Amor é estrela de várias pontas e quem opta por utilizar a luminosidade de apenas uma em potência máxima, acaba por se sabotar e colapsar o equilíbrio do que deveria ser um sistema claro e justo, queimando e ferindo quem estiver em sua direção.

Quem consegue irradiar amor, não precisa sequer esperar reciprocidade. Ele volta, na medida certa.

Felicidade é saber reconhecer o próprio tempo

Felicidade é saber reconhecer o próprio tempo

Felicidade é não esconder sentimentos em troca de relacionamentos comuns, de uma vida sem vibração e num trabalho que mais parece um piloto automático de chatices sem porquês e explicações. Mas felicidade também não é jogar tudo para alto e imaginar viver uma vida isenta de limites e consequências. Felicidade é, no termo inteiro, saber reconhecer o próprio tempo.

Sim, felicidade é ponto de partida e não linha de chegada. Ainda assim, vivemos diariamente com uma arma angustiante apontada para a alma. O medo que não te deixa seguir. O passado que não te deixa criar presentes. E são obrigações e mais obrigações a serem cumpridas. Normas e regras ditadoras de sentimentos. Desaprendemos a amar. Pouco já não preenche. O quero muito e agora é cada vez mais visto nos sorrisos amarelos, nas fotos filtradas e nas declarações do tipo “como se não houvesse amanhã”.

Talvez, em todo esse processo, estejamos afastando a tal felicidade das nossas vidas. Até o convívio sereno de outrora deu lugar para essa busca incessante e egocêntrica. Pressionados, abrimos um leque de possibilidades com uma das mãos e deixamos ao léu as coisas simples noutra. O cheiro de café saindo, o abraço da saudade, a chuva inesperada no meio do dia e o amor que chega sem coletar o carinho dado. Cadê?

Não adianta cruzar os braços e dizer que o tempo é curto e injusto. Felicidade é saber prezar por momentos mais sublimes e por escolhas que não submetam o coração a um cárcere privado. Felicidade é, antes de qualquer coisa, saber da beleza dos instantes, pois não existe isso de felizes para sempre. A felicidade é, entre uma escolha e outra, a perspectiva e o tamanho da coragem que depositamos por prazeres não extintos em tempo de vida. O importante é a felicidade contida no tempo de nós.

Não é que eu seja indiferente. É que cuidar da minha vida já dá um trabalhão danado.

Não é que eu seja indiferente. É que cuidar da minha vida já dá um trabalhão danado.

Confesso. Eu não estou nem aí para certas coisas. Respeito quem acredita que “o desprezo é o contrário do amor” e outras teses. Mas eu discordo. Desprezar o que não nos serve é um exercício de liberdade, um gesto de amor por nós mesmos e por quem interessa.

Tem coisa e tem gente por aí que não merecem um segundo da nossa atenção. Assim como de quando em vez não se pode ficar indiferente a uma atitude duvidosa, de vez em quando é preciso não ter dúvida de desviar e seguir adiante.

Acho mesmo que o direito de concordar que discordamos é uma das prerrogativas da vida em sociedade. Anda ao lado do nosso dever de respeitar a opinião do outro. E se a opinião do outro me incomodar a ponto de eu querer distância dele, eu mantenho distância e pronto!

Não é que eu seja indiferente, não. É que cuidar da minha própria vida já dá um trabalhão danado! Deus me livre de tentar mudar o pensamento alheio.

Tem dias em que eu bem gostaria de me lançar a uma discussão interminável sobre assuntos polêmicos, ressaltar a diferença entre fatos e impressões pessoais, defender a minha tese de que não é preciso mudar a posição do outro para provar que a minha é melhor que a dele, argumentar que somos diversos e que isso é uma riqueza imensa. Mas não.

Às vezes eu bem quero responder a uma provocação aqui, um insulto ali, uma incorreção acolá, mas aí eu olho as horas, percebo a pilha de trabalho que me espera e deixo para depois. Quem sabe outro dia? Agora não dá. Agora eu tenho coisa mais importante. Agora eu tenho mais o que fazer.

