Aos homens maduros, por Lisiê Silva

Aos homens maduros, por Lisiê Silva

Há uma indisfarçável e sedutora beleza na personalidade de muitos homens que hoje estão na idade madura. É claro que toda a regra tem as suas exceções, e cada idade tem o seu próprio valor. Porém, com toda a consideração e respeito às demais idades, destacarei aqui uma classe de homens que são companhias agradabilíssimas: os que hoje são quarentões, cinquentões e sessentões.

Percebe-se com certa facilidade, a sensibilidade de seus corações, a devoção que eles têm pelo que há de mais belo: o sentimento.

Eles são mais inteligentes, vividos, charmosos, eloqüentes. Sabem o que falam, e sabem falar na hora certa. São cativantes, sabem fazer-se presentes, sem incomodar. Sabem conquistar uma grande amizade.

Em termos de relacionamento, trocam a quantidade pela qualidade aguçada sobre os valores da vida, sabem tratar uma mulher com respeito e carinho.

São homens especiais, românticos, interessantes e atraentes pelo que possuem na sua forma de ser, de pensar, e de viver.

Na forma de encarar a vida, são mais poéticos, mais sentimentais, mais emocionais e mais emocionantes.

Homens mais amadurecidos têm mais desenvoltura no trato com as mulheres, sabem reconhecer as suas qualidades, são mais espirituosos, discretos, compreensivos e mais educados. A razão pela quais muitos homens maduros possuem estas qualidades maravilhosas deve-se a vários fatores: a opção de ser e de viver de cada um, suas personalidades, formação própria e familiar, suas raízes, sabedoria, gastos individuais, etc.

Mas eu creio que em parte, há uma boa parcela de influência nos modos de viver de uma época, filmes e musicas ouvida e curtidas deixaram boas recordações da sua juventude, um tempo não tão remoto, mas que com certeza, não voltam mais.

Viveram a sua mocidade (época que marca a vida de todos nós) em um dos melhores períodos do nosso tempo: os anos 60/70. Considerados as “décadas de ouro” da juventude, quando o romantismo foi vivido e cantado em verso e prosa.

A saudável influência de uma época, provocada por tantos acontecimentos importantes, que hoje permanecem na memória, e que mudaram a vida de muitos. Uma época em que o melhor da festa era dançar agarradinho e namorar ao ritmo suave das baladas românticas. O luar era inspirador, os domingos de sol eram só alegrias.

Ouviam Beatles, Johnny Mathis, Roberto Carlos, Antônio Marcos, The Fevers, Golden Boys, Bossa Nova, Marres Albert, Jovem Guarda e muitos outros que em balaram suas “jovens tardes de domingo, quantas alegrias! Velho tempo, belos dias”.

Foram e ainda são os Homens que mais souberam namorar: namoro no portão, aperto de mão, abraços apertadinhos, com respeito e com carinho, olhos nos olhos tinham mais valor…

A moda era amar ou sofrer de amor.

Muitos viveram de amor…

Outros morreram de amor…

Estes Homens maduros de hoje, nunca foram Homens de “ficar”.

Ou eles estavam a namorar pela certa, ou estavam na “fossa”, ou estavam sozinhos. Se eles “ficassem”, ficariam para sempre… ao trocar alianças com suas amadas.

Junto com Benedito de Paula, eles cantaram a “Mulher Brasileira em primeiro lugar”!

A paixão pelo nosso país, era evidente quando cantavam: “As praias do Brasil, ensolaradas, no céu do meu Brasil, mais esplendor… A mão de Deus abençoou, mulher que nasce aqui, tem muito mais amor… Eu te amo, meu Brasil, eu te amo. Ninguém segura a juventude do Brasil… sil… sil.”

A juventude passou, mas deixou “gravado” neles, a forma mais sublime e romântica de viver.

Hoje eles possuem uma “bagagem” de conhecimentos, experiências, maturidade e inteligência que foram acumulando com o passar dos anos. O tempo se encarregou de distingui-los dos demais: deixando seus cabelos cor de prata, os movimentos mais suaves, a voz pausada, porém mais sonora, hoje eles são Homens que marcaram uma época.

Eu tenho a felicidade de ter alguns deles como amigos virtuais, mesmo não os vendo pessoalmente, percebo estas características através de suas palavras e gestos.

Muitos deles hoje “dominam” com habilidade e destreza essas máquinas virtuais, comprovando que nem o avanço da tecnologia lhes esfriar os sentimentos pois ainda se encantam com versos, rimas, músicas e palavra de amor. Nem lhes diminuiu a grande capacidade de amar, sentir e expressar seus sentimentos. Muitos tornaram-se poetas, outros amam a poesia.

Por que o mais importante não é a idade denunciada nos detalhes de suas fisionomias e sim os raros valores de suas personalidades. O importante é perceber que seus corações permanecem jovens…

São Homens maduros, e que nós, mulheres de hoje, temos o privilégio de admirá-los.

Lisiê Silva

Nota da página: A autoria foi corrigida, pois a verdadeira autora é Lisiê Silva e não Zélia Gatai.

Borboletas Negras, o filme (Eu sou eu e minhas circunstâncias?)

Borboletas Negras, o filme (Eu sou eu e minhas circunstâncias?)

O filme Borboletas Negras, dirigido por Paula von der Oest, retrata a história da poetisa sul-africana Ingrid Jonker, numa interpretação irreparável da atriz holandesa Carice Van Houten. Com os pais separados antes do seu nascimento, Jonker passa o início da sua infância com a mãe, a irmã mais velha e os avós em uma fazenda. Aos dez anos, com a morte da sua mãe, ela e sua irmã Anna vão morar com o pai na Cidade do Cabo. Críticas, não aceitação, intolerância e rejeição paterna vão marcar a vida de Ingrid a partir desse momento.

O relacionamento ríspido com o pai faz com que Ingrid case logo cedo apenas para sair de casa. Logo depois, com o casamento fracassado, Jonker conhece o escritor Jack Pole, por quem se apaixona e passa a morar com ele.

Com o convívio com Jack, Ingrid começa a se relacionar com uma classe de artistas, fortes críticos do regime do apartheid, assunto do qual ela mesmo se identifica, tornando-se mais uma crítica ao governo segregacionista da África do Sul. Posteriormente, ao presenciar a morte de uma criança negra, ela escreve o famoso poema “A criança que foi assassinada pelos soldados de Nyanga”. Poema que se tornou conhecido mundialmente quando Nelson Mandela o leu em seu primeiro discurso como presidente da África do Sul.

