Aquilo que fizemos autocentradamente acaba

Aquilo que fizemos autocentradamente acaba

Esses dias eu li um trechinho do livro “A joia dos Desejos” do querido Lama Padma Samten e fiquei refletindo sobre o quanto nós deixamos de fazer algo de bom pelas outras pessoas por causa do autocentramento, um grande veneno que vem assolando cada vez mais a humanidade.

Farei uma breve reflexão a partir de suas palavras. Leia com bastante atenção!

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“Esquecidos da compaixão, temos nossos afazeres urgentes e prioridades inadiáveis. E o tempo passa. Quando os ciclos da vida se completam, tudo desaba, tudo perde o sentido, e o que fica de bom tem um único sabor: a generosidade, o amor e a compaixão que dedicamos a outros seres. Aquilo que fizemos autocentradamente acaba. O que fizemos carinhosamente para um outro, mesmo que pareça não mais existir no plano material, curiosamente segue presente em uma dimensão de satisfação sutil.”

Lama Padma Samten

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Essas são palavras extremamente profundas e tocantes. O Lama Samten, com toda sua serenidade e sabedoria, dá uma verdadeira aula, nos ensinando que, mesmo que seja algo pequeno, de pouca relevância, podemos fazer algo que seja bom e positivo para os outros.

Falo isso com bastante humildade e reconhecimento. Todos os dias eu me olho no espelho e fico pensando: “Caramba! Eu ainda faço tão pouco em prol das pessoas…”. Mas eu não digo isso me menosprezando nem nada do tipo. Isso me motiva a fazer pelo menos o pouco que me cabe com os dons que eu recebi.

Um dos meus maiores dons é a escrita objetiva e clara, então eu tento na medida do possível utilizá-lo para espalhar boas sementes, que como diz o Lama: “mesmo que pareça não mais existir no plano material, curiosamente segue presente em uma dimensão de satisfação sutil…”.

Recebo constantemente os feedbacks dos leitores me dizendo que minhas palavras os ajudaram, que algum texto lhes fizeram mudar de atitude, de perspectiva etc. Isso não tem preço! Uma das coisas que mais me motiva a continuar escrevendo é saber que depois de publicado, o texto fica como que numa “nuvem”, que é a internet, e cheio de palavras-chaves, que quando pesquisadas no “google”, fazem os leitores caírem nele.

Por exemplo. Esse texto traz a palavra “autocentramento”, que quando pesquisada no “google” faz com que apareça o link em alguma página, e na hora certa, pra pessoa certa, ela vai lá e acaba clicando. Na hora de ler ela diz: “Nossa! Era exatamente isso que estava precisando ler…”.

Isso é algo mágico e acontece o tempo todo aqui no blog. Esse é um exemplo objetivo do pouco que eu posso fazer para ajudar os outros. E faço isso com bastante alegria.

Até já falei em outros textos. Um passo simples e de grande relevância no bem é simplesmente se dispor a ouvir uma pessoa que esteja carente de atenção. Se você se coloca genuinamente nesse sentido, seja onde for ou com quem for, pode ter certeza de que esse pequeno gesto fará um bem danado não só à pessoa que você deu atenção e parte do seu tempo, mas a toda uma teia de pessoas que convive com ele ou ela.

Eu fico impressionado que em todo lugar que eu vou, sempre vejo pessoas autocentradas, em maior ou menor grau. Gente que trabalha, trabalha e trabalha só pensando em comprar uma casa maior, ou um carro melhor, ou então juntam dinheiro para fazer aquela viagem dos sonhos para a Europa etc etc.

Quero deixar claro que não estou condenando nada disso, na realidade é maravilhoso pensarmos em melhoria de vida, o nome disso é prosperidade. O que estou falando é das pessoas que fazem isso com 100% dos seus recursos entende? Esses são os autocentrados que o Lama está falando no seu livro.

Perceba! Um dinheiro que você junta para comprar uma casa maior, um carro mais chique, uma viagem para o exterior vai ter um destino, mas será o destino de uma bolha de desejos de uma ou duas pessoas. Não será multiplicado para dezenas, centenas ou milhares de pessoas.

Com minha profissão (professor), eu não ganho tanto dinheiro assim, mas com o que ganho tento ajudar mesmo que com pouco algumas pessoas necessitadas, ou compro livros para quem eu sei que se beneficiará do seu conteúdo, entre outras coisas! São atitudes bem pequenas, mas que geram sementes do bem.

Quero concluir reforçando isso. Não queira ajudar de forma mirabolante, extravagante, porque se pensar dessa maneira, você nunca vai sair do lugar. Procure ajudar as pessoas AGORA, com os recursos financeiros de que dispõe, e acima de tudo, com os dons de que dispõe. Seja criativo! Eu tenho certeza que você tem dons incríveis que poderão ajudar muitas pessoas. Façamos cada um de nós a nossa parte e desse jeito, aos pouquinhos veremos muitas sementes germinando, crescendo e se transformando em jardins cheios de árvores frondosas e belas…

Imagem de capa: Reprodução

Insistir muito com alguém não é garantia de amor

Insistir muito com alguém não é garantia de amor

Primeiro, existe uma enorme diferença entre insistir e não desistir de alguém. Não desistir é quando coisas comuns saem do lugar. Quando ambos querem fazer dar certo, mas uns pensamentos aqui e ali não batem. Já insistir com alguém é sobre você entregar muito e o outro lado não mostrar a mesma disponibilidade em troca. É quando um relacionamento é tudo, menos amor.

Correr atrás, abaixar a cabeça e aceitar situações e sentimentos que trazem mais peso do que liberdade é o contrário do amor. Você não ganha pontos por se anular em favor de quem era para ser parceria. Quem entende o significado do amor sabe que ele não é possível sem uma resposta sincera dos envolvidos. Manter o coração com essa perspectiva de fazer por dois é afastar qualquer chance de reciprocidade.

Claro, o amor é um risco. Seja qual for o caminho traçado, ele ainda é uma aposta. Mas isso não quer dizer que você deva mendigar mais ou menos com alguém. Jamais vale como amor você suplicar. É aquela velha história, quem quer ficar, fica.

Troque expectativas por inteiros. Alguém que vale a pena é alguém que se importa. É, ainda, alguém ausente de sabotar quem ama. Se for para insistir, procure a pessoa que insista com você. Como? Não deixando de lado o respeito, a ternura e o querer continuar do seu lado.