Imagem de capa: Peshkova/shutterstock

Permita-se desistir

Permita-se desistir

Dá-se muita importância ao que se consegue, ao que se alcança, ao quanto vencemos na vida. Livros, filmes, reportagens são dedicadas a louvar as virtudes daqueles que venceram, que saíram da pobreza, que se tornaram famosos, pois jamais desistiram de seus sonhos. No entanto, poucos se lembram de que será preciso que desistamos, que abramos mão de muitas coisas e de algumas pessoas, caso queiramos persistir na busca de uma meta. Permita-se desistir.

Desista de correr atrás de pessoas que não o incluem em nenhum de seus planos, que mal se lembram de que você existe, que colocam seu nome no final de qualquer lista. Não se humilhe por quem não consegue enxergar tudo o que você tem a oferecer. Aproxime-se daqueles que sorriem ao ver você chegar, que se dispõem a ouvir o que você tem a dizer, que respondem suas chamadas, suas mensagens, seu olhar.

Desista de investir naquilo que não tem futuro, de gastar energia e tempo elaborando planos que não condizem com o que você é. Não procure carreiras rentáveis, não se perca em meio a gente hipócrita, que sabe o preço dos seus sapatos, mas desconhece a data de seu nascimento. Invista na sua qualidade de vida, nos sonhos que vão ao encontro do que existe dentro de você, do que faz seu coração vibrar.

Desista de se contentar com pouco, com metades, conformando-se com o que poderia – e deveria – ser muito melhor. Não caminhe por travessias menos coloridas, menos iluminadas, menos especiais, por conta de achar que já está bom. Queira mais, queira inteireza, amplitude, bonança afetiva, amor transbordante, gargalhadas de doer o estômago. Deseje preencher a dimensão exata de seus sonhos mais altos, nada menos do que isso.

Desista de sentir pena de si mesmo, de choramingar pelos cantos, correndo os olhos pelas vidas alheias, enquanto desperdiça os momentos que anseiam por preencher a sua jornada. Não inveje, não se compare com o outro, não se esqueça do que e de quem já está com você, enquanto assiste aos acontecimentos que não são seus com sentimento de derrota. Nunca estaremos derrotados, enquanto vida houver, enquanto pudermos levantar a cada manhã, com tudo ali à nossa frente nos esperando.

Nem sempre estaremos bem, nem sempre poderemos contar com as pessoas, nem sempre conseguiremos conter as lágrimas que insistem em cair. Enfrentaremos dias e noites sem fim, sem luz, momentos de dor e desalento. Teremos perdas inconsoláveis, decepções doloridas, escuridões em que não conseguiremos ver saída. No entanto, caso tenhamos desistido de sofrer por tudo o que era inútil, estaremos fortalecidos junto ao amor com reciprocidade, ao consolo sincero e providencial de gente que ficou de verdade. Porque então teremos feito as desistências que salvam.

No fim das contas a gente conta com poucos, mas esses poucos são os que contam pra gente!

No fim das contas a gente conta com poucos, mas esses poucos são os que contam pra gente!

Dentro da gente há inúmeros aposentos. Uns habitados por muitos. Outros habitados por poucos. Outros absolutamente vazios de outros, mas cheios de nós mesmos. Vamos sendo tecidos, fio a fio, pelas incontáveis conexões humanas que a vida nos apresenta. Somos uma trama de tudo o que vivemos, ainda que tenhamos vivido sós. Mas, os outros… Ahhh… os outros são o nosso tempero, norte e perdição.

Há os que vêm só de visita, aqueles que são deliciosos como um café recém passado numa tarde de chuvinha fina. Há os que duram o tempo de um dia ou dois, aqueles que são maravilhosos como uma viagem surpresa de fim de semana. Há os que permanecem como hóspedes bem-vindos de um país estrangeiro, são aqueles interessantes e instigantes como filmes argentinos. E há os que nos entremeiam e entrelaçam-se a nós pelo resto de nossos dias, são aqueles arrebatadores livros inesquecíveis, daqueles que lemos quando eles ainda eram “proibido” para nós.

