Desconfie de quem nunca sai do sério

Desconfie de quem nunca sai do sério

 

Não é preciso ter formação em Psicologia para saber que todos temos nossos momentos de desequilíbrio, seja sozinhos ou na frente de quem for, quando explodimos incontrolavelmente, soltando o verbo. Por mais que seja necessário evitar destemperos em frente a quem não tem nada a ver com isso, existem momentos em que nada mais é capaz de conter tudo aquilo que precisa sair de dentro de nós.

É fato que devemos sempre tentar manter a calma diante das atribulações, não descontando nossos problemas nos outros, rindo de nós mesmos, porém, muitas vezes nos vemos em meio a situações que nos testam os limites da paciência de uma forma tão intensa, que qualquer resquício de racionalidade acaba caindo por terra. Cada um se desequilibra com mais ou menos intensidade, mas todos – ou quase isso – iremos explodir, mais dia, menos dia.

Parece que os rumos que as sociedades vêm tomando contribuem ainda mais com o desequilíbrio emocional de todos. Assistimos, de tempos para cá, à crescente intolerância para com o diferente, à sobrevivência do racismo, à cultura do status, do egoísmo, ao esvaziamento ideológico, à corrupção que cresce junto com a crise financeira. Assistirmos ao noticiários tornou-se um exercício de paciência, diante de tantas injustiças e misérias contidas em cada reportagem.

No plano da convivência social, está cada vez mais difícil às pessoas manter o respeito e o entendimento, para um convívio harmônico. Isso, em grande parte, é consequência dessa dificuldade de muitos em aceitar que nem todo mundo vai agir conforme querem, pois as verdades de cada um são de cada um e não da maioria, tampouco podem ser tidas como absolutas. E então a elevação da voz e a agressividade substituem a argumentação ponderada. 

No entanto, mesmo que não seja o desejável, existirão momentos em que teremos de deixar extravasar, gritar, enfrentar o outro, chutar o balde, dizendo o que está entalado na garganta, doa a quem doer. Muitas pessoas não têm senso de limite e teremos de deixar bem claro a elas qual é o nosso. Por essa razão é que causa estranhamento encontrarmos alguém que nunca sai do sério, nunca se desequilibra, nunca eleva a voz, mesmo em meio a uma discussão acalorada. Uma pessoa tão fleumática, em toda e qualquer situação, acaba passando a imagem de alguém sem sentimentos e frio, embora isso nem sempre corresponda à realidade.

Por isso, quando necessário, dê-se a oportunidade de gritar por seus limites, de bradar pelos seus direitos, de externar seu descontentamento com veemência, de indignar-se contra atitudes aviltantes, de lutar por suas verdades, pois, às vezes, é só assim que espantamos de nossas vidas tudo aquilo que nos faz mal. Às vezes, é só assim que não nos sufocamos por dentro e respiramos aliviados enquanto caminhamos rumo à realização de nossos sonhos.

Imagem de capa: Reprodução

Que delícia usar o silêncio quando o outro espera que você grite

Que delícia usar o silêncio quando o outro espera que você grite

Enquanto vivermos, estaremos sujeitos a sermos contrariados por pessoas, por acontecimentos, imprevistos, pela vida. É assim e sempre será, desde que nascemos, até nosso último suspiro. Somos várias pessoas nos encontrando e nos desencontrando em ambientes variados, cada uma com seus pensamentos, objetivos e visões sobre o mundo. Inevitável, portanto, trombarmos com quem em nada concordará conosco, ou até mesmo com quem adore azucrinar a paciência alheia.

Infelizmente, existe muita gente cuidando da vida do outro. Seremos questionados sobre o porquê de não namorarmos, de ainda não termos nos casado, de não termos filhos ou de termos determinada quantidade dos mesmos, sobre o porquê do porquê do porquê, e, pior, por pessoas que mal nos conhecem. Ou seja, muitos nem interesse sincero terão por nossas vidas, estarão apenas curiosos mesmo.

Da mesma forma, muitas pessoas farão observações desagradáveis e incômodas sobre nós, deixando-nos desconfortáveis. Haverá quem dirá que engordamos, que envelhecemos; haverá quem nos censurará e nos julgará pelo modo de vida que escolhermos; haverá quem nos repreenderá por alguma atitude que tomarmos. Incrivelmente, mesmo que nosso comportamento não lhes afete de maneira alguma.

Seremos testados, em vários momentos, por pessoas destemperadas, seja em relacionamentos, no serviço, em casa, na escola, seja na vida. Muitos criam tempestades e, em vez de tentarem sair delas, desejam trazer para debaixo de seus raios e trovões quem estiver por perto. Não se percebem, jamais se responsabilizam pelo que eles próprios provocaram, culpando o mundo, vitimizando-se e espalhando discórdia por onde estiverem.

Caberá a nós manter o controle, o equilíbrio, para que não nos permitamos adentrar a doença do outro, para que não nos molhemos sob tempestades que não são nossas. Teremos que tentar ajudar quem estiver pronto a ouvir, porém, o silêncio será sempre a melhor resposta a quem espera e aguarda pelo nosso destempero, pois assim é que neutralizamos todo o mal que nos rodeia. Isso é maturidade e autopreservação. É sobrevivência.

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A felicidade só é possível para quem acredita nela.

A felicidade só é possível para quem acredita nela.

Há dois ditados populares muito comuns, acredito que todos já tenham ouvido pelo menos uma vez na vida, são eles: “Ah, isso é muito bom para ser verdade” e ” Quando a esmola é grande, o santo desconfia”. Essas frases tão carregadas de crença são verbalizadas por muitas pessoas ao se perceberem diante de um acontecimento feliz. Ou seja, muitas pessoas, ao serem abençoadas, ao invés de encherem-se de gratidão e agradecerem, elas nutrem o sentimento de que aquelas bênçãos chegaram em suas vidas de forma acidental. Em síntese, elas simplesmente recusam a felicidade. Tenho visto isso nos mais variados contextos. Pessoas que conseguem pagar suas dívidas dizendo: “não acredito que agora terei meu salário integral”. Outras que conseguem uma promoção no trabalho, dizem: “isso não é possível, esse santo quer reza”…e tantas outras atitudes semelhantes. Embora eu não possua embasamento científico para tratar disso, eu acredito que por trás dessas crenças limitantes expressas nesses ditados populares, exista uma espécie de temor da felicidade, talvez associando-a a algo pecaminoso. É delicado tratar disso, mas é muito comum percebermos nas falas de algumas pessoas a crença de que só quem sofre recebe a misericórdia de Deus. Provavelmente a raiz dessa percepção esteja vinculada à religião. Sabe aquela história de voto de pobreza? Enfim, não quero me aprofundar na temática religiosa. O que aprendi com muita clareza, após desconstruir uma série de crenças limitantes, é que a gratidão atrai prosperidade, e a prosperidade a que me refiro aqui não é somente aquela relacionada às condições financeiras e materiais. Refiro-me à prosperidade como um todo. É vivermos com qualidade e sem culpas por estar tudo fluindo bem em nossa vida. É entender que merecemos um amor que encha o nosso estômago de borboletas ao invés de encher nossa cabeça de grilos…(risos). Precisamos aprender a atrair a felicidade para as nossas vidas e uma das formas é expressando gratidão a cada momento que algo bom nos acontece. A felicidade precisa ver em nós pessoas que a querem por perto, somente dessa forma, ela ficará à vontade para ser nossa aliada. Parece estranho, mas existem pessoas que se sentem culpadas por estarem bem. É como se isso fosse errado, sabe? São pessoas que não sabem lidar com o próprio bem estar, sentindo um profundo desconforto quando os problemas dão uma trégua. Apesar de ser muito difícil compreender, é uma realidade, muitas pessoas sentem-se mais “felizes” quando estão mergulhadas em problemas, pois elas acabam atraindo a piedade alheia. Sim, para muitos, serem vistos como “o coitado” é algo acolhedor, algo próximo de uma ostentação. São aquelas pessoas que adoram falar sobre doenças reais ou imaginárias nas filas dos bancos e das padarias, por exemplo. Pessoas assim acabam obstruindo o canal do bem estar e da felicidade em suas vidas. Possivelmente elas pensam: “se estiver tudo bem comigo, quem vai sentir pena de mim?” Então, querido(a) leitor(a), caso você deseje ser feliz e próspero e, ao mesmo tempo, tem esse comportamento de “achar estranho quando algo bom te acontece”, sugiro que desconstrua essas crenças bloqueadoras e tome posse de tudo de bom que possa receber de Deus, da vida, do universo, das circunstâncias, enfim. Para tomarmos posse de uma bênção em nossa vida, é indispensável que nos vejamos como merecedores dela, do contrário, essa bênção irá buscar as vidas que a busquem com convicção. A dica é simples: quando algo bom chegar em suas mãos, festeje com a alma, com toda a intensidade e mais bênçãos chegarão. Seja feliz, querido(a) leitor(a).