Nada pode ser considerado uma garantia de amor. Todos os instantes são importantes. Todos os abraços são possíveis despedidas. Ame, mas não esqueça de reparar se o amor volta. Se for só com você, não insista.

Imagem de capa: N.Melanjina, Shutterstock

Por que príncipes viram sapos?- Flávio Gikovate

Por que príncipes viram sapos?- Flávio Gikovate

Para entender por que nos decepcionamos com o ser amado, é preciso conhecer o processo de namoro: saber o que leva a nos encantarmos sentimentalmente com alguém.

O que faz uma pessoa até há pouco tempo desconhecida se tornar tão indispensável para nós que não imaginamos mais a vida sem ela? Não há como responder integralmente a essa pergunta, mas algumas conclusões parciais podem ser úteis para cometermos menos erros.

Em primeiro lugar, as pessoas se envolvem porque se acham incompletas. Se todos nós nos sentíssemos “inteiros” em vez de “metades”, não amaríamos, pois o amor é o sentimento que desenvolvemos por quem nos provoca aquelas sensações de aconchego e de algo completo que não conseguimos ter sozinhos.

A escolha do parceiro envolve variáveis intrigantes, que vão do desejo de nos sabermos protegidos à necessidade de sermos úteis ou mesmo explorados.

A aparência física ocupa um papel importante nesta fase, sobretudo nos homens, que são mais sensíveis aos estímulos visuais. Muitos registram na memória figuras que os impressionaram e que servem de base para criar modelos ideais, com os quais cada mulher é confrontada.

Pode ser a cor dos olhos, dos cabelos, o tipo de seio ou de quadril. São elementos que lembram desde suas mães até uma estrela de cinema.

As mulheres também selecionam indicadores do homem ideal: deve ser esbelto ou musculoso, executivo ou intelectualizado, voltado para as artes e assim por diante.

Todos esses ingredientes incluem elementos eróticos e se transformam, na nossa imaginação, em símbolos de parceiros ideais. De repente, julgamos ter encontrado uma quantidade significativa de tais símbolos naquela pessoa que passou pela nossa vida. E nos apaixonamos.

A fase de encantamento, no entanto, se fundamenta não só em aspectos ligados à aparência, mas também no que há por dentro.

Porém, uma outra situação pode ocorrer: conversamos com quem nos chamou a atenção e, devido à atração inicial e ao nosso enorme desejo de amar, tendemos a ver no seu interior as afinidades que sempre quisemos que existissem naquele que nos arrebata o coração.

Por exemplo: um rapaz franzino e intelectualizado é visto como emotivo, romântico, delicado, respeitoso e pouco ciumento. A moça se encanta com ele e espera que ele seja portador dessas qualidades.

A isso chamamos idealização: acreditar que o outro tem características que lhe atribuímos. Sonhamos com um príncipe encantado – ou com uma princesa ideal – e projetamos todos os nossos desejos sobre aquela pessoa. E, quando passamos a conviver com ela, esperamos as reações próprias do ser que idealizamos.

Mas o que ocorre? É o indivíduo real que vai reagir e se comportar conforme suas peculiaridades. E é muito provável que nos decepcionemos – não exatamente por causa de suas características, mas porque havíamos despejado sobre ele fantasias de perfeição.

O erro nem sempre está no parceiro, e sim no fato de termos sonhado com ele mais do que prestado atenção no que ele realmente é.

Eis aí um bom exemplo dos perigos derivados da sofisticação da mente, capaz de usar a imaginação de uma forma tão livre que a realidade jamais conseguirá alcançá-la.

Imagem de capa: Briana Hunter/shutterstock

Sobre a psicologia das mulheres- Flávio Gikovate

Sobre a psicologia das mulheres- Flávio Gikovate

“Um fato curioso da psicologia de certas mulheres é a tendência a se adequar aos gostos, valores e interesses daquele por quem se apaixonam.

A tendência a se manter com pouca identidade para melhor se adaptar ao parceiro conjugal deve ter sido parte da formação feminina do passado.

Quando se dançava junto, a moça “leve”, a que acompanhava com facilidade os passos do rapaz, era muito valorizada: era sinal de feminilidade.

Os tempos são outros e a expectativa nos relacionamentos afetivos é mais de parceria do que de submissão; a busca é de efetivas afinidades.

Muitas moças, talvez sob o impacto de uma formação tradicional, podem simular afinidades que não possuem: estão só agindo como antigamente.

Quando a conduta da moça é apenas simulação, com o passar dos meses ela vai resgatando sua verdadeira identidade e isso pode gerar conflito.

Os moços costumam se sentir enganados, traídos mesmo: se encantaram por quem parecia tão fácil e dócil e que depois se mostra bem diferente.

Os conflitos e tensões próprios dos elos atuais derivam desse período de transição que vivemos: o velho e o novo coabitam em nossas mentes!”

Flávio Gikovate

Imagem de capa: chombosan/shutterstock

A genialidade está ligada ao encantamento

A genialidade está ligada ao encantamento

Em minha opinião, um dos grandes gênios do século XX que está cada vez mais imortalizando a sua obra é o místico oriental Osho, que sempre me inspira não só a escrever, mas a fazer a minha vida se tornar mais rica internamente, mais leve, pura e essencial.

Quero falar sobre o tema da genialidade a partir da sua visão, extraída do belíssimo livro “Inocência, conhecimento e encantamento”. Esse texto certamente fará você refletir sobre como tem olhado a sua vida e como tem decidido vivê-la! Vamos as suas palavras…

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As últimas palavras de Einstein foram: “Estive pensando durante toda a minha vida que iria desmistificar o universo. Mas o que aconteceu foi justamente o contrário. Quanto mais eu penetrei na existência, mais o mistério se aprofundou. Estou morrendo repleto de assombro, estou morrendo assombrado”. Mas isso é raro; esta é a qualidade de um gênio. O gênio é aquele que não permite que a sociedade o transforme em um robô; essa é a minha definição de um gênio. Todo mundo nasce como um gênio, mas as pessoas muito cedo começam a se comprometer. E quando se comprometem, seus talentos desaparecem, sua inteligência morre. Elas vão vendendo suas almas por coisas mundanas, por coisas inúteis – inúteis no sentido fundamental; elas podem ser úteis aqui, mas a morte vem e todas essas coisas desaparecem junto com ela.