E, rendamos a importância justa àqueles que embarcam em nossas vidas, seja de forma meteórica, sazonal ou histórica, com a indecifrável missão de nos desafiar. São os desafetos, os desaforados, os difíceis de digerir. A esses, devemos as mais importantes lições. Sem eles, seguiríamos a vida acreditando em nuvens de algodão doce, coelhos que pintam ovos de chocolate e, até, quem sabe, na bondade inerente ao ser humano.

Ahhh…sim, é fundamental termos fé em alguma coisa, ainda que essa coisa seja a bondade inerente ao ser humano, uma fantasia ou um mistério divino. O único pequeno problema nessa crença é que ela pode beirar a ingenuidade, caso não seja acompanhada de um importante empenho próprio em tomar nas mãos a responsabilidade sobre acertar e errar. Fé sem reflexão é uma máscara sem buraquinhos para os olhos, só servem se você pretende ficar adormecido como se o escuro da noite fosse durar para sempre.

No fim das contas a gente conta com poucos, mas esses poucos são os que contam pra gente. São aqueles que cabem direitinho nas lembranças e no presente e que não nos causam nenhum tipo de aflição ou angústia sobre o futuro. Porque a gente sabe que eles não vão durar para sempre aqui do lado de fora. Mas vão iluminar para sempre o nosso lado de dentro.

Sem privação não há felicidade

Sem privação não há felicidade

Em 1930, o escritor Bertrand Russell afirmou que “não possuir algumas das coisas que desejamos é parte indispensável da felicidade”. Há muitas controvérsias em relação a isso. Contudo, o fato é que sempre tememos não ter o bastante, e ainda nos damos ao luxo de sofrer por desejar mais do que já temos. Sustentamos o vício do descontentamento por incompletude. É uma ingratidão regenerativa em manifesto.

A saber, Russell foi um eminente matemático e filósofo britânico do século XX, tendo ganhado, merecidamente, o prêmio Nobel de Literatura de 1950 “em reconhecimento de seus variados e significativos escritos, nos quais defende ideais humanitários e liberdade de pensamento”. Sua filosofia era pautada no ativismo social, pacifismo, agnosticismo e humanismo, e fincada na lógica analítica e argumentação teórica.

Durante sua existência, Russell teve três paixões, maiores do que todas as outras, simples, mas irresistivelmente fortes: o desejo imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade.

Em vida, ele produziu tratados relevantíssimos sobre temas universais à vivência humana, incluindo religião, trabalho, moral, política e felicidade. Sobre este último tema em especial, há de se destacar sua maravilhosa obra A Conquista da Felicidade, que é dividida em duas partes: a primeira fala das causas de infelicidade; a segunda, das causas de felicidade.

Magistralmente, Russell aborda aspectos lógico-filosóficos sobre o que ele pensa configurar uma vida feliz, mas faz isso somente após incluir apontamentos do que viabiliza essa felicidade: a infelicidade. Esse livro, segundo ele, é um esforço para sugerir uma cura para a infelicidade cotidiana ordinária de que a maioria das pessoas em países civilizados sofre.

Na atual época de distração, individualismo e distanciamento, torna-se mais exótica a fluência da capacidade de entrega – essencial para a conquista da felicidade. Russell, com sagacidade nada discreta, oferece sua percepção oportuna sobre os demônios internos que não cessam em apequenar-nos, e promove dizeres que, esperançosamente,  transcendem o mal, trazendo uma consciência mais lúcida para as nossas próprias patologias.

Desse livro, entende-se que sem privação não há felicidade. A plenitude do ser feliz é humanamente inalcançável, exceto em alguns estágios felizes da existência, os quais, justamente por serem tão bons, tem sua finidade. O apogeu da felicidade é uma promessa que não pode ser cumprida, uma vez que sua procura não cessa.

