Ninguém morre de amor

Ninguém morre de amor

Imagem de capa: Maksim Toome, Shutterstock

Depois de certo tempo você percebe que por mais bonito que seja o amor, ele é vulnerável e pode acabar. Por isso há que se cuidar do amor. Ter cuidado com as palavras, pensamentos e ações. Não permitir que qualquer um se aproxime e possa entrar com seus palpites e soluções. Resguardar a intimidade e relevar os desencantos. Celebrar as alegrias e dissipar o pranto.

Depois de certo tempo e alguma vivência, você também percebe que ninguém morre de amor. Que o fim de uma relação pode doer, machucar, deixar marcas profundas. Mas a gente sobrevive. A gente sobrevive e se torna mais resistente. A gente sobrevive e aprende a buscar novas alternativas para a dor do presente. A gente sobrevive e, com sorte, volta a querer amar de novo.

Ninguém morre de amor. É certo que virão saudades e lembranças, recordações e esperanças, mas é preciso seguir em frente.

E pra seguir em frente é preciso sepultar o amor de antes. Enterrar bem fundo para que não ressuscite com falsas esperanças. Chorar o fim de um tempo, se vestir de luto, encontrar no meio do caos um reduto.

O amor morreu, mas você não. E isso tem que ser o bastante para você querer todas as coisas que lhe fazem sorrir. Pois o que machuca não pode lhe definir. O que magoa, não pode lhe conduzir. O que partiu, não pode lhe destruir.

Ninguém morre de amor e você também não vai morrer. Eu sei que está doendo muito agora e disseram que o tempo cura tudo, mas você sente que não está curando nada. É que cada um tem seu próprio tempo de recuperação, mas ela acontece, mais cedo ou mais tarde, deixando uma cicatriz tão visível quanto foram as lembranças. Uma cicatriz que irá coçar de vez em quando, mas nunca mais irá doer como antes.

Por fim, me lembrei de Caio Fernando Abreu e sua sabedoria. Da frase em que ele diz: “Se algumas pessoas se afastarem de você, não fique triste, é a resposta da oração “livrai-me de todo mal, amém.””

De vez em quando a gente quer “morrer por dentro” porque uma relação chegou ao fim. O que a gente não enxerga são os presentes que a vida nos reserva. Presentes que podem vir da descoberta de que perder alguém foi a melhor coisa que nos aconteceu.

Então sejamos gratos por quem se despede e por quem permanece. Pela oportunidade de sairmos modificados, mas ainda assim inteiros, do fim de uma relação. Pelo dom de superarmos as ausências, faltas e falhas do amor. E pela bênção de aos poucos reconhecermos as mãos de Deus nos livrando de todo mal…

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Tudo o que eu não quero

Tudo o que eu não quero

Imagem de capa: Izabela Magier, Shutterstock

Posso não saber tudo o que eu quero ainda para a minha vida – sei que é muito coisa! -, mas sei exatamente o que eu não quero:

Eu não quero que os meus desencantos com o mundo me tornem uma pessoa triste e apagada.

Eu não quero que o não realizar de alguns sonhos me deixe desmotiva e sem esperanças.

Eu não quero que a rotina me torne “automatizada” e me cegue para as maravilhosas simplicidades da vida.

Eu não quero ser aquela pessoa amargurada que repele as outras pessoas apenas com o seu olhar mal-humorado.

Eu não quero ser aquela pessoa sempre aflita em razão dos graves problemas mundiais, tais como a fome, as guerras e a violência disseminada.

Eu não quero ser aquela pessoa “carregada” por absorver as energias negativas dos outros e se angustiar demais com as dores e mazelas alheias.

Eu não quero ser aquela companheira paranoica com a possibilidade de ser traída, passando a vida a desconfiar de cada olhar do parceiro e vigiar cada um dos seus atos.

Eu não quero ser aquela mãe que transfere para os filhos as suas frustrações com a vida, sendo rude desnecessariamente, ou não suficientemente amorosa.

Eu não quero ser aquela pessoa esgotada emocionalmente e sem energia para nada por não se dar a atenção e reservar o tempo que, induvidosamente, merece só para si.

Eu não quero ser aquela pessoa frustrada por dar demais aos outros e se colocar sempre em segundo (ou terceiro, ou quarto) plano, não sabendo impor limites de forma a se preservar.

Mas também não quero ser aquela pessoa que olha apenas para o próprio umbigo, não sabendo o que é empatia e não tentando contribuir, de alguma forma, com a construção de um mundo melhor para todos.

Eu não quero ser “saco de pancada” de quem quer que seja, sendo aberta demais a ponto de receber todo o “lixo psíquico” alheio.

Eu não quero ser aquela pessoa que não tem amigos de verdade por sempre desconfiar das intenções alheias.

Eu não quero ser aquela pessoa comedida em tudo, guardando amor, dinheiro e alegria para serem gastos no futuro, talvez quando não tiver mais condições.

Eu não quero ser aquela pessoa lembrada por ser arrogante e convencida, que se sente superior aos outros.

Mas também não quero ser aquela pessoa que abaixou a cabeça para todo mundo, por achar que os outros sempre eram melhores e mais merecedores.

Eu não quero ser aquela pessoa que se arrependerá, no futuro, pelo que não fez porque teve medo de dizer “não é isso o que eu quero”, teve vergonha de ousar, não se jogou de cabeça naquilo que a sua intuição apontava.

Eu não quero ser aquela pessoa que vive pensando no “e se…”, cogitando outras hipóteses para tudo o que já passou.