Se você conseguir morrer como Albert Einstein – perplexo, repleto de encantamento, com reverência no coração, com a poesia surgindo em você –, terá vivido da maneira certa e estará morrendo da maneira certa…

Osho

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Concordo totalmente com a visão do Osho. Os gênios são as pessoas que mesmo na vida adulta permanecessem inocentes, permanecem com esse olhar de encantamento, esse olhar de assombro com as maravilhas e mistérios do universo.

Ele fala sobre cedo nos comprometermos. É preciso entender bem o que ele quis dizer. Não é que ele esteja condenando ter compromisso na vida. Isso é bom e até importante! Sem compromisso não podemos fazer nada com 100% de dedicação. Sem compromisso não existe o chamado “capricho” entende? Ao falar sobre compromisso, ele está falando sobre a tal da RESPONSABILIDADE, quem em sua raiz quer dizer: “a capacidade de gerar respostas”. Simples assim!

O Osho condena as pessoas que são muito responsáveis, ou seja, que tem uma resposta pronta para todas as demandas que a vida em sociedade nos impõe. Não precisa ser assim! É essa postura que mina toda a nossa genialidade. Todos nós nascemos gênios, porque nascemos inocentes, ingênuos, com esse olhar de encantamento para tudo. Inclusive, só a título de informação. Essas palavras do Osho foram inspiradas nessa indagação: “Eu não tenho em mim a mesma sensação de encantamento que eu tinha quando era criança. Por quê?”

Esse é um baita questionamento, e a resposta do Osho não poderia ser melhor, a resposta de um verdadeiro iluminado.

Lendo esse trecho do seu livro acabei me reportando à outro gênio do século XX que admiro profundamente, o querido Rubem Alves. Você sabia que ele tinha o apelido de “Professor de espantos”? Esse é um apelido perfeito para ele, porque ele ensinava de um jeito absolutamente original.

Uma de suas metáforas é engraçadíssima. Ele compara a inteligência com o pênis. Isso espanta qualquer estudante. Como assim um pênis?

A inteligência é como um pênis, flácido, cabisbaixo, escondido por um tecido que chamamos de cueca. Mas se ele for devidamente estimulado e provocado, começa a haver uma transformação hidráulica impressionante, ele passe a olhar para frente, feliz e vibrante. Assume a forma de um foguete intercontinental e pode até soltar fogos de artifício…

Quando a inteligência está no seu clímax (gozo), é capaz de soltar fogos de emoção e com esses fogos gerar vida…

Percebe que incrível? Só um verdadeiro gênio para criar uma metáfora tão espantosa como essa. Ele morreu como um menino, aos 80 anos. É outro que também se eternizará! Grande Rubem…

Outro dia um leitor que admira os textos que escrevo fez um comentário me chamando de gênio. Agradeci a ele obviamente, mas respondi ao comentário dizendo que ele e todos os leitores tem suas próprias genialidades, e o levei junto comigo a refletir que para ser um gênio basta seguir o coração, procurando trabalhar e se colocar no mundo naquilo que ama fazer, ou parafraseando o Osho, naquilo que faz o seu coração vibrar de emoção…

Escrever é algo que me faz vibrar o coração. Ao escrever um texto como esse meu coração pulsa de alegria e é essa emoção que faz com que tantos leitores se identifiquem com minhas palavras.

Quero concluir lhe instigando a buscar esse olhar de encantamento. Olhe para o seu passado e procure descobrir onde foi que você se deixou engolir pelo monstro Sist (como diria outro gênio chamado Raul Seixas)? Resgate esse olhar que você já teve quando era uma criança! Daí em pouco tempo perceberá a sua genialidade surgindo. E como já falei em outros textos, a genialidade não é algo restrito à Matemática, ou a Física ou ao mundo das invenções. Nada disso! Existem gênios em todos os ramos e todas as profissões.

Chico Buarque é um gênio da música.

Al Pacino é um gênio do cinema.

Clarice Lispector é um gênio da literatura.

Michelangelo é um gênio das esculturas.

Warren Buffet é um gênio das finanças.

Oprah Winfrey é um gênio na comunicação.

Usain Bolt é um gênio das corridas curtas.

Descubra, aliás, RE-DESCUBRA genialidade que mora dentro de você, pois dessa forma você fará como Albert Einstein, viverá e morrerá do jeito certo…

Imagem de capa:  mural de Eduardo Kobra- Albert Einstein

Poesia dentro da gente

Poesia dentro da gente

Essa tarde, caminhando pela praia, lembrei-me de uma conversa logo cedo com meu filho. Pela terceira vez essa semana, me contou que havia sonhado com “sua namorada”. Perguntei se andava pensando muito nela, e a resposta imediata, do alto dos seus sete anos foi: “O tempo todo, mamãe”…

Sem saber, essa garotinha de sorte existe aqui, em nossas férias, perto do mar, entre as dunas, na areia que escorre por seus dedinhos arredondados, na risada barulhenta, nos desenhos que a água apaga. Está presente de um jeito doce, terno, verdadeiro. Pode ser que um dia seus caminhos se encontrem verdadeiramente_ ou não. Pode ser que ela nunca saiba que existiu nele.

Você já se perguntou de que forma existe por aí? De que forma é lembrado, rebobinado, editado e reprisado?

Existimos no amor que damos, na saudade que deixamos, na falta que fazemos, nos sonhos que povoamos, no desejo que despertamos, na raiva que provocamos, na preocupação que causamos, no mistério que não revelamos, na alegria que irradiamos. Existimos naqueles que amamos, nas relações _ entre amantes, pais e filhos, amigos_ que estabelecemos; e_ como poderíamos saber?_ onde nunca imaginamos.

Porque nem tudo o tempo consente que a gente viva. Nem todos os caminhos se cruzam ou consolidam. Nem tudo nos cabe. Algumas coisas não exigem resposta, nem troca, nem conhecimento ou correspondência de parte alguma. Elas simplesmente caminham conosco, nos fazem companhia e povoam nossos sonhos. É a vida que não deu as mãos, mas vai dentro da gente… (linda na melodia do Skank).

Existir em alguém é ser lembrado num dia difícil ou demasiadamente feliz; é ser recordado com ternura e por um segundo ser o ideal de perfeição daquilo que sempre se almejou; é ser gostado gratuitamente, sem exigência de reciprocidade ou retorno; aceito nas imperfeições e manias, sem cobranças ou condições. É ser prece no meio da noite; nome escrito na areia; caligrafia primária envolta em corações coloridos; canção que leva às lagrimas e alguma saudade_ do que foi vivido ou nunca aconteceu.