De acordo com Russell, a felicidade humana provém da plena posse das faculdades – físicas, emocionais, psicológicas, intelectuais. Vê-se daí como a felicidade é mais desafiadora e rara do que supomos. Diz ele:

“O homem dividido contra si mesmo procura estímulos e distrações; ama as paixões fortes, não por razões profundas, mas porque momentaneamente elas lhe permitem evadir-se de si próprio e afastam dele a dolorosa necessidade de pensar. Toda a paixão é para ele uma forma de intoxicação e, desde que não possa conceber uma felicidade fundamental, a intoxicação parece-lhe o único alívio para o seu sofrimento. Isso, no entanto, é o sintoma duma doença de raízes profundas. Quando não há tal doença, a felicidade provém da plena posse das faculdades. São nos momentos em que o espírito está mais ativo, em que mais coisas são esquecidas, que se sentem alegrias mais intensas.”

Nessa obra, o autor britânico traça um paralelo entre a felicidade e o êxito, no qual a sensação de sucesso costuma ser compatível com a de estar feliz:

“A raiz do mal reside no fato de se insistir demasiadamente que no êxito da competição está a principal fonte de felicidade. Não nego que o sentimento do triunfo torna a vida mais agradável. Um pintor, por exemplo, que viveu obscuramente na juventude, decerto se sentirá feliz se o seu talento acabar por ser reconhecido. Não nego também que o dinheiro, até um certo limite, é capaz de aumentar a felicidade; para lá desse limite, julgo que não. O que eu afirmo é que o êxito só pode ser um dos vários elementos da felicidade, e que é demasiado o preço pelo qual se obtém se a ele se sacrificam todos os outros.”

Um dos motivos de infelicidade, fadiga e tensão nervosa, supõe Russell, é a incapacidade de não tomar interesse por tudo que não tenha uma importância prática na vida. Daí resulta que a mente fica ocupada com infinitos problemas, cada um dos quais provocando certamente algumas inquietações. Contudo, se fosse projetada a ausência dessas inquietações, não se daria conta de todos os problemas, e ser feliz depende de superá-los.

O livro não trata só de felicidade. Outra abordagem de Russell foi o hábito popular de fazer fofocas. Ele acredita que uma das formas mais universais de irracionalidade é o boato do tipo falacioso. Pouquíssimas pessoas têm a capacidade de resistir à tentação de falar mal dos outros, mesmo quando a ocasião em que difamam lhes faria apontar a arma para si mesmas. Por outro lado, se tomam ciência de que alguém – íntimo ou não – falou mal delas, enchem-se de cólera e indignação. Boatos e fofocas espalham-se no ar como vírus, principalmente em lugares onde as pessoas não tem nada melhor para fazer. A fofoca alimenta-se muito da difamação.

Certamente, algumas virtudes estão disfarçadas em defeitos, mas esse disfarce é difícil de perceber. Por tal motivo, é bastante complexo diferenciar moralidade prática de imoralidade prática, já que a atitude moral é fragmentada e por vezes subjetiva, em detrimento do dever ético circunscrito. De acordo com Russell:

“Exigimos de toda a gente o mesmo sentimento de amor e de profundo respeito que sentimos por nós próprios. Nunca nos ocorre que não devemos exigir que os outros pensem melhor de nós do que nós pensamos a respeito deles, e isso não nos ocorre, porque, aos nossos olhos, os méritos próprios são grandes e evidentes, ao passo que os dos outros, se na realidade existem, só são reconhecidos com certa benevolência.”

A Conquista da Felicidade também contém, como pauta, o tema “trabalho”. O filósofo britânico alega existir, segundo a natureza da obra e a capacidade do trabalhador, todas as gradações, desde o simples alívio do tédio às satisfações mais profundas. Trabalhar nem sempre é gratificante, mas supre uma condição de escolher o que fazer no tempo livre, já que se desocupar na vadiagem é oneroso demais para que se permaneça nessa situação por muito tempo sem ser prejudicado, principalmente em um mundo movido por dinheiro.

“Na maior parte dos casos, o trabalho que as pessoas têm de executar não é interessante, mas ainda em tais circunstâncias oferece grandes vantagens. Em primeiro lugar, preenche uma boa parte do dia sem haver necessidade de decidir sobre o que se há de fazer. A maioria das pessoas, quando estão em condições de escolher livremente o emprego do seu tempo, têm dificuldade em encontrar o que quer que seja suficientemente agradável para as ocupar. E tudo o que decidem deixa-as atormentadas pela ideia de que qualquer outra coisa seria mais agradável.”