Imagem de capa: WAYHOME studio/shutterstock

“Senta aqui e vamos falar de nós”

“Senta aqui e vamos falar de nós”

Sentimentos deveriam ser mais às claras, da gente saber o que se passa, e ter certeza do que sente, sem firula. Mas nem sempre é assim. Se relacionar pode parecer um pouco ousado quando os sentimentos são colocados à prova num território desconhecido . Nesse caso, é bom pedir um mapa.

Adivinhar o que o outro pensa e tirar as próprias conclusões pode ser um caminho bastante perigosos se você não é vidente ou não tem uma boa de cristal. Cada ser humano é um universo, e estamos aqui para nos relacionar e aprender um com outro.

Pedir um mapa é pedir para que o outro te guie por meio do diálogo. Quando iniciamos uma relação com alguém, várias dessas questões surgem a todo o momento. Estamos conhecendo mais profundamente o outro ser humano, buscando entender suas motivações, reações, expectativas em relação aos dois e a tudo.

Buscamos nos encaixar nesse universo de imperfeições querendo ambos uma harmonia. E pra que dois se entendam é preciso mais que química.

“Senta aqui e vamos falar de nós”. Essa temática deveria existir sempre na vida do casal. Se não sempre que precisar, a cada 7 dias, por exemplo, para deixar tudo entendido, sem achismos.

É mais provável que assim os caminhos se encurtem e as coisas se ajeitem. Nada como um bom diálogo a dois para deixar duas cabeças mais próximas.
Mas, receio que não é muito disso que acontece de fato… O que acontece mesmo são as ações tomando lugar das palavras, abrindo brechas para o subtexto, sub entendimento no sub onde reside a paranoia.

As atitudes sem palavras agem de forma solta, abrangente, dizem muito sobre tudo e não são especificas em nada. Elas abrem para muitas interpretações, demonstram um turbilhão de pensamentos, emitem ruído e por isso muitas vezes podem não ser compreendidas pelo receptor.

É importante dialogar. Afinal estamos falando de dois territórios humanos desconhecidos – quer algo mais complexo que isso? – Saber o que o outro está sentido e buscar compreender suas motivações emocionais é maturidade emocional. É escolher entre ignorar ou comprar uma briga, gritar ou melhorar os argumentos, é buscar a melhor saída para aquilo que muitas vezes foge do nosso controle. Resolver dilemas e dificuldade reconhecendo suas forças e fraquezas, sendo competente para lidar com seus sentimentos e com do outro buscando dessa forma eliminar qualquer dificuldade emocional. Veja, é controlar, entender, codificar e não reprimir.

Quando somos tomados por sentimentos fortes como raiva, ciúmes, ficamos burros emocionalmente… falamos coisas que realmente não sentimos, agimos com imaturidade, descarregamos uma carga de emoção desnecessária a alguém muitas vezes gostamos muito. Depois de ter passado o tsunami emocional, bate a uma ressaca emocional que dá mesmo dor de cabeça e te deixa num ambiente bastante bagunçado.

Não é fácil controlar emoção. Mas acredito que o diálogo é a chave mestra para evitar desentendimentos. Quando duas pessoas gritam uma com a outra é porque os corações estão distantes, elas não estão se ouvindo. Por isso o diálogo consiste em vozes baixas, quase ao pé do ouvido, deixando os corações falarem, se ouvirem.

Abrir-se para o diálogo não só fortalece relações como nos dá clareza, nos traz conhecimento, aprimora relações e amplia nosso entendimento. É pra isso que estamos aqui nessa existência, para aprender a nos relacionar!

Por isso, ganhe tempo, ganhe vida. Sentimentos não resolvidos gastam energia desnecessária, deixam a mente cansada, não abre espaço para coisas boas fluírem livremente. Elas realmente ocupam espaço. Elimine o que atormenta por meio do diálogo. Qualidade de vida também é aquela que cultivamos na nossa mente. Uma mente livre e em paz transforma a vida. Mais vale a compreensão a dois que um dilema desnecessário por falta de diálogo.

Imagem de capa: YuryKo/shutterstock

Escolha suas companhias – prefira gente do bem!

Escolha suas companhias – prefira gente do bem!

Preserve com você pessoas de bem com a vida, que são boas de papo, de riso solto, de olhar amigável. Fique junto de quem fala com verdade, e quando fala, olha nos olhos e não te medem de cima a baixo.

Pessoas dessas são joias da vida. Tem atitudes de amor, sabem se expressar com elegância e gentileza, e tem beleza interior. Se por acaso encontrar uma pessoa dessa, por favor, deixa-a ficar. Permaneça com ela e deixe-se afetar.

A gente precisa mesmo cultivar gente que tem verão no sorriso, tem paz no espírito e sabe como viver bem, se resolvem na vida sem passar por cima de ninguém. A gente aprende muito com elas. São sinceras mas não são rudes, e carregam consigo uma bagagem de humildade e bondade.

Não, elas não são bobas, elas sabem como lidar com adversidades e pessoas com maldade. Elas não andam por aí enganchadas, elas sabem como se preservar. Reconhecem quem é de verdade e é luz para os que não são. Passam deixando marcas e levam sempre o que há de bom. Elas sabem respeitar o espaço alheio e não há invasão nem imposição. Existe uma liberdade em estar perto delas.

Do contrário, não perca seu tempo com quem não é assim. Pessoas negativas, que usam palavras agressivas, só reclamam da vida e não sentem gratidão não acrescentam, sugam. Estas vivem numa prisão que elas mesmas construíram, muro por muro. Não sabem ser pontes. E dessas tem de monte…

Pessoas que falam demais e não sabem o que dizem, não trazem humildade, elas não olham nos olhos, elas medem com o olhar. E é assim que a gente reconhece esse tipo de pessoa, o olhar as entrega. Elas não trazem verdade.

Pessoas assim, podem estar muito próximas de nós, podem ser nossos parentes, colegas de trabalho e mesmo assim você não precisa ser leal por pura conveniência, afaste-se. Seja no máximo referência mas não cultive laço. Não irá te fazer bem e você poderá sentir uma exaustão física e mental além do normal. Você tem direito de escolher as pessoas que deseja se relacionar.

Para esses casos, vibre amor. O que faz mal ao nosso corpo e mente não deve ser alimentado, deve ser remediado. Deseje o bem e não se deixe afetar pela reação que ela irá tomar pela sua distância. Cuide de você. Escolha bem suas companhias.