Uma vez li uma frase num livro, e hoje não consigo ser fiel à fonte (pois não me lembro mais), mas a frase dizia mais ou menos o seguinte: Após nossa morte, permanecemos vivos enquanto a última pessoa que ainda se lembrar de nós permanecer viva. Enquanto formos lembrança, existimos.

Infelizmente, existe o outro lado da moeda, quando a lembrança de um nome ou rosto evoca sensações desagradáveis, sentimentos soterrados, recordações funestas. Porém, aquilo que não lhe machucou, nem subtraiu ou dividiu… é parte de você também. Não faz mal lembrar. Deixar viver aí dentro. Imaginando se você existe por lá também, de um jeito bom, quem sabe preenchendo lacunas ou fazendo o quebra cabeças ter algum sentido…

A gente precisa de poesia dentro da gente. De alma perfumada e riso de criança. Ás vezes o córrego da vida precisa de sal, de algo que nos desperte por dentro. Sinta-se recompensado se conseguir sentir. Se, de alguma forma, for tocado. Se perceber uma parte de você acordando (paradoxalmente, nem que seja dormindo…) como a garotinha dos sonhos de meu menino. Tanto chão pela frente, tanta alegria e desilusão a serem vividas no decorrer dos anos… mas ainda assim, ela permanece dentro dele. Como melodia de dias felizes, tempero de momentos vazios, açúcar de horas amargas, perfume de noites futuras…

Imagem de capa: Oleksandr Berezko/shutterstock

Viver sem amar e passar a vida só olhando o mar

Viver sem amar e passar a vida só olhando o mar

Pode ser até que um dia alguém faça trincas no coração da gente. E, então, a tristeza da alma que foi ocupada e depois não serviu mais, vazará. Surgirá uma incompreensão absoluta pela ausência repentina do amor. Haverá perplexidade diante da necessidade do outro pela adrenalina do conflito, pela sensação de poder. Aquele que quer ficar nunca entende o adeus.

Amores acabam. Alguns acabam. Duram, enquanto durar o encantamento da paixão, o frio na barriga, o coração aos saltos, o arrepio. Frio e calor juntos, no mesmo toque. Mas ainda assim, terá sido amor. Ainda que não tenha restado nada do estado etéreo das primeiras carícias; do sobressalto do primeiro beijo; da excitação de acordar com saudade no meio da noite. Ainda assim, terá sido amor.

Porque o amor tem muitas formas de nos acomodar em suas malhas do tempo. Há amores que ficaram na infância. Na sensação de pertencimento que nasce de um gesto desajeitado de carinho; de ter por perto uma mão que cabe direitinho no encaixe da nossa. Na cumplicidade de um riso que não se contém. No mágico acontecimento que é falar por meio de tantas outras coisas que não sejam palavras.

Há amores que chegam de repente. Tempestade de verão. Vêm coroar uma tarde quente e abafada; trazer o frescor da chuva; o cheiro das gotas que encontram o chão. Amores passageiros, nem chegam a causar qualquer dor. São carícias feitas devagarinho, na pele úmida. Ternos, suaves, compreensivos. Amores que deixam saudades para sempre.

Há amores que se constroem com os dias. Chegam devagar. No prazer de conversar. Amores amigos, vão se transformando. Vão transbordando em abraços que nunca terminam de verdade. E mãos entrelaçadas que não têm pressa de se soltar. Em segredos, contados em voz baixa, em madrugadas insones. Amores que brotam feito flores de verbena. Exalam o perfume da confiança, da entrega e do gostar eternamente.

Há ainda, aqueles amores que só existem na fantasia de um sonho. Nunca se concretizam. Não chegam a ser um fato, ficam no plano das ideias. São amores ideais. Viajam com a rapidez de um raio e terminam em tardes de garoa fina. Moram para sempre dentro de nós. Nunca serão capazes de nos ferir. Os encontros nunca serão esquecidos; as promessas nunca serão descumpridas. Nada de rompimentos ou corações partidos. Amores que se dissolvem no ar.

E, quem de nós não terá tido um amor que parecia único, especial, definitivo. Um plano para a vida inteira. Um projeto no qual era possível erguer paredes, plantar jasmins, pendurar balanços em árvores, imaginar varandas de frente para o mar. Eram amores eternos. Amores para nos acolher lá no tempo distante, quando já não fôssemos tão tolos e afoitos. Amores para percorrer toda uma vida conosco. Para nos entender, acolher, conhecer.

O amor? Ahhhh… O amor tem tantos jeitos de existir. Pode permanecer ou partir. Pode nos fazer sorrir sem perceber. Pode nos ensinar a duvidar. Pode nos transformar em algo que nunca supúnhamos alcançar. Amor é para que tem coragem. Amor é para quem ousa acreditar que uma vida sem ter amado, é uma vida que nem existiu.

Imagem de capa: Lia Koltyrina/shutterstock

Não colecione lamentações, eternize momentos especiais

Não colecione lamentações, eternize momentos especiais

Vivemos, muitas vezes, presos a amarras condicionadas a convenções e normas de comportamento que nos tolhem a liberdade necessária ao bem viver. Acumulamos estresses desnecessários e lamentamos diariamente aquilo que poderíamos fazer ou deveríamos ter feito, com a consciência intranquila, ou seja, acabamos nos sentido de maneira oposta ao que gostaríamos, mesmo após tantas privações e castrações, muitas dela infundadas. É preciso permitir-se!

Permita-se sentir o sabor dos alimentos demoradamente, mastigando e sorvendo cada mistura de gostos, desfrutando o recarregar de energias em todo o prazer que ele encerra. Ouça e aprecie a letra de uma música de que gosta, analisando-a e conscientizando-se da magia que a melodia imprime em seus sentidos.

Permita-se contemplar a natureza, o verde, ou mesmo a rusticidade do concreto à sua volta, sentindo-se parte integrante da paisagem onde transita. Feche os olhos e escute a sonoridade que permeia o silêncio interior, os movimentos voláteis que circundam sua existência na ausência de luz.

Permita-se enxergar o parceiro, sua presença enquanto pessoa, sua importância na caminhada que trilham juntos. Coloque-se no lugar do outro, para que estenda seu campo de visão além de si mesmo e compreenda sua importância como ser constituinte de um todo coletivo.

Permita-se correr riscos, em nome do amor, da amizade, de si mesmo. Esqueça o estabelecido, o hegemônico, tudo aquilo que lhe ensinaram. Arrisque-se e assuma seus erros. Reveja conceitos e atitudes, evoluindo o fluxo de suas ideias e pensamentos, em consonância com o célere movimento da história e da vida.