E também não quero ser aquela pessoa que não vive o presente por estar sempre ansiosa com o futuro, por tudo o que pode vir a acontecer.

Eu não quero ser aquela pessoa que se acomoda em uma vida medíocre e não realizadora, por crer ser mais estável ou por ficar preocupada com o que os outros vão achar.

Eu não quero ser aquela pessoa que deixa a oportunidade de viver um grande amor passar batido, por temer se arrepender depois se não der certo para sempre.

Eu não quero ser aquela pessoa sem paixão, sem tesão, sem entusiasmo pela vida, acomodada em uma felicidade de faz de conta.

Eu, definitivamente, não quero ser aquela pessoa que chegou ao fim da sua vida e percebeu que não teve coragem de arriscar o necessário para promover as mudanças que a tornariam plena e realizada.

E, por não querer nada disso, é preciso parar de deixar para depois a necessária reanálise da vida e a efetiva definição das atitudes a serem tomadas, para ontem…

Afinal, quem garantirá que amanhã ainda haverá tempo?

Trouxa é quem insiste em dar uma de esperto

Trouxa é quem insiste em dar uma de esperto

Imagem de capa: SAKARET, Shutterstock

Vivemos em tempos que os ditos sentimentais, honestos e intensos são chamados de trouxas. Não poderíamos estar mais enganados. O verdadeiro trouxa não saber dizer a verdade, não sabe ser carinhoso, empático e gentil. Trouxa é quem insiste em dar uma de esperto para cima nós, sinceros de coração.

É cada vez mais comum ver essa onda crescente de piadas sobre trouxices. O amor que deu cano é o principal deles. Por quê? Desde quando ser carregado de bons sentimentos, significa estarmos dando um passo para trás no quesito esperteza? Quando foi que trocamos valores sólidos por essa concorrência efêmera do quanto menos sinto, mais ganho? Alguns adoram bater no peito com orgulho para gabarem-se por terem se livrado de uma furada amorosa. Mas a troco do quê? Metades, inverdades e um leve toque do fingir ser quem não é. Isso não é ser esperto, mas trouxa do mais alto finesse.

Quem diria que um dia estaríamos aqui, pontuando os descaminhos dos nossos corações, e com tantos distanciamentos e friezas? Não, não podemos permitir isso. Não somos trouxas e os que tiverem a certeza do contrário, um até logo estampado na ponta dos lábios.

Gostamos da simplicidade. Somos inteiros e tratamos com verdades os possíveis desdobramentos de vindouros relacionamentos. Não medimos importâncias sobre como devemos nos comportar porque, sem nenhum medo de transbordarmos felicidades, entendemos que o melhor é enfrentar as consequências de um mundo despreparado para os sentimentais do que continuarmos vivendo nessa leva dos espertinhos e mentirosos. Os verdadeiros trouxas, lembrem-se.

O maior afrodisíaco de uma relação é uma alma escancarada

O maior afrodisíaco de uma relação é uma alma escancarada

Imagem de capa:  Sjale, Shutterstock

O maior afrodisíaco que pode existir em uma relação é uma alma escancarada. Não há nada mais belo, mais sedutor, mais atraente do que alguém completamente despido em suas miudezas, aberto em sua loucura, completamente vulnerável, ansiando para ser tocado, fisgado por um abraço, preso em um olhar.

Todo relacionamento profundo depende da abertura das pessoas presentes na relação. Dessa maneira, é necessário que as almas estejam escancaradas, a fim de que haja profundidade para o mergulho. Caso contrário, a relação será superficial e, por conseguinte, incompleta.

Acho que nós, mais do que ninguém, sabemos disso, afinal, em quantos relacionamentos nos sentimos completamente despidos, sem joguinhos, arrodeios e medo?

Eu sei que é bem verdade que quando nos colocamos de maneira totalmente desarmada em frente a alguém, há o grande risco de nos machucarmos ou de não sermos correspondidos. No entanto, procurando o prazer sempre há o risco de tropeçarmos na dor. Sendo assim, é preciso que estejamos dispostos a nos arriscar, já que não se envolver profundamente com alguém por medo, como diria Sean, personagem de Robin Williams, no filme Gênio Indomável, é apenas uma superfilosofia que garante que você nunca irá conhecer ninguém de verdade.

Somente almas escancaradas são capazes de mergulhar na loucura, não a psiquiátrica, mas a que permite que todos os pecadinhos, os segredos, as esquisitices, as coisas bobas sejam reveladas. Ou seja, a loucura que permite a eclosão do próprio sujeito, o qual se transforma a partir do mergulho nas profundezas de outro ser. Um mergulho na essência do humano, da intimidade e, portanto, bálsamo do divino.

Desse modo, quando há a libertação dos medos e nos entregamos, com a alma completamente nua, acontece o encontro que alegra, lembrando Spinoza. Nesse espaço colocado entre duas pessoas enlaçadas sem nenhum subterfúgio, acontece o gozo, o prazer, o delírio, a perda da própria consciência, a imersão em uma órbita superior, em que não há limites para o voo, pois todas as limitações terrenas se esvaem na medida em que sentimos a manifestação do divino.

Acontecem os refluxos da alegria, o aumento da potência de ser e, acima de tudo, sentimos por instantes que somos capazes de criar um escudo contra a morte, porque criamos memórias compartilhadas e estas são eternas, porque existem no espaço secreto onde as almas se beijam e o tempo não passa.

