Ter experiência não é igual ter maturidade

Ter experiência não é igual ter maturidade

Ao perceber o peso implacável do tempo sobre o corpo, penso numa frase clichê frequentemente utilizada por quem já deixou a juventude para trás.
“Ah como seria bom ter a cabeça de agora e o corpo de 20 anos.”

De fato, os anos nos trazem experiência de vida no mesmo passo em que o corpo parece, simplesmente, oxidar. Mas, enquanto o avançar dos anos, invariavelmente, corrompe a integridade do corpo físico, nem sempre eles nos trazem maturidade emocional.

Descobri que passamos a vida inteira tratando experiência e maturidade como sinônimos para então constatar que pessoas muito experientes podem se tornar arrogantes, intolerantes e excessivamente seguras, mas pessoas maduras se tornam calmas, humildes e assertivas.

Descobri que ter experiência é saber sobre as coisas da vida, mas ter maturidade é poder compreendê-las.
Descobri que a experiência pode nostornar dogmáticos, mas a maturidade nos torna humanos, acolhedores da diversidade.

Descobri que pode existir pessoas jovens emocionalmente maduras e sexagenários emocionalmente infantis e que muitos de nós, a despeito do fato que aos 25 anos acreditávamos saber tudo sobre a vida, aos 50 concluímos que, no que diz respeito à maturidade emocional, somos mesmo recém-nascidos.

Por gentileza, leia este texto. Obrigada !

Possivelmente, você deve ter estranhado o título acima.
Mas, o objetivo deste meu texto é mostrar a importância de palavras como:
por gentileza, obrigado, por favor, com licença, me desculpe –
palavras que a maioria dos pais ensinam ou ensinavam a seus filhos
desde pequenos e que são muito pouco usadas atualmente.
Já pisaram no meu pé várias vezes, já levei bolsada na cabeça, dentro de ônibus,
já me magoaram outras tantas…
Me pediram desculpas? Não! (com raras exceções). Mas, minha desilusão
não foi pelas pisadas no pé e bolsadas na cabeça e por terem me magoado.
Mas sim, pelo não pedido de desculpas.
E esse ato de pedir desculpas põe fim a qualquer irritação.
E eu, particularmente, sou movida à gentilezas.
O cavalheirismo de antes, em que nós, mulheres, éramos cordialmente convidadas
a entrar primeiro num local; Até aquelas “cantadas” masculinas, que tinham um “quê”
de graciosidade e que, falsamente fingíamos não ouvir, acabaram.
É de uma beleza divina, quando somos magoados por gestos ou palavras, e logo em
seguida, vem aquele consolador pedido de desculpas.
É muito desolador constatar que essas atitudes estão perdendo o seu valor.
Parece que pedir desculpas, dizer por favor, cumprimentos, viraram palavras de luxo, ou demodê.
Será que o bonito hoje, é ser rude, madboy?
Ainda há, com certeza, quem aprecie a cordialidade, o falar leve, a delicadeza de um gesto,
de um abraço, um aperto de mão, de ouvir um desculpe, um bom dia, mas, temos receio
de sermos vistos como fora de moda, ou até bajuladores.
Um olhar que diz tudo! Podemos até sorrir, demonstrar simpatia, compreensão, compaixão,
pelo nosso modo de olhar!
Quase sempre um amor nasce num primeiro olhar, depois aumenta no primeiro beijo…
O mundo está clamando por mais AMOR, por mais palavras calorosas, por amizades sinceras.
Já sofremos bastante com as durezas inevitáveis da vida e com outras
mazelas que poderiam ser evitadas.
A ternura não se extiguirá se cada um de nós se propuser a fazer a sua parte
– sem receio de parecer ridículo, fora de moda.
Porque o que está fora da moda bonita,
é a deselegância das palavras, dos gestos, das atitudes…
Por onde passarmos, deixemos o nosso brilho,
ou teremos passado por este planeta, em vão!

Ah! Obrigada de coração, se você leu este texto até aqui!
Lu Prado

As 3 fases de um relacionamento tóxico

As 3 fases de um relacionamento tóxico

O PRÍNCIPE ENCANTADO – FASE DA IDEALIZAÇÃO

Idealização, Desvalorização e Descarte: as três palavras mais terríveis para qualquer um que já tenha se envolvido no ciclo de uma relação com um sociopata narcisista ou antissocial.

No início de seu relacionamento ele era tudo o que você sempre quis? O príncipe encantado com quem um dia você sonhou e quando acordou, lá estava ele aos seus pés? Aposto que ele era. Era todo carinho e adoração? Sua atenção, seu tempo, seu interesse, tudo para era você? As surpresas inesperadas, os elogios constantes que faziam com que você se sentisse linda e muito especial? Ele parecia genuinamente ouvir o que você tinha a dizer? Horas conversando… e de repente, você achou sua alma gêmea, seu melhor amigo e o amante mais cuidadoso? Tenho certeza que sim!

Os sociopatas narcisistas e antissocias são mestres absolutos do charme e manipulação. Eles têm a incrível capacidade de ser exatamente o reflexo daquilo que você deseja, quer e precisa. Mas não se engane, o sociopata não se importa com você. Nada daquilo que você vê é real. É tudo desenhado para a conveniência dele e para que ele consiga adentrar suas defesas, limites e espaço pessoal, tomando o controle de seu tempo, de sua atenção, de sua vida. Esse sonho tem um prazo de duração e quem determina esse prazo é ele.

No início do relacionamento com um sociopata, todas as emoções normais de euforia que se sente quando se inicia um novo relacionamento estão lá. No entanto, ainda que tudo esteja perfeito, tem sempre algo estranho sobre ele que não se encaixa, que você não entende bem o que, mas decide ignorar para continuar vivendo o sonho. 

Uma vez que o sociopata percebe que você pode ser uma fonte viável de suprimento narcísico, investirá em você tão rápido, tão alto e com tanta força que você não vai saber o que a atingiu. Você mal acreditará quanto esta pessoa parece estar apaixonada por você. Seu charme e constante afeto não são como nada que você já tenha experimentado antes. Ele realmente parece bom demais para ser verdade…

A idealização é a primeira fase neste ciclo surreal constante que é a relação com sociopatas. É a “fase do pedestal “, isto é, você é posta na posição de uma deusa, e ele parece tão sincero, faz com que você se sinta tão bem e produza tantas daquelas endorfinas da paixão, que logo você fica dependente . Ele demanda seu cuidado e atenção constantes, despertando em você a empatia e seu lado maternal.

Nessa fase ele moveria montanhas para sua felicidade. Ele ama tudo sobre você e faz questão que você saiba disso. O contato com você é constante. Faz planos, quer te ver, ouvir sua voz mesmo que seja para um simples “oi”. “Desfila” com você para os amigos e quem sabe até para sua família, como se você fosse um troféu do qual ele está orgulhoso. E você lá, deslumbrada com toda essa atenção que nunca recebeu de ninguém. Por ele, você começa a dizer a si mesma que tudo vale a pena e… logo colocará isso em prática…

Vocês se conhecem há pouco tempo, mas já parece anos. Tudo se move rápido com ele. É comum o sociopata falar rapidamente de casamento, filhos e tudo que ele, estudando você, saiba que você quer ouvir. Como são irresponsáveis, inconsequentes e não sentem qualquer culpa ou remorso, dirão essas coisas mesmo sem nenhuma intenção de concretizá-las. Ainda que cheguem a concretizar algo, viram as costas para essas coisas sem nenhuma cerimônia. Mas isso só acontece mais tarde…quando já atingiram todos os seus objetivos obscuros.

Na fase da idealização estamos só no começo. Nessa fase parece que ele não se cansa de você, certo? Errado! Ele pode e ele vai se cansar. Logo. Uma vez que o narcisista percebe que a “comida dele está no anzol”, ele começa a enrolar a linha para trazer sua presa para suas mãos. E é aqui que começa o verdadeiro pesadelo.

PRÍNCIPE OU SAPO? – FASE DA DESVALORIZAÇÃO

Desvalorização é a segunda fase do ciclo que compõe a relação com sociopatas, em especial, o narcisista . Eu, pessoalmente, não estou bem certa de qual fase é pior, a desvalorização ou o descarte. Ambas são terríveis. 

Agora que você está viciada em toda a atenção, romantismo e bombardeamento amoroso que vêm em sua direção com grande intensidade e rapidez na fase da IDEALIZAÇÃO prepare-se porque é hora de conhecer o homem (ou a mulher) com quem você está realmente.

O narcisista tem dois métodos para fazer o outro se sentir abaixo de zero: ele pode destruir de forma rápida e brusca o pedestal sob seus pés, desaparecendo no nada como se você nunca tivesse existido, sem dar a mínima explicação e comodamente reaparecer como se nada fosse ou…fazer isso de forma lenta, insidiosa e cruel. É quando escolhe esta segunda técnica de desvalorização que ele mina sua autoestima, corrói sua identidade, desdenha de seus sonhos e conquistas, aponta de forma cruel seus defeitos, isola-a do mundo acusando a todos, levanta contra você suspeitas daquilo que você não fez, alterna sua cara amarrada e mal humor com pequenos gestos de doçura (de modo que não perca o controle sobre você), enfim, lhe faz provar um doce-amargo constante e infernal, de modo que você passa a ter diante de si alguém que você “ama”, mas que estranhamente lhe entristece a maior parte do tempo. 

Ele fará isso com tudo o que ele tem em seu arsenal. Seu arsenal é bem abastecido. Abastecido com seu ódio, raiva e incapacidade de assumir a responsabilidade por qualquer de suas ações ou receios. Sempre com raiva, busca culpar qualquer um além de si mesmo por tudo que não dá certo ou que lhe desagrada. Ele nunca fez nada. Ele é a vítima. Não importa quanto você o venere, obedeça, ceda ou concorde, você sempre fez algo terrível que “o magoou profundamente e que justifica os seus mau tratos”… 

Pesquisas mostram que a maior parte dos narcisistas desenvolvem seu transtorno no início da adolescência e também na infância, quando não conseguem desenvolver bem o superego. Muitas vezes, é um resultado direto de abuso ou negligência. Outras, resultado de uma vida sem limites por parte dos cuidadores. Principalmente, se não quase sempre, por parte da mãe. 

Mas, pare! Eu sei no que você está pensando: Não, você NÃO pode ajudá-lo. Quem se envolve com alguém assim precisa de mais ajuda do que ele. Você não pode ajudá-lo pelo simples motivo que ele não acredita que haja algo errado com ele. O problema “está com você”. No final você será difamada como louca, perseguidora, fútil, interesseira, etc. Você será o que na verdade ele é e por isso projetará TUDO em você.