Como uma lâmpada acesa, gente do bem atrai todo tipo de pessoa – aquelas de energias afins e aqueles hipnotizadas pela luz. Quem é esse tipo “lâmpada”, é importante saber se manter luz, sempre, para ajudar e guiar; Peça proteção e não se perca nas influências.

Gente que é do bem se sente de longe, não precisa nem perguntar. Almas bonitas criam logo empatia. E se você encontrar alguém que te coloca pra cima e te faz feliz, deixe essa pessoa entrar na sua vida; É com essa que você deve andar! No mais, seja luz e deixe o mundo se contagiar.

Imagem de capa: Dima Aslanian/shutterstock

Sobre fins do mundo…

Sobre fins do mundo…

Mal a gente começa uma história, já vai instalando dentro da gente aquela coceirinha para saber, prever, intuir ou controlar o que vem depois. A gente vive brincando de mago, adivinho ou vidente da própria sorte. Ansiosos. Somos ansiosos.

Ansiamos pela próxima página, mesmo antes de termos aberto completamente o livro. Ansiamos por acordar enroscado nos braços de um amor, mesmo antes de saber se é tão bom quanto parece, adormecer em sua companhia. Ansiamos por aquilo que não temos e que, por alguma razão tola ou desconhecida, nos parece ser definitivamente indispensável.

Colocamos valores exagerados na conta das perdas que tivemos, das dores que nos fizeram encolher à noite na cama, dos fracassos que nos roubaram o fogo da fé em nossa própria capacidade. E assinamos recibos pesadíssimos sobre essas contas, numa manobra arriscada de apostar contra a nossa própria felicidade e a favor do nosso apego à perfeição que escraviza.

O medo do fim nos envolve tanto, que os começos passam em velocidades estonteantes, os meios se dissolvem em águas turvas e revoltas dos pensamentos acelerados e os pontos finais caem qual meteoritos desgovernados em rota de colisão com os nossos sonhos.

Teimamos em tecer teorias de aniquilação material para esse mundo que nos rodeia e abriga, como se esse lugar bendito de moradia fosse um organismo, cuja vida se desenrola numa dimensão paralela, fora de nós.

Como somos tolos. O universo inteiro é um organismo vivo e pulsa, palpita e respira no mesmo ritmo que cada uma de nossas células dança dentro de nós. Cada mínima gota de vida contida em toda água do oceano, carrega em si mesma a nossa ancestral luta para fugir da sina de apenas sobreviver.

Buscamos entender a luz, a escuridão, o frio que corta, o fogo que aquece. Descobrimos que há luzes que cegam mais poderosamente do que a mais retinta das escuridões; que há escuridões que são pausas benditas e bem-vindas a nos embalar no colo e fazer adormecer; há friezas que nos atingem com a indiscutível e transformadora missão de nos incomodar, de nos tirar da calmaria morna da mediocridade; e há chamas que, de tão intensas, nos reduzem a cinzas, e transmutam nossa matéria original em sumo bruto, caldo de vida para que um outro embrião seja gerado e nutrido.

Insistimos nessa visão fantasiosa e infantil de que seremos atingidos por uma bola de fogo redentora, uma reação venal da natureza que chegará para nos igualar a todos, e de tal forma, que não haverá nenhum de nós destinado a sobreviver.

Mas… sabe… o fim do mundo somos nós… a cada vez que trocamos um abraço de corpo inteiro por algo que possa ser possuído; a cada vez que desistimos de um sonho porque é cômodo e menos trabalhoso apenas reclamar; a cada vez que ignoramos um olhar aflito do outro, porque enfiamos na cabeça que precisamos nos proteger e isolar.

E, de verdade, é preciso mesmo que esses mundos acabem. O mundo da posse, da desesperança e da indiferença. Que acabem de forma avassaladora, a ponto de não restar uma única poeirinha dessa ladainha rançosa e triste. E que venha um mundo inédito, onde seremos mais aptos, enfim, para pararmos de enfiar pregos em nossa própria cruz.

Imagem de capa: hikrcn/shutterstock

Aceita que dói menos

Aceita que dói menos

É difícil aceitar algumas verdades. Elas doem, sangram e machucam a gente. É difícil enxergar aquilo que não queremos ver. É difícil viver situações exaustivas, mas abrir os olhos para a realidade pode nos salvar.

Comumente a gente idealiza a vida como uma festa bonita, com música, alegrias, amigos, amores e felicidade. Mas é só a gente passar pela porta para perceber que as coisas não são bem assim.

Não quero dizer que não vai ter felicidade, dança, apoio, companheirismo, amor. Não, nada disso, só estou dizendo que em alguns momentos as coisas vão ficar bem longe disso.

Continuar dançando quando a banda parou, viver na negação, fechando os olhos para aquilo que está ali, bem na frente da sua cara, nunca será a melhor opção.

Pergunte a qualquer um qual é o seu infortúnio e você vai ver que todos estão passando por situações complicadas. A diferença está na forma como cada um age diante das dificuldades.

Se a grama do vizinho é mais bem cuidada, certamente, é porque ele está atento às ervas daninhas que, vez ou outra, tentam criar raízes por lá também. A grama do vizinho não é mais especial que a minha ou que a sua. A grama do vizinho é o resultado de como ele lida com as oportunidades e adversidades da vida.

Aceitar é o primeiro passo para mudar, para transmutar a dor em algo que possa servir de lição e consolo. Aceitar não quer dizer que você vai se entregar e engolir um monte de sapos. Não, nada disso, aceitar é tomar consciência da situação para agir diante dela com assertividade.

Uma pessoa assertiva, psicologicamente falando, apresenta um comportamento equilibrado diante das situações, não agindo com submissão ou agressividade.

Apenas lembrando que podemos agir de quatro formas distintas diante do que nos surge: podemos ser passivos, agressivos, passivos-agressivos ou assertivos.

De acordo com a psicologia, agir de modo seguro e confiante é ser assertivo e pessoas assertivas sabem identificar quais ações são mais apropriadas para determinados momentos.

A boa nova é que eu posso ser assertiva e você pode ser assertivo, basta querer. Mas para trilhar esse caminho antes precisamos aceitar nossa condição, por mais arrasadora que nos pareça e buscar um novo ponto de vista, uma nova solução ou forma de agir.

Precisamos nesse ponto ser meio “Dráuzios Varellas”. Eu explico. Quando alguém estaciona muito próximo ao carro do médico ele não pensa duas vezes em dar a volta e entrar pela outra porta. Algo que é sim desconfortável, afinal há um freio de mão no meio do caminho, mas que resolve mais do que reclamar, xingar ou ter um ataque de fúria, coisa que só traria mais dor de cabeça.

As razões e culpas pelo que nos acontece, podem ser concretas, mas não resolvem as coisas. O ideal é que a gente enxergue o inevitável com bons olhos e se poupe daquilo que é irremediável.

Acompanhe a autora no Facebook pela sua comunidade Vanelli Doratioto – Alcova Moderna.

Atribuição da imagem: pexels.com – CC0 Public Domain.

A diferença entre vontade de amor e amor por vontade

A diferença entre vontade de amor e amor por vontade

A vontade de amor é produto da sensibilidade pura que move o ser para um objetivo consciente, de acordo com sua personalidade – está na égide do empoderado afetivo que oferece sem precisar pedir. O amor por vontade é consequência da insensibilidade, incerteza emocional e superficialidade – está na égide do miserável afetivo que só mendiga e não sabe doar. Um se tem; pelo outro se é tido.

O “Eu te amo” do miserável esconde um “Por favor”, um vazio desesperado para ser preenchido. O “Eu te amo” do empoderado revela um “Obrigado”, uma gratidão essencial que o mantém feliz e protege.

Amar a vontade significa ser controlado por ela, enquanto a vontade de amor estabelece uma força que não encontra resistências.