Muita gente precisa trabalhar, mas não tem noção do que quer fazer, optando, neste último caso, por miséria ou por nada. A escolha por uma profissão subverte todas as outras possíveis, dentre aquelas adequadas ao perfil e às capacidades ou não. Essa dúvida impossibilita a dedicação prioritária a uma determinada função profissional e, desse jeito, a trilha de uma carreira se divide em várias partes: a confusão de metas atrapalha no reconhecimento de objetivos.

Russell diz que uma escolha profissional, em especial para quem está iniciando a carreira, é, em geral, difícil e fatigante; somente pessoas com iniciativa excepcional conseguem acertar sua vocação rapidamente, porque essas, além de tentar mais, não sucumbem à incerteza. As outras, indecisas, mantêm-se prostradas e perdem vantagem competitiva no mercado de trabalho, pois se deduz delas a falta de experiência. E, então, posicionam-se infelizes, privadas daquilo que lhes conferiria status e reconhecimento por suas competências qualificatórias.

Muitos compreendem que uma vida é tanto mais feliz quanto mais produtiva, agitada, corrida, ocupada. Essa vida repleta de ocupação, entretanto, pode ser esgotante, já que exige estimulantes cada vez mais fortes para domar os prazeres mundanos insaciáveis. Quando se evita a agitação, é comum dar de cara com a monotonia, essa força que é inimiga dos hiperativos. A monotonia tem apenas um mérito: sem ela, nenhuma aventura seria boa o bastante.

“Há sempre um certo aborrecimento quando se evita em demasia a agitação, mas, por sua vez, a agitação demasiada não só enfraquece a saúde como embota o gosto para toda a espécie de prazeres, substituindo titilações por profundas satisfações orgânicas, habilidade por inteligência e impressões fugidias por beleza. Não pretendo exagerar os perigos da agitação. Uma certa quantidade talvez seja saudável, mas, como em quase todas as outras coisas, o problema é de ordem quantitativa. Uma dose demasiado pequena pode gerar desejos mórbidos, e o abuso pode produzir esgotamento. Certa capacidade para suportar o aborrecimento é essencial a uma vida feliz, e isso era uma das coisas que deviam ser ensinadas aos jovens.”

Russell achou sensato acrescentar, no livro, comentários sobre a influência do tédio – irmão da monotonia – na conquista da felicidade. Para ele, hoje nós estamos menos aborrecidos do que nossos antepassados, mas temos mais medo do tédio. Acreditamos que o tédio é um apêndice sempre dispensável de nossa vida, a ser extraído pela excitação. Com uma presciência impressionante, Russell escreve:

“À medida que nos elevamos na escala social, a busca da excitação se torna cada vez mais intensa. Aqueles que podem pagá-la estão se movendo perpetuamente de um lugar para outro, carregando com eles a alegria, dançando e bebendo, mas por alguma razão sempre esperando para desfrutar mais destes em um novo lugar. Aqueles que têm de ganhar a vida recebem a sua parte de tédio, por necessidade, nas horas de trabalho, mas aqueles que têm dinheiro suficiente para ser libertados da necessidade de trabalho têm como seu ideal uma vida completamente livre do tédio. É um ideal nobre, e muito longe de mim para condená-lo, mas tenho medo de que, como outros ideais, seja mais difícil de realização do que os idealistas supõem. Afinal, as manhãs são chatas na proporção em que as noites anteriores foram divertidas. Talvez algum elemento de tédio seja um ingrediente necessário na vida. O desejo de escapar do tédio é natural; de fato, todas as raças da humanidade a mostraram como a oportunidade aconteceu. Guerras, genocídios e perseguições fizeram parte da fuga do tédio; até mesmo discussões com vizinhos foram encontradas melhores do que nada. O tédio é, portanto, um problema vital para o moralista, uma vez que pelo menos metade dos pecados da humanidade são causados pelo medo dele.”