Permita-se perdoar a si mesmo, redimindo-se dos pecados imaginários que carrega inutilmente nos ombros e que emperram seu caminhar, estagnando sua evolução pessoal. Renda-se e desmorone, cedendo, quando em vez, às suas fraquezas e aos instantes em que elas momentaneamente vencem, para que se afastem fantasmas criados por você mesmo. Levite os sentidos, torne-se mais leve. Ria, gargalhe, na rua, no trabalho, no bar da esquina, onde der vontade.

Permita-se desejar a quem lhe acelera o coração, sem preconceitos, julgamentos, desde que não machuque ninguém pelo caminho. Guie-se, quando preciso, pela atração, pela química, pela libido, acalmando o fogo que não se abranda por meio do sufocamento de desejos. Acorde seus sonhos, traga-os à vida real, compartilhando-os com quem acredita em seu potencial, naquilo que você é.

Permita-se entregar-se à paixão que lhe rouba os sentidos, que lhe incendeia os poros e lhe furta o respirar, nem que seja alguém com quem quebrará a cara, pois assim aprenderá, ainda que dolorosamente, que os instantes de gozo não bastam para preencher os sonhos de uma vida toda.

Permita-se viver, permita-se respirar tranquilamente. Arrepender-se do que nem chegou a ser feito traz tão somente frustração, mas arrepender-se do que se tentou fazer traz coragem e aprendizado. A vida passa rapidamente, mas o tempo gasto com queixas e arrependimentos parece interminável. Não colecione lamentações, eternize momentos especiais e, assim, sempre terá a sensação de que a vida conspira a seu favor. Assim, sempre terá a sensação de que é feliz – e, na verdade, então estará realmente sendo feliz.

Imagem de capa: Olena Andreychuk/shutterstock

Na Natureza Selvagem- a busca por si mesmo e pela verdade

Na Natureza Selvagem- a busca por si mesmo e pela verdade

Para Nietzsche, mais importante do que a verdade é o questionamento sobre por que existe, no homem, aquele impulso à verdade. Alex Supertramp estava em busca dessa verdade, da verdade das coisas. Um sentimento que, em algum momento da vida, todos nós temos. A vontade de saber o que se esconde por trás das máscaras, das maquiagens e do controle. A vontade de saber o que somos e o que faz o coração bater mais forte. A vontade de saber o que é um sorriso apenas pelo momento.

A busca por essa ilha desconhecida, que é o ser humano, torna-se difícil na vida em sociedade, uma vez que está está cercada de controle e de regras que devem ser seguidas como mandamentos. E todos aqueles que buscam viver suas vidas fora dessa rede aprisionadora são vistos como loucos. Perceber-se estando imerso nesse ambiente que condena a busca pelo autoconhecimento, a solidão necessária a essa busca de si e o pensamento crítico, é quase impossível.

Essa atmosfera pesada criada pelas ditaduras, como a do consumismo, que serve apenas para afastar as pessoas umas das outras e simbolicamente dar valor a coisas secundárias, atormenta Alex, que se sente intoxicado e anseia por ares mais leves e limpos.

“Não mais disposto a ser envenenado pela civilização, ele foge.”

Alex compartilha de Thoreau a agonia de não entender a imobilidade das pessoas que se comportam segundo os ditames e regras da sociedade. Totalmente adequadas e adestradas, são incapazes de modificar as suas vidas, nem mesmo se questionam se não existem outras possibilidades de vida que não seja a da sociedade de consumo, a qual produz grandes mazelas sociais, embora, seja mascarada por um falso discurso de progresso, diga-se de passagem, visão positivista que já deveria ter sido superada.

A vida na natureza selvagem, para Alex, assim como foi para Thoreau, é a forma que ele encontra de poder enxergar além da obviedade daquilo que todos percebem. Ele quer poder enxergar a si mesmo sem lentes. Enxergar o que o cerca e tirar as suas próprias conclusões. A busca pelo autoconhecimento e, por conseguinte, pela verdade, é o que o faz afastar-se da sociedade, para que, assim, sem obrigações e olhares, consiga ter linhas da sua vida escritas por si mesmo.

Alex não quer passar a vida sendo apenas uma marionete que faz o que os outros dizem ou o que a sociedade julga como certo, como adequado. Ele sabe que existem outras possibilidades, que cada um deve viver conforme lhe apraz e que existem valores maiores do que as mentiras e as hipocrisias das relações sociais, cheias de glamour e de superficialidade. Como ele mesmo diz, o âmago da vida está em viver novas experiências, sobretudo, consigo mesmo. Mais que isso, permitindo que os desejos do seu coração tornem-se fatos do seu entendimento. Entretanto,

 “Somos completa e sinceramente forçados a viver reverenciando nossa vida e negando a possibilidade de modificação. Dizemos ser esta a única maneira, mas há tantas quantos os raios que podem ser desenhados a partir de um centro.”

Em troca de uma vida aparentemente confortável, deixamos de existir e passamos apenas a representar os papéis que a sociedade nos oferece. Chega a ser estranho como nós, seres livres e pensativos, em determinado momento ficamos condicionados. Vivemos vidas sem brilho e repetitivas. Não conseguimos perceber o que nos cerca, a natureza, o outro. O pior é que não demonstramos a menor vontade de mudança, ainda que silenciosamente nos matemos a cada dia.

“A grande maioria dos homens leva uma vida de sereno desespero.”

O que Alex quer, no fim das contas, é descobrir o que faz o seu coração ferver. O que é a felicidade real, fora do mundo de obrigações e status, de hipocrisias e mentiras. A grande questão é que o preço por essa busca é doloroso, pois a liberdade traz um fardo pesado para o indivíduo e exige deste a capacidade de lidar com as verdades por trás das máscaras, o que, sendo honesto, muitas vezes não preferimos. Mas Alex é corajoso e destemido, e não quer passar o resto da vida sofrendo silenciosamente. Não se importa em deixar para trás uma carreira de “sucesso” ou um belo carro, pois o que não quer é morrer sendo um estranho a si mesmo. Assim, vai em busca da verdade, da sua verdade. E você, já descobriu a sua?

“Mais do que amor, do que dinheiro, do que fé, do que fama, do que justiça, dêem-me a verdade.”