Em sua obra metafísica conceitual Ethics, Benedict de Spinoza afirma que a essência de amar é uma “potência de agir”. O frágil admite-se como tal pela verdade da sensibilidade que busca, sinal de que não a encontrou em absoluto e está no caminho certo, dado que seu encontro final marcaria o início de um declínio de potência. Quanto mais ressonância com o mundo, mais amor se sente, porque a razão se torna ela mesma e a liberdade dos sentidos está sendo direcionada. Em vida, a redução e aumento da energia sensível se dá em processo ininterrupto que pode ser ilustrado por um pêndulo – ele oscila para lá e para cá, sem nunca chegar a uma extremidade.

Em cada ser há uma reserva energética de vontade que suplanta o próprio amor verdadeiro, mas essa reserva não é como um gerador que se usa em casos de pane geral no sistema, mas um ideal da imaginação, produto da inteligência humana.

É tranquilo administrar o poder de amar quando as coisas estão indo bem – em casa, no trabalho, nos estudos e no lazer. Mas a validez do amor também se mede no caos, na doença, no infortúnio, na desgraça, na possibilidade de ruptura. Porque alguém com legítima vontade de amar preza a reciprocidade, mas, substancialmente, não depende da boa vontade alheia e se esforça para adaptar-se a seu vazio, de forma que, mesmo se perturbado, não ousa duvidar de seu amor, sabendo que a vida às vezes lhe derrubará independente de como se aproveita dela.

Muita gente julga que a necessidade de poder no ato de amar remete a egoísmo. Mas isso se deve à concepção narcísica de poder. Todos sabem como termina Narciso, o eterno contemplador de si. O poder, no sentido de potência, é um efeito claríssimo do amor, como não?

Quem tem vontade de amor simplesmente não precisa caçá-la, porque o amor por vontade relaciona-se com o desejo e, se o desejo dita os termos da relação, está no controle, o que é um gravíssimo problema, pois gera seres possessivos de amor, efetivamente o oposto de amar. Se o homem se comporta como um caçador de emoções, não sente; e, se está sentindo, elas voluntariamente lhe vieram.

As pessoas pensam que são livres para desejar, mas é a vontade de desejo que as governa e apenas suas escolhas conscientes dão-se à liberdade; desconhecem as causas de seus instintos. Portanto, amar o desejo é uma forma de se aprisionar, e a vontade de amor (subsidiada por ações livres à sua realização) caracteriza um ser preparado para amar, não para ser livre.

O desejo de estar com alguém, por si só, não é suficiente; precisa haver respeito, mas o respeito considerado um fim em si mesmo, imune a tentações opostas de toda espécie, até mesmo à privação do desejo. Não sendo um fim, inexiste a base sólida de amor e, se este declina, o sujeito está propenso a se considerar vítima das circunstâncias.

O mito de Orfeu e Eurídice ilustra bem como o desejo incontrolável é capaz de arruinar um homem. Conta-se que Orfeu era o compositor predileto dos gregos. Sua música fazia o velho mais insensível chorar rios de lágrimas, a criança mais entediada bradar em êxtase e a mulher mais odiosa ajoelhar a seus pés suplicando para ele nunca mais interromper suas melodias. Orfeu devotava-se à arte, sem ela não existiria, mas sua maior razão de viver era a esposa Eurídice. Contudo, o destino haveria de decepcioná-lo: uma serpente venenosa e letal a picou e ela foi encaminhada para o reino de Hades, onde perambulam as almas dos mortos. Desolado, mas com esperanças, Orfeu pega sua harpa e desce até o submundo para reaver a amada. Chegando ao rio Estige, Caronte, o barqueiro que vigia a passagem, tentou barrá-lo, mas foi imediatamente hipnotizado pela canção que Orfeu lhe apresentou. Tendo ultrapassado as margens do rio, deparou-se com Cérbero, o terrífico cão protetor do inferno, mas toda a ferocidade do animal foi amansada tão logo Orfeu dedilhou sua harpa.

Quando se apresentou à Hades, o deus maligno que até então não conhecia o significado de misericórdia, Orfeu colocou em prática a música que compôs assim que soube da morte da esposa. Ela soava tão triste e melancólica que Hades, senhor dos mortos, não pôde negar que o amor naquele homem era muito mais forte do que todo seu ódio acumulado. Emocionado como nunca, concordou em libertar Eurídice do submundo, mas sob uma condição: até chegar lá em cima, à luz do sol, Orfeu não deveria olhar para a face de sua esposa. Durante o caminho de volta, Eurídice ia recuperando as forças vitais enquanto seu marido tocava a harpa, à sua frente. No entanto, o desejo de olhar no rosto da amada foi maior que a prudência em honrar o acordo com Hades. Ao chegar à superfície, Orfeu olhou para trás e, por um segundo, vislumbrou a imagem de Eurídice tal como lhe surgia nos seus sonhos mais lindos, até que uma força invisível puxou-a de volta às profundezas e de lá ela nunca mais saiu. O desejo apaixonado dominou Orfeu e, em vida, sua arte perdeu o sentido.

É uma história trágica, nada irreal. Spinoza chega a questionar: “Por que os homens lutam por sua servidão tão teimosos como se fosse sua salvação?”. Talvez por suspeitarem que as próprias forças do coração agem por livre-arbítrio e indiferentes a um condicionamento externo. Não é tarefa de um mortal resolver esse mistério.

A substância do amor por vontade, que se chama de paixão, uma vez manifestada neste mundo – com todas suas alegrias, tristezas e confusões – só pode ser resolvida neste mundo, então qualquer solução trágica não adianta, porque nesse caso vai-se embora o portador da substância, ainda que permaneça o eco de suas forças apaixonadas. A frustração mortal resulta da manutenção entrópica da irracionalidade.

O risco de perder o amor já está presente desde que ele começou; negar essa possibilidade é investir num ideal de perfeição amorosa que faz sofrer infinitamente mais do que o descaso que acarretaria a obtenção de uma garantia de qualidade afetiva ininterrupta.

Um artista plástico, para fazer uma pintura, tem que estar próximo dela. À distância eles não se conversam, não se olham, não há reconhecimento nem empatia. Toda sua intuição de nada vale se a obra estiver fora de alcance. As habilidades sensíveis esfriam conforme ele se afasta demais do fruto de sua invenção. O pintor dedica sua paixão à obra e sem ela não sabe mais quem é. Essa obsessão é positiva na arte, pois demonstra o alto nível de compatibilidade entre criador e criatura. Em um relacionamento conjugal, entretanto, a obsessão gera o efeito totalmente contrário: ódio. Porque um considera o outro como se fosse matéria de sua predileção, como coisa que vale tanto quanto tornada utilitária, como objeto de sua construção, enquanto as pessoas são todas obras inacabadas.

Ao defenderem a necessidade de controle, muitos distorcem o amor. Esse tipo de poder não é positivo, mas letárgico e ainda acusa impotência. Os impotentes, por inclinação, querem dominar, pois estão passivos de si mesmos e com medo de ser dominados. Potência é requisito da liberdade, algo que os moralistas tradicionais abominam com medo de ela ser usada para todos os fins que não o de potência.

Quanto maior o desejo de controle, menor será a percepção de união. Só que as pessoas, em sua maioria, enxergam isso como falta de firmeza, atitude dos ingênuos. Por quê? Provavelmente pela associação de que permitir a liberdade do outro significa não se importar que as coisas saiam do normal. A liberdade existirá enquanto houver regras. Todo relacionamento é uma espécie de contrato, diferindo cada um em rigor de execução. O problema é que os possessivos apelam para a chantagem emocional sobre as consequências da insubordinação, o que reflete sua desconfiança.

Dar liberdade é respeitar o fato de que cada um tem seu próprio tempo e espaço; há várias formas de fazer jus à palavra e seguir as normas de um relacionamento sem que para isso se falte com a dignidade. Nem todos merecem a liberdade que têm, e, no fim, alguns merecedores saem perdendo, mas não terá sido culpa sua.