Na verdade, o narcisista é um grande impostor que projeta uma imagem charmosa e perfeita. Mas sua incapacidade de manter a máscara, permite que você enxergue rapidamente ver quem ele realmente é. E se você não ignorar seus instintos, é claro…

Sua própria turbulência interna , baixa autoestima (ao contrário da crença popular, narcisista não têm a autoestima elevada que mostra ao mundo ) e medo de abandono, faz com que o narcisista abandone as pessoas com grande facilidade. Isso não deixa de ser um mecanismo de defesa contra aquilo que no fundo, teme. Ah, e não, não adiante assegurar-lhe que você não vai abandoná-lo. Isso só vai enfurecê-lo, mostrar quanto você é submissa e fraca. Na verdade isso mostra que você tem para dar um amor que ele não tem e isso faz com ele se sinta inferior e inadequado. Não é o seu abandono que ele teme. É o da mãe (que está no passado, mas que o assombra) e isso, você não pode mudar. Não, nem mesmo com todo o amor do mundo. Na verdade, sua busca é receber amor de seu objeto primário (a mãe), o que nunca ocorrerá porque o tempo em que essa ferida se abriu está lá na infância, impossível de se resgatar na fase adulta quando se trata de narcisistas e antissociais.

Na fase de desvalorização, o que ele antes achava incrível sobre você agora se torna veneno. Assim, lançará farpas sobre você sem nenhuma razão aparente. É o momento de destruir em você tudo o que ele admira e que sabe não possuir. Isso faz imensa confusão na cabeça das vítimas. Elas são incapazes de compreender por quê isso acontece . Como você poderia ser amado num minuto e tão ferozmente detestado no próximo?

É nessa fase que o narcisista vai usar tudo o que você confidenciou-lhe, contra você. Lembre-se: o narcisista é um predador e sua presa é bem dimensionada na fase de idealização . Todo o tempo que ele escutou você tão atentamente, espremendo mais e mais informações sobre a sua vida, seu passado e seus objetivos atuais e futuros…lamento em informar: ele estava apenas observando, estudando você… e essa pesquisa culminará com a sua destruição final e devastadora, basta você permitir.

Ele passa a criticar tudo sobre você , desde a maneira de olhar, rir , dormir, comer, se vestir, se relacionar com os outros, sua família, seus amigos, tudo será alvo de críticas. Críticas abertas ou veladas. Algumas vezes escrachadas outras travestidas de “eu só estava brincando”… Ele pode vir a público e criticá-lo severamente ou pode fazê-lo muito sorrateiramente, tentando disfarçar como se ele só quisesse ajudar… Ele não ajuda e não ajudará jamais. Jamais será o companheiro que você sonhou. 

Se você for do tipo questionadora, que capta quando há maldade, ele vai devolver para você com sua especialidade: o tratamento silencioso. Uma agressividade passiva, um “silêncio ensurdecedor” que acusa você sem sequer uma palavra. É um de seus métodos mais cruéis e mais utilizados contra suas vítimas mais inteligentes e questionadoras. Ele não consegue argumentar seu comportamento completamente desequilibrado então fica calado, castigando, insinuando que você está tão errada que não vale a pena nem dirigir-lhe a palavra! Diga lá: São mestres ou não em manipulação?

Aos poucos o narcisista separa-se emocionalmente de você. Isso faz com que você se pergunte o que fez de errado e inicie uma maratona para “compensá-lo” e trazer a relação para a primeira fase. A resposta é mais distanciamento e indiferença. Ele sabe bem o que está fazendo. Passa a dar desculpas para gastar menos tempo com você, chegar tarde em casa, não aparecer, não dar sinal por dias. 

Nesta fase você terá pequenas pausas em que será bem tratada. Isso acontece quando ele percebe que você está se distanciando, andando com as próprias pernas, desligando-se do abuso. Ele não quer que você se vá antes que ele esteja pronto para descartá-la e, para evitar isso, vez ou outra se apresentará com a máscara do começo. E isso só causa mais confusão emocional, a não ser, é claro, que você já entenda com quem está lidando. Se já entende, esta é sua chance de cair fora antes de ser massacrada. Você será, basta esperar.

De repente, o seu trabalho torna-se engolir abuso, humilhações, abandono e choro . O que o narcisista está fazendo com você é a DESVALORIZAÇÃO propriamente dita. Ele faz isso porque é irremediavelmente machucado por dentro. Um verdadeiro zumbi moderno, vazio de outra coisa senão instintos mais primitivos e gratificações instantâneas. Ele faz isso porque realmente não está disposto a fazer tudo o que é necessário para manter seu suprimento narcísico (você). Ele precisa de suprimento narcísico (atenção, dedicação, adoração, subserviência, sexo, etc) como uma droga. Ele quer agora e não quer trabalhar por isso. Ele sabe disso e se ressente.

O narcisista se cansa muito facilmente e, como qualquer viciado em drogas, precisa de mais e mais a cada vez para manter “seu barato”. Quando a euforia sentida no início de qualquer relacionamento acaba, uma vez que está provado que surge de substâncias químicas no cérebro, ele simplesmente se entedia e se enfurece. Sabe que o problema está com ele, mas projetará culpas imaginárias sobre você para não ter que lidar com sua superficialidade, além ter uma desculpa para partir para a próxima vítima que lhe dê suprimento novo, sem parecer o vilão da história.

As pessoas saudáveis, durante a química da paixão, podem desenvolver outras ligações, respeito pelos limites do outro e outros sentimentos que criam laços mais profundos, substituindo a paixão química. Há desenvolvimento de uma relação saudável onde ambos mantêm sua autonomia como indivíduos. Então esqueça: Você jamais terá isso com um narcisista patológico. Ele não permitirá que tais laços se estabeleçam. Ele olha para as pessoas nesses relacionamentos como fracos, submissos ou patéticos. Isso ocorre porque alguns estágios emocionais e de desenvolvimento do narcisista foram atrofiados na infância ou adolescência por algum evento traumático, ainda que esse trauma seja uma mera percepção dele de um determinado fato. É claro que nem todo mundo que experimenta traumas de infância desenvolve Transtorno de Personalidade Narcisista. 

Então acredite, na desvalorização o que ele deseja é destruir sua mente, seu brilho, sua energia vital, pelo simples fato de que ele se ressente de sua dependência por você, e é através da desvalorização que ele conseguirá colocá-la na posição de dependente, de modo a sentir-se um pouco melhor. Quem chegou a esse ponto deve preparar-se para o golpe final: O DESCARTE

DO CASTELO À LATA DO LIXO – FASE DO DESCARTE

O DESCARTE é a terceira e última fase da experiência traumatizante e dolorosa que é o encontro com um sociopata narcisista. Prepare-se, pois é nessa fase que você vai vê-lo completamente sem máscara, numa versão diabólica que você nunca pensou em associar àquele anjo imaculado que você conheceu e que lhe deu tanta lição de moral e bons costumes ao longo de toda relação.

Quando ele tiver rasgado você ao meio e arrastado seus pedaços para as profundezas do inferno com suas agressões verbais, sua humilhações, suas mentiras, traições, inversões, projeções e, em muitos casos, atos de violência física , ele vai descartar você. 

Assim que ele tiver sugado por completo sua energia vital, deixando-a esvaziada de alegria de viver, autoestima, amor próprio, autorrespeito e dignidade, ele vai jogá-la fora com crueldade e sangue frio. Simples assim, como se você um pedaço de papel sujo. Papel higiênico que ele usou para se livrar de sua sujeira, constantemente projetada sobre você. Só então ele estará pronto para descartá-la.

Durante a fase de desvalorização, a vítima tenta incansavelmente descobrir o que fez de errado para que seu parceiro tão perfeito do início se voltasse contra ela de forma tão furiosa. Ao longo da fase de desvalorização, o sociopata deixa bem claro que tudo foi culpa sua. TUDO. Ao final, a vítima está cansada, reprimida, deprimida e oprimida. A este ponto provavelmente já se tornou tão isolada que tem pouca ou nenhuma vida social. Enquanto ele a encantava com carinho e atenção ímpar, sorrateiramente exigia seu afastamento dos hobbies, amigos, familiares e colegas. Ora mantendo-a ocupada (e distraída) com atenção constante, ora castigando-a com mau humor e tratamento silencioso de modo que, aos poucos, você começa a evitar as condutas que desagradam o parceiro “tão apaixonado”.

Em um piscar de olhos você está distante de tudo e de todos que possam ser para o sociopata uma ameaça. Qualquer coisa que receba seu carinho e atenção, não é bom para você e, logo, deve ser eliminado. Sua vida e interesses devem ser dedicados exclusivamente a ele. Ele nunca diz isso abertamente. Conduz sua vítima a isso, através de manipulações, vitimizações, acusações e mentiras. E assim foi, sem você perceber.

O sociopata consegue isolar e degradar a identidade e autoestima da vítima para igualar à sua. Esvaziada, de joelhos, completamente perdida e sem vida própria, a vítima já não tem para fornecer qualquer suprimento narcísico (adoração, atenção, sexo, presentes, etc) e aí chega o momento em que ele vai descartá-la sem olhar para trás, como se nunca tivesse existido. Aquele amor eterno prometido, os planos grandiosos para o futuro, tudo se perde no nada. É como se nunca tivesse acontecido e a naturalidade com a qual ele faz isso vai deixá-la confusa, machucada, humilhada e sem vontade de acordar de manhã. Mas escreva minhas palavras: Ele nunca vai deixá-la a menos que já tenha garantido uma nova fonte de suprimento narcísico. Leia de novo. NUNCA. Pode não ser uma amante. Pode ser qualquer coisa (carro novo, consumismo, viagens, etc), novos amigos, velhos amigos, ex, qualquer coisa que naquele momento o sociopata narcisista perceba ser uma maior ou melhor fonte de suprimento narcísico. 

Incapaz de viver luto por perdas e de passar períodos sozinho, ele está sempre à procura de uma melhor “alimentação”. Sempre. Ao afastar-se e observá-lo de longe, você se verá diante de alguém promíscuo, que troca de parceiro com a naturalidade de quem troca de roupas. Você testemunhará futilidades absurdas em seus costumes consumistas. Você ouvirá mentiras a seu respeito. Você se encontrará muitas vezes perguntando: “quem é essa pessoa?” “como pode ser a mesma que um dia me fez tão feliz?”. Não se torture mais. Você conheceu um ilusionista talentoso que não conhece escrúpulos nem limites para tirar de suas vítimas o que mais lhe convém, ainda que para isso tenha que lhe prometer, sem nenhum pudor, um mundo maravilhoso e cor de rosa que, de repente, se transforma num lugar frio, tenebroso e escuro, onde você não significada NADA.