Imagem de capa: Reprodução

Você é maior do que seus traumas

Você é maior do que seus traumas

No ano em que meu pai faleceu, encontrei dificuldade em definir uma maneira menos impactante de contar a minha história. Ficou difícil fazer novos amigos sem mencionar meus traumas. Eu já estava meio acostumada com isso, porque antes dos anos “pai com câncer” tive os anos “mãe com Alzheimer” e por um tempo também vivi o “não faço nada da vida” (na minha fase entre carreiras). Com tudo isso a morte do meu vô ficou até um pouco camuflada, mas sim, também perdi meu avô, no mesmo ano em que perdi meu pai. E vivendo tanta coisa tão perto, ficou difícil separar quem sou eu das partes mais tristes da minha história.

Então em um ato meio desesperado para quebrar o gelo, quando conheço alguém, já vou logo falando tudo de uma vez que é para não ter que revisitar pouco a pouco a doença da minha mãe e os cuidados com ela, o ano do tratamento do meu pai e a perda dessa batalha  Em cinco minutos faço um breve resumo de tudo, na esperança de que a pessoa consiga digerir rapidamente e que possamos mudar logo de assunto. Claro, isso nunca deu certo, a intenção pode ser boa, mas nenhum ser empático passa ileso pelo meu relato.

A verdade mesmo é que com tanta coisa que aconteceu, ainda encontro dificuldade para entender que os meus traumas não me definem. Eu não sou a perda do meu pai, nem a doença da minha mãe. Tudo isso é com certeza algo que ajudou a moldar quem sou hoje, a maneira como escolho viver e tantas outras coisas. Mas, minhas dores não me definem.

E é certo que por ser algo tão recente, ainda estou aprendendo a contar minha história, talvez eu precise antes entender que não preciso contá-la para um recém-conhecido e nem para ninguém, porque a doença dos meus pais é apenas um capítulo da minha história. Dessa maneira, não preciso justificar nada do que me aconteceu e porque estou bem. Não, nossos traumas não nos definem, eles eventualmente podem nos tornar mais humanos, melhores, mais fortes, mas eles não nos definem.

E aprendi que da mesma maneira que nos apegamos à objetos e pessoas, nos apegamos também aos nossos traumas. Sei que preciso ter esse cuidado, de não deixar que minhas dores me definam, de contar minha história a partir do que eu sou, do que gosto, do que faço. É certo que nunca vou esquecer acontecimentos tão marcantes da minha vida, mas chega um tempo é preciso deixar toda essa dor ir embora. Para algumas linhas da psicologia o luto ou as dores de um trauma podem durar até um ano e meio, o que vem depois disso é apego, é desculpa que usamos para justificar nossos erros e desresponsabilização perante nossas escolhas tortas, é um monte de outras coisas, é desculpa para não ser feliz, menos luto.

Todo e qualquer ser humano tem seus traumas, suas partes mais tortas e sombrias, suas feridas mais profundas, mas existe um momento em que precisamos aprender a ressignificá-los. É preciso desapegar dos traumas e entender que eles não nos definem. Você não é a perda trágica de alguém que ama, a perda de qualquer maneira de alguém que ama, a rejeição dos pais, a separação dos pais, o abuso sofrido na infância ou em qualquer outro período da vida, a doença de pai e mãe, você não é a sua doença. Você não é a perda de um filho, o aborto que você precisou fazer, o aborto que seu corpo precisou fazer, o casamento que ruiu, o coração partido. Você é muito mais que isso. Você é maior do que seus traumas.

Tudo que parece insuperável é de fato superável, só não é passível de ser esquecido, mas dá para caminhar com tudo isso e ser feliz, sem precisar contar eternamente a mesma história triste. Você é muito mais que suas dores. É preciso desapegar delas para viver mais leve, para viver também as dádivas, porque da mesma maneira que existe na nossa histórias partes tão tristes, também tem muita coisa boa esperando por nós, basta abrir espaço para a alegria entrar.

Aprendendo a amar o ódio

Aprendendo a amar o ódio

Tendo a percepção que sempre terei a luz e a sombra, o preto e o branco, e a realidade do ódio convivendo com o profundo amor, que por trás de cada gesto de afeto, existe também um gesto de cobrança, eu vou entender que a nossa natureza convive com essa realidade e que o ser humano é mal. Reconhecer o ser humano como puro ódio é construir uma utopia, tão negativa e tão falsa quanto reconhecer o ser humano como um ser profundamente amoroso, incapaz e só alguns monstros por tara genética é que seriam capazes dessa dor. Todos somos capazes de grandes gestos de ódio.

O inferno são os outros, porque também o paraíso está nos outros.”

Leandro Karnal

A perda trágica de um amigo. O pagamento obrigatório de um acordo onde me senti injustiçada. O momento político brasileiro. E ódio. Muito ódio. Esse ódio tomou conta do meu coração em uma proporção enorme e incontrolável. E ele perdurou. Embora os assassinos tenham sido presos, embora eu entenda que dinheiro é um bem material, embora tenha plena convicção de que os políticos são o reflexo de um povo acomodado, alienado e relapso, embora entenda que amar e perdoar são sentimentos nobres e libertadores, ainda assim senti ódio. Muito ódio.

A irreversibilidade da morte gera um ódio que nada, nenhuma justiça, nem do homem, nem divina, pode apagar. A percepção quase que passiva de que um ser humano é capaz de tirar a vida do outro a sangue frio, praticamente de graça, é insuportavelmente indignante. E, nesse momento, sentir ódio é o que me mantém viva. E mesmo que eu saiba que o mal existe no ser humano desde que mundo é mundo, tenho ódio.

E esse ódio que sinto me faz revisitar lugares sombrios de meu ser onde nem sempre gosto de estar e, independente das justificativas de racionalização e compreensão que busquei na tentativa “apaziguá-lo”, ele continua latente. Sei que senti e sentirei ódio por muito tempo ainda, pelos motivos já citados e por tantos outros motivos. Mas, finalmente compreendi que o ódio é uma parte essencial do que sou, pois quando me indigno, quando o mal parece insuportável e paralisante, o ódio se torna uma parte ativa de mim, é ele que me faz sentir viva.

E no momento político em que nos encontramos, com os discursos de ódio tão estampados nas “timelines” e nas conversas diárias, entendi algo que é tão óbvio, mas que com nossa tendência à hipocrisia tentamos (em vão) evitar: sim, o ódio faz parte do que somos. O ódio talvez faça uma parte muito maior de nós do que gostaríamos. E odiar muitas vezes é mais fácil que amar e infinitamente mais fácil do que perdoar.