Nessa fase a relação da poetisa com o pai, Abraham Jonker, se torna insustentável, tendo em vista que ele, membro do Partido Nacional do Parlamento, defensor ferrenho do Apartheid, e que tinha como função censurar quaisquer publicações contra o regime, não reconhecia o talento literário da filha e a rejeitava publicamente.

No meio de tantos conflitos internos, com uma vida marcada por tragédias, a vida de Ingrid se desalinha de vez, seu relacionamento amoroso com Jack Pole se perde, assim com os posteriores também. Adultério, aborto, carência afetiva extrema, alcoolismo, drogas, internações em hospícios e um diagnóstico de doença psíquica esvaziam aos poucos a mente brilhante da escritora. O final do filme é catártico.

A morte da mãe na infância, a rejeição pública do pai, a solidão, a enorme sensibilidade em confronto com o momento histórico em que vivia e, por fim, o alcoolismo e a própria doença agravada por uma vida trágica, é mostrado de forma crua para que se possa compreender as razões pela qual ela não conseguiu achar um caminho, saudável, que a permitisse conviver com suas dores e culpas.

Apesar da doença de Ingrid, o filme tem um viés que nos faz pensar. O sentimento de culpa, por circunstâncias das quais não fomos protagonistas e, muitas vezes, fomos até vítimas, pode levar a uma crença íntima de que não somos pessoas boas o bastante ou merecedores de uma vida feliz. Ocorre que, não raro, precisamos tornar essa crença em realidade, sabotando as possibilidades de uma vida viável emocionalmente, seja minando as coisas boas ou, simplesmente, aceitando as más e, o pior, nem percebemos que fazemos isso.

O efeito colateral da auto sabotagem é magoar a quem amamos, não avançar com nossos talentos e desistir dos nossos sonhos, pela falsa crença de que não merecemos ser amados, não merecemos sucesso e, por fim, não merecemos ser felizes. O resultado, por óbvio, são novas culpas e mágoas somadas às antigas.

Seria interessante que todos se questionassem por alguns comportamentos negativos e se perguntassem: será que as coisas não funcionam mesmo ou, por muitas vezes, somos nós os próprios vilões de nossas vidas? Somos nós os próprios sabotadores da nossa felicidade?

Bom, como não há existência sem dor, nem isenta de influências negativas, que nos faz desacreditar de nós mesmos, o perdão é um bom começo. Se não conseguimos perdoar o outro, ao menos, podemos nos perdoar pelas nossas fraquezas para seguir em frente, pois somos, sim, merecedores de uma vida plena e feliz.

Então fica a pergunta, estaria o filósofo espanhol José Ortega Y Gasset correto ao afirmar que “eu sou eu e minhas circunstâncias e se não a salvo, não salvo a mim mesmo”? Vamos todos refletir sobre isso.

Segue também o trailer:

O que é a Matrix? A sociedade de consumo por Marx e Baudrillard

O que é a Matrix? A sociedade de consumo por Marx e Baudrillard

O que é a Matrix? Essa é a pergunta feita por Neo, mas, de tão intrigante que é, o telespectador atento a internaliza como sua e, assim, passa a questionar-se. Morpheus, o grande filósofo da obra cinematográfica, diz, em dado momento, a Neo, que somente ele pode descobrir, de fato, o que é a Matrix, do mesmo modo que somente cada um de nós pode descobrir essa verdade.

“Infelizmente, é impossível dizer o que é a Matrix. Você tem de ver por si mesmo”.

Sendo assim, a descoberta da realidade é um ato individual, ainda que possa ser influenciado por outrem, sendo que depende de vontade e coragem. É muito mais fácil permanecer seguindo a rotina cotidiana, fazendo parte de uma engrenagem, como gostam de falar os positivistas. A dificuldade reside em enfrentar as condições dadas, a fim de que se possa atingir a consciência do real, tornando-se um inadequado social.

A escolha entre a pílula azul e a vermelha é o que determina se você quer saber o que é a Matrix. Se você decidiu pela pílula azul, por favor, não continue. Caso ainda esteja lendo, escolheu a vermelha. Sábia escolha. Seguem as palavras de Morpheus sobre o que é a Matrix:

Neo: O que é a Matrix?

Morpheus: Você quer saber o que é a Matrix? Matrix está em toda parte […] é o mundo que acredita ser real para que não perceba a verdade.

Neo: Que verdade?

Morpheus: Que você é um escravo, Neo. Como todo mundo, você nasceu em um cativeiro. Nasceu em uma prisão que não pode ver, cheirar ou tocar. Uma prisão para a sua mente.

A Matrix, dessa forma, é a construção artificial de uma realidade que se reveste de aparências determinadas pela nossa mente. É uma hiper-realidade, uma espetacularização, dada pelos dominantes e que aceitamos como verdadeira. Como prisão “tradicional”, haveria repulsa e todos combateriam tal prisão. No entanto, quando se criam gaiolas enfeitadas e cheias de distrações, passamos a não perceber (ou a não querer perceber) que, embora existam “atrativos”, ainda estamos em uma prisão. E, como em toda prisão, há controle, coerção e cerceamento de liberdade.

Todos os elementos que formam a Matrix não passam de manipulações sígnicas feitas por aqueles que detêm o monopólio das relações de força, para usar um termo de Foucault, e que nós aceitamos como verdadeiras. Assim, internalizamos as coisas a partir de seu valor simbólico, o que leva, por consequência, a um mundo de simulacros.

Embora o simulacro seja uma versão simulada da realidade, a sua construção se dá de uma forma tão cuidadosa, que a ilusão passa a substituir o real no imaginário das pessoas. Estas ficam condicionadas de tal maneira, que se recusam a aceitar que aquele mundo é apenas uma ilusão. Morpheus chega a alertar Neo para isso, afirmando-lhe que alguns indivíduos estão tão habituados àquela realidade, que defenderão o sistema.

Esse fato demonstra que a força do dominante consiste no nosso consentimento, uma vez que aceitamos uma realidade que nos é passada sem o menor poder de questionamento. Pelo contrário, procuramos aumentar a nossa dependência e alienação em relação ao sistema, o que, em uma sociedade de consumo, obviamente se demonstra pelo consumismo.

Há de se considerar que o problema não é o consumo, mas sim o valor simbólico que é dado às mercadorias, criando a hiper-realidade da Matrix. Essas ideias de Baudrillard podem ser percebidas também em Marx, a saber, na relação de fetichismo da mercadoria, em que as pessoas passam a atribuir às mercadorias um valor quase divino, consumindo-as pela sua transcendência, isto é, pela capacidade que certas mercadorias têm de elevar o indivíduo perante os outros.