A conversa, o toque, podem até existir em qualquer relação, todavia, é apenas quando sentimos que temos a nossa frente uma alma escancarada que conseguimos interpretar cada palavra e perceber a sua poesia, inclusive, a do olhar, que mesmo em silêncio, é capaz de fazer as denúncias mais subterrâneas, como se houvesse um canal ligado diretamente à alma, uma janela aberta sem nenhum tipo de cortina.

Sendo assim, o maior afrodisíaco que pode existir é uma alma escancarada, entregue e vulnerável, capaz de sentir cada dedo penetrando, acariciando e envolvendo cada célula do corpo, pois o maior prazer que existe em uma relação é perceber que em meio a tanta superficialidade, há um lugar no mundo onde podemos encontrar luz e calor para descansar nosso corpo e acordar nossa alma.

Sobre amores e sorvetes derretidos: quando você insiste em querer mais

Sobre amores e sorvetes derretidos: quando você insiste em querer mais

Imagem de capa: Milles Studio, Shutterstock

Algum lugar do mundo, 03 de janeiro de 2017

O que é toda essa inconformidade com o amor que não vingou? Por que está tão difícil aceitar que não era para ser? A ladainha já sei de cor, a mente tem certeza, mas o sentimento insiste em fisgar. Na barriga, na garganta, nos olhos que pesam e, porventura, lacrimejam.

O “E se…” golpeia dez vezes por dia. Não luto. Tento focar no presente. “E se…” já morreu, eu sei. Não me culpo. Já aconteceu antes e sobrevivi. O coração tem seu próprio relógio. Lá no fundo da dor, existe paz, sei que vai passar. Gostaria que fosse logo. Fico triste quando vejo o coração em luto, sendo que todos continuam a amar por aí.

– Coração, fique em luto pelo que realmente vale a pena.

Mas ele me olha, como uma criança desolada pela bola do sorvete casquinha que acabou de espatifar no chão após a primeira lambida.
– Existem outros sorvetes, outros sabores. Até mesmo iguais a esse que acabou de derrubar.

Não adianta. Ele lamenta incrédulo. Queria aquele sorvete ali que está no chão. Já o queria antes de tê-lo, quis imensamente quando o provou e agora o quer ainda mais. Agora que ele está perdido e o calor que aliviaria continua castigando. E se culpa. Foi falta de cuidado? Foi a lambida descalibrada que o empurrou para o outro lado? Ou foi a mão que entortou enquanto o ouvido se distraiu com o passarinho que cantava?

Mesmo não sendo o rei da razão, até mesmo o coração sabia que não valeria a pena ir ao chão, para tentar saborear o que sobrara daquele sorvete. Em primeira instância, até teve esse impulso, mas desistiu ao vê-lo sujo de terra e com os cabelos brancos do senhor da banca de jornal que caíram naquela manhã. A vida ajudou e tratou de derretê-lo rapidamente. A chuva veio e lavou o chão melado. A gordura restante, o cachorro cuidou de acabar.

Só teve uma coisa que a vida não conseguiu apagar: aquele gosto da única lambida dada. Aqueles dois ou três segundos que gelaram a língua, ativaram as papilas gustativas e refrescaram o corpo e a alma. Essa memória, o bendito coração não quer deixar ir. Abraça-a com força. E tem certeza que o resto do sorvete seria tão bom quanto aquele lapso de prazer.

Tudo bem, já disse, eu respeito. Dou o tempo que ele quiser. Fique ai na sua lamúria… Só digo uma coisa: que sorvete mais indigesto! Uma lambida e não se consegue engolir mais nada há mais de mês. Imagine se fossem dois litros tomados.

– Só para que eu possa entender melhor: qual é sua esperança, coração? Espera ganhar a máquina que produziu o alvo do seu deleite? Gostaria, então, de tomar sorvete, até sentir o estômago doer e o cérebro congelar?

E o coração não tem a resposta. Só sente. E, em prece, pede ajuda para livrar-se de tudo aquilo. Ou melhor, pede ajuda para querer soltar a saudade. Pois não quer.

Coração, o que você quer não é sorvete à vontade. Tampouco foi o gosto que o prendeu. Você quer é sentir novamente aquela sensação. Aquela primeira lambida. O gelado na língua descendo pela garganta naquele dia de sol. A glicose entrando no seu sangue e deixando-o eufórico. Aquela plenitude, enquanto o doce ainda não enjoara e o peso na consciência por burlar a dieta ainda não batera. A verdade é que pouco importava naquele momento o sabor do sorvete. Aquela primeira lambida com gosto de quero mais é que o deixou assim. E, agora, mal concebe a ideia de experimentar outros sorvetes, deixando evidente o gosto amargo na língua. Cismou que aquele caído era o melhor do mundo.

Mas, escute, em um argumento consigo convencê-lo do contrário. Talvez seu sorvete até tivesse potencial de ganhar um prêmio regional ou outro, não fora por um óbvio detalhe. Não era firme. Derreteu com o calor do ambiente e do seu corpo e espatifou ao chão. E, veja, não se trata de algo irrelevante. Consistência é um requisito imprescindível a um sorvete de boa qualidade.

Coração… Amigo… Chore o quanto quiser pelo sorvete derretido. É fácil apegar-se às primeiras lambidas. Assim como ao primeiro gole de água quando estamos com sede. Mas não se esqueça de ir limpando o paladar. A gente nunca sabe os sabores inéditos que a vida fabrica. E, acima de tudo, saiba que existe um sabor cujo gosto ainda não provou, mas que jamais será superado. Sabor este que não enjoa, não derrete, nem faz mal, e que guarda aí dentro de ti.