O sociopata narcisista é oportunista na essência. Quando o tempo com você não for mais conveniente ou não servir mais aos seus propósitos, ele dará seu golpe final e desaparecerá. Se seu contato era telefônico, não atenderá mais. Se você insistir de outro número em busca desesperada por uma razão de tudo aquilo, vai humilhá-la da pior forma possível ou simplesmente dizer que você ligou para o número errado!

Se ele mora com você, vai arrumar as malas e sumir, quer dando-lhe o tratamento do silêncio, quer tendo um ataque de fúria (por culpa sua, é claro) ou com um “combo” de desvalorização mortal, no qual juntará todas as suas técnicas de descarte e soltará sobre sua cabeça como uma pedra gigantesca que vai te esmagar como a uma formiga. Seja como for, ele vai sair de sua vida, sem encerramento, sem explicação, sem nada, deixando para você apenas dúvidas, culpa e muita dor.

E não se iluda, porque mesmo longe ele fará de tudo para sujar seu nome entre aqueles que conhecem o casal. As mentiras e histórias hollywoodianas protagonizadas pela vítima que era “louca” e que “não tinha vida própria” e que “o sufocava” serão contadas repetidas vezes e, não raro, conseguirão uma legião de simpatizantes que se compadecerão de seu “sofrimento”. 

Apesar de ser revoltante o sentimento de injustiça, o segredo é não reagir e aguardar. Como não conseguem manter máscaras por muito tempo, rapidamente suas ações passam a depor contra suas palavras e as pessoas, por si só, compreendem quem era a vítima e quem era o vilão. Reagir só vai fazer com que pareça que ele tem razão ao chamá-la de louca. Nesta fase é preciso focar em si e evitar contato com informações sobre essa pessoa que não tinha e jamais terá algo valioso para lhe oferecer. Seu encontro com ele foi uma fatalidade. Aprenda o que puder desta experiência e siga com dignidade. Não insista atrás de explicação e siga em frente, pois se você insistir, pode piorar e muito. A explicação é simples: você se envolveu com um transtornado mental. Ponto final.

Após o DESCARTE, se ele voltar (E ELE VAI VOLTAR) e você aceita-lo de volta, passada a lua de mel, você estará diante do ciclo LAVA, ENXÁGUA, USA, JOGA FORA E REPETE. Até quando ELE não quiser mais. Sim. Eles sempre voltam e o fazem por diversos motivos. Voltam essencialmente para ter certeza que ainda tem controle sobre suas vítimas. Voltam para machucar a vítima atual. Voltam porque têm certeza que você ainda os espera. Voltam porque são obcecados e veem suas vítimas como posse. Voltam porque perceberam que sua vida foi adiante sem eles e isso é inadmissível. Voltam porque ao vê-la melhor, percebem-na como fonte nova de suprimento e querem novamente sugá-la.

Se tiver sido você a deixá-lo, fará stalking, a perseguirá prometendo amor eterno, dizendo tudo aquilo que sabe que você deseja ouvir, falará de casamento, filhos e se apresentará em sua melhor versão. Será tudo o que você um dia sonhou. Ele voltará “mudado”. Graças a você ele “entendeu muitas coisas”. Mas se você me perguntar se neste momento ele merece uma segunda chance, lhe digo sem medo de errar: Aceitá-lo de volta é voltar à primeira fase sim, aquela maravilhosa da IDEALIZAÇÃO, mas sem esquecer que logo em seguida você deverá enfrentar a DESVALORIZAÇÃO e o DESCARTE, reinserindo-se num ciclo vicioso, mortal e sem fim do qual SOMENTE VOCÊ sairá prejudicada.

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Eu prefiro não saber

Eu prefiro não saber

Então ela me disse:

-Se você souber que ele me traiu; se souber que ele tem outra, por favor, não me conte! Eu não quero saber.

-Como não! Por que não quer saber?

-Porque passamos a vida juntos, porque passei com ele maus bocados, porque seria uma decepção muito grande e eu sofreria uma pressão enorme de mim mesma e do mundo para fazer algo a respeito e eu não sei se a essa altura da minha vida eu quero fazer algo.

Eu estava certa de que ela nunca havia sido traída e ela já beirava os setenta anos muito bem vividos ao lado do marido e dos filhos. Tiveram uma vida muito difícil no começo do casamento, porém, com o passar dos anos a situação financeira melhorou e puderam viver com conforto até o dia daquela conversa. O marido nunca teve qualquer comportamento que levantasse a suspeita de uma traição. Sim, existem homens fieis sim e é bem fácil perceber este tipo de “espécie”. Ser fiel faz parte de um conjunto de valores bastante complexo.

Eu tinha vinte e poucos anos na época e não era capaz de entender porque ela me fizera tal pedido. Onde já se viu não querer saber! Eu, naquela época, não conseguia entender nada sobre o velho ditado “o que os olhos não veem o coração não sente”. Quando se é jovem, se é perseguido por uma espécie de doença que lhe obriga a ter que saber de tudo. Se um amigo não nos conta algo em primeira mão, tomamos aquilo como uma traição maior do que as que existem dentro dos casamentos e sobre a qual aquela sábia senhora não queria nem saber.

Há pouco tempo, ficávamos sabendo de quase nada se compararmos aos dias de hoje. Atualmente quase ninguém viaja sem que a lista de contatos – compartilhada em todas as redes sociais – fique sabendo. Se passarmos um final de semana nos dedicando a passear pelos perfis dos nossos amigos, teremos itinerário completo de quase todos eles. Sabemos quase em tempo real de tudo sobre a vida de todos que nos rodeiam, e está sim, bem mais fácil descobrir as traições. Fotos, vídeos e conversas vazam o tempo todo e chegam depressa, mesmo aos que preferiam não saber. Sorte de quem pôde viver em tempos nos quais podia estar na ignorância, não só da traição, mas também de notícias inúteis.

Existe muita sabedoria em preferir viver na ignorância. Existe talvez um desejo de “preferir nem ter ficado sabendo” de certas verdades, porém, pode ser que seja inevitável que elas venham e aí nos resta enfrentar a dor. O que aquela senhora me pede não é uma atitude de gente covarde. Ela me pede para não sofrer. Ela viveu em um tempo no qual os casamentos não se “dissolviam em água” e ela talvez não quisesse ficar sozinha. Talvez ela nem tivesse para onde ir e talvez ela tenha passado a vida pedindo não só aos outros, mas a si mesma que “não lhe contasse nada”. Não são raras as vezes nas quais utilizamos o mecanismo de negação pela completa falta de repertório para enfrentar certas realidades. Cada um tem o direito de escolher seu caminho e sua atitude perante os fatos.

Mais do que acreditar na fidelidade, eu acredito na lealdade e quando me lembro daquele dia, me lembro como uma das minhas maiores aulas sobre a vida. A maturidade deve trazer certa paz e deve tirar o peso de quase tudo que carregamos como verdade hoje em dia. Vivemos tempos de Tinder, de enviar nudes como se enviavam correios elegantes e ao mesmo tempo, vejo muito mais agressão e intolerância às traições do que soube ter existido há cinquenta anos. Tornamo-nos mais violentos, mais egoístas e ao contrário do que se pensa; o mesmo machismo que protegia os homens no passado continua firme, forte e reluzente, alimentando os egos e os grupos masculinos de whatsapp. A traição continua um pecado mortal para a mulher e um deslize para o homem. As mulheres que perdoam continuam sendo aplaudidas por seu altruísmo e os homens que não perdoam “a vagabunda” também.

Então, diante disso, eu consigo entender que, de vez em quando, é melhor nem ficar sabendo porque só uma mulher que já passou por isso sabe o que enfrenta da sociedade, junto com a  dor de ter sido traída. A pressão da plateia chega a ser digna do coliseu, querem ver sangue e jamais toleram que haja algum perdão ou uma segunda chance.

Bons tempos foram os quais vivíamos no anonimato, quando podíamos contar apenas com as fofoqueiras do boca a boca e quando podíamos nos dar o luxo de não querer nem saber. Felizes tempos nos quais nós não éramos julgados e condenados via satélite e nos quais nossos problemas eram apenas nossos. Felizes os tempos nos quais podíamos escolher como e quando resolveríamos os nossos problemas familiares.

Dos meus sonhos cuido eu

Dos meus sonhos cuido eu

A vida quase que se resume a uma infinidade de cobranças feitas pelos outros sobre o que estamos fazendo de nossas vidas, muitas vezes partindo de pessoas que mal fazem parte de nosso convívio. Somos questionados quanto ao namoro, ao noivado, ao casamento, aos filhos, aos estudos, e por aí vai.

Enquanto amadurecemos e estamos em processo de formação, é comum e saudável sermos cobrados por nossos pais, professores, porém, chega uma época na vida de todos em que já somos gente feita e crescida o suficiente para determinarmos o que e com quem seguiremos nossa jornada. Chegada a hora, é preciso romper com a dependência do outro e assumir as escolhas próprias e intransferíveis.

Devemos satisfações a quem nos sustenta, nos emprega, a quem divide a nossa cama, caso ainda não consigamos nos tornar independentes e autônomos, seja na esfera familiar, na profissional, ou sentimental. Não somos uma ilha e nossas atitudes sempre se estenderão às vidas que caminham conosco. Porém, há limites claros entre o que é pessoal e o que é coletivo.

Quando resolvemos atrelar nossas vidas às de outras pessoas, optando por constituir família, por fazer sociedade em algum empreendimento, qualquer coisa que nos aproxime intimamente de alguém, então teremos que pautar nossas ações por ponderações que levem o outro em consideração. Porém, quando buscamos ser felizes de acordo com sonhos pessoais, caso não atropelemos ninguém pelo caminho, é necessário que tentemos sempre viver nossas verdades.

Sem que estejamos convictos do que somos e de tudo o que queremos, não conseguiremos partir ao encontro de alguém que nos respeite e nos ame por tudo aquilo que é tão nosso. Somente estaremos prontos para dividir nossas vidas quando conseguirmos realmente viver o que somos, quando estivermos caminhando em compasso harmônico com os sonhos que estruturam os nossos sentidos, pois sem um eu verdadeiro, o outro não chega em sua completude.