O que não percebemos (ou não queremos perceber), mais uma vez, é que a Matrix, a nossa sociedade consumista, cria um exército de servos voluntários, que aceita os grilhões impostos pelos dominantes através da publicidade, como se fossem soluções mágicas de felicidade. Tomando suas pílulas azuis todos os dias, distanciam-se de si mesmos e, portanto, do autoconhecimento, tão necessário à libertação, já que, como dito, a libertação é individual e, se o indivíduo não busca autoconhecer-se, a fim de pensar de forma crítica o mundo que o circunda, torna-se impossível enxergar a Matrix.

A decisão entre sair ou permanecer na caverna é difícil desde Platão. Entretanto, a coragem é o que separa as almas livres dos meros autômatos que nos tornamos. A coragem é que faz um homem decidir tomar a pílula vermelha e livrar-se das amarras que tornam o mundo mais “bonito”. A coragem é que faz o homem manter-se erguido, percebendo a decadência da humanidade fora da hiper-realidade. A coragem é o que permite que alguns homens lutem pela liberdade daqueles que se acham livres por poderem escolher entre o Bob’s e o McDonald’s. A coragem é o que falta para aqueles que insistem em continuar dobrando a colher e não percebem que são eles que se dobram, pois, como disse Goethe:

“Não existe pior escravo do que aquele que falsamente acredita estar livre.”

Dizer adeus a um amigo

Dizer adeus a um amigo

Amigo é a cola que nos prende a cada etapa da existência. Amigos de infância, de colégio, de esporte e trabalho, amigos de copo, de loucuras, sem razão e sem noção. Os amigos nos situam, nos mostram onde estamos no momento, e, sem dúvida, por onde passamos e o que nos tornamos, inclusive por eles.

Dizer adeus a um amigo é renunciar obrigatoriamente ao seu convívio. É se dar conta de que, o que era uma escolha, no momento do adeus torna-se uma cruel imposição.

Amigos são aqueles que passaram por nossas vidas e deixaram lembranças, quase sempre deliciosas e divertidas, mas foram levados para outras estradas, outras escolhas, outros lugares. Amigos são os que frequentam a nossa vida e viraram nossos compadres, tios dos nossos filhos, conselheiros e enfermeiros para todas as horas. Amigos são também os que o mundo virtual nos apresenta, que de alguma forma se importam conosco, torcem por boas conquistas, fazem votos de aniversário, pensam em nós com carinho. E somos amigos de todos esses amigos na medida que retribuímos. Na parcela de tempo e vontade que destacamos para responder a uma mensagem, fazer uma ligação, uma visita, comparecer a uma festinha, encontrar na rua e dar um abração!

Diferente das outras formas de relacionamento, para os amigos não é preciso muito. Basta saber que o amigo existe e está tocando a vida como sonhou ou como pode, mas que é seu amigo, que ilustrou alguns dos seus dias e você guarda lembranças reais e a maioria delas é feliz! Até mesmo as que não foram, o tempo as transforma em piadas e lendas, e, quando contadas, se tornam o charme da amizade.

Dizer adeus a um amigo é ter a irremediável certeza de não haver mais nenhuma repetição dos momentos vividos. É sentir-se um pouco mais só no mundo, constatar a patética e tola certeza de que a vida escorre pelos dedos e nunca seremos capazes de segurá-la.

Dizer adeus a um amigo nos faz repensar o tempo. Como vivemos o tempo que temos. Como, de forma totalmente equivocada, já evitamos reencontros pelas mais variadas e infelizes desculpas.

E então é o dia de dizer adeus a um amigo. E nos deparamos no espelho com cara de órfãos, desolados e desorientados. Adultos que somos, vamos superar, mas, se há uma dor miserável de  intensa, essa é a dor, de dizer a adeus a um amigo. É dizer adeus a si mesmo, à parte que fomos em sua companhia, e, mesmo que ínfima no todo da vida, é a parte nos diz adeus e nos desfaz, a cada amigo que se vai.

Pre$ente*

Pre$ente*

Estamos nos aproximando do Natal. Muito embora a televisão não me tenha como expectadora percebo, por outros meios, que há sempre uma forte associação com a data, teoricamente ligada ao calendário religioso, e o comércio. As primeiras páginas na Internet e nos jornais nos bombardeiam de anúncios que se metem na frente das notícias nos obrigando praticamente a comprar qualquer coisa. Também há os shoppings lotados de pessoas penduradas de bolsas que, para quem as carrega, parece mostrar uma certa proporcionalidade do volume transportado com a alegria que sentirão na noite de Natal.

Todo esse desconforto que sinto passaria em silêncio, como já passou vários anos, mas o diferencial que não mais me deixou ficar calada foi o fato de minha filha de 11 anos vir me pedir um presente. Ainda por cima, pediu algo bem caro, pois, como ela mesmo disse, não era um presente qualquer, era um presente de Natal! Ela quer um PSP. Na hora eu pensei que fosse algum partido político e não entendi nada, mas depois descobri que é um videogame portátil de mil reais mais ou menos. Eu poderia até dar o que Nara havia me pedido, mas não mais como presente, pois este não se pede. Foi exatamente isso o que eu lhe disse e ela, obviamente, não entendeu. Então, contei-lhe uma história.

Há pouco tempo atrás eu vi vendendo em uma padaria umas bananadas pretinhas e grossas. Comprei uma e, antes mesmo de sair do estabelecimento, abri e comi. Ao descer pela garganta, aquele doce trouxe, além de calorias para dentro de mim, uma lembrança com a mesma quantidade de açúcar que continha. Fez com que meus olhos brilhassem com mais intensidade por causa das lágrimas que foram produzidas muito timidamente. Quem, ou melhor, por que um adulto choraria numa padaria ao morder uma bananada? Contive-me um pouco e acabei fazendo pior do que chorar. Ri com os dentes ainda pretos para quem me vendeu o doce e pedi todas as outras bananadas que estavam no balcão.

Cheguei em casa, coloquei toda aquela deliciosa aquisição numa caixa de sapato e embrulhei com um papel de presente bem bonito. Abusei do durex e das fitas vermelhas em volta. Tudo propositalmente, pois, como já deu para perceber, iria presentear alguém. A abertura de um presente é um momento solene e eu queria que esse momento durasse um pouco mais do que o normal… exatamente para eu ter mais tempo de observar o rosto assustado para quem ele seria destinado.