“Você tem que aprender a levantar-se da mesa quando o amor não está mais sendo servido.”
Nina Simone

Por que diabo todo canalha pensa que é Deus?

Por que diabo todo canalha pensa que é Deus?

Imagem de capa: ArtFamily, Shutterstock

É um clássico. Está na história, vive se repetindo: a maior característica de um patife é conceder a si mesmo o direito de decidir sobre a vida do outro. Ditadores inalcançáveis ou criminosos rasteiros, todo bandido pensa que é Deus. Quem mata, explora, subjuga e pratica qualquer mal acha mesmo que está fazendo “o que é certo”. Não tem o menor pudor de abusar do que julga ser o seu poder para tal.

Pode reparar. De boa intenção o discurso de um canalha está cheio. Covardes, valentões, linchadores, assassinos, exploradores e outros crápulas estão sempre matraqueando por aí o quanto são decentes e lapidares. Ora se gabam de sua honestidade porque declaram o imposto de renda, crentes de que realizam uma proeza e não apenas uma vulgar obrigação, ora esgoelam seu apoio à polícia, abominam a corrupção na política, defendem a moral e os bons costumes. Tudo nos conformes.

Depois, ao se sentirem “provocados”, não têm o menor receio de fazer justiça com as próprias mãos. Como se a sua pré-anunciada “perfeição” lhes desse salvaguarda para fazerem o que bem entenderem, inclusive agredir e até matar a ex-esposa, culpada por não respeitar a obrigação matrimonial de obedecer ao marido. Em pleno século vinte e um, ainda estamos na idade média.

Sim, eu estou fazendo uma generalização. Perdão, universo, mas todo assassino acredita mesmo ser Deus. Quem mata outra pessoa está brincando de senhor da vida e da morte. E quando a vítima é alguém que simplesmente ousou valorizar a própria vontade ao abandonar uma relação que de amor já não tem nada, aí o absurdo é maior ainda.

Em qualquer casamento, quem manifesta o desejo de se separar tem o direito de fazê-lo e o outro tem o dever de aceitar. É assim e pronto. Tentar impedir alguém de seguir em frente é perversão, crime, indecência, prática de cárcere privado. Fosse o mundo um lugar mais razoável, quem não aceita uma separação a ponto de agredir ou matar o outro seria trancafiado como bandido hediondo.

Verdade é que o mundo não aguenta mais tanto idiota metido a senhor de tudo e de todos. Tem muita gente má circulando por aí, esguichando veneno em caminhões-pipa, metralhando bobagens por todo lado como franco atiradores. Quem é mau anda piorando sem culpa e sem vergonha de bancar o mocinho, defensor da moral e dos bons costumes. Para compensar, quem é bom de verdade, quem se importa com o outro tanto quanto consigo mesmo tem obrigação de fazer alguma coisa boa.

A quem ainda resta o mínimo de decência, é urgente tomar partido e bater o pé contra a cultura segundo a qual um ser humano não tem o direito de terminar uma amizade, um namoro ou um casamento quando bem entender. Gente não é objeto da vontade alheia nem propriedade privada de ninguém. Logo, canalhas e assassinos não podem seguir brincando de Deus por aí.

“A vida começa todos os dias.”

“A vida começa todos os dias.”

Imagem de capa: Sunny studio, Shutterstock

“A vida começa todos os dias”
Érico Veríssimo

Mais um ano terminou e, inevitavelmente, começamos a retrospectiva interna. Foram tantos sonhos rabiscados em papéis avulsos com as cores da esperança, tantos desejos que ficaram para trás e se transformaram em frustração. Não queremos olhar novamente aquele projeto que não vingou, aquele amor que era só de fachada, aquela amizade que era puro interesse.

Pois é, a vida tem dessas coisas, mas a vida é, principalmente, resposta do que fazemos, e às vezes, somos bobos demais, cedemos espaço antes de saber o que é, se é de verdade ou não, se há alguma reciprocidade do outro lado, se é somente coisa passageira, que cumpre o ciclo e esvoaça.

Mas não é para se angustiar não, somos nós que mudamos as coisas de lugar ou as devolvemos para o lugar de origem. A nossa potência está na capacidade de reviravoltas incríveis, mesmo quando tudo diz não e não há claridade. Sonhos não possuem data de validade e podem ser ressonhados com detalhes maiores, com estratégia, paciência e determinação.

As chances sempre estiveram aí, por todo lado e em lugares não imaginados. Só precisamos ter cautela e consciência de que tudo tem hora certa para acontecer e nem sempre coincide com o prazo desejado. Sempre é hora de resgatar aquele desejo que grita por dentro. Eu sei, a gente cria expectativa e se imagina já com aquela possibilidade concretizada do jeito que sonhamos, com todos os adornos de nossas esperas, com toda gente que sonhou junto e fez do nosso sonho o deles também. Mas, não se culpe por ter criado a expectativa. Faz parte esperar com tanta força. Só não podemos deixar que o esperar se torne um desesperar.

Sofrimento e sonho são duas atmosferas distantes e distintas. A espera é a certeza de que algo foi feito com esmero. Dentro desse lugar onde o sonho repousa enquanto vai ganhando consistência, também existe lugar para outros voos, outras incursões e ousadias. Tentar mais uma vez quando tudo parecer desastre e ruína, de novo e sempre que cair.