A influência do trabalho na felicidade e vice-versa foi melhor ainda abordada por Russell em outra obra, Elogio ao Ócio, publicada em 1935. Aqui, Russell defende, sem amarras, que “o caminho para a felicidade está na redução organizada do trabalho”. Ele diz que uma pessoa só pode ser feliz se sua criatividade for despertada. A ótica do autor é que criatividade exige certa autonomia e liberdade; assim, a redução da jornada de trabalho nos liberaria para buscar interesses mais criativos. Ao permitirmos (ou sermos obrigados) a ocupar quase todo o tempo em horas de vigília, não podemos viver plenamente.

Bertrand Russell argumenta que o lazer, algo antes conhecido apenas por pouquíssimos privilegiados, é crucialmente necessário para uma vida rica, saudável, próspera, significativa e feliz.

O autor sugeriu uma jornada de trabalho de quatro horas diárias. Sim, é realmente muito pouco para sustentar as demandas da grande maioria dos serviços prestados, mas o britânico respondia que a nossa capacidade para recreação e despreocupação foi eclipsada pelo culto da eficiência. Essa realidade é antiga, persiste e persistirá. Uma sociedade que leva educação e felicidade a sério leva o lazer a sério. Diversão sacia necessidades de aprendizado e deleitamento, sem os quais o trabalho – especialmente o de caráter intelectual – é sempre deformado.

Em A Conquista da Felicidade, Russell faz uma alusão relacionada à inveja. O invejoso, ao invejar, está cego, não enxerga a própria felicidade, tornando-se carente dela. É um problema de perspectiva. O filósofo britânico diz:

“De todas as características que são vulgares na natureza humana, inveja é a mais desgraçada; o invejoso não só deseja provocar o infortúnio e o provoca sempre que o pode fazer impunemente, como também se torna infeliz por causa da sua inveja. Em vez de sentir prazer com o que possui, sofre com o que os outros têm. Se puder, priva os outros das suas vantagens, o que para ele é tão desejável como assegurar as mesmas vantagens para si próprio. Se uma tal paixão toma proporções desmedidas, torna-se fatal a todo o mérito e mesmo ao exercício do talento mais excepcional […] Afortunadamente, porém, há na natureza humana um sentimento compensador, chamado admiração. Todos os que desejam aumentar a felicidade humana devem procurar aumentar a admiração e diminuir a inveja.”

Adiante no livro, temos ainda mais contato com a ideia sobre a importância da privação para a conquista da felicidade. O homem que adquire facilmente as coisas está fadado à insatisfação crônica. Aquele que tem tudo o que precisa não é necessariamente mais feliz do que aquele que não tem o suficiente; na verdade, um quer ter o que o outro tem, mas não ponderam o que desejam, e então se esquecem do que têm. A vontade de ambição gera oportunidades de ser feliz, mas também serve como armadilha da infelicidade.

O autor traz à tona correlações curiosas, no espectro humano, entre razão e emoção. Muita gente acredita que são coisas incompatíveis, e que uma obscurece a outra. Outras pessoas acham que uma vida de razão preponderante prejudica a sensibilidade emocional, e que tal razão nubla a capacidade de se entregar à emocionalidade de forma genuína.

A racionalidade completa e a emocionalidade completa são inatingíveis, só que, enquanto considerarmos determinadas pessoas como loucas, sempre acharemos umas mais racionais do que outras. Tais julgamentos de sanidade nunca são confiáveis, pois somos todos loucos em alguma medida: o louco que julga outro louco não deixa de ser louco.

A felicidade depende de um mínimo grau de loucura. Muitos instantes da vida seriam insuportáveis se não fossem apimentados pela loucura, como defendeu o filósofo holandês Erasmo de Roterdã em seu livro Elogio da Loucura. Gente sã demais não é gente normal, como se diz por aí.