Manoela, que morava na casa ao lado da casa de meus pais, a madrinha de todas as minhas bonecas, foi minha melhor amiga na infância. Tínhamos a mesma idade, íamos juntas para a escola cantando as músicas do Balão Mágico, voltávamos juntas, fazíamos deveres de casa separadas porque mamãe dizia que aprender era um ato solitário, mas depois era só pular o muro e pronto! Juntas de novo! Fizemos, agora veja, o catecismo e a primeira comunhão juntas! Contamos tudo uma para a outra, até o que dissemos e não dissemos para o padre na hora da nossa primeira confissão. Manoela que falou mais do que devia teve a primeira penitência muito maior do que a minha. Quando eu estava no “amém” terminando a minha dúzia de pais-nossos, Manoela se ajoelhou ao meu lado com aquele número assustador: 30 pais-nossos e 20 ave-marias. Você contou aquele sonho? Ai, Manu, como tu é burra! Deixa que eu rezo as ave-marias pra você. Dentre tantas coisas prazerosas que a infância nos proporcionou uma delas era a nossa ida semanal a um botequim perto de casa que vendia umas bananadas que era o manjar dos deuses. Comprávamos o doce preto embrulhado no plástico e corríamos para nossa cabana para comer bem devagar. Nem sei quantas vezes fizemos isso juntas.

A infância havia passado e a adolescência também. Manoela estava morando sozinha num apartamento por aqui perto. Bati na porta e ela se surpreendeu ao me ver e ficou mais ainda assustada quando, sem falar nada, estiquei os meus braços passando-lhe o presente. A ingenuidade havia passado com os anos. A desconfiança, marca dos sobreviventes, ganhava espaço no olhar. Sorri. Abra, sua boba! Ainda na porta, cada uma de um lado que marcava o limite daquele lar solitário, Manoela começou abrir a caixa de sapatos. Parou um momento com medo de continuar. Estava na cara que era uma brincadeira e ela não estava segura de que iria se divertir com aquilo. Abra, Manu!Olha, se você não gostar me devolva, ok? Manoela demorou a acreditar quando viu o conteúdo. Ficou olhando para dentro da caixa um tempão e seus olhos azuis estavam completamente lubrificados de emoção. Elika, foi o melhor presente que ganhei na minha vida!

Aquelas bananadas, que não me custaram cinco reais, mostraram como Manoela esteve presente dentro de mim. E deve ser por isso que presente se chama presente. Para mostrar que não esquecemos da pessoa. Ele é uma comunicação simbólica na qual estão expressos nossos sentimentos mais pessoais. O valor não está ligado a um número que vem precedido de um cifrão.

Tá bom, mãe, entendi. Mas, por favor, não espere que eu fique feliz com bananadas no Natal.

Um a zero para a televisão.

Quando o amor chegar

Quando o amor chegar

Por muito tempo imaginei como seria o dia em que me apaixonaria. Cabelos ao vento, câmera lenta, música linda tocando, eu distraído, impecavelmente bem vestido, observo uma criança perdendo seu balão para o ar. É neste momento em que nos trombamos, eu peço desculpas, ele pede perdão e então a mágica acontece: nossos olhos encontram-se, um inunda o outro de sua existência, estamos apaixonados. Tudo perfeito, mas não é bem assim que acontece.

Na maioria das vezes, encontramos pessoas especiais em lugares terrivelmente triviais. Já me apaixonei numa fila, já me encantei em churrascos de domingo, já me entreguei aos olhos do amor em barzinhos de esquina, nunca em um campo florido, nunca numa ponte sobre o rio Sena.

E eram sempre as piores trilhas. Dava vontade de engatar a ré e adiar a felicidade só para não ter aquela música da reboladinha como nosso tema de primeiro encontro. E conheço gente que faz mesmo isso: anda com a música perfeita no bolso e dá play ao primeiro olhar. Obviamente isso assusta um pouco. A perfeição costuma mesmo assustar.

Esqueça Hollywood, desista de Woody Allen, apague Shakespeare. O amor não vai correr atrás de você no aeroporto, nem te salvar do afogamento, ou te tirar de um prédio em chamas. O amor não frequenta bailes de máscaras, nem salta no teto do trem. O amor gosta de se infiltrar nas pequenas rotinas, é lá que estão as pessoas de verdade.

Ele está ali, repousando naquele amigo tímido, tomando uma cerveja calmamente no posto de gasolina, por trás de um nick engraçado, segurando o elevador pra te esperar, te xingando no trânsito ou te ajudando a carimbar processos.

Quando o amor chegar, você não vai estar com sua melhor roupa, nem em paz com seu cabelo. Você vai estar resfriada, com pressa, sem humor ou dinheiro. Não vai conseguir dizer frases das quais possa se orgulhar e reprisar para os filhos. Você vai estar alta de tequila, dançando sem muita coordenação motora, você vai estar sendo aplaudida no pior karaokê do bairro da Liberdade.

Ao contrário do que você sonhou, quando o amor chegar, não haverá trilha, cenografia, nem iluminação. O amor acha chato o exato, morre de tédio com a perfeição. Quando o amor chegar só serão vocês dois e isso vai bastar para ser incrível. Mergulhe, entregue-se, mesmo que a música ao fundo só peça pra você requebrar até o chão.

Contribua com a publicação do meu livro “Amar, Modo de Usar” e garanta seu exemplar autografado. Saiba mais: www.kickante.com.br/amarmododeusar

Comportamento agressivo e violência na TV

Comportamento agressivo e violência na TV

De desenhos animados a jornalismo sangrento, estima-se que quase a metade do que se assiste nas salas de estar sejam cenas de violência. Até que ponto a violência exibida nas TVs de todo o país contribui para o aumento da violência urbana?

Essa questão é muito antiga, surgiu na década de quarenta e desde então muitos estudos têm sido feitos. Quase todos eles apresentam a existência de ligações claras entre a exposição de crianças á violência e desenvolvimento do comportamento agressivo. Há quase quinze anos um grande estudo também mostrou a ligação do comportamento agressivo às crianças expostas a videogames de conteúdo violento.

Diferente do impulso agressivo, o comportamento violento é aprendido. Eu pude ver com meus próprios olhos o meu filho reproduzir um ou dois comportamentos violentos por ter assistido três episódios do Chaves. Ele tem quatro anos e, ao ver algumas cenas nas quais o Sr. Madruga bate no Kiko, ele logo começou a “brincar de bater” na gente. Ele não assiste mais ao seriado, pelo menos até a segunda ordem minha e do pai dele.