Spinoza assevera:

“Se alguém imagina que uma coisa que ele ama é unida por outra por um vínculo de amizade tão próximo ou mais próximo que aquele com o qual ele mesmo, sozinho, possui a coisa, será afetado com ódio sobre o que ama e invejará o outro.”

O vínculo de reconhecimento afetivo concernente ao amor próprio não se compara, porque uma pessoa que se dá a transcender o afeto por outrem do de si mesmo não quer seu amado por admiração, mas deseja possui-lo para se libertar do ódio insuportável de si mesmo. É o fenômeno que acontece no homem apaixonado e com ciúme: vacilação sobre a amada somada com o ódio de um possível inimigo. A paixão o faz escravo e ele está muito feliz de sê-lo enquanto não houver outro que a possua além dele; havendo, mostra todo seu lado colérico.

Ódio, aponta Spinoza, pode ser destruído pelo amor, e uma vez que é totalmente destruído pelo amor será, então, maior do que se não tivesse sido precedido de ódio.

A mulher não consegue doar ao homem ciumento a mesma ternura do que faz quando ele não gasta tempo útil lutando contra ameaças externas do romance mas, em vez disso, valoriza-a aqui e agora. O que é muito difícil para um homem apaixonado entender é que, se ele diz que luta contra inimigos (por ciúme) para proteger a sua amada, de fato quer proteger-se da própria insegurança, partindo do pensamento de que ela não tem força e autonomia para se defender por si mesma. Isso ofende a mulher. Estando ela convicta da relação, lutará para se desvencilhar dos que pretendem prejudicá-la; não estando, ele saberá.

Se o ciúme tem motivo real, o homem tomará as devidas providências ao descobrir, não antes. Ocorre que muita paranoia ronda quem precisa apossar-se da amada para fugir do espectro da solidão e do ódio.

Nada dura para sempre, inclusive o desejo. Mas por que quem ama de verdade parece sentir a sua eternidade e não quer largá-la?

Em 1901, Bertrand Russell, honorável escritor britânico, vinha de um casamento de sete anos com Alys Smith, seu primeiro amor. Em um dia gélido de outono, ele escreveu em seu bloco de notas:

“Saí para andar de bicicleta em uma tarde e, de repente, enquanto pedalava por uma estrada rural, percebi que não mais amava minha esposa Alys. Até aquele momento, não tinha ideia de que meu amor por ela estava enfraquecendo. O problema apresentado por esta descoberta foi muito grave. Desde o início do nosso casamento, convivemos na mais próxima intimidade possível. Sempre compartilhamos uma cama e nenhum de nós precisou dormir em um quarto separado. Conversamos abertamente sobre tudo que nos aconteceu… Eu sabia que ela ainda estava devotada a mim. Eu não desejava ser indecente, mas acreditava, naqueles dias, que nas relações íntimas é preciso falar a verdade.”

A verdade que abateu Russell naquela tarde não lhe era nada conveniente, mas o britânico não conseguiu escondê-la; dizia muito sobre sua vontade de amor. Alys era extremamente ciumenta e controladora. Manipulava os amigos e familiares mais próximos de Russell para tê-lo em tempo integral. Embora alimentasse a discórdia com sua insegurança, dizia amá-lo profundamente. Eles ficaram juntos mais alguns anos, até que o casamento atingiu um ponto insustentável. Russell se apaixonara por outra pessoa e, como não era propenso a trair, disse à ex-mulher que precisava ir embora, dessa vez sem volta.

Tempos depois, Alys se casou com outro homem. Num surto de sinceridade, lúcida e visivelmente desapegada daquele ciúme, escreveu mensagem para uma amiga:

“Bertie era um companheiro ideal, ele me ensinou mais do que eu jamais poderei pagar. Nunca fui inteligente o bastante para ele, e talvez ele fosse muito sofisticado para mim. Eu estive idealmente feliz por vários anos, quase delirantemente feliz, até que uma brusca mudança de sentimentos tornou nossa vida mútua muito difícil. Uma separação final levou ao divórcio, quando ele se casou novamente. Mas isso foi realizado sem amargura, brigas ou recriminações. Minha vida foi completamente alterada e nunca mais consegui encontrá-lo novamente por medo da renovação da minha terrível miséria.”

Muitos casais vivem anos e anos em um relacionamento possessivo simplesmente porque não imaginam uma vida sem o outro. Estão tão apegados à outra pele e insensíveis às injustiças entre si que suas manifestações de desamor acabam despercebidas e, pior, justificadas pelo desejo de posse. Um dito de Russell aborda o dilema crítico entre esconder uma mentira para não ferir o outro e dizer a verdade para manter a dignidade na relação:

“De todas as formas de cautela, a de amor é, talvez, a mais fatal para a felicidade verdadeira.”

A perspectiva do abandono é tão terrivelmente evitada e, devido às condições instáveis no mundo atual, agigantada, que a genuinidade na comunicação de sentimentos se tornou quase que uma ameaça à apropriação da felicidade, e por isso os casais mais felizes costumam dizer que o silêncio de um é ouvido pelo outro e não há segredos que, compartilhados, causariam mais estragos do que a sua omissão.

Não adianta ter vontade de amar se ela não for aplicada do modo correto, e isso exige o entendimento de que as pessoas não serão exatamente as mesmas amanhã do que foram ontem. Amar uma pessoa significa compreendê-la, e isso requer aprendizado constante. Quem age com preguiça sobre o amado pode desaprender-se dele, colocando o próprio amor em risco, e depois não terá direito de reclamar. A melhor forma de nutrir a relação é gostando de aprender, e, com a devida experiência, aprender a gostar: amor.

Muitas pessoas caem no erro de julgar como péssimo um relacionamento antigo que, enquanto durou, foi maravilhoso – simplesmente porque teve fim. Pior ainda se acabou sem uma razão convincente: pensam que não devia ter acabado. Assim, elas trocam a lembrança de todos os pequenos eventos positivos que lhes permitiram ficar juntos (saudade) pela cicatriz de não mais vivê-los (melancolia). Por outro lado, se o relacionamento era tóxico e terminou, mesmo que de forma violenta, vê-se isso com alívio. Um relacionamento ótimo terminado sem motivo é intolerável, deixa mágoa; um relacionamento abusivo terminado de forma consciente deixa as pessoas livres para amar novamente, pois permitiram a resiliência ao aceitar o perdão.

Há os que dizem “Segue o baile”. Mas não existe paranormalidade. A música não tocará sozinha, alguém deve se predispor a organizar o ambiente para que se dance nele. A importância de um bom planejamento é subestimada. “Deixe fluir”. Deixar fluir é uma coisa, não fazer nada e esperar acontecer é outra.

O discurso de abandonar a filosofia do carpe diem (viva o presente) para adotar o senso visionário (crie o amanhã) somente é óbvio para quem considera que o tempo de amadurecimento é o mesmo para todos. Não é. Esse moralismo até ajuda a tomar partido do que realmente importa para sustentar afetos, mas a troco de muita ofensa e hipocrisia.

Há quem adore nadar na liquidez e superficialidade. Não é uma lei da vida que se deva substituir o descompromisso libertário pela relação privada e segura. Porém, existe uma tendência inevitável de, com o passar dos anos, a pessoa ir trocando liberdade por segurança, por dois motivos principais: medo da solidão e percepção da finitude da vida.

As melhores coisas na vida acontecem naturalmente, com base em espontaneidade, a qual produz o ser feliz. Dizem que para tudo há uma primeira vez. Besteira. O mundo não corresponde a todos os anseios do homem, é responsabilidade deste significar o mundo; forjar as suas respostas, em vez de aguardá-las.