Não é para provar nada para ninguém. Não se trata disso. A potência sempre esteve dentro e não importa se é virada de ano, está tudo aí. Já iniciamos um novo ano, mas essa é só mais uma alavanca nesse mundo de possibilidades que é estar vivo. “A vida começa todos os dias”.

Ao invejar ao outro, o invejoso investe contra si mesmo

Ao invejar ao outro, o invejoso investe contra si mesmo

Imagem de capa: Phovoir, Shutterstock

Ninguém está imune a ela, mas todo mundo finge estar. Entra ano e sai ano e a inveja, o mais inconfessável dos pecados capitais, ainda tira a paz e o sono de muita gente.

A inveja é um impulso primordialmente destrutivo, pois é normalmente acompanhada por um desejo de aniquilação, de sofrimento e nunca é construtiva.

Quem explica é a psicóloga e psicanalista Heloisa Antiori. Para ela, a inveja elimina a admiração. “Quando admiramos alguém temos a possibilidade de nos identificarmos com ela e desejar ser igual… ou em parte igual. A inveja quer destruir, fazer o outro virar pó e não reproduzir”, diz, antes de comentar que é comum ao invejoso sentir-se injustiçado pela vida, ao acreditar que o outro tem o que tem “por sorte e privilégio, não por esforço”.

Inveja é não querer que o outro tenha. Pelo menos é assim que a maioria dos especialistas estudados e ouvidos a definem.

A grande teórica do assunto é a psicanalista Melanie Klein (1882-1960), aluna e discípula de Freud que se dedicou já na década de 20 a estudar a psicanálise infantil. Seu livro “Inveja e Gratidão”, lançado na década de 50, é até hoje um marco.

Klein argumenta que a inveja está presente já na primeira infância, quando a criança inveja o seio da sua progenitora, o poder de dar e de negar alimento. Nesse contexto, a inveja surge logo que o recém-nascido percebe-se impotente perante a mãe. Ou seja, praticamente nascemos invejosos.

Foi a partir dessa publicação pioneira que a inveja passou a ocupar maior espaço na discussão científica, passando a despertar cada vez mais interesse como objeto de estudo e possibilitando discussões mais amplas e aprofundadas.

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Fotografia: Ollyy, Shutterstock

O INFERNO DOS OUTROS

O escritor e jornalista Zuenir Ventura investiu alguns anos de sua vida pesquisando sobre o tema e o resultado pode ser visto no ótimo livro “Inveja: Mal Secreto” (Objetiva, 1998), onde investiga o seu funcionamento no cotidiano, expondo casos interessantes, contados por gente de diversas áreas.

O livro de Zuenir traz dados interessantes. Segundo uma pesquisa feita pelo Ibope, com o intuito de ajudá-lo em sua árdua tarefa, a inveja é o pecado mais conhecido dos brasileiros. No entanto, é curiosamente o menos cometido, pelo menos é o que dizem os entrevistados. É que, segundo os dados coletados, 73% deles diziam conhecer o pecado da inveja, mas 84% responderam que nunca o haviam cometido. A conta não fecha, mas a vida segue.

“Esses resultados desconcertantes (…) tinham na verdade uma explicação, pois resumiam o que a literatura dizia: as pessoas conhecem o pecado, mas negam que o praticam”, escreveu o autor.

Zuenir também chama a atenção para outros fatos interessantes em seu livro. Por exemplo, o modo como separamos inveja de admiração.

“Na inveja, se o outro possui uma bondade, essa será negada pelo invejoso. Será enfocada como uma qualidade perdida, principalmente quando não se possui essa qualidade. Os invejosos concentram-se no desejo de destruir aquela qualidade que o vizinho possui”, diz a professora e psicóloga Lideli Crepaldi. “A admiração espontânea é substituída para remoer o que não existe ou conjecturar como extinguir o que existe.”

A equação é simples. Quanto mais distante de mim, mais “admirável” e quanto mais perto, mais invejável.

“Invejamos aqueles que navegam nas mesmas águas e que não levam grandes vantagens sobre nossos talentos”, escreveu o escritor português João Pereira Coutinho, em sua coluna na Folha. O psicanalista iniciante não inveja Contardo Calligaris, mas o vizinho que também trabalha em uma clínica. O escritor iniciante não inveja Valter Hugo Mãe, mas o colega que conseguiu publicar um livro antes dele. A cantora de bar não inveja Elis Regina, mas a moça que fechou contrato com a mesma casa de shows por mais tempo que ela.

O VERDADEIRO INIMIGO

A inveja constitui uma cegueira seletiva. Ela veta o acesso ao que nós temos de melhor e nos direciona sempre para o que achamos que o outro tem de melhor. É isso que demonstra o professor e sociólogo Leandro Karnal em uma interessante palestra sobre o tema para o instituto CPFL.

O invejoso é aquele que tem dificuldade em lidar com os próprios fracassos. Ele é infeliz porque não consegue pensar naquilo que tem. E é por essas e outras que a tal da envidia é considerada uma patologia grave – ela destrói a autoestima.

“A inveja faz as pessoas pararem no princípio, antes de realmente começar, de forma a não poder seguir para caminho algum”, afirma Lideli. “Quando invejamos, escolhemos contra nós mesmos.”

A cura para este mal tão secreto quanto estrutural pode estar então no exercício de olhar mais para si mesmo; de reconhecer os próprios limites e a própria capacidade. Além disso, o invejoso “precisa deixar de odiar esse outro ‘imaginário’ que ele supõe ser culpado por seu destino e dor”, indica Heloisa.