A mídia se preocupa e se responsabiliza muito pouco pelo que exibe, dessa forma cabe aos pais um cuidado grande e constante com o controle do que seus filhos assistem, principalmente nos cinco primeiros anos de idade. Nessa fase a criança tem uma forte tendência a imitar – ela aprendeu a falar e a se comportar de forma geral imitando os adultos – ou seja – estar exposta ao comportamento violento vai, inevitavelmente fazer com que ela o reproduza.

Uma criança não deve assistir a programas de jornalismo sensacionalista e violento em hipótese alguma. O ideal é que ela não tenha liberdade total de mudar de canal. Até os cinco anos de idade o sugerido é que crianças assistam a um máximo de duas horas de TV por dia, mesmo que fracionadas, e que assista apenas à programação infantil adequada a sua idade. Casas com TV a cabo e/ou canais pagos em tablets também precisam de atenção. Ambos devem ser travados de modo à criança ter apenas acesso à programação adequada.

Aos que julgam que haja exagero na conduta acima, é importante lembrar que a violência na televisão tem grande poder de ser memorizada. Uma cena que dura apenas alguns segundos – transmitida numa pequena parte de um programa – pode ser recordada a longo prazo, mais do que qualquer outra cena da história em si. A violência possui uma mensagem muito contagiosa.  A reprodução de um comportamento violento visto na TV não é só agressão infantil física ou verbal, tal como bater em alguém. Ela representa formas diretas e sérias de agressão. Por exemplo: reproduzir cenas como disparar um revólver sobre alguém, atacar uma vítima com uma faca, atear fogo em algo, cortar alguém com uma garrafa partida. Crianças de até cinco anos estão na fase do pensamento mágico; assistir a cenas violentas alimenta negativamente a criação de histórias – tão comum nesse período.

Ao perceber que uma criança brinca reproduzindo comportamentos e/ou cenas violentas ou mesmo se, ao pedir que ela conte uma história, esta venha com cenas e conteúdo violento, fique atento. É inevitável que a uma certa altura da vida todos nós tenhamos que nos deparar com a triste realidade da violência social que infecta a nossa sociedade, porém ao descuidar do que as crianças assistem, estamos contribuindo para o aumento da violência. Muito cuidado com os deslizes em “achar bonita” e “engraçado” crianças violentas ou acreditar que elas assim possam se defender. Qualquer comportamento violento em crianças deve ser trabalhado para que seja extinto, mesmo que para isso seja preciso buscar orientação psicológica. Um aviso principalmente aos pais que praticam artes marciais ou qualquer tipo de luta: cuidado redobrado! As crianças não possuem ainda cognição para entender as particularidades do esporte, nem tampouco a restrição de quando e onde podem ser praticados.

Onde mora a violência, o afeto não entra.

O psicopata pode morar na sua casa!

O psicopata pode morar na sua casa!

Por Carmen Janssen

Eles estão espalhados por todos os lugares e sempre causando sofrimento às pessoas. É difícil identificá-los. O melhor antídoto é o conhecimento.

Quando se fala em psicopatas a maior parte das pessoas ainda associa a imagem de criminosos violentos e assassinos em série. Embora muitos psicopatas sejam assassinos, nem todo assassino é psicopata e nem todo psicopata é assassino.

Psicopatas não são doentes mentais, pelo contrário, são muito conscientes de seus atos. A psicopatia é um transtorno de personalidade antissocial e de acordo com estudos neurocientíficos é um defeito cerebral que tem um forte componente genético, é uma falha no sistema límbico (parte do cérebro responsável pelas emoções). As conexões cerebrais que fazem a pessoa sentir empatia pelos outros, não funcionam no psicopata. Ele(a) é insensível e sua principal característica é a total falta de sentimento de culpa ou arrependimento, quando comete um delito.

Inteligentes e extremamente individualistas, os psicopatas geralmente são sedutores, simpáticos e manipuladores. Eles usam essas “qualidades” para conseguir tudo o que querem.Sua missão de vida é aproveitar-se da humanidade custe o que custar. São indivíduos capazes de destruir a vida de uma pessoa sem sentir um pingo de remorso. Sua estratégia, eliminar todos os obstáculos. E não adianta tentar consertá-lo,o cérebro dele não é capaz de responder.

Aquele que tem um grau mais “leve” de psicopatia é o camarada enganador que sacaneia as pessoas para tirar vantagem delas. Ele se diverte com isso, não paga as próprias dívidas por opção, seduz mulheres carentes para conseguir dinheiro e depois desaparece, finge que é médico ou diz ser especialista de alguma área do conhecimento sem nunca ter feito sequer nenhuma formação ou especialização.

Na empresa é aquela pessoa que puxa o tapete de todo mundo para conseguir uma promoção, torna a vida das pessoas um inferno e até rouba a empresa.

É aquele cara conhecido como “esperto”, que vive para satisfazer, exclusivamente, as próprias necessidades. Ele não vai te matar, mas ele é um psicopata!

O difícil é provar, pois por ele ser muito carismático ninguém vai acreditar em você.

Os psicopatas podem estar disfarçados nos mais diversos papéis, tais como cartomantes, líderes religiosos que se enriquecem à custa dos fiéis, podem também estar entre os políticos ou falsos empresários, entre tantas outras variações.

Ou seja, ele pode morar na sua casa!

Por outro lado, o psicopata assassino não tem a menor dificuldade para matar. Ele é cruel e se diverte com a humilhação e o sofrimento da vítima.

Assassino ou não, o psicopata é sempre frio e calculista e totalmente indiferente aos sentimentos alheios, não tem laços familiares nem com a própria família, mas pode fingir sentimentos com maestria se isso lhe convier. Fique atento e afaste-se dele!

O psicopata comumente apresenta uma tendência à crueldade desde a infância. Alguns são crianças extremamente cruéis e com frequência causam sofrimento físico a pequenos animais, são agressivos e na escola, humilham colegas e professores. São pessoas que têm péssima adaptação social e dificuldade para seguir regras.

Se essas manifestações aparecerem repetidas no comportamento do seu filho, é preciso buscar ajuda psiquiátrica para encontrar as possíveis soluções adaptativas.

Carmen Janssen é psicanalista, sexóloga, escritora e conferencista internacional. Conheça mais artigos da autora em www.carmenjanssen.com.br.

(Esse é um conteúdo de nossa página parceira:www.fasdapsicanalise.com.br)

Pai registra o universo particular de seu filho autista

Pai registra o universo particular de seu filho autista

Rafael d’Avila do site Creatives publicou uma matéria onde apresentava as imagens do fotógrafo Timothy Archibald.