Jane Goldberg em “O lado escuro do amor” dedicou-se a estudar o ódio, e o identificou como um sentimento que faz parte essencial do que somos, complementar ao amor e que equivocadamente nos é ensinado como algo ruim. O ódio não é um mal, o que escolhemos fazer com ele, talvez. Odiar não nos faz ruins, apenas nos faz humanos. Mas, a maneira como escolhemos expressar nosso ódio, as palavras e atitudes muitas vezes destrutivas que são geradas através desse sentimento tão essencial para nossa saúde mental, sim, isso nos faz piores.

Segundo Goldberg odiar o ódio tem profundas consequências negativas. Pois, odiar nosso próprio ódio é odiar uma parte vital de quem somos, que nos faz desejar mudanças, que nos incomoda, aquieta, move, e, portanto, nos mantêm vivos. Para aprender a amar, é preciso também aprender a odiar, pois não existe amor sem ódio. O que existe são maneiras mais pacíficas e saudáveis de odiar.

Além disso, o mal, assim como o ódio, também é inerente a todo e qualquer ser. A alemã Hannah Arendt em “A banalidade do mal” escreveu:

“O mal não é extraordinário, o mal não está inteiramente fora das pessoas, o mal não é um monstro, o mal é banal, o mal é comum, o mal é presente, o mal está em muitos lugares, o mal está em todos nós”.

Mas, diferentemente do ódio que é essencial e quase involuntário, o mal é uma escolha pessoal. Nossos sentimentos nos tornam iguais, o que escolhemos fazer com eles nos difere. Portanto, fazer o bem ou o mal é uma escolha diária, pautada por valores, crenças, sentimentos, histórias de vida e tantas outras coisas extremamente pessoais e que por sua vez, nos tornam tão diferentes.

E infelizmente parece que nossa capacidade de fazer o mal é maior do que fazer o bem, talvez seja porque um gesto bondoso vem sempre acompanhado de cobranças enquanto que um gesto ruim é livre. Talvez seja porque enquanto eu odeio, me sinto superior àquele que odeio. Ou talvez porque aprendemos a odiar o ódio, muito mais do que aprendemos a amar o amor.

E se as causas do mal não são exatas, o que é certo é que quando não reconhecemos essas dualidades tão essenciais que existem em nós,  amor e ódio, bem e mal, quando não compreendemos que as pessoas podem ser ao mesmo tempo boas e más, aprisionamo-nos no modo de pensar infantilizado, que é incapaz de ultrapassar o mecanismo da dualidade bom-mau e ficamos para sempre condicionados a amar o amor e o odiar o ódio, como duas coisas separadas, uma utopia que não se sustenta e gera mais infelicidade ainda.

Quem sabe se nós aprendermos a amar o ódio e nos permitirmos senti-lo, se entendermos que o mal é mais comum do que pensamos e que ele não está somente no outro, ele está também em nós. Se entendermos que se nós não formos capazes de odiar, tampouco seremos capazes de amar, talvez nunca encontraremos um pouco de paz. Portanto, mesmo amando o amor e sabendo que ele é tão poderoso, ainda, por tudo isso, por todas as mortes matadas e por tudo que é mal, para que eu tenha saúde emocional, para que eu ainda com todo o mal, possa crer na prevalência do bem, sentirei e amarei o ódio.

Imagem de capa: MarinaP/shutterstock

Uma criança que lê será um adulto que pensa

Uma criança que lê será um adulto que pensa

Fomentar a leitura em qualquer idade sempre é sinônimo de enriquecimento, mas incentivar esse hábito entre os mais jovens da sociedade é uma garantia total de um futuro melhor. Uma criança que lê irá se convertendo em um adulto com ideias próprias e uma mentalidade firme, capaz de questionar o que a cerca e de compreender mais facilmente seu lugar no mundo.

Uma criança que lê será um adulto que pensa, porque não há um domínio maior do conhecimento do que aquele que nos oferecem os livros. Quando lemos nos nutrimos de imaginação e raciocínio que os outros depositaram em folhas em branco, e somos mais receptores quando nos abrimos: as crianças, sem preconceitos, são capazes de ler com toda a sua gama de emoções depositadas na leitura.

Uma criança que lê será livre para sempre

Ler nos ajuda a pensar e pensar nos liberta, assim, se seu filho gosta de passar o tempo lendo histórias, é melhor que continue agindo assim. Na verdade, essa será a forma mais eficaz que ele terá para enxergar uma variedade de situações, opiniões e de condutas que a vida oferece: com certeza isso ajudará a formar a tolerância da criança e ela ganhará em respeito e solidariedade.

 

contioutra.com - Uma criança que lê será um adulto que pensa
Evgeny Atamanenko/shutterstock

Em muitas ocasiões, como adultos, aquilo que era desconhecido em nosso pequeno mundo habitual nos surpreendia ou, inclusive, incomodava. Essas sensações provêm sobretudo de querer acreditar que o seu é o válido e o do outro não pode ser, pensamento que deriva sobretudo da ignorância.

Ler é como viajar em todos os seus sentidos e nos ajuda a abrir a mente: uma criança que lê descobrirá outras culturas, outros modos de vida, outros costumes diferentes dos seus e saberá, muito antes do que aquele que não lê, que existem outras coisas além do olhar cotidiano. Ter consciência disso fará com que ela se torne um adulto que escapará de juízos de valor gratuitos e se sentirá menos preso aos interesses de outras pessoas.

O refúgio contra as misérias da vida

Por sorte ou por azar, o mundo administra os que acreditam ser normais, mas dá vida plena a aqueles que acreditam ser loucos. Já dizia Dom Quixote: ele lia e lia até que encontrou a forma de viver baseado em suas crenças e ilusões que o permitia ser feliz, enquanto ao seu redor continuava sujeito a uma realidade convencional que julgava a sua maneira de viver.

Os “loucos” que leem são capazes de encontrar o refúgio das misérias da vida enquanto os que não o fazem vivem nelas sem sequer estarem conscientes disso. Por isso, é preciso deixar uma criança chorar e rir ao ler um livro, é necessário permitir-lhe se apaixonar por uma história e apoiá-la se ela decidir entrar com tudo nesse campo da imaginação que está ao alcance de qualquer um.

Por outro lado, ao se deparar mesmo com um texto pequeno, ela se surpreenderá com o que encontra e é provável que sofra mais com o que absorve, uma vez que será para ela como uma entidade estranha que quer mudar o seu conformismo. Unamuno empregou as palavras corretas ao pedir que as crianças cresçam lendo porque dessa maneira serão adultos menos vulneráveis, menos indefesos e mais humanos.