Costuma-se pensar que razão e emoção são antagônicas. Hipoteticamente, um indivíduo dotado somente de emoção arruinar-se-ia na irracionalidade, ao passo que um dotado somente de razão nem humano seria considerado. A falta de razão pressupõe certo descontrole emocional; razão demais aniquila paixões e faz um alguém robótico. Russell aponta:

“Há a ideia de que quando se concede à razão inteira liberdade, ela destrói todas as emoções profundas. Esta opinião parece-me devida a uma concepção inteiramente errada da função da razão na vida humana. Não é objetivo da razão gerar emoções, embora possa ser parte da sua função descobrir os meios de impedir que tais emoções sejam um obstáculo ao bem-estar. Mas é um erro supor que, diminuindo essas paixões, diminuiremos ao mesmo tempo a intensidade das paixões que a razão não condena.”

Ele supõe que a razão praticada serve de pressuposto para busca de harmonia interior. A emoção, nesse caso, também pode ser aproveitada, porque a razão faz com que os excessos sensacionais sejam pacificados. O homem que faz da razão seu escudo sente-se mais livre na contemplação do mundo e no emprego de sua energia para conseguir propósitos exteriores, do que o homem que continuamente é embaraçado por conflitos emocionais interiores.

Concentrar-se intermitentemente na interioridade para elevar a energização exige mais do que a mente é capaz de aguentar. Essa limitação obriga o uso da razão a mais passional das pessoas. Obriga também a buscar refúgio no exterior. Quem se fecha em si por muito tempo acaba explodindo. Uma pessoa é mais propensa à felicidade se não deixa a razão superar todos os seus impulsos, mas também e principalmente se for capaz, por prudência e discernimento, de saber quando e por que refreá-los.

“Pregar racionalidade é um tanto diferente, porque ela nos ajuda, de modo geral, a satisfazer os nossos próprios desejos, quaisquer que sejam. O homem é racional na proporção em que a sua inteligência orienta e controla seus impulsos. Acredito que o controle dos nossos atos pela inteligência é, afinal, o que mais importa e a única coisa capaz de preservar a possibilidade de vida social.”

Em média, as pessoas que sentem uma necessidade obsessiva de controle são as mais descontroladas. Têm dificuldade de reconhecer suas emoções em um contexto que as justifique; elas cedem às paixões todas que porventura apareçam, e depois não entendem as razões dos seus desequilíbrios.

O desejo é, por rotina, alimento para a fome de felicidade. Quando o desejo é consumado, o vazio surge perversamente, como se a fome ainda se mantivesse. No final, todos buscam motivos – fundados ou não – para convencer a si ou aos outros de que a satisfação do prazer é um dever de felicidade, enquanto não passa de um direito que alguns podem gozar e outros não conseguem aproveitar.

Acerca dessa perseguição da felicidade a partir do combustível do prazer, Russell oferece um panorama interessante, acertando que a vontade de ser feliz varia de pessoa para pessoa, dependendo de como sua razão é afetada pelo desejo. O que acontece, por exemplo, quando um homem busca conquistar a felicidade apenas pela conveniência do prazer? Para Russell:

“O homem que deseja agir de certa forma se persuadirá que, assim procedendo, alcançará algum propósito que considera bom, mesmo que não vise motivo algum para pensar dessa forma, se não tivesse tal desejo. E julgará os fatos e probabilidades de maneira muito diferente daquela adotada por um homem com desejos opostos. Como todos sabem, os jogadores estão cheios de crenças irracionais relativas a sistemas que devem, no fim, fazê-los ganhar. Os que se interessam pela política persuadem-se de que os líderes do seu partido jamais praticariam as patifarias cometidas pelos adversários. Os homens que gostam de administrar acham que é bom para o povo ser tratado como um rebanho de ovelhas, os que gostam do fumo dizem que acalma os nervos, e os que apreciam o álcool afirmam que aguça o tino. A parcialidade assim criada falsifica o julgamento dos homens em relação aos fatos, de modo muito difícil de evitar.”

A única forma de evitar isso seria esquecer a felicidade, o que é, de certa forma, algo impensável, até para as pessoas com as personalidades mais mórbidas e melancólicas.