Não acredita em amor eterno? Não se case. Nem se imagina como mãe? Não tenha filhos. Tem aversão à falta de liberdade? Não aceite empregos formais. Está de bem com o espelho? Coma sem culpa. Vá ser feliz do seu jeito, mas sem machucar ninguém pelo caminho, afinal, lá na frente, enfrentaremos a nós mesmos quando tivermos de prestar as contas da vida. Porque é assim que temos de ser e é assim que as coisas têm que acontecer.

Amar alguém só pode fazer bem

Amar alguém só pode fazer bem

Para ler ouvindo Marisa Monte – Clique aqui 

Amor deveria ser um bem comum.

Amor deveria ser grátis. Deveria ser fácil, leve e solto. Tal qual espontaneidade de bicho do mato.

Amor deveria ser cachoeira de águas cristalinas, que dá de beber a quem se aproxima. E deveria também ser terra fértil, pronta pra quem quiser cultivar com as próprias mãos. Deveria ser como o mar, a planta, a areia que nasceu neste planeta muito antes de nós e não há cerca que pudesse forjar uma obrigação, uma definição, uma possessão. Sem drama, sem decisão.

Amor não deveria ser público e nem privado, porque não pertence a nenhuma empresa e nem ao estado. Amor vem da terra, vem do mato, vem na gente antes de saber falar e entender, antes de conhecer a carga pesada da palavra ‘amor’.

Amar não deveria ser livre. Porque amar é a própria liberdade em si.

Todo mundo deveria ter direito ao amor, porque amor que é amor não exclui.

Amor não deveria ter cor, raça, nação… Amor deveria ser cego, surdo, mudo e pobre. Tão rico quanto uma alma solta, tão farto como uma floresta e seus encantos, tão fácil quanto a vida antes dos significados.

Amar deveria ser pomar em território de ninguém.

O amor não deveria deixar uns desnutridos e outros empapuçados.

O amor não deveria ser dividido, pensado, organizado, catalogado, exigido, ignorado. O amor deveria ser apenas compartilhado. Pega-se o que se quer, dá-se o que se tem.

Amar não deveria exigir que a gente fosse melhor do que ninguém pra poder merecer o que já é nosso por essência!

Amar é só energia de cura, de carinho, de compaixão. É deitar num ombro sem saber qual a razão.

É uma expressão de beleza dos olhos, de uma verdade das mãos.

Amor é bom, amor está antes e além de tudo o que convém.

Amar alguém só pode fazer bem.

Distraído, não. Estou atento ao que me interessa.

Distraído, não. Estou atento ao que me interessa.

Ahh… minha Mãe, segura nossa mão. Tem dias em que só assim. Aquela moça, sabe? Aquela moça amiga nossa, aquela que namora outra mulher, deixou a casa dos pais. A mãe a expulsou. A mãe. Não foi o pai, não foi o irmão mais velho. Foi a mãe. A mãe botou a própria filha na rua.

Aqui pertinho, um sujeito com o coração cheio de ódio passou a mão numa faca e machucou de morte um cachorro sem dono, um vira-latinha. Disse que o bicho tinha mordido o gato da filha dele e então resolveu fazer vingança. A Senhora veja se pode um negócio desse, minha Mãe! Cá entre nós, o que será que essa menina, uma criança aprendendo a dar amor a um animalzinho, vai compreender da vida assistindo à fúria vingativa do pai?

Nossa Senhora! Tem coisa que deixa a gente numa tristeza só. Um amigo me conta que na cidade dele, naquelas horas em que o povo sai do trabalho de cabeça quente, uma mulher de idade reclamou no ônibus com duas moças na casa dos vinte anos: elas estavam sentadas nos assentos reservados aos mais velhos. Pois não foi que as duas, cheias de saúde e de coragem, levantaram e estapearam a velhinha?

Eu fico aqui pensando essas coisas e vem alguém me chamar a atenção. Diz que eu sou um sujeito “distraído”. Não é má pessoa, não. Ela só não sabe que eu estou atento é em outras coisas. Minha atenção é incapaz de assumir duas tarefas ao mesmo tempo. Faz o que dá. Então esse meu jeito grave de olhar o nada até parece alheamento. E é exatamente isso. Eu vivo alheio ao que não me interessa.

Ligo não. Quase sempre não dou a mínima. Mas de vez em quando aparecem os donos da verdade e, Vixe Maria, essa gente me cansa. Ô mania de achar que os outros, todos os outros, são obrigados a ter os mesmos e exatos interesses que os deles, minha Mãe!

Para esse gente, destoar é proibido, estar alheio é ofensivo. E é tão engraçado como as pessoas carecidas de atenção sejam tão afeitas a julgar as “distraídas”!

É como se elas dissessem “fulana é distraída, nunca ouve quando eu falo”. Ai, quanto drama! É que ninguém é obrigado a estar atento o tempo todo a todo mundo, sabe? Uma coisa é se distrair no trânsito, ao volante, picando cebola, manejando um moedor de carne, regendo uma orquestra, digitando os números de um código de barras, operando um apêndice, andando na corda bamba sem uma rede lá embaixo. Aí precisa se concentrar, não pode se distrair. Nessas horas tem de prestar atenção. Outra coisa diferente é o direito de cada um se ensimesmar quando pode, ficar na sua, olhar para o nada e pensar somente no que lhe interesse. Será isso pedir demais, Virgem Santa?

Confesso: sou pessoa distraída. Mas essa é só a opinião de quem não tem a minha atenção. E a minha atenção agora anda focada em tanta, tanta coisa. Penso na moça amiga que a mãe expulsou de casa. E me alegra a notícia de que uma tia dela muito atenta a acolheu com amor. Penso no cidadão sem dó que esfaqueou um cachorro da rua. E me alivia o fato de que uma boa gente se reuniu e cuidou do bichinho machucado. Penso na velhinha que apanhou no ônibus, minha Mãe, ela que podia ser a minha própria mãezinha! E me acalma saber que o motorista, o cobrador e os passageiros de bem saíram em sua defesa e agora ela vai bem, recuperando-se do susto na companhia amorosa da família.

Penso nisso tudo com atenção. É tanta coisa para pensar! Então eu penso, penso e peço. Peço sem dó: rogai por nós, minha Mãe. Rogai por nós. Tem dias em que só assim. Tem dias em que só assim…

Fique atento aos sinais- Aline Andrade

Fique atento aos sinais- Aline Andrade

Por Aline Andrade

    Meus caros amigos, a vida é efêmera!

Vivemos em tempos que tudo ocorre a uma velocidade extremamente rápida, seja por avanços tecnológicos ou por nossos próprios anseios. Somos a geração dos impacientes, queremos que tudo aconteça rápido ou a sociedade nos cobra para buscarmos mais e mais a cada dia. Mal saímos do colegial já somos, em uma grande maioria, encaminhados para buscarmos um curso, uma faculdade e por aí vai, em uma fração tão rápida de tempo já nos formamos, buscamos um bom emprego depois seguimos anseios de casar ou não, ter filhos ou não.

Uma sociedade de relacionamentos líquidos a qual nos entregamos a esse ritmo frenético das coisas e mal temos tempo para um café, uma boa conversa, um encontro com aquele velho e bom amigo. Muitos de nós, às vezes nem observamos o que está ao nosso redor, no nosso dia a dia, quiçá as pessoas com quem cruzamos em uma caminhada, ou ida em algum lugar. Estamos voltados para o nosso ego e nossos afazeres.

Com isso deixamos para trás coisas simples e que fazem extrema diferença, como um bom dia, um obrigado, parar e olhar o pôr-do-sol, a lua, toda a simplicidade do mundo a nossa volta. Vivemos preocupados com o futuro e com recortes nostálgicos do passado, talvez isso explique a famosa “geração Prozac e Rivotril”, que necessita de doses anestésicas diárias para conseguir suportar o presente.

Já dizia Vinícius de Moraes em seu samba lindo, “a vida é pra valer, a vida é pra levar”, e a vida é agora e feita de momentos, a vida é evolução, amor, altruísmo, é dar e receber. Nos deparamos com sinais que nos mostram o quão simples e bom pode ser a vida…

Por isso, fique atento aos sinais!

Sobre a autoria:

 Aline Andrade, 23 anos, estudante de Direito,

 apaixonada pela simplicidade da vida, arte e poesia.

Alice no pais das maravilhas e os tiranos do dia a dia- Carla Acácio

Alice no pais das maravilhas e os tiranos do dia a dia- Carla Acácio

Por Carla Acácio

Baseado no diálogo da Alice com a Rainha de Copas. :

 

Alice: Eu estava tentando encontrar o meu caminho…

Rainha de copas: Seu caminho???? Todos os caminhos são meus caminhos 

(e se vc discorda então cortem lhe a cabeça!!!)

A Rainha vermelha representa o tirano na história da Alice. Enquanto Alice que está perdida por aí tenta encontrar o “seu caminho”, a rainha não permite que ninguém tenha um caminho próprio pra seguir pq todos os caminhos são dela. E cortem a cabeça de quem ousar discordar.

Todos temos um pouco de tirano em nós. Temos nossas convicções, vontade de estarmos certos e de que todas as pessoas do mundo concordem com nosso ponto de vista, até aí tudo bem o problema é se tornar um tirano na vida real que não aceita que as pessoas sejam livres pra terem suas próprias convicções e querer privá-las do direito de não concordar com vc. Querer puni-las por isso.

Temos hoje o caso do deputado da bancada evangélica Anderson Ferreira (PR-PE) que propõe 15 anos de cadeia pra qualquer mulher que abortar por microcefalia.

( estou impressionada por não ter pedido pra decapita-las )

Não é novidade que para a maioria dos evangélicos o aborto é pecado, essa ideia é baseada no conceito religioso de que o feto já tem uma alma a partir do momento da concepcão, de que ele já é um ser humano. Não é errado ter essa crença, porém ela é baseada na sua fé, existem diversos cientistas, médicos, etc, pessoas com propriedade científica que não compartilham da sua visão. Inclusive a ONU fez a recomendação de aborto em casos de microcefalia. A idéia de que o feto já é um ser humano não é uma verdade absoluta, uma criança já nascida sim, é um ser humano completo, não há quem discorde, o feto, há divergências meu caro. Isso te agrade ou não.

Nao se pode obrigar todas pessoas a andarem pelo seu caminho. Quem discorda tem seu embasamento pra isso. Não cortem-lhe as cabeças…
Criar leis com base na sua visão religiosa e moral sem considerar a pluralidade cultural do país e punir quem quer andar por caminhos diferentes dos seus dogmas, é tirania!