Leitura: a fábrica da imaginação

Existem várias atividades que ajudam a desenvolver e melhorar a imaginação independentemente de quantos anos nós tenhamos, incluindo uma das mais bonitas que é a leitura: uma fábrica inteira onde é forjada e recolhida toda criatividade dos seres humanos.

Uma criança que lê será uma criança que pensa, afirmou algum pensador genial, e ele não estava enganado. Ler é brincadeira, é entretenimento, é construir sonhos, é refletir, é um estado de ânimo, é isolamento e companhia, é prazer. Ler brinda lembranças que foram cumpridas e outras que cumpriremos, e move as incertezas mais internas para nos aproximarmos delas.

Fonte Texto: A Mente é Maravilhosa

Imagem de capa: conrado/shutterstock

“Ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”

“Ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”

Dia desses acordei repetindo um trecho de uma das mais poderosas frases do psiquiatra Carl Jung, e fui procurar a frase completa na internet. Desde então, tenho me reconectado com seu sentido, tentando absorver sua essência e trazendo seu ensinamento para todos os setores da minha vida. A frase diz: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.

Como eu disse, o sentido dessa frase pode ser aplicado a inúmeros setores da minha e da sua vida. Trabalhando como dentista no SUS, tenho que ter consciência que, além de toda técnica e conhecimento que tenho, além de toda responsabilidade e cumprimento de protocolos, além de todo profissionalismo e senso de dever, sou uma alma humana tocando outra alma humana. E isso tem que ser maior que qualquer regra, filosofia, teoria, intenção ou sabedoria. Naquele momento, alguém cuida de alguém, mas acima de tudo tem que prevalecer a igualdade e a empatia. A compreensão e a sintonia. A humildade e muita humanidade.

Porém, de vez em quando estamos do lado oposto. Temos a tendência de imaginar que o outro é bem maior que nós, bem mais sucedido, bem mais feliz… só porque aparenta ter a vida mais cheia de filtros no Instagram, mais abarrotada de conhecimento e conquistas, mais repleta de afetos e possibilidades, mais adequada e notável. O que ninguém nos conta é que todos nós estamos nus. Cada um de nós tenta, dia a dia, sobreviver às próprias batalhas, encontrar sentido, vencer as próprias prisões, superar os próprios obstáculos, afugentar as dores e tentar viver o presente da melhor maneira possível. Cada um de nós tenta se vestir, camuflar ou fantasiar da melhor maneira que pode, sem imaginar que somente se despindo estará mais próximo do que é de fato, e muito mais perto de Deus.

Você tem que entender que não é preciso impressionar ninguém. Tem que entender que quando tenta convencer alguém sobre sua felicidade, seus dons ou qualidades, está se afastando de quem é de fato. Está dando asas à vaidade, ao ego, e não à sua felicidade. É preciso aprender a ser simples. Aprender que nessa vida não há deuses, nem superpoderosos, nem donos da verdade e muito menos gente isenta de defeitos. E que se alguém se apresenta dessa maneira, com arrogância, superioridade e prepotência, não cabe a você tentar fazer o mesmo para se igualar. Saiba que, assim como você, ele é “apenas” outra alma humana. Ao desconstruir esse mito, passamos a enxergar todos, sem exceção, como nossos semelhantes. E assim respiramos aliviados, pois descobrimos que ninguém é muita areia para o caminhão de ninguém.

Um relacionamento bem-sucedido requer mais do que beijos e declarações de amor. Requer entrega, e ao se entregar de verdade, você se torna um pouco vulnerável também. Porque no fim das contas, você estará nu, não somente por fora, mas (e talvez essa seja a parte mais difícil) por dentro também.

Para ter um relacionamento de verdade, você precisará se despir dos medos, inseguranças e travas internas e assumir os riscos de ser quem é, com tudo de bom e ruim que existe por trás da sua necessidade de ser aceito e ser amado.

Para ter um relacionamento de verdade, você precisará se despir da necessidade de comparar a sua vida com a dos outros, e do constrangimento de não ter todos os seus ideais alcançados. Precisará assumir que também fica triste, que dá preguiça ir à ginástica todos os dias, que chora em cerimonias de casamento, que não tem paciência para discutir a relação, e que se sente sozinho a maior parte do tempo.

Para ter um relacionamento de verdade, você precisará se despir dos filtros e se despedir da necessidade de aprovação a todo custo. Terá que entender que é somente uma alma humana, e como tal não carrega passaporte, diplomas ou medalhas. Terá que baixar a guarda, simplificar a aparência, ampliar o sorriso e abrir o coração. Só assim atrairá a “pessoa certa”, pois como já foi dito por alguém, “semelhante atrai semelhante”. E no final, você se sentirá recompensado, não somente pelos beijos, química e risadas, mas pela possibilidade de estar com alguém que conhece _ e aceita _ sua alma nua…

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Sobre discussões e polêmicas- Flávio Gikovate

Sobre discussões e polêmicas- Flávio Gikovate

“Um aspecto triste das discussões e polêmicas é que as divergências de opinião são tratadas com rancor, como se se tratasse de ofensa pessoal.

Debater é uma coisa e polemizar é outra. Nos debates existe o real anseio de avançar na direção de um saber mais complexo, mais sofisticado.

Ouvir o outro com isenção significa não se defender de seus pontos de vista, não tentar, enquanto escuta, buscar argumentos contra os dele.

Muitos defendem suas ideias como se fossem uma parte deles; não entendem que elas, um dia, terão o mesmo destino: irão se tornar obsoletas!

Sempre me lembro de uma frase de Platão, que dizia que “nunca deveríamos morrer por nossas ideias posto que elas podem não ser verdadeiras”.

Todas as nossas ideias devem ser tratadas como transitórias: deveríamos estar dispostos a trocá-las por outras melhores a qualquer momento.

Quem busca se aproximar da verdade com honestidade intelectual abre mão de suas ideias quando novos fatos mostram que elas não valem mais.

Pensando com mais rigor, polemizar para ganhar a discussão ou para o bem da carreira e da vaidade é algo que não interessa às pessoas do bem.

Afora os debates sinceros, quase todas as polêmicas me parecem desnecessárias. O tempo é que irá separar o saber que é útil do que é fútil.”

Flávio Gikovate

Imagem de capa: pathdoc/shutterstock

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