Algumas pessoas, em maneira de ser, depreciam a felicidade, não para menosprezar sua importância, mas de modo que possam se tornar menos dependentes dela e, por intenção, menos frustradas. Por mais que resistam à tentação do desejo – considerando-a como fundamental para a felicidade –, não o fazem por muito tempo, sabendo que a paixão é passível de desaparecer sem aviso prévio.

Russell apregoa o que conduz o comportamento humano em vias da felicidade, dizendo que toda a atividade humana é induzida pelo desejo. Alguns moralistas adiantam que é possível resistir ao desejo no interesse aos princípios morais. Essa alegação, para Russell, é falaciosa, porque o dever não tem nenhuma aplicação a menos que se deseje ser obediente. Se quisermos saber o que os homens provavelmente irão fazer, devemos não só compreender suas circunstâncias físicas e materiais, mas todo o sistema de seus desejos com suas forças relativas.

“O homem difere de outros animais em um aspecto muito importante, e é que ele tem alguns desejos que são, por assim dizer, infinitos, que nunca podem ser totalmente gratificados, e que o manteriam inquieto mesmo no Paraíso. Uma jiboia-constritora, quando já teve uma refeição adequada, vai dormir, e não acorda até que precise de outra refeição. Os seres humanos, em sua maior parte, não são assim.”

O autor indica quatro desses desejos infinitos, que são: aquisição, rivalidade, vaidade e amor ao poder. Quando um desses desejos não é perpetuado, ser feliz passa a ser uma questão de resiliência.

O que importa é ter uma vida boa, e esta não é medida pela resposta à ser feliz ou não, e sim à pergunta de estar feliz ou não. Segundo Russell:

“Uma vida boa é inspirada pelo amor e guiada pelo conhecimento. Nem amor sem conhecimento nem conhecimento sem amor podem produzir uma vida boa.”

O filósofo não quis incluir a palavra “felicidade” em sua definição de vida boa. Talvez porque a fórmula da felicidade seja desconhecida. O britânico diz que, embora amor e conhecimento sejam obviamente necessários, o amor é, em certo sentido, mais fundamental, pois leva as pessoas inteligentes a buscar o conhecimento a fim de descobrir como beneficiar aqueles a quem elas amam. Não obstante, se as pessoas não são inteligentes, elas se contentarão em acreditar em tudo que lhes for dito, sendo passíveis de praticar o mal, apesar da sua mais genuína benevolência.

Bertrand Russell ajudou com suas contribuições sem igual ao pensamento que tange à busca humana por felicidade. Mas ele nunca se preocupou com a verdade sobre o que escrevia. Dizia sempre:

“Jamais morreria pelas minhas crenças, porque elas podem estar erradas.”

Para ele, a experiência nunca permite atingir certezas absolutas, muito menos verdades absolutas. Portanto, não devemos procurar obter mais do que probabilidades.

“Muitos homens cometem o equívoco de substituir o conhecimento pela afirmação de que é verdade aquilo que eles desejam […] É importante aprender a não se aborrecer com opiniões diferentes das suas, mas dispor-se a trabalhar para entender como elas surgiram. Se depois de entendê-las ainda lhe parecerem falsas, então poderá combatê-las com mais eficiência do que se você tivesse se mantido simplesmente chocado.”

Perto do fim de sua vida, Russell foi entrevistado pela BBC. Na ocasião, ele disse:

“Eu acredito que quando morrer, irei apodrecer e nada do meu ego sobreviverá. Mas me recuso a tremer de terror diante da minha aniquilação. A felicidade não é menos felicidade porque deve chegar a um fim, nem o pensamento e o amor perdem seu valor porque não são eternos.”

Pelo jeito, Russell alegava não temer a morte e, por isso, deve ter morrido feliz, o que não diz nada de tão real sobre essa falta de temor.

Pensar na própria mortalidade com coragem não protege contra a morte, mas tranquiliza a consciência de seus efeitos acuadores. Uma frase famosa e irônica de Russell diz respeito ao destino humano final:

“A maior parte das pessoas prefere morrer a pensar; na verdade, é isso que fazem.”

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