Em maior escala ainda temos os terroristas que chegam a fazer atentados, torturar e matar qualquer pessoas que não compartilhe das suas crenças.

Esses são casos extremos mas a verdade é que
Todos tem um pouco (ou muito) de tirano em si.

Devemos deixar cada um deve ser livre para percorrer o seu próprio caminho.
Sem passar por cima dos direitos dos outros.

Agora, deixando um pouco de lado os defeitos alheios e começando por onde podemos mudar mais facilmente:
Por nós mesmos
E ai vc já foi um tirano hoje?

Carla Acácio é formada em artes e trabalha como ilustradora

6 sinais alarmantes de que seu amor está morrendo

6 sinais alarmantes de que seu amor está morrendo

Por Stael F. Pedrosa Metzger

Quando um casal busca por uma terapia suas reclamações mais comuns apontam para desilusões, raiva e dor que devem ser cavadas para que se possa encontrar no fundo qualquer coisa de valor que possa ajudar o casal a encontrar a cura.

Os seis sinais mais alarmantes de uma relação que está morrendo podem estar relacionados abaixo:

1. Punição e escárnio

Quando a relação está realmente em apuros, os parceiros acusam um ao outro por qualquer erro que aconteça. Surge o jogo emocional da culpa e da exigência do “adequado arrependimento”. Quando não é atingido tal nível a punição e o escárnio se fazem presentes nas frases ditas um ao outro. Algumas podem soar como:

“É a terceira vez que você dorme no sofá, porque não diz logo que está me evitando?”

“Você fala como se fosse especialista em todos os assuntos… Quando foi mesmo que você leu um livro pela última vez?”

2. Dureza

Casais em crise não são delicados um com o outro. Seja qual tenha sido o nível de proximidade entre eles um dia, agora tudo se foi. Parecem vestir uma armadura de cinismo, amargura e pessimismo que os enrijece, prende e os deixa na defensiva o tempo todo. Alguns dos insultos mais comuns costumam surgir como:

“Claro que não me importo, de que adiantaria me importar?”

“Eu não vou me abrir para alguém que só faz me machucar…”

“Não estou mais ouvindo. Você é um idiota e sempre será!”

3. Rupturas não resolvidas

É normal que um casal tenha diferentes maneiras de ver a vida e de discordar sobre qualquer assunto. Os casais saudáveis usam essas diferenças como meio de se conhecerem mais, buscarem ver as coisas por outro ângulo e usar essas diferenças como complementos para uma relação mais rica e ampla. Os casais em crise costumam não resolver suas diferenças seja porque não sabem como fazê-lo ou estão mais interessados em “ganhar” uma discussão que ver o ponto de vista do outro. Eis as expressões mais comuns que as pessoas dizem quando estão presas a este tipo de comportamento:

“Eu não vou nem compartilhar tal assunto com você. Você não ouve mesmo…”

“Você só vê as coisas do seu ponto de vista.”

“Você é o dono da verdade. Está feliz por ganhar mais essa discussão?”

4. Domínio e controle

Quando os casais não vivem mais em parceria, as brigas tomam conta e eles parecem estar em contínua batalha pelo poder. Os comportamentos podem ser os mais absurdos como gritar, ser violento ou até sair de casa. São comuns as frases a seguir quando um casal está em plena luta para dar a última palavra:

“Quem lhe deixou tomar essa decisão? Deus?”

“Eu sei que estou certo e você não vai me convencer do contrário.”

“Ah, tá, você estragou tudo dessa vez, acha que vou lhe dar outra chance de pôr tudo a perder?”

“Eu estou assumindo o controle e não há nada que você possa fazer.”

5. Desconfiança

As desilusões, mágoas, desapontamentos podem quebrar a confiança, principalmente se são inesperadas, importantes e reincidentes. Vícios, traição, promessas não cumpridas destroem a segurança do parceiro e trazem a desconfiança para a relação. Exemplos de frases que mostram uma confiança minada:

“Eu queria contar, mas nunca consegui…”

“Eu sei que prometi que ficaria em casa esse fim de semana, mas eu não posso controlar meu chefe.”

“Será que eu tenho que dizer todos os dias que eu te amo? Isso cansa!”

“Vê se cresce, tá?”

6. Reclamações crônicas

Quando a crise está no ponto “morte iminente do amor” não há nada no parceiro que o outro goste ou apoie. Tudo é irritante, tudo cansa ou enoja. As reclamações têm sido constantes e em nada têm ajudado. Não há mudanças de comportamento em nenhum dos lados. As queixas constantes vão construindo um muro entre os parceiros. O amor que havia agora está enterrado embaixo de uma montanha de raiva, autoindulgência e vitimização.

Nesse cenário devastador, as frases cortantes e constantes são algo como:

“Quem quer faz, quem não quer encontra uma desculpa.”

“Eu falei para você não tentar consertar, agora estragou de vez…”

“Você devia aprender com seus erros e não ficar repetindo a mesma estupidez!”

Consertar uma relação nesse estado só é possível se ambos desejam reconciliar suas diferenças. Se estiverem dispostos a olharem de frente os problemas, reconhecerem o erro e voltarem ao rumo certo, então há esperança.

O primeiro passo é identificar qual comportamento tem feito maior estrago e começar por aí a desenrolar os fios da relação. Comece por um e irá encontrando os outros.

Fonte indicada: Família

                                                                Imagem de capa: Dean Drobot/shutterstock

Gosto das pessoas que oferecem luz mesmo que o dia esteja nublado

Gosto das pessoas que oferecem luz mesmo que o dia esteja nublado

Albert Einstein dizia que, na verdade, a escuridão não existe. Ele comentava que a escuridão nada mais é do que a ausência de luz, e isso é o que acontece às vezes em muitas das pessoas que nos rodeiam.

É difícil saber por que, mas todos nós temos amigos ou familiares que frente a qualquer situação complicada só trazem mais negativismo. São incapazes de apresentar estratégias, soluções e, muito menos, apoio.

Mas há pessoas tão íntegras que nem mesmo elas são conscientes da sua autenticidade. São a paz na tempestade, a companhia na sua solidão e força nas suas tristezas.

Todos também sabemos que estas pessoas não são muitas em nosso dia a dia. Amigos e familiares assim não preenchem os dedos de uma mão, e por isso é preciso se proteger de certa forma desses outros que só sabem pintar os nossos dias de cinza e as nossas esperanças de incertezas.

Convidamos você a refletir sobre isto, sugerindo, inclusive, que se você é uma dessas pessoas com luz própria, nunca deixe de brilhar.

As pessoas com luz própria, faróis para o nosso dia a dia

Qual o verdadeiro significado de uma pessoa com luz própria? Estaríamos caindo em uma vertente mais espiritual do que psicológica? Não é tão complicado defini-las e ainda menos reconhecê-las.

As pessoas com luz transmitem facilidade no trato e serenidade. Não são a luz no fim do túnel porque com elas não existem túneis, apenas caminhos de tranquilidade onde a vida parece mais fácil, onde tudo jaz em sutil equilíbrio.

Há muitos traços psicológicos facilmente identificáveis nesse tipo de perfil, e não estamos falando de magia. São pessoas comuns que vestem sorrisos cotidianos, que têm a palavra certa para o momento carente.

contioutra.com - Gosto das pessoas que oferecem luz mesmo que o dia esteja nublado

Não são pessoas que praticam esse positivismo arbitrário presenteando a todos um “não se preocupe, tudo dará certo”, de forma alguma.

Sabem estabelecer intimidade porque dispõem de uma grande empatia e equilíbrio interior. São positivas, mas é um positivismo prático baseado na estratégia e no equilíbrio.

Sabem quando são necessárias e também sabem abrir espaço. Não exigem, não pedem nada em troca. Quando estamos perto delas podemos ser nós mesmos. Sem pressões, sem ter que disfarçar e muito menos se justificar.

São pessoas que oferecem luz porque confortam, apesar de não darem solução a nossos problemas, que também não é o que lhes pedimos. Só precisamos que “estejam ali”, sem julgar, sem criticar, sem menosprezar.

Se é você quem oferece luz aos outros, nunca deixe de brilhar

É muito provável que você seja uma criatura de luz. Você ilumina os outros a cada dia desejando o melhor, e o faz de forma desinteressada porque é assim como você se sente bem. Porque é assim que você entende a vida e porque você não saberia fazê-lo de outra forma.

Se é você quem oferece apoio e esperança aos outros, você precisa agir com cautela. Há quem possa se aproximar de você de forma egoísta, para ganhar o seu calor e a sua integridade. Existem autênticos especialistas em apagar a luz dos outros com suas sombras…

Você precisa lembrar que se o seu jeito de ser e de sentir a vida é oferecendo apoio aos que lhe rodeiam, e vivendo a vida desde esse ponto de vista mais simples e humilde, você estará brilhando sempre com a sua luz própria.

Contudo, às vezes você também pode ficar esgotado.

– É fácil ver a luz na tempestade, mas às vezes quem está ao nosso lado pode rir disso. Podem chamá-lo de ingênuo, podem ironizar a sua nobreza rotulando você de frouxo, de ser a típica pessoa da qual os outros se aproveitam.

– Lembre-se mais uma vez do que dissemos no início, tomando como referência a frase de Einstein. A escuridão não existe, na verdade é falta de luz. Isto é, poderíamos dizer que não existe a maldade autêntica nas pessoas que cometem o erro de atacar a sua forma de ser.

– Em vez de maldade, ou escuridão, o que há é uma falta de inteligência emocional, de compreensão, de empatia e de estratégias pessoais.

– Se você brilha com a sua luz própria, não permita que outros a apaguem. Também não gaste toda a sua energia com quem não a merece.

Existem planetas frios e desertos que orbitam ao redor das estrelas esperando receber o seu calor. Ofereça-lhes a sua luz se você quiser, ou afaste-se se perceber que você perde a suas forças. Porque os seres de luz, apesar da sua grandiosidade, também podem ser muito frágeis…

Imagens cortesia de Sonia Koch, Pascal Campion.

Fonte indicada: A mente é maravilhosa

O que a Metamorfose de Kafka pode nos ensinar sobre direitos humanos

O que a Metamorfose de Kafka pode nos ensinar sobre direitos humanos

Por Monaliza Montinegro, via Justificando

“Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregório Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto.”
A metamorfose, Kafka [1]

A mensagem é dura. Mas, antes que interpretem mal, não é uma comparação. Eu sei que o parâmetro de Kafka para discutir um tema tão complexo incomoda.  Quem leu ” A metamorfose” sabe do que estou falando. Ele toca lá no fundo da nossa hipocrisia e abre uma carapuça de máscaras que usamos para nos proteger do que nos é diferente. Para quem não leu o livro, peço que continue o texto mesmo assim. Kafka tem muito a nos dizer.