Muito se confunde o ato de cuidar e ensinar responsabilidades (próprio dos educadores) com controlar e tolher a individualidade do outro (próprio dos doutrinadores). Muitos responsáveis dizem que controlam para proteger. Às vezes, suas intervenções são realmente necessárias. Mas há casos em que interferem indevidamente. A perpetração inflexível da disciplina transforma vigilância em hábito e seus dependentes estarão sendo treinados para acreditar que a divergência de opiniões é um entrave à sua formação, que atitudes destoantes da tradição cultural são estranhos e perigosos à ordem, e o resultado são mais fantoches pertencentes à massa de manobra.

Muitos pais obrigam os filhos a adotar comportamentos idênticos aos seus apenas para dizer aos outros como se sentem portentosos pelo que se tornaram e causar inveja naqueles que estão sob sua má consideração. Que honra há nisso? Ser homogêneo é a coisa mais fácil que existe.

O jardim do vizinho só é considerado mais verde se faltou carinho e dedicação da parte do invejoso. Nada a ver com diferença de talento. Não é a beleza das plantas que chama a atenção, mas o esforço em criá-las; não o senso de competição, mas a necessidade de buscar referências para o próprio desenvolvimento.

Legiões de crianças praticam a atividade do livre pensamento, mas a maioria dos educadores as reprova por esse hábito, já que, segundo seu modelo pedagógico de mundo, não há nada de novo sob o sol e as tentativas de questionamento da obediência são sujeitas à patologização. Como resultado, essas crianças crescem sem personalidade, achando que um mundo estranho as cerca e que devem ter um parafuso a menos na cabeça, não se identificando em lugar nenhum. O respeito colocado como um fim libera a tentação de castrar a autenticidade do outro, tudo por causa de um amor que não é.

Não é fácil assumir toda a responsabilidade pelos ideais defendidos sem uma sensação ambígua de desamparo e arrependimento – facilmente usada como motivo de submissão aos poderes tutelares. Há, pois, certa abstenção da liberdade de pensamento para ensinar o que se quiser, em prol de uma obrigação ideológica de silenciar aquilo que não deve ser aprendido, de acordo com a segurança das massas.

A vontade de criar seres à própria imagem mostra que a cópia é preferível ao original, afinal, custa menos, mas também diminui o orgulho da criação. Ser original é um ideal que vai muito além da capacidade de aceitar seus perigos. A exclusão é um risco de ser autêntico. Talvez isso explique o fato de que, à medida que se fica mais velho e, obviamente, mais seletivo, aumenta-se o grau de invisibilidade.

O homem preocupado com o amor genuíno alia três elementos interconectados: o da razão em vias de orientar seus impulsos e desejos, o da dignidade moral através do respeito humano, e o da inteligência na busca do conhecimento.

Os homens são seres de desejo, daí a necessidade de ética. E a ética, como estratégia social de sobrevivência, não se sustenta por desejo, mas impreterivelmente pela razão que o economiza ou gasta quando precisa.

Uma das falácias mais proferidas pelo senso comum é que um ser muito racional automaticamente sente menos, que a administração das emoções é bem feita quando se deixa a razão de lado, e que quem pensa muito racionalmente carece de sentimentos espontâneos. O engano está em colocar razão e sensibilidade como inimigas. Ignorando-se o conhecimento de uma emoção, nada sobra a não ser intuições vazias. Outra falácia popular está em dar as expressões “Ter razão” e “Estar certo” como sinônimas. A verdade nem sempre está com razão.

O entendimento só existe em comunhão com a sensibilidade, porém, nem todas as emoções são inteligíveis, e ainda bem, porque, se fossem, os psicólogos cessariam suas pesquisas e morreriam de tédio.

Razão depende da sensibilidade; esta oferece as informações, aquela decide como utilizá-las. Um homem sem percepção não é capaz de fazer quaisquer julgamentos, tampouco sentir.

Certas pessoas, ao serem questionadas sobre seus sentimentos, logo respondem: “Não sei, só sinto”. Como elas podem sentir algo sem entender? O coração as informa e não precisam de mais nada? Prosa poética sem fundamento. As emoções só sobrevivem em um ser dotado de razão; recursos emocionais nas mãos de um mau senhor o fazem para o abismo. O que se demonstra mesmo é preguiça de pensar, embora o amor não tolere preguiçosos.

Pregar amorosidade é muito fácil, por isso todos o fazem, sinal de que deve ser simples. Ninguém é inteiramente bom e, se fosse, seria péssimo para o amor, pois, como arte, sua intuição só se percebe na superação do erro, com treinamento.

Os frustrados de amor são levados a pensar – por ressentimento ou depressão – que a sua vontade de amar é uma armadilha: a fuga da infelicidade que sentem. Mas, na verdade, eles temem o amor e não o estado infeliz; seu sofrimento é mal justificado. Agem como os cadáveres que temem o amor, idealizando uma vida sem sofrimento, aquela que é exclusiva dos mortos.

Charles Bukowski acreditava que o amor é tudo aquilo que não se diz sobre ele. Sim, o amor foge de todas suas definições e, enquanto se o vive subjetivamente, conforme a oportunidade, destaca-se como o mais objetivo dos sentimentos. Os livros de autoajuda continuarão vendendo que nem água porque as pessoas tendem a procurar uma alquimia infalível do amor, um atalho que facilite sua experiência. O dinheiro que gastam com esses livros roda apenas a economia e não o amor.

Dois seres humanos estão namorando. Eles têm química, combinam-se harmonicamente e o clima está favorável. Mas, se um deles perde a casa, o carro, o emprego, a saúde e as finanças zeram, o outro, em vez de ficar, foge desesperadamente para longe como se o espírito do Diabo estivesse prestes a apossá-lo. Trata-se do sentimento capitalista que Maquiavel denunciou no seu O Príncipe e Franz Kafka na sua Metamorfose: fique com a pessoa enquanto ela lhe proporciona bens materiais, conforto e prazer, mas não hesite em ir embora e desprezá-la se perceber que não terá mais essas vantagens. Amor por vontade – boa parte dos relacionamentos é assim.

A vontade de amor é o que mantém casais juntos por cinquenta, sessenta, setenta anos e, melhor, felizes, apesar das várias limitações orgânicas e desgastes no percurso. Duas pessoas idosíssimas não terão o mesmo desejo que compartilhavam em outrora, e não é por falta de querer. Mas elas não reclamam da abstinência de paixão, seria inútil. Se pudessem, gozariam dela regular e intensamente como provavelmente faziam, mas sabem que existem coisas mais importantes do que o prazer para viabilizar a longevidade de uma parceria.

Obrigada Clarice Lispector, você me ensinou muito sobre o amor

Obrigada Clarice Lispector, você me ensinou muito sobre o amor

Clarice, tuas palavras entorpecem. Para ti não há uma classificação. Não se diz escritora, mas o é de forma tão visceral que chega a causar vertigens. Não vou negar aqui que cheguei até você porque disseram-me que havia algo de Clarice em mim, mas ao te ler percebi que há algo de Clarice em todos nós.

Clarice, você viveu para buscar. Buscava sempre algo nos vazios e silêncios. Naquilo que ainda não era, mas que poderia ser. Tuas palavras são buscas, são caminhos, são veios de rios que nem sempre chegam ao mar, mas que beijam as margens com uma ferocidade brutal, muitas vezes arrastando-as para si.

Clarice, quem não busca, já morreu. A vida está nessa inquietação mansa que faz a água seguir seu curso e transformar. Quem larga mão daquilo que ainda não é, mas que pode vir a ser, deixa-se enganar pela razão e morre para as boas coisas da vida. E gente com excesso de razão é chata demais.