Em época de início de novos ciclos, o conceito socrático de conhece-te a ti mesmo se faz necessário, urgentemente necessário. Pelo visto, neste ano que chega, precisamos nos conhecer mais e nos desprezarmos menos.

Ela é certeza e não importa o que o mundo pensa disso

Ela é certeza e não importa o que o mundo pensa disso

Imagem de capa: Helen Sushitskaya, Shutterstock

Enquanto o mundo vive em desassossego, ela vai na contramão dos sentimentos banais. Ela é felicidade em todos os instantes. Ela é inteira e não aceita metades em troca. Ela dança entre o caos da cidade e dos meios carinhos. Ela já foi dúvida um dia desses, mas hoje, não mais. E o melhor? Ela não se importa com o que o mundo pensa disso.

Ela é encanto enquanto fala e versos quando escuta. Ela é muito mais mundo de manhã. Não perde tempo remoendo passados, não se atreve a ficar esperando futuros. Ela é presente no sentido imperfeito, mas verdadeiro. Entrega sorrisos sem medidas, abraços sem tempo de duração e amores permissíveis para o sempre. Ela exala vida das mais cheirosas, cativantes e entusiastas. O mundo não sabe lidar com ela. Quem chega ausente de disposição, também não sabe o que fazer com ela. Mas tudo bem. Cá para nós, ela não faz questão de ser aceita. Ela não precisa de autorização para ser. Ela não pede. Ela pega e vai. Ela bebe prazeres, dorme com a cara estampando tranquilidade no travesseiro e, na hora de sair, coloca o que bem entender no seu corpo errante de desejo.

Ela é independente dos julgamentos alheios e dona de si. Não brinca em serviço, não amolece no dia a dia e, muito menos, não chega atrasada no que diz respeito aos próprios anseios. Ela é dessas figuras raras que você encontra uma vez na vida e nunca mais esquece. Porque ela é irresistível de estar por perto. Porque ela conversa com a alma nas mãos transbordando pelos dedos. Porque ela dá saudade antes mesmo de acenar qualquer adeus.

Ela não vacila ou corre atrás dos indecisos. Ela não se acomoda ou desiste dos seus sonhos. Ela é certeza e não importa o que o mundo pensa disso. Para ela, o mundo é grande demais para caber apertado no coração.

Amizade no amor…

Amizade no amor…

Imagem de capa: GeniusKp, Shutterstock

É claro que os nossos amores devem ser nossos amigos (muitas vezes, são os melhores!). Contudo, é fundamental não permitirmos que a paixão se esvazie com o passar do tempo, de modo a restar, apenas e tão somente, uma boa amizade…

Talvez um dos maiores desafios dos relacionamentos amorosos longos seja não virar amizade. Não que o casal não deva ser amigo um do outro (pelo contrário, isso é essencial!), o problema é quando o relacionamento vira amizade demais e paixão de menos.

Claro que já ouvimos falar que a paixão arrebatadora dura apenas “x” anos, que depois o que sobra – se é que sobra – é apenas o amor, que pessoas inteligentes devem saber lidar com isso (ou seja, com a falta da sensação de andar nas nuvens), etc., etc., etc., mas, analisando a coisa bem a fundo, vemos que não é tão simples assim.

Ora, evidente que não podemos sentir pelos nossos namorados, companheiros ou maridos apenas o que sentimos pelos nossos pais, amigos e irmãos! Por mais lindo e profundo que seja esse amor, por mais companheirismo que exista e por mais que a relação seja legal e gratificante, para um relacionamento amoroso efetivamente se manter e ser verdadeiro, tem que haver paixão sim, nem que não seja aquela sensação tórrida do início, nem que não seja de nos fazer perder a noção, nem que seja um tantinho só…

E, nesse contexto, o tempo é o principal vilão, pois com o seu passar as pessoas tendem a se acomodar, a se acostumar com a presença do outro, a não se importar mais em surpreender, a não vê-lo como objeto de desejo, a não investir, de alguma forma, para “manter acesa a centelha”.

Não é raro vermos pessoas públicas assumirem que seus casamentos, aparentemente perfeitos, terminaram de uma hora não por brigas, falta de afinidade ou traições, mas simplesmente por ter virado amizade, apenas e tão somente.

E esse tipo de término deve ser muito triste, pois o rompimento se dá com uma pessoa que significou – e ainda significa – muito na sua vida, com a qual você tem muitas afinidades e que é sua parceira para muitas horas (senão todas). Mas, como todo fim inevitavelmente traz dor – especialmente quando se estima a pessoa da qual se está separando -, deve ser muito complicado lidar com a situação e com a amizade que poderá sobrar, se é que ela se sustentará.

Acredito que devemos, pois, em defesa do mais nobre dos sentimentos, nos negar a aceitar que todos os amores românticos tenham prazo de validade, que os que duram uma vida inteira inevitavelmente viraram apenas uma boa e profunda amizade, que não há nada que possamos fazer para que “a pessoa da nossa vida” seja nossa paixão pra sempre.

A questão, então, é como não deixar que o “amor de amantes” vire um “amor de amigos”. Dicas não faltam, profissionais das mais diversas áreas palpitam de diferentes formas acerca do assunto, mas, na prática, nada é tão fácil como parece. Uns dizem para ter mais intimidade, outros dizem que ela – a intimidade em demasia – é a culpada pelo desencanto, e por aí vai… E o tempo, que quase sempre é um bálsamo, nesse caso é o vilão.