O personagem principal dessa história é Gregório, que também poderia ser Maria (e por que não “Viviany Beleboni”? [2]). Na obra de Kafka, Gregório era um homem comum, um trabalhador, como muitos, em um labor que não satisfazia a sua felicidade, mas que muito servia para ajudar a sua família. Até que, em um dia como outro qualquer, o personagem falta ao trabalho. Sua ausência leva seu chefe até a sua casa. E lá acontece o encontro com a realidade aparentemente fria e assustadora, principalmente sob o ponto de vista de quem não consegue ver o invisível (a alma do ser, em sua dignidade). Quando ninguém da família teria aberto a porta do quarto de Gregório, o chefe provoca essa situação e, juntos, se deparam com um grande inseto, com descrições semelhantes a de uma barata.

Uma barata gigante? Não sei exatamente, porque o autor faz questão, em seu jogo de palavras, de deixar tal fato subentendido. Mas, com certeza, naquela narrativa, Gregório se sentia o mais assustador de todos os insetos. Então, a primeira reflexão: será essa também a dor de quem sente a rejeição em razão do que exterioriza? Não sei. Só sei que o fato do livro muito se assemelha à realidade de protagonistas do mundo real que por vezes agonizam na luta para tentar voltar à sua “condição natural”, em um conflito claro entre o ser e as imposições sociais.

A temática de “A metamorfose”, na interpretação através dos olhos de quem lê, muito mais fala de um indivíduo isolado do seu meio, despido de sua “humanidade”, heterodeterminado pelas condições sociais, visto por outros como um inseto, em meio em que só se aceita quem é igual, do que sobre uma mera transformação genética.

 A Dignidade da Pessoa Humana

No estilo “kafkiano” de escrever, o autor haure, através de metáforas, a denúncia sobre as graves violações ocorridas à Dignidade da Pessoa Humana. O livro “A Metamorfose” nos mostra um indivíduo excluído do sistema de relações humanas, subtraído da qualidade inerente à sua personalidade, sem autonomia e autodeterminação. Um indivíduo do qual furtaram a própria dignidade. Dentro dessa noção é possível captar a mensagem que diferencia os conceitos de isolamento e solidão bem delineados no pensamento de Hannah Arendt [3]:

 “O que chamamos de isolamento na esfera política é chamado de solidão na esfera dos contatos sociais. Isolamento e solidão não são a mesma coisa. Posso estar isolado – isto é, numa situação em que não posso agir porque não há ninguém para agir comigo – sem que esteja solitário – isto é, numa situação em que, como pessoa, me sinto completamente abandonado por toda companhia humana – sem estar isolado.”

A par da “forma (des)humana” apresentada pelo livro ao leitor, retira-se dessa noção o reflexo da intolerância à quebra de padrões. A figura vista como um inseto, quando associada à mudança no movimento e na fala e o incômodo que esta ocasiona, é apenas uma característica física que representa uma sobreposição do exterior em detrimento do interior. Na narrativa, a família, que antes vivia uma relação afetuosa com Gregório, sobretudo em razão da comodidade financeira que esse proporcionava, descobre em sua transfiguração exterior a razão para transformar todo aquele afeto em vergonha, pena e muitas vezes até de raiva.

Até mesmo a misericórdia ou compaixão externada no início do livro, através da criatura até então considerada mais dócil no ciclo do protagonista, a sua irmã caçula, não se apresenta de forma pura. Vem carregada do sentimento de não aceitação. Eis que, ao aproximar-se dele com o objetivo de alimentá-lo, o faz com  a ojeriza à sua exteriorização atual e com esperanças de que o irmão volte à condição humana, chegando ao extremo de provocar sua própria morte, através da dor psicológica e da debilidade física impregnada nele por aquela situação:

“– Ele tem que ir embora! – gritou a irmã. – É o único jeito, pai. O senhor precisa se desfazer da ideia de que aquilo é Gregor. Acreditar nisso, durante tanto tempo, tem sido a nossa desgraça. Como pode ser Gregor? Se fosse, há muito tempo teria percebido que seres humanos não podem viver com um bicho como aquele. E teria partido por conta própria” (KAFKA, 2001, p. 70-71).

Por óbvio, a abordagem do autor não se restringe a crítica ao padrão estético. Vai para além dos interesses que pautam a convivência humana. Incorre na dificuldade humana diante de uma situação de conflito com os padrões sociais e os retornos que esses padrões oferecem.

A Dignidade da Pessoa Humana X Direito à Autodeterminação do Indivíduo

Nesse ponto da estória, vem a calhar a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948, que, em seu artigo 1º, prevê: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito e fraternidade”.

Kafka, então, nos propõe a noção da disparidade entre o considerado humano e o considerado inumano.  Quanto mais próximo do “humano”, mais merecedor de direitos, em um tênue limite social entre o digno e o não-digno, o aceito e o não-aceito, o credor da tutela estatal, digno do respeito social ou não, o merecedor da cruz e aquele que não pode tocá-la. Somos forçados a concluir que a dignidade da pessoa humana caminha entre o amor divino, no respeito ao seu semelhante, e o escarnio da condenação social do seu dessemelhante ao fogo das amarguras eternas.

Nesse contexto, resta óbvio que a noção abstencionista de Estado, no sentido de que esse deve se abster na heterodeterminação dos indivíduos, embora necessária, nunca se fez suficiente para a promoção da autonomia individual. Assim como a noção de igualdade formal nunca foi suficiente para promover a paz social.

Não basta, portanto, que seja consignada a razão pela qual os seres humanos nasçam “livres e iguais”. Numa rápida alusão à “Teoria dos Quatro Status” de Georg Jellinek, a relação do indivíduo com o Estado só se fará completa se houverem status passivos, ativos, negativos e positivos. Faz-se imperativo que o Estado possa oferecer meios para que todos possam se sentir humanos em sua noção individual. Essa é a razão do Estado Democrático de Direito: construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I da CF), sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3, IV da CF).

Nesse sentido, o Estado aparece como promotor da autodeterminação dos indivíduos. De nada vale a sua abstenção se dela não resultar direitos concretizáveis. Assim, o direito à busca pela felicidade não se resume à ausência de intervenção estatal na intimidade individual, mas tem relação direta com oferta de meios para que o indivíduo possa buscar a sua felicidade plena.

A dignidade da pessoa humana, portanto, é a intrínseca necessidade do indivíduo  em autoafirmar-se em sua individualidade, diferenciando-se dos outros para ser reconhecido por ser quem é, o que, paradoxalmente, ocorre a medida em que todos se igualam entre si, algo que pode ser bem ilustrado naquilo que Boaventura definiu como “o direito a ser igual quando a diferença inferiorizar e o direito a ser diferente quando a igualdade descaracterizar”. [4]

Do Direito a Dispor do Próprio Corpo – Cirurgia de Redesignação de Sexo

O direito ao próprio corpo está disciplinado no art. 13 do Código Civil. Embora completamente ultrapassada a referência aos bons costumes prevista nesse dispositivo, que choca diretamente com a noção de alteridade em sua razão ontológica, a cirurgia de redesignação de sexo aparece como corolário do direito à disposição do próprio corpo nele prevista.

Somando-se esse fato ao direito à saúde, que compreende o bem-estar físico e psíquico (art. 3º, p. único da Lei nº 8.080/90), a 3ª Turma do TRF 4, no ano de 2008, deu provimento a Ação Civil Pública impetrada pelo Ministério Público Federal, determinando que a cirurgia de redesignação sexual (CFM art. 6º, 1.955/10) passasse a ser fornecida pelo S.U.S., o que levou edição da Portaria nº 1.707 do Ministério da Saúde, em 2008,  possibilitando a oferta do procedimento.

Atualmente, apesar das dificuldades fáticas encontradas da implementação da cirurgia e da ausência de disposição legal específica, paulatinamente estão sendo conquistados direitos sobre a oferta de meios para que realizada a cirurgia de transgenitalização em sua melhor forma, tanto que já fora editada uma outra portaria disciplinando o assunto com direitos mais abrangentes, como por exemplo, a implantação de próteses de silicone. (Portaria nº 2.803/13 do Ministério da Saúde) [5]

O Direito a Utilização de Banheiros

Lamentavelmente, a lei, quando produzida, não abarca todas as situações cotidianas. Por essa razão, a confusão entre a sua literalidade com o conceito de justiça faz deixar de fora, por pura indiferença, situações que dizem respeito as minorias. Essa lacuna paira, hoje, sobre o direito a utilização de um banheiro condizente com a realidade psicológica dos transexuais, que, por isso, acabam submetidos as piores formas de abusos, muitas vezes por parte do poder público. Caminham, então, entre o limbo da aceitação, sendo muitas vezes expulsos de forma violenta de banheiros ora iguais, ora opostos, à sua realidade morfológica.

Tenho convicção de que em algum momento da história olharemos para esse estágio da humanidade com a tristeza de quem vê que foi preciso um indivíduo recorrer até o Supremo Tribunal Federal para ter o direito de utilizar um banheiro público.  E, com mais assombro ainda, perceberemos o fato de que, embora esse direito já conte com dois votos favoráveis, existem ministros, “guardiões da Constituição”, que hesitam em reconhecer uma prerrogativa básica, mas essencial, para a dignidade do transexual.

Parece que o óbvio jurídico não tem espaço onde há preconceito. A legalidade, em sentido amplo, como corolário da própria noção de Estado Democrático de Direito, assegura o direito aos cidadãos de atuar livremente na ausência de previsão legal.  Entender o contrário, exclusivamente por razões no preconceito, além de consistir em violação à dignidade da pessoa humana fere de morte a igualdade em sua forma mais primitiva, a igualdade formal.

Direito a Mudança no Registro Civil

Outro aspecto que padece de regulamentação legal, sobretudo porque a ausência de norma específica tem causado desconforto igualmente de grande repercussão, é a questão da modificação do registro civil em seu nome e gênero.

Sob esse aspecto, cabe mencionar que o nome, enquanto a razão para a identificação, é direito fundamental do indivíduo tanto que o Código Civil Brasileiro elevou o nome à categoria de direito de personalidade, destinando-lhe especial proteção (art. 16 e 18 do CC), uma vez que traz em sua essência o direito de ser diferente e individualizado. Assim, adequá-lo à realidade íntima é, paradoxalmente, o direito de se tornar igual em um aspecto no qual a diferença descaracteriza.

A Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), também conferindo especial proteção ao nome, permite em seu artigo 58 que seja substituído por apelidos públicos e notórios. No entanto, as diferenças entre o registro e a realidade social vão muito além da problemática dos apelidos públicos e notórios, transportando para  o “papel” o conflito ocasionado entre o princípio da imutabilidade do nome e a dignidade da pessoa humana, eis que a mesma lei que permite a alteração do nome em razão de apelidos notórios apresenta uma enorme lacuna no que se refere a alteração do registro civil em razão da transexualidade.

Foi visando preencher esse espaço que a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, conferindo uma interpretação conjunta aos artigos 55 e 58 da Lei de Registros Públicos, passou a reconhecer que o indivíduo que já passou por cirurgia de redesignação de sexo tem direito à alteração de seu prenome, substituindo-o pelo apelido público e notório pelo qual é conhecido no meio em que vive, com ressalva, inclusive, de não constar a alteração na certidão emitida. Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, “se o indivíduo já realizou a cirurgia e se o registro está em desconformidade com o mundo fenomênico, não há motivos para constar da certidão.”

Do Direito a Mudança no Gênero e Nome mesmo sem a Realização de Cirurgia de Redesignação de Sexo

Essa situação conflituosa, entretanto, perpassa a adequação no mundo fenomênico e o mundo civil, atingindo a esfera da personalidade, que fica comprometida quando condiciona a alteração do nome à realização da cirurgia de transgenitalização. Apresenta carga axiológica calcada nos direitos individuais, fundamentais e sociais, pois, o nome, enquanto atributo da autodeterminação individual, é um importante condicionante de seu bem-estar psíquico.

Portanto, é necessário compreender que condicionar esse direito à realização de uma cirurgia é aprisionar a sua essência do ser humano num golpe fatal à sua identidade, aprisionando seu espírito no que há de pior: a alma solitária em plena socialização.

Assim, vem à tona novamente os efeitos desastrosos ocasionados à saúde em razão da violação desse direito, que nada mais é do que um desdobramento do direito à saúde (artigo 3º da Lei nº 8.080/90), razão pela qual Conselho Nacional de Justiça/CNJ, durante a I Jornada de Direito à Saúde, editou dois enunciados consignando o direito do transexual alterar seu nome e o gênero constante no registro, independentemente da realização de cirurgia de transgenitalização, nas seguintes redações:

Enunciado 42. Quando comprovado o desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto,  resultando numa incongruência entre a identidade determinada pela anatomia de nascimento e a identidade sentida, a cirurgia de transgenitalização é dispensável para  a retificação de nome no registro civil.

Enunciado 43. É possível a retificação do sexo jurídico SEM a realização da cirurgia de transgenitalização. (g.n) [6]

Do Direito ao Esquecimento

Com a mudança do nome e do gênero no assento civil, nasce, portanto, um novo ser social. Um ser com vida própria, independentemente das pechas ditadas por elementos morais de uma maioria dominante. Parafraseando Fernando Pessoa, a recordação, nesse caso, passa a ser uma traição à natureza, porque a natureza de ontem não é natureza. O que foi não é nada.

Sob esse aspecto, cabe deixar bem claro que qualquer mudança protagonizada nesse sentido não deve constar no assento civil. O direito ao esquecimento, contemplado no Enunciado 531 do Conselho de Justiça Federal, [7] permite que a pessoa que conseguiu, finalmente, adequar a sua realidade psíquica à realidade social possa ter as razões anteriores apagadas completamente da sua história. “Antes o voo da ave, que passa e não deixa rasto,  que a passagem do animal, que fica lembrada no chão. ” (Fernando Pessoa) [8]

A Metamorfose e a Realidade Social, Psíquica e Morfológica

Retornamos, então, à obra de Kafka, para compreender que nem sempre a realidade psicológica se adequa à realidade social e, consequentemente, à realidade registral. Nem sempre a realidade biológica se coaduna com a realidade morfológica e nem sempre a realidade morfológica coincide com a realidade de gênero. São realidades distintas e independentes, para as quais, caso houvesse uma escala hierárquica entre elas, haveria de prevalecer o direito à personalidade individual, sob a conclusão de que dignidade da pessoa humana, enquanto valor intrínseco, deve se sobrepor à genética humana e aos valores morais e religiosos, quebrando as amarras darwinistas e rompendo com as amarras sociais.

Despontar tão duras amarras não deveria ser algo tão difícil, já que exige apenas nobres sentimentos, como o amor ao próximo, a tolerância ao diferente e o respeito ao que é essencial, parafraseando Antoine de Saint-Exupéry, respeito ao invisível aos olhos. [9]

As danosas amarras sociais, que impedem o processo de evolução humana, foram a razão para a metáfora utilizada nesse texto. Talvez, tenha sido extrema e exagerada. No entanto, longe de uma associação simplista, quis retratar o sofrimento ocasionado ao indivíduo que sente na pele a rejeição pelo que é, ou pelo gostaria de ser. A mutação está nos olhos de quem vê, porque quem o é, apenas exterioriza o que sente. E, aqui, aproveito a oportunidade para registrar o meu aplauso aos pais da menininha de 9 anos do Mato Grosso, que nasceu no corpo de um menino, e foram até a justiça buscar o direito da filha ser quem ela é, passando, desde já, pela transformação pretendida e necessária. [10]

É preciso quebrar de uma vez por todas o egocentrismo moral coletivo para reconstruir uma realidade social mais saudável, livre da interferência externa na busca pela felicidade individual. A intolerância social viola mais do que um indivíduo isolado: fere o pacto social de inclusão coletiva, com risco de morte do Estado Democrático de Direito, que urge por efetividade jurídica.


REFERÊNCIAS
[1] FRANZ, Kafka. A metamorfose. 14º ed. Tradução de Modesto Carone, Companhia das Letras, São Paulo, 1997
[2] Viviany Beleboni ficou nacionalmente conhecida após ter encenado uma crucificação na Parada LGBT de São Paulo, como forma de protesto contra a transfobia. A atriz foi repudiada nacionalmente, julgada e até esfaqueada depois do acontecimento. O jornal Globo chegou a divulgar a notícia da agressão de forma desconfiada, com a manchete “Viviany Beleboni diz ter sido esfaqueada em São Paulo”. Sobre o assunto, recomendo a leitura do texto de Roberto Tardelli: “A dor dessa gente não sai no jornal”. Disponível em: http://justificando.com/2015/08/11/a-dor-dessa-gente-nao-sai-no-jornal/ Acesso dia 12.02.2016
[3] ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo: Antissemitismo, Imperialismo e Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. 8ª Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
[4] SANTOS, Boaventura de Sousa. (1997) Uma concepção multicultural de Direitos Humanos. Lua Nova Revista de Cultura e Política. Governo e Direitos – CEDEC
[5] Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt2803_19_11_2013.html. Acesso em 12.02.2016
[6] Enunciados dos disponíveis em http://www.cnj.jus.br/images/eventos/I_jornada_forum_saude/enunciados_aprovados_jornada_direito_saude.pdf(acesso em 12.02.2016).
[7] Enunciado 531, aprovado durante a VI Jornada de Direito Civil, realizada em março deste ano pelo Centro de Estudos do Judiciário do Conselho da Justiça Federal (CJE/CJF): “A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento”. Disponível em http://www.cjf.jus.br/cjf/noticias-do-cjf/2013/abril/enunciado-trata-do-direito-ao-esquecimento-na-sociedade-da-informacao (acesso dia 12.02.2016).
[8] “Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rasto,
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.
A recordação é uma traição à Natureza,
Porque a Natureza de ontem não é Natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!
(Alberto Caeiro, in “O Guardador de Rebanhos – Poema XLIII”
Heterónimo de Fernando Pessoa )]
[9] SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O pequeno príncipe. Rio de Janeiro, Editora Agir, 2009. Aquarelas do autor. 48ª edição / 49ª reimpressão. Tradução por Dom Marcos Barbosa.  93 páginas.
[10] Juiz autoriza mudança de gênero e nome para brasileira de 9 anos. Disponível em http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2016/02/juiz-autoriza-mudanca-de-genero-e-nome-para-brasileira-de-9-anos.html (Acesso dia 13.02.16)

Essa matéria foi publicada originalmente em nossa página parceira:

contioutra.com - O que a Metamorfose de Kafka pode nos ensinar sobre direitos humanos

 

Sobre a autora

contioutra.com - O que a Metamorfose de Kafka pode nos ensinar sobre direitos humanos

Monaliza Maelly Fernandes Montinegro é Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte; Analista do Seguro Social com formação em Direito; Aprovada no concurso da Defensoria Publica do Estado da Paraíba

Email: [email protected]

Saiba escolher suas batalhas para não perder a paz

Saiba escolher suas batalhas para não perder a paz

Quando temos o hábito de “não levar desaforo pra casa”, qualquer coisa se torna uma batalha. Se pedir uma pizza com calabresa por baixo e queijo por cima e vier o contrário, é uma tragédia.

Quem não sabe escolher suas batalhas, não sabe relevar um deslize, tem um “senso de justiça” tão aguçado que transforma o cotiano numa sucessão de batalhas inúteis, consumidoras de tempo e de energia.

Quem age assim, não sabe que o descontrole no trânsito, a atenção excessiva ao fato que alguém não ligou quando disse que ligaria, a raiva do garçon displicente, não são “brigas de qualidade”. A luta contra um câncer, a perda de um filho, a quebra financeira, são.

O problema é que não importa o tamanho, ambos os tipos de batalhas sugarão sua energia. Assim,  a um certo ponto da vida é preciso aprender a buscar mais calma, mais lucidez, mais discernimento para entender:

– Que cada um de nossos dias vem com uma quantidade limitada de energia e que é preciso consumí-la de forma inteligente, caso contrário chega-se ao final do dia extenuado, sem ter realizado nada e sem fôlego para aquilo que realmente requer seu esforço e preocupação.

– Que a vida nos apresenta inúmeras batalhas diárias e que é preciso escolher quais a gente quer lutar e quais ignorar, mas que o segredo está em escolher a cada dia menos delas, até o dia em que nenhuma será importante o suficiente a ponto de valer a sua paz interior.