Timothy é pai de Eli. Eli é autista.

Nas fotos destacam-se a maneira particular com que Eli percebe e interage com o mundo que o circunda. As imagens não foram planejadas e são registros de momentos espontâneos de Eli.

A série fotográfica intitulado de ‘Echolilia: Sometimes I Wonder’ , segundo Rafael d’Avila:

“…é bastante íntima e instigante, captando a essência daquilo que desejava transmitir como forma de ‘estar fazendo algo por seu filho.'”

“…faz com que as pessoas consigam entender o que uma pessoa autista passa e como é o seu universo. Eli foi fotografado exatamente como ele é, diferentemente daqueles outros ensaios de crianças que sempre vemos, todos muito sorridentes em situações divertidas.

Para além das palavras, cada fotografia fala por si mesma. Confiram.

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Todas imagens são de Timothy Archibald

Que tal cuidar da sua vida?

Que tal cuidar da sua vida?

Vivemos numa sociedade em que muitas pessoas adoram se meter na vida privada dos outros. Decidem o que é certo e errado de acordo com suas próprias conveniências. E, por outro lado, muita gente deixa de fazer, ou finge que não faz, isso ou aquilo com medo do julgamento alheio. É um círculo vicioso.

Em verdade estamos mesmo é dando muita autoridade a quem não tem, a quem não paga nossas contas, a quem não conhece nossa história e não sabe o que nos faz feliz.

Não raro somos surpreendidos também com os nossos próprios parentes ou amigos que nos apontam o dedo para questões das quais não cabiam julgar, nem se meter, mas apenas apoiar ou pelo menos torcer.

Claro que não estou aqui falando que os conselhos da família e dos amigos não são bons. Muitas vezes são necessários. Falo da intervenção impertinente, não pedida, relativa à liberdade das nossas escolhas pessoais, daquilo que desejamos intimamente, mas que está fora do roteiro padrão que nos é ensinado desde cedo.

O velho roteiro padrão que todo mundo conhece: casar, ter filhos, ser bem sucedido na carreira, ganhar muito dinheiro, ter casa própria, carro etc. Para muitos alcançar tais metas é o ideal de vida perfeita, não há o que criticar, mas acontece que não somos iguais, não possuímos os mesmos sonhos.

Muitas pessoas preferem viajar a comprar um carro, algumas não querem casar, nem ter filhos, outras optam por uma vida mais sossegada sem a ânsia do sucesso profissional etc.

Warren Buffett, considerado um dos homens mais ricos do mundo, surpreendeu a todos ao afirmar o seguinte: “eu daria toda a minha fortuna para ser reconhecido como um grande filósofo e não como o homem mais rico do mundo”.

Nem sempre o roteiro padrão é o desejado e sonhado. Quantos artistas geniais se imortalizaram por coragem de romper com os padrões da sua época? E quantos artistas geniais, menos corajosos e mais conformados, a humanidade não deve ter perdido?

Tem a ótima frase de Magiezi que diz: “desde que minha vida saiu dos trilhos, sinto que posso ir a qualquer lugar”. É isso aí! As vezes precisamos sair dos trilhos para tomar o caminho correto, sem medo do julgamento alheio, sem medo de ser feliz.

Geralmente aqueles que têm a coragem de sair do lugar comum são os que buscam a felicidade com maior fervor. Submetem-se ao julgamento da sociedade? Sim. Sofrem com isso? Talvez. Já os que não têm essa coragem permanecem dando autoridade aos outros, numa busca por aceitação, cujo único preço é a própria liberdade.

Essa semana estava vendo um filme em que uma garota francesa, filha de pais brancos católicos, resolve se casar com um negro imigrante africano. A mãe da moça, apesar de simpatizar com o rapaz, confessa que se preocupa com os futuros netos mestiços e com a reação das pessoas quanto ela tiver que passear com as crianças na rua. A preocupação maior não é com a felicidade da filha, mas com os outros.

O filme retrata a mais pura realidade: o medo dos comentários alheios. Recentemente o escritor Fabrício Carpinejar foi muito feliz ao escrever: “Acabamos nos controlando demais com medo dos outros. Viver com medo é nunca ter nascido. Abençoada seja a loucura do bem. A vida precisa de mais entrega, de mais emoção, de mais autenticidade”.

A melhor forma de combater o preconceito, a hipocrisia e a inveja é buscar a nossa felicidade sem medo de errar. Somos livres e devemos exercer esse direito por mais difícil que seja.

Sim, se for nosso desejo, podemos nos relacionar com pessoas de outras raças ou credos, do sexo oposto ou do mesmo sexo, ter filhos mestiços, adotados, optar em não ter nenhum, casar, não casar, descasar e casar novamente, ser mãe ou pai solteiro, mudar de nome, de sexo, ser empresário, médico, artista, hippie, ser católico, espírita, evangélico, ateu, enfim ser o que quisermos. Nós podemos!

O que não podemos aceitar é a corrupção, a maldade, o preconceito, a violência, a falta de ética e outros males que assolam a humanidade.

O mundo seria muito melhor se as pessoas parassem de julgar os outros e se preocupassem com suas próprias vidas. Contudo, nada mais utópico do que pensar assim. Por isso, cabe a cada um brigar por seus sonhos e por uma vida mais autêntica.

Se somos tão diferentes em comportamento e em relação ao que queremos, como então se mede um homem? “Um homem se mede pela sua coragem. Coragem de ousar, arriscar e sonhar. E viver o que sonhou e continuar, eterno!” (Vitor Hilário)

Só uma mente muito tacanha pode achar que existe roteiro preestabelecido ou receita para a felicidade. Quem já tentou o roteiro padrão e está infeliz é melhor deixar o script de lado e começar a escrever a própria história, seja ela qual for.

Está na hora de sair dos trilhos, abstrair-se da inquisição alheia, e ousar ser feliz!

É fácil? Claro que não. Viver é tarefa.

Pontuando a vida.

Pontuando a vida.

Se seu texto ainda não chegou ao ponto final, valorize as exclamações!

O travessão avisa que vou falar, que é o meu espaço de comunicação, que tenho uma mensagem, um acréscimo, uma contribuição.

Quando peço a palavra para a vida, tomo a responsabilidade de ser ouvida e em alguns casos, seguida como exemplo. O travessão pode ser uma ponte, um caminho,  ou uma arma. Uma espada afiada.