Maturidade, consciência da real situação, expectativas diminuídas , disposição em fazer a coisa dar certo e dedicação bem dosada parecem fazer parte da receita de sucesso. O resto, se alguém descobrir, que ganhe o Nobel…

Lembranças dançarinas

Lembranças dançarinas

Imagem de capa: Jorge Henrique Paul e Rafael Ariza Gonçalves

Pode ter sido a brisa morna da tarde; ou a corrente fina de suor a traçar um desenho carinhoso na linha perfeita de sua nuca; ou ainda, quem sabe, a languidez provocada pelas carícias da areia fina por entre os dedos de seus delicados pés.

O fato real, aqui descrito, mais pela impossibilidade de ser recolhido do que pelo desejo de vê-lo revelado, é que ela era toda descuido e elegância ali, diante daquele amarelo esverdeado das folhas secas que o vento trazia, à moda de uma ciranda em torno de suas pernas esguias.

Mais parecia uma escultura, daquelas torneadas, com firme delicadeza, que só as mãos de um artista apaixonado são capazes de esculpir. Os olhos miúdos, de um verde esmaecido pelas incontáveis lágrimas de doces alegrias ou ácidas tristezas, piscavam diante do tempo.

O tempo. Esse parceiro decidido e apressado, que segue seu curso a passos resolutos e desinteressados de nós. O tempo não se envolve em nossas imprudentes aventuras; apenas observa. O tempo é pano de fundo dinâmico e independente, que zomba de nossa infantil ilusão acerca da eternidade.

A eternidade parece ínfima naqueles momentos de glorioso amor: o roçar dos lábios no primeiro beijo, os olhos que se cerram no momento do prazer, o calor das bochechas de um filho recém-nascido, que tocam o seio; o curvar dos sorrisos à toa, que enchem a vida de cores que nem existem de fato.

Essa mesma eternidade parece infinita nos momentos intermináveis de dor: a ruptura de um amor partido, a desilusão de um sonho acalentado, a fragilidade do corpo cansado e curvado pelas moléstias da vida, o adeus, a partida, o abandono.

Todas essas memórias, travestidas de lembranças ou presságios, pareciam dançarinas à sua volta. As mãos, miúdas, de pele fininha e desenhada pelas marcas das lidas, torciam-se, num gesto que tanto podia ser uma prece, quanto uma coreografia de anseios.

Ela estava ali para se despedir. Dizer um adeus desajeitado à mulher que fora um dia. Sussurrar um até breve às inúmeras personagens a quem dera alma e corpo. Murmurar boas vindas às imagens coloridas ou desbotadas, misturadas num caleidoscópio de histórias que teimavam em escapar de suas lembranças.

Ela estava ali, num ato de reverência a si, à sua história, que parecia escoar por entre seus dedos, qual água de uma fonte que não jorra mais. Por um instante, ficou atordoada. O que viera mesmo fazer ali?! Passou as mãos pelos cabelos prateados e finos; alisou a saia com gestos inseguros. Buscou na bolsinha um espelho antigo e firmou-o à sua frente. E a imagem que se projetou pareceu-lhe levemente familiar. Tão leve que voou para longe. Lembranças dançarinas, qual lagartas transmutadas em borboletas leves e de vida breve.

Texto publicado originalmente no livro “Velhice, imagem e memória” – Organização de Geni Araújo Costa – Editora Assis

Lista de prioridades: sumir, viajar sem destino, cair no mundo

Lista de prioridades: sumir, viajar sem destino, cair no mundo

“Fernweh” é uma palavra alemã cujo significado não encontra correspondência em um vocábulo específico da língua portuguesa e que traduz um desejo de fugir, viajando por aí. Trata-se daquela vontade de sumir de tudo e de todos que muitas vezes nos acomete, quando nossa paciência se esgota, quando o tédio se instala, quando nada mais parece ter sentido à nossa volta, quando nosso mundo cai e não conseguimos visualizar alguma saída.

Os homens, desde sempre, encontram-se suscetíveis de se encontrarem desgostosos com o mundo, descontentes consigo mesmos, enredados em vidas com as quais não se identifica, limitados pelas obrigações que a vida impõe, perdidos em meio ao cotidiano robótico e frio de horas que se arrastam. O desejo de fuga, então, torna-se inevitável, o que direciona cada um de nós a determinada válvula de escape, seja ela benéfica, inofensiva, ou até mesmo perigosa.

Certas pessoas se voltam às artes, à música, outras escrevem, lêem, assistem a filmes, algumas recorrem a drogas, ou seja, cada um se vira ao seu modo e cada um colhe as consequências pelo que escolheu. Ah, mas o desejo de sair por aí sem destino, mochila nas costas, mapa nas mãos e nada na cabeça pode ser tomado como algo quase natural e parte da vida de quase todos que conhecemos.

O ser humano é capaz de pensar, de forma ilimitada, de sentir o mundo sob variadas sensações, de projetar o futuro, fazer planos, sonhar o que quiser. Ao mesmo tempo em que a realidade tenta nos limitar, nossos pensamentos nos tornam cada vez mais inconformados com o que é estanque, com o que se repete sempre da mesma forma. Queremos mais, precisamos de algo maior, desejamos conhecer o que vai além dos nossos quintais. É algo que pulsa dentro de nós.

Na verdade, usar do escapismo com frequência, como se fosse uma necessidade constante ausentar-se do que se encontra ali em frente, pode ser um aviso de que é hora de mudar. Mudar de emprego, mudar de amigos, de ambientes, de roupas, de pensamentos, mudar de vida. Pode ser a nossa essência querendo desatar as amarras com que a sufocamos dentro de nós. Um pedido de socorro que só a gente é capaz de ouvir.