Gente cheia de razão não entende que você, no meio do caminho, entre uma coisa e outra, pode decidir mudar de calçada, mudar de rua, mudar de humor. Gente cheia de razão não entende que existem vários jeitos de ir. Essa gente nem desconfia que o segredo está no caminho e nos olhos que o percorrem com um interesse estrangeiro.

Então, Clarice, certo dia, eis que soube, pela vida, que você era despudoradamente amada por um homem de olhos mansos e falar macio. Então eu te vi ressurgir em festa, esplendorosa, sublime, viva, declarando, em outras línguas, com seu ar enigmático: amo e sou loucamente amada!

Esse homem, Benjamin*, tirou a poeira de ti. Fez brilhar teus olhos. Traduziu teu sotaque. Pegou tuas mãos e te devolveu o mundo. Libertou-a do exílio que era essa nossa terra. Só quem ama pode dar o mundo, Clarice. Só quem ama sabe ler as verdades por trás de parágrafos que resumem, tão friamente, uma grandiosa vida.

Você, Clarice, sem saber, ao encontrar o amor, nesse hiato tão particular que te cabe, nos ensinou muito sobre ele. Você veio com essa de ser amada depois da vida e calou a voz daqueles que vivem dizendo que, em certo ponto, é tarde demais para o amor. A vida não te coube, Clarice, você é maior que ela! E o interessante é que a vida, de certa forma, não precisa nos caber também.

Aprendi com você que é preciso deixar o amor vir até nós, ingênuo e distraído. Que é preciso deixar o amor ser quando tiver que ser.

Obrigada, Clarice, por mais essa esplendorosa lição.

Acompanhe a autora no Facebook pela sua comunidade Vanelli Doratioto – Alcova Moderna.

Atribuição da imagem: pexels.com – CC0 Public Domain.

*Benjamin Moser: biógrafo apaixonado por Clarice, escreveu a Biografia “Clarice,” e Lançou a primeira coletânea completa de contos da escritora intitulada “Todos os Contos”.

Ela decidiu parar de pedir desculpas pela vida que sempre quis

Ela decidiu parar de pedir desculpas pela vida que sempre quis

Ela cansou de verdade. Não é que ela não se importe mais com algumas pessoas e com certas coisas. Ela simplesmente mudou depois de muitas quedas e decepções. Tudo o que ela quer é poder correr atrás das próprias felicidades sem ter a obrigação de pedir desculpas, seja para a vida ou para quem estiver junto dela.

Ela acha um absurdo dar satisfações por causa dos seus sonhos. Ela passou por tanto até construí-los que não cabe ficar justificando como eles são importantes. Quem chega, quem quer mesmo ficar deve, com respeito e parceria, compartilhar dessa busca. Ela nunca fez questão de uma vida exagerada, mas também não pretende abrir mão de uma trajetória confortável, onde cada gosto tenha liberdade e oportunidade de transbordar. Ela quer ser inteira no sentido mais literal possível.

Se no passado ela abaixou a cabeça e travou o coração por conta de medos aleatórios, hoje ela é capaz de lançar um largo sorriso para sentimentos sinceros. Ela aprecia amores fora da curva, amores fogos de artifício. Daqueles resistentes e entregues no agora. O depois é muito sem graça para ela. Um dos maiores motivos dela ter mudado ao longo do tempo foi essa fome de viver os instantes presentes. É a forma que ela encontrou de cuidar e entender dos próprios passos e interferências. Ela quer um lugar tranquilo, uma viagem inesquecível, um abraço bem dado.

Ela decidiu parar de pedir desculpas pela vida que sempre quis e, com isso, de aceitar menos do que merece. Ela não chora as pitangas porque o destino fez outros planos para a sua vida. Ela tem a confiança e a sintonia de começar o que quiser, quando quiser. Ela transforma todos os porquês em mensagens claras e objetivas ao próprio jeito de seguir em frente. Pelos seus sonhos, nem a vida se atreve a dar uma opinião.

Imagem de capa: O Vale das Bonecas (1967) – Dir. Mark Robson

Penso, logo não odeio quem pensa diferente de mim.

Penso, logo não odeio quem pensa diferente de mim.

Não, eu não vou odiar você porque as nossas opiniões divergem. Não vou enfiar o seu nome na boca do sapo porque, primeiro, eu nada tenho a ver com a sua vida e, depois, o coitado do sapo nada tem a ver com isso.

É claro que eu não vou odiar você por defender e incentivar essa onda de violência dos que se entrincheiram à esquerda ou à direita, atacando uns aos outros nas ruas como inimigos de morte. E como se hoje fizesse alguma diferença ser “de esquerda” ou “de direita”.

Não vou riscar o seu nome do meu caderno por você não perceber que nós estamos todos no meio da confusão, no alvo, na linha de tiro. E que o nosso bizarro, tacanho e antiquado sistema político-partidário foi criado mesmo para favorecer a corrupção e o enriquecimento de meia dúzia de “escolhidos”. Enquanto nos engalfinhamos, os políticos de TODOS os partidos, únicos beneficiados por essa máquina medonha, estão achando ótima a nossa desunião. Mas eu não vou repelir você por não ter se dado conta disso.

Você vai me desculpar, mas se enganou feito uma besta ao imaginar que eu ia perder um só segundo maldizendo a pobre da sua mãe em resposta à sua mensagem covarde, escondida sob um nome falso, ofendendo a minha.

Olha, eu não vou pedir a Deus que fulmine a sua cabeça com um raio daqueles só porque você se acha a única alma prejudicada pela crise, a corrupção, a roubalheira na política e essas coisas.

Não vou abominar a sua figura, nem quando apela para abobrinhas do gênero “a culpa da violência do povo é do governo”, “fulano que defende sicrano tem mais é que apanhar” ou “só quem sente na pele os efeitos da crise sabe que é preciso lutar por um país mais justo e blá blá blá”, como se “lutar” fosse igual a enfiar a porrada em quem pensa diferente de você. Não vou fazer campanha contra a sua pessoa por isso, não. No máximo, confesso, vou rir um pouquinho aqui comigo da sua ingenuidade, da sua ignorância e da sua burrice. Mas odiar, não. Ninguém precisa odiar quem tem opiniões diferentes das suas.

Acredite. Eu não vou arder de raiva de você por compartilhar uma certa lista com nomes de artistas, músicos, jornalistas e outros cidadãos que “apoiam” um partido ou outro, numa execrável e patética caça às bruxas, uma típica manifestação de fascismo macartista. Eu, não. Ahh… também não vou desejar a sua morte se você se orgulhar de não saber o que foi o macarthismo ou achar que isso não lhe interessa.

Não vou mandar você àquele local por me acusar de estar em cima do muro porque eu não me posiciono a favor de qualquer partido, mas me ponho contra qualquer tipo de investida violenta, inclusive aos direitos individuais de cada um de nós.

Eu não vou odiar você por pensar diferente de mim, não. Eu só vou discordar de você. Discordo o quanto eu quiser. Discordo e vou defender o meu direito de apoiar as ideias que achar que devo e divergir de quem eu bem entender. Defendo o meu e o seu direito de discordar. E discordar não quer dizer “bater de frente” ou, simplesmente, odiar.

É que eu não odeio quem pensa diferente de mim. Não preciso. Não perco meu tempo com isso, não. Eu tenho mais o que amar por aí.

Imagem de capa: pathdoc/shutterstock

Ser solteira incomoda muita gente, ser solteira e feliz incomoda muito mais.

Ser solteira incomoda muita gente, ser solteira e feliz incomoda muito mais.

Tem coisa mais chata do que aquela pergunta da sua tia, em um almoço de família no domingo: E os namoradinhos? Pois tem; é aquela pergunta de quem não te vê há meses, te encontra na rua e manda aquela frase que deveria ter ficado apenas no pensamento: E aí, está namorando?