Reticências dão o tom da divagação, da respiração que tenta concluir, refletir, deixar o outro complementar se preciso for. Em si são boas, mas o abuso delas pode comprometer a mensagem…

A vida entre parênteses é um perigo. Nunca se sabe se é melhor sair e fazer parte da dinâmica, ou, permanecer velada, visível mas impenetrável, infelizmente dispensável se retirada do contexto. É o caso das indecisões, da falta de posicionamento, do medo paralisante de errar e fracassar. Entre parênteses, coloque-se somente o que realmente não pode ser misturado ao todo.

Dois pontos são as constatações importantes, as realidades, as ocorrências, felizes ou não, mas presentes em toda a composição da vida. As vírgulas ditam o ritmo, as pausas, o que se acrescenta e segue em frente. O que é narrado entre  vírgulas,  geralmente é especial.

Na dúvida, na vontade de saber mais, de se aventurar, que questionar, todas as interrogações do mundo são válidas. E a cada parágrafo um novo passo, um assunto diferente, uma nuance da vida descoberta com o tempo, carregada de vivências. Carregamos alguns parágrafos longos e enfadonhos, seguidos de outros mais leves e sintéticos. Depende sempre do desenrolar da história.

Tudo necessário, útil e com significado e valores definidos, Contudo, nada mais inquietante, desbravador e estimulante do que as exclamações! Através delas consegue-se demonstrar grandes surpresas, loucas descobertas, estupendas emoções! Exclamar é quase obrigatoriamente terminar uma frase com um sorriso! Exclamar é soltar de forma espontânea uma reação! Exclamar é fazer um anúncio, uma homenagem, uma aclamação!

A pontuação da vida é uma composição pessoal, muitas vezes colaborativa, outras, solitária ou mal entendida, mas cada um sabe onde cada ponto lhe convém.

Importante lembrar, enquanto não chega o momento do ponto final, que exclamações são infinitamente mais empolgantes e vibrantes do que reticências, e, que as aspas alheias sejam exemplo de valores a considerar.

Talvez seja hoje o dia

Talvez seja hoje o dia

Talvez seja hoje o dia de retornarmos à velha natureza, mas não àquela do mundo. Talvez seja hoje o tempo de retornarmos humildes à natureza que nos habita.

Talvez seja hoje o dia de sairmos à caça de respostas cujas perguntas estão esquecidas em nós.

Talvez seja hoje o dia de abandonarmos a sensatez e de nos entregarmos à sandice de adentrarmos os vastos bosques que nos habitam, descalços.

Talvez seja hoje o dia para exercitarmos a fé e crermos que, mesmo quando a noite cair – e nos virmos sozinhos no escuro de uma floresta – um novo sol virá, um novo recomeço será, um novo sonho dançará em frente aos nossos olhos e quem sabe, um novo amor poderá cair sobre nós feito chuva de verão.

Talvez seja hoje o dia para perguntarmos aos loucos como eles conseguiram sair dos caminhos meticulosamente traçados pela razão.

Talvez seja hoje o dia de enterrarmos nossos mortos para darmos novas chances aos vivos. Talvez seja hoje o dia de negarmos ao corpo o medo e de acreditarmos que somos maiores que todo o desconhecido que nos permeia.

Talvez seja hoje o dia em que nascerá em nós a percepção que nos dirá de quem realmente somos.

Talvez seja hoje o dia de acreditarmos em algo maior e melhor. O dia de crermos e aceitarmos que o outro não nos matará, mas sim nos amará longa e profundamente.

Talvez seja hoje o dia de esquecermos o que nos contaram e de entregarmos em novas mãos, novas possibilidades.

Talvez seja hoje o dia de nos encontrarmos em diferentes etapas da vida e de tirarmos nossas próprias conclusões acerca de tudo que disseram de nós. Talvez seja hoje o tempo que nos cabe para vencermos as armadilhas do mundo e aquelas que nós mesmos armamos dentro do nosso eu.

Talvez seja hoje o dia de cavalgarmos os potros selvagens que infestam nossos instintos e de deixá-los nos guiar ao encontro das nossas mais profundas aspirações.

Talvez seja hoje o dia de admirarmos o melhor em nós. De encontrarmos a coragem que mora na cabana de nossa alma e de abandonarmos os destroços dos nossos erros do passado.

Talvez seja hoje o dia de perdoarmos nossos tropeços, de olharmos para o horizonte de um jeito novo, de amarmos sem pudores e de nos deixarmos amar, onde e quando tivermos vontade.

Talvez seja hoje o dia de enfrentarmos o desconhecido que nos habita e de nos afeiçoarmos à nossa natureza, ouvindo nos sons vindos do nosso eu mais profundo, as mais belas melodias.

Talvez seja hoje o dia de finalmente sermos, de finalmente realizarmos, de finalmente nos aprumarmos para, em nossa humanidade, sermos tudo aquilo que precisamos ser para, com êxito, sermos os donos dos nossos próprios caminhos.

Acompanhe a autora no Facebook pela sua comunidade Vanelli Doratioto – Alcova Moderna

Quando casar sara?

Quando casar sara?

Por Marcela Alice Bianco

“Quando Casar Sara! Quantos de nós, quando crianças, ouvímos essa frase de nossas mães, tias e avós após nos machucarmos? No meu caso, além dessa afirmação, povoavam meu imaginário e ambiente familiar, tantas outras mensagens que remetiam ao casamento e ao papel que ele representaria na minha existência futura. Lembro-me, por exemplo, de uma brincadeira que fazia com as amigas em que definíamos através de uma conta com as letras de uma palavra com quantos anos iríamos casar e quantos filhos teríamos. Também me recordo de um baú de bordados da minha avó no qual ela guardava os futuros enxovais de suas netas. Muitas vezes, ela abria o baú para me mostrar o material com entusiamo e dizia: – “Se Deus quiser você casará com um homem bom!”

Além disso, todos os contos de fadas que eu lia falavam de princesas que adormecidas, abandonadas ou enclausaradas em torres eram libertadas por lindos príncipes corajosos que as levavam para castelos onde viveriam felizes para sempre. E tudo isso gerava fantasias de que um dia eu precisaria ser libertada de alguma coisa para ser feliz.

Os anos se passaram e eu não casei com a idade prevista na brincadeira, mas bem depois! Também não herdei da minha avó os bordados já então amarelados pelo tempo para enfeitar a minha casa nova, assim como não levei a diante seu modelo de relacionamento conjugal. Faço parte de uma geração, que, ao crescer e perceber a possibilidade de independência financeira e emocional, pôde fazer outras escolhas que não a de esperar pelo resgate do príncipe encantado.