O Aborto é o Roubo Infinito*

O Aborto é o Roubo Infinito*

Sou contra o aborto e a sua legalização. Isso posto, vou argumentar. Antes de qualquer coisa, devo esclarecer que sou a favor das causas feministas e acho que ser contra a legalização do aborto não me coloca contra elas. Ofereço, a partir daqui, um novo ângulo para repensar tudo isso.

O tema é inesgotável e acho que aprofundarmos qualquer discussão é sempre válido. Tentarei verbalizar parte do que penso. Espero contribuir para o debate trazendo novos questionamentos e novas reflexões para o tema que não vi mencionados, ao menos, nos textos que li. Estou aberta a mudar tudo o que aqui será escrito; desdizer, diria Guimarães Rosa. Mas peço que fundamentem e ataquem os pontos que serão colocados ou que venham com informações diferentes dessas que mencionarei para que cresçamos todas no tema.

Primeiramente, a minha posição, óbvio, nada tem a ver com religião. Não acredito em Deus e muito menos no Diabo.

Quero começar pela palavra “escolha” que está diretamente ligada ao verbete “liberdade”. Li muito antes de vir aqui expor a minha opinião. Em todos os textos, os argumentos a favor da legalização do aborto, sem exceção, a palavra “escolha” foi usada de forma deliberada como se esse conceito fosse algo trivial. O discurso de uma forma geral afirma que “a mulher tem direito de fazer o que quiser com o próprio corpo, tem o direito fazer suas próprias escolhas e viver como desejar, pois viver sem poder escolher não é nada mais nada menos do que transformar a vida numa prisão das circunstâncias.”

Ledo engano. Ao meu ver, nem mulher nem homem são livres para escolha alguma. Sequer a palavra “escolha” faz algum sentido se a analisarmos profundamente.

Pensemos…

Há grandes possibilidades de que as “nossas escolhas” não sejam exatamente nossas, mesmo quando temos total certeza de que as tenhamos tomado de forma consciente. Para começar, se acreditamos na ciência, que o universo é previsível e segue um conjunto determinado de regras, ou seja, que cada coisa no universo que temos observado até agora segue algumas diretrizes específicas e nada está isento da influência de forças externas, então, por que nós – os produtos do universo – estaríamos isentos de influências do ambiente? Como fundamentar o livre arbítrio, a vontade que causa algo mas não é causada, numa mente inserida num mundo físico onde nada quebra a regra da causa e efeito?

Se a Teoria da Relatividade estiver certa, passado, presente e futuro não passam de uma ilusão de nossa mente, como afirmou Einstein. Consequentemente, causa e efeito não fazem sentido já que a causa sempre precede o efeito e, por tabela, a palavra “escolha” cai por terra.

Ok. A ciência também pode ser um tremendo discurso romântico e subjetivo, mas trazê-la para a discussão nos permite perguntar se e quais forças externas desempenham algum papel na nossa tomada de decisões. E só pelo fato de flertar com a ciência sem sequer aprofundarmos em seus fundamentos já surge a dúvida: será que a razão pela qual a intuição nos diz que temos um livre-arbítrio não seria porque a nossa mente altamente limitada não consegue identificar todos os fatores que afetam a nossa “escolha”?

Se acreditarmos nas ideias levantadas por Freud, veremos que não agimos de forma livre mas sim conforme nossos impulsos e desejos inconscientes, como se fossemos reféns dos mesmos.  Desta forma, acreditamos estar agindo a todo instante conforme queremos e escolhemos sem notar que na verdade, estamos satisfazendo desejos que se encontram em nosso inconsciente. E vejamos como isso faz sentido: o que nos leva a consumir certos produtos, a trabalhar em certas atividades e a nos relacionar com determinadas pessoas? O quanto condicionamos nossos atos aos resultados que estes trarão? O quanto estes resultados que almejamos são construídos pelo meio social em que vivemos? Dito de uma outra forma: se um objeto lançado por nós tivesse consciência do seu movimento não poderia ele se julgar livre para perseverar nesse movimento na medida em que ignorasse por completo o impulso que demos a ele? Em que medida aquele que crê ser livre não é tal e qual uma pedra lançada ao vento que ignora a força que a impeliu?

Afinal, “o que, então, determina a minha vontade?”, perguntaria você. Eu não sei ao certo, mas se você acha que é você mesmo, perceba o quanto isso é incoerente: se é você que determina a vontade, isso significa pressupor um “você” de certa natureza que determina necessariamente a vontade. Dizer que “você” determinou sua vontade só faz algum sentido na defesa do livre arbítrio se “você” não é determinado por nada (ou por Deus). Porém, o que seria algo que não é determinado por nada (ou por uma força superior)? Complicado quando pensamos seriamente a respeito, não?

Ainda na esteira da ciência, pergunto-lhe: uma célula individual tem o livre-arbítrio? E uma bactéria, teria? Ou uma flor? E uma girafa, um cachorro ou um leão, por exemplo – será que eles têm livre-arbítrio? Em que ponto da nossa história, essa tão contraditória e ilusória ideia de liberdade para escolher apareceu em nós? E por quê? Em todas as culturas do planeta o livre-arbítrio é considerado como real? Por que na nossa cultura acreditamos e usamos deliberadamente a palavra “liberdade” que sequer é ponto pacífico a sua definição no mundo? O fato de a ideia da escolha vir associada a outra de julgamento não é por acaso: a última precisa da existência da primeira. Isso é algo simples de compreender, afinal, quais seriam as consequências para a sociedade, então, se descobríssemos que não existe livre arbítrio? Como a doutrina da condenação e salvação se sustentaria?

Entrando agora diretamente no tema, o que estão querendo quando defendem a legalização do aborto é mostrar que abortar não deve ser condenável. Na defesa da legalização, alguns argumentos se repetem:

Todos nós, que não somos hipócritas, sabemos que as mulheres mais ricas procuram boas clínicas e abortam em segurança. E todos nós, que não somos hipócritas, sabemos que são as mulheres mais pobres que morrem em procedimentos clandestinos, porque não têm dinheiro para pagar as boas clínicas.” – Eliane Brum

Aborto é de fato um problema complexo de saúde pública e a sua legalização é uma necessidade.  O sofrimento das mulheres e das famílias que vivenciam o abandono e a ausência do Estado quando precisam ou desejam abortar deve ser dimensionado por todos os atores públicos, se é que ocupam esta posição para defender os interesses públicos.” – Por que legalizar o aborto?, na Revista Carta Capital por Ana Maria Costa — publicado 28/09/2013

Ou seja, defende-se a legalização com o argumento que as mulheres pobres são as que mais sofrem com isso. Com a criminalização do aborto, as mulheres ricas vão para clínicas privadas, onde são muito bem tratadas, e as pobres são obrigadas a ir a lugares sem as mínimas condições necessárias. Logo, as ricas são bem cuidadas e as pobres sofrem risco de vida. Legalizar o aborto, portanto, implicaria em também proteger as mulheres pobres já que, sendo crime ou não, querendo todas abortam.

Li textos citando que nos  Estados Unidos, onde o aborto é legalizado, cerca de 4 em cada 5 mulheres que o requerem são negras ou latinas. Seria diferente por aqui no Brasil? Estamos defendendo o que afinal: a legalização do aborto ou uma limpeza social? Qual raça, coloquemos assim, que seria mais impedida de nascer quando o aborto for legalizado? Estamos protegendo as mulheres negras ou impedindo que negros nasçam?

No mais, por que as pesquisas mostrando o quanto o aborto prejudica o corpo da mulher, além dela também correr risco de morrer como em qualquer outra operação, não são explicitadas? Quem as está escondendo e por quê? Existe um aumento da probabilidade real da mulher após o aborto sofrer de problemas de ordem psicológica, ter um aborto natural em futuras gestações e desenvolver outras doenças mesmo tudo sendo feito, digamos, nas condições ideais. Ainda que alguns mencionem essas colocações, fazem-no como nota de página.

“Uma mulher não deveria gerar uma gravidez que não desejou, se uma mulher tomou todos os cuidados e usou os métodos contraceptivos, ao se ver vítima do destino, tendo uma gravidez indesejada deveria poder interromper a gravidez. Se não há dolo, não deve haver consequência.”

Por que não concentrar toda essa energia em intensificar os métodos de prevenção, as opções de encaminhamento para adoção e sobre as causas das mulheres abortarem?

Percebam que não há mais liberdade alguma e sim mais prisão. Estudos mostraram que muitas recorrem ao aborto, sejam elas brancas ou negras, com medo dos danos às suas reputações e muitas confessaram que a gravidez foi fruto de uma relação socialmente reprovada. Mais uma vez pergunto: em que medida essa mulher está fazendo uma “escolha” quando só lhe resta essa opção? Em que medida ser livre é agir por medo? O que mais é um instrumento de opressão aos direitos das mulheres: criminalizá-lo ou descriminalizá-lo?

Os dados sociais oferecidos por aqueles que são a favor da legalização do aborto falam que as mulheres estão iniciando a vida sexual cada vez mais cedo e, quando engravidam jovens, são obrigadas a perder toda a sua juventude para criar de uma criança que muitas vezes nem pai presente terá. A gravidez na adolescência compromete os estudos e a carreira da jovem. Se o aborto foi legalizado, essa mazela seria sanada. Pergunto: em que medida esse tipo de raciocínio contribui para que melhoremos como sociedade e como seres humanos?

Existe uma diferença entre ser a favor do aborto e ser a favor da legalização do aborto. Ser a favor de sua legalização não é ser a favor do aborto. Entendo isso. Mas ouvir que “não criminalizar o aborto não é incentivar sua prática”  e que “em países onde o aborto foi legalizado o número de abortos não aumentou efetivamente” não são coisas simples. Ambas colocações que vêm no sentido de proteger a mulher pobre e, vejam que interessante e paradoxal: quanto mais imaginamos um livre-arbítrio para escolher, mais nos tornamos escravos porque precisamos de regras que limitem, justifiquem e expliquem a liberdade.

Se uma pessoa perde a consciência, ou mantém a consciência e perde a sensibilidade de todo o resto do corpo, ou seja, fica tetraplégica, temos o direito de praticar a eutanásia? Dizer que o feto ainda não sente dor, ainda não tem sistema nervoso formado e nem cérebro, não justifica. Em muitos casos, fetos sobrevivem às várias tentativas de aborto, uma vez que antes de nascer, já existe algo que os faz “brigar” por suas próprias vidas. Dizer que a mulher pode fazer o que quiser com a vida dela não significa dizer que ela possa fazer o que quiser com a vida que carrega dentro de seu corpo. O. Feto não faz parte do corpo da mulher, ele não é um prolongamento do