Eu queria registrar a cara de decepção das pessoas, quando respondo a essas perguntas com um não. E, logo em seguida, vem aquela fala doce em tom de desculpas, como se isso fosse um erro. “Ah mais você é tão bonita, como assim não tem ninguém”; “Oh… quem muito escolhe acaba sendo escolhido.” Aposto que você já foi bombardeada(o) com essas frases que nos causam riso.

Depois de um tempo, a gente se cansa de dar sempre as mesmas respostas e as pessoas confundirem isso com desculpas. Não vejo problema algum em querer um tempo para si, em querer se dedicar a um projeto ou querer viajar pelo mundo sem ninguém. Eu não preciso estar casada aos 30, com filhos, uma carreira profissional de sucesso, tese de mestrado pronta e me preparando para defender o doutorado.

Eu posso querer ficar em casa no feriado, atualizando as minhas séries ao invés do meu currículo. Eu posso gostar da companhia dos meus amigos e adorar ir ao cinema assistir a um romance e chorar feito um bebê, não como quem está desesperado por um amor, mas como quem achou aquela história bonita. Eu prefiro um coração feliz a um coração machucado e, sinceramente, eu me divirto com as minhas séries.

Essa visão errônea das pessoas de que quem está solteiro necessariamente está sozinho mostra a visão distorcida do amor. O amor não é uma questão de tentativas com medo de ficar só. O amor nem de longe é refúgio, abrigo, por medo da solidão. As pessoas colocam a responsabilidade de serem felizes nas mãos do outro, achando que um relacionamento é a chave para aliviar toda angustia, tristeza e dor. Antes de ser um bom par, é fundamental ser um bom ímpar, gostar da própria companhia, gostar daquilo que se vê no espelho todos os dias e da pessoa incrível que você tem se tornado. É fundamental se conhecer e se amar. Gostar do seu cabelo desarrumado, do seu jeito bagunçado e da sua loucura.

As pessoas sempre irão arrumar um jeito de saber das “atualizações” de nossa vida. Hoje você está solteira, então a pergunta da vez é: “Quando você vai namorar?” E aí você entra em um relacionamento e surge outra questão: “Quando você irá se casar?” E então você se casa e vem o tal: “Quando vocês irão ter filhos?”; e por aí se segue a lógica de quem parece esperar muito de nós, quando, na verdade, é só curiosidade alheia pela vida do outro.

Imagem de capa: Jacob Lund/shutterstock

Se ele não te assume, suma!

Se ele não te assume, suma!

Nem todos estão dispostos a se entregar ao desprendimento de si mesmo, pois não querem abrir mão de nada, nem mesmo daquilo que não traz nada de bom. Não possuem maturidade suficiente para assumir responsabilidades sobre ninguém, uma vez que nem conseguem ser responsáveis por si mesmos.

Existem pessoas que mantêm um relacionamento sigiloso, vivendo às escondidas, encontrando-se longe de todos, nunca aparecendo em público. Por incrível que pareça, nem todos são assim por conta de um dos parceiros – ou ambos – estar traindo alguém, ou em razão de se tratar de alguma aventura adolescente em que se tenta enganar os pais. Há quem não assuma relacionamentos publicamente simplesmente porque assumi-los implica obrigações e responsabilidades.

Quando entramos com verdade nos encontros amorosos que constituem nossa jornada, temos que estar prontos para a entrega, para o acolhimento do outro em nossas vidas, com tudo o que vem junto, as doçuras e amarguras, os sorrisos e as lágrimas. Temos que estar dispostos a abrir mão, a fazer concessões, a olhar além de nós mesmos, deixando de priorizar tão somente o nosso ego mimado. Andar junto com alguém requer dar as mãos, olhar nos olhos, dialogar, enxergar o outro e a si mesmo. Amor é mão dupla, é reciprocidade.

Para que possamos manter alguém junto a nossas vidas, é preciso que essa pessoa se sinta parte da gente, alguém com quem nos importamos, a quem dispensamos atenção verdadeira, interesse afetivo. Nesse percurso, teremos que enfrentar, sobretudo, a nós mesmos, entendendo que nossas ações não mais dizem respeito somente a nós próprios. Tem alguém lá fora que será atingido por nossas atitudes, bem fundo no coração. Tem alguém que torce e espera sempre o melhor de nós.

Infelizmente, nem todos estão dispostos a se entregar ao desprendimento de si mesmo, pois não querem abrir mão de nada, nem mesmo daquilo que não traz nada de bom. Não possuem maturidade suficiente para assumir responsabilidades sobre ninguém, uma vez que nem conseguem ser responsáveis por si mesmos. Assim, relacionar-se na clandestinidade lhes é cômodo, pois, no escuro, não necessitam se doar ou se mostrar como verdadeiramente são. No escuro, iludem-se com as próprias mentiras.

Ninguém merece sujeitar-se à clandestinidade afetiva, ao amor contido, velado, silenciado, por conta da covardia alheia. Ninguém merece ter que se esconder como se amar fosse errado, ilegal, vivendo vida dupla, sendo pela metade. A não ser lhe que seja cômodo também, mas aí o problema é de cada um. Porque o que é do amor é da vida, o que é sentimento traz luz, serenidade, conforto e verdade. O contrário disso é mentira.

Imagem de capa: Hrecheniuk Oleksii/shutterstock

Tenho medo de quem esqueceu como ser ridículo

Tenho medo de quem esqueceu como ser ridículo

Por vezes, eu acho que é muito bom ser ridículo, por exemplo, num amor recém nascido, como é bom ser ridículo! Numa história fresca na nossa vida, como é importante a pieguice que nos baixa, o clichê das frases e das sensações tão antigas. Como é bom sentir o universal friozinho na barriga e falar dele e senti-lo livremente.

Como é bom o ‘boa noite amor’, o ‘eu te amo’ da madrugada, por mais batida e surrada que essa frase seja. Como é bom se tornar o chato da turma, aquele que enquanto todos reclamam da política, do trânsito, da rotina, fica concordando com tudo e sorrindo, porque está vivendo o ridículo momento do passarinho verde.

Como é bom olhar a lua, sentir o vento, receber mais uma multa e achar que tudo bem, que tudo lindo! Ficar ouvindo 100 vezes a mesma mensagem de voz que não diz nada, mas faz cócegas na orelha. Como é bom começar a achar graça em tudo!

E quem nunca foi exageradamente ridículo numa dor de cotovelo? Quem nunca chorou cantando alto, achando que a música ‘Sozinho’ do Caetano Veloso foi feita exatamente pra você?

Como é bom, apesar de depois acharmos feio e constrangedor, ser livre e abertamente ridículos, contar as dores de amor para a manicure, para a pessoa sentada ao lado no ônibus, para a outra ex-namorada que te entende tão bem, como é bom vomitar dores no ouvido do garçom! Viver os momentos sendo assumidamente ridículo, até lavar a alma.

O ridículo enche nossas vidas, afinal o que seriam dessas rotinas insossas se não fossem os dramas mexicanos que nos inundam de enredos e histórias pra contar, que nos tornam interessantes para os nossos amigos, que nos fazem querer encher a cara e nos compartilhar? O que seriam dos insípidos dias se não fosse o perfume doce e brega de uma paixão adolescente? E o que seriam das histórias de amor se não deixássemos nosso lado ridículo aflorar e alimentar uma energia boa que vibra na gente?

O ridículo é semente, o ridículo é a desanestesia, é o acordar para sentimentos simples, mas que ainda me tocam, é perceber que ainda há tutano e energia vital por trás dessas minhas orgulhosas e imponentes cicatrizes.

Eu não tenho medo do ridículo, eu tenho medo das pessoas que, por pura escolha sensata, esqueceram como sê-lo.

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