Tal liberdade também trouxe novos desafios, pois já que não seria mais necessário ter um príncipe e nem assumir o papel de uma princesa, passou a ser preciso aprender um novo jeito de relacionar.

Mas, parece que, de alguma forma e por vezes, inconscientemente, ainda carregamos conosco uma imagem do relacionamento baseado no amor romântico, e por consequência, do casamento como algo que irá nos salvar ou nos fazer sarar de algo que está ferido. E, portanto, passamos a investir na imagem de um parceiro amoroso a projeção da completude para um vazio existencial.

Muitos têm fracassado na tarefa, seja porque não conseguem encontrar a pessoa “ideal” ou porque não conseguem trilhar um caminho saudável no casamento que leve a realização. Entre os que se casam, os relatos de desentendimentos, conflitos, frustrações, cobranças e desajustes são inúmeros. Em muito casos, a separação é a saída encontrada por um ou por ambos os lados da dupla. A questão é que as pessoas já não estão mais dispostas a manter um casamento infeliz e que não as satisfaçam. E, uma boa parte das que permanecem em relações desgastadas e sem mudanças estão presas em questões materialistas, em seus próprios ideiais ou em algum ciclo vicioso doentio.

Independente da opção escolhida: casar-se ou não casar; separar-se ou tentar reconstruir uma relação desgastada, a questão que fica é que precisamos repensar o que esperamos de um casamento e qual sua função em nossas vidas.

Para além da consolidação dos modelos de sociedade e de família vigentes na nossa cultura atual, é fundamental que encontremos razões individuais para desejarmos ou não o enlaçe com outrem, já que compartilharemos com ele nossa existência e caminho de desenvolvimento.

Voltando a ideia do casamento como algo que nos curará das nossas feridas, imaginamos que ele nos levará a um estado de bem-estar contínuo e satisfatório para o nosso modo de vida. Bem-estar significa ausência de desprazer, de tensão, de desgates. Liga-se a ideia de plenitude, prazer e conforto. E também à necessidade de pertencimento e de se sentir protegido e seguro. Seria o tal do “felizes para sempre”.

Porém, a vida não se faz num contínuo de bem-estar e satisfação. Para amadurecermos, seja individualmente ou como casal, precisamos enfrentar os opostos, ou seja, as diferenças de criação, de jeitos de ser, de expectativas e por aí vai. Processos que geram conflitos, inseguranças, dúvidas e ansiedade. Mas, que também trazem a possibilidade do surgimento de uma nova personalidade mais madura, integrada e consciente.

Neste sentido, o casamento pode ser sim uma forma de salvamento, mas não àquela salvação que nos levará a uma espécie de paraíso onde tudo é perfeito e maravilhoso. O que ele pode oferecer é uma via para o processo de individuação. Ou seja, um caminho para que cada um dos pares possa seguir em seu desenvolvimento, tornando-se o mais próximo possível do próprio potencial de realização.

A intimidade e a entrega impõem desafios. O ajuste das expectativas projetadas no outro e a capacidade de compreendermos o que ele é realmente capaz de nos oferecer exige que o enxerguemos como alguém diferente de nós e não como uma extensão dos nossos desejos. O controle das reações agressivas diante das frustrações e do ciúme demandam força, habilidade e amadurecimento pessoal. Desde a negociação de qual será o sabonete para o banho até como se dará a educação dos filhos, todas as tarefas que envolverão o casal durante sua jornada os ajudarão a amadurecer sua forma de ser relacionar com o parceiro e consigo mesmo.

Então se formos responder à pergunta: Quando casar sara? A única resposta que podemos encontrar é: Depende!

Depende das feridas que você carregou ao logo do caminho até chegar no altar e do que será preciso para curá-las. Depende do parceiro escolhido para a jornada de individuação que a vida te propõe.  Depende se o casal não deixará a relação estagnar e cair na rotina e no automatismo. Ou se ficarão apenas no desejo sensual ou presos aos deveres.

A questão é que todo mundo leva para dentro do novo lar toda sua bagagem de vida e nela podem ser encontrados todos os tipos de feridas psíquicas imagináveis. E, nesse caminho podemos passar a vida repetindo os mesmos comportamentos que nos levam a nos machucar irremediavelmente ou podemos, através do aprendizado e da mudança alcançar um novo nível de consciência que nos ajude a se relacionar com o outro de maneira criativa e amorosa. Neste último caso, o casamento pode ser sim uma via saudável para o crescimento e para a busca da felicidade onde, duas pessoas inteiras, compartilham uma jornada de desafios e conquistas que as levará a um profundo conhecimento de si próprias e do outro.

Enquanto uns têm preços, outros têm valores

Enquanto uns têm preços, outros têm valores

Preço e valor são coisas completamente diferentes, muito embora alguns as tenham erroneamente por sinônimo. Isso vale tanto para o mundo dos negócios, quanto para as demais relações sociais. O problema maior dessa confusão é quando o que está em questão são pessoas.

Nos negócios, o preço está relacionado a dinheiro, enquanto que valor está relacionado aos benefícios agregados ao produto, tais como sentimento de pertencimento, utilidade e sentimento a ele relacionado (possui valor agregado). Quando estamos falando de pessoas, notamos que o sentido é semelhante, porém sua confusão é mais danosa.

Preço é quanto vale, em dinheiro, o produto, objeto ou até mesmo uma pessoa. Este está relacionado as suas características próprias, sem nenhum outro agregado. Já o valor não é definido pelas características próprias do produto, objeto ou pessoa, mas pelo que ele agrega.

As pessoas têm seus valores definidos a partir do que agregam ao longo de suas vidas. Seus valores dependem da educação, dos tipos de relações sociais vivenciadas. O homem nem nasce mau, como atestava Hobbes, nem mesmo bom, como aferia Rousseau; apenas nasce homem… sem valores, apenas como preço de homem.

Enquanto uns apenas têm preços, outros têm valores. O caráter destes últimos não está à venda ou pode ser mensurado por meio de “preço”, seja ele pago em dinheiro, com fama ou com poder. O seu valor não está em si, mas no que agregou ao longo da vida. Por outro lado, enquanto uns tem valores, outros têm apenas preços. Alguns destes etiquetados, aguardando um comprador; expostos em vitrines, muitas vezes em promoção. Vendem-se, trocam-se sem nenhum valor agregado. Na verdade, vende-se por preços que nem mesmo valem. Quem compra, logo percebe que uns valem muito menos que 30 moedas de prata.

Por Cristiano das Neves Bodart- Fonte indicada: Café com Sociologia

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