Nem sempre somos nós mesmos que provocamos os desagrados que pontuam nossa jornada, pois quem caminha conosco também pode ser a causa de alguns dissabores que enfrentamos, porém, sempre será necessário refletirmos sobre o que estamos fazendo de nossas vidas, a quem queremos agradar, o que de fato queremos alcançar e a que custo. Porque, caso o problema esteja tão somente dentro de nós, mesmo que estejamos em casa, mesmo na praia, na neve, em Paris, ele nos acompanhará.

Viajar é uma delícia, pois renova nossos olhares, nossos sentidos, nosso amanhecer, alargando nossos horizontes e oxigenando nossos pensamentos e, muitas vezes, olhar as coisas a uma distância segura pode acabar nos trazendo de volta ao que já tínhamos com mais segurança e verdade. Mas, se o que incomoda estiver dentro de nós, somente o enfrentamento doloroso de nossa vida poderá nos levar às mudanças urgentes e necessárias. E sem gastar dinheiro.

Nota: Falando em viagem, que tal uma viagem com aventura em Ilhabela?

Imagem de capa: EpicStockMedia, Shutterstock

Lugar de mágoa é nos cotovelos. No coração a gente sente amor.

Lugar de mágoa é nos cotovelos. No coração a gente sente amor.

Imagem de capa:  FCSCAFEINE, Shutterstock

Dói, sim. A gente quando se magoa sente dor. Tem mágoa que dói mais, mágoa que dói menos, mas sempre dói. Ninguém está livre de se esborrachar aqui e ali. Acontece. Agora, depois do tombo, cabe a cada um de nós cuidar da dor no lugar que lhe é direito.

E lugar de mágoa não é no coração, não. É nos cotovelos. É lá que deve doer toda decepção e todo desarranjo, todo recalque e todo desgosto. Nos cotovelos. Deixemos o coração para o amor!

O amor e seus sonhos de grandeza, seus ímpetos, suas ansiedades, o amor e seus frêmitos, seus desejos insuspeitados, o amor e suas lembranças, suas saudades e até suas tristezas inevitáveis, o amor e seu eterno querer bem vivem no coração da gente e não merecem o aborrecimento de dar de cara com dissabores que deviam latejar à vontade em outro canto.

O coração é dos amantes e suas histórias. As mágoas e os ressentimentos, esses deixemos doer em paz lá embaixo, lá atrás. Nos cotovelos. Deus nos ajude a não guardar chateações no coração. Quando elas chegarem, sejamos capazes de despachá-las sem burocracia para o lugar certo.

Vem, gente amiga. Deixemos doer os cotovelos quando assim tiver de ser. Que doam sem dó. Estalem doloridos, façam bolhas, avermelhem-se, esfolem-se e criem cascas! Nós aguentamos!

Mas que o amor se aposse generoso de todo canto vazio no coração da gente. Porque é lá que se guarda e se sente todo profundo, verdadeiro e generoso amor. E as dores que fiquem no cotovelos!

O amor não requer provas e sim atitudes

O amor não requer provas e sim atitudes

Carência em excesso é muito desagradável, bem como indiferença constante chega a ser cruel. Equilibrar os sentimentos, as emoções, tentando sobreviver ao dia-a-dia caótico dessa vida louca e acelerada a que nos sujeitamos, sem nos machucar ou ferir quem está ao nosso lado, será um de nossos propósitos. As obrigações e responsabilidades crescentes não podem nos desviar da manutenção da afetividade que nos completa.

Por conta dessa excessiva carga de trabalho e do cansaço que nos deixa inertes ao chegar do trabalho, muitos de nós nos sentimos mal, pois temos consciência de que estamos deixando de lado os cuidados para com os nossos queridos. Chegamos exaustos e sem vontade de nada, quando não estressados em razão dos dissabores enfrentados no dia. Com isso, tentamos compensar essa ausência emocional com presentes, com o que o dinheiro compra, mas que não preenche vazio afetivo.

Sim, é gostoso receber flores, ver a casa pintada, os jardins floridos, os móveis reluzindo, o carro novinho na garagem. É bom jantar em lugares refinados, viajar, poder olhar para um closet volumoso. O conforto material é muito importante, isso não se nega, porém, somente isso, apenas o que se vê e massageia nosso corpo não será capaz de nos preencher em toda a dimensão de nosso íntimo, de nossas necessidades afetivas.

Somos carne e essência, temos olhos e temos alma, uma alma que também clama por ser acariciada. Não basta somente ter alguém, precisamos sentir esse alguém, saber que ele se importa, que somos parte de sua vida, que seus olhos nos procuram, que suas mãos nos tocam, que seu amor é nosso. O que nos certifica o amor é a maneira como o outro sorri quando nos vê, é o tanto de verdade que vem junto com quem trazemos para nossas vidas, é o comportamento amoroso sem fingimento e afetação. É transparência.

Ainda que o cansaço extenue nosso ânimo, mesmo que o corpo se arraste, até quando nada deu certo naquele dia, chegar a nossa casa disposto a relembrar o quanto somos amados e queridos ali naquele reduto só nosso nos tornará sempre capazes de nos reerguermos e de nos fortalecermos. Porque amor correspondido é combustível de vida, amor que transpira certezas vence as dores da alma, pois é chama que não se apaga, é a eternidade brilhando dentro de cada um de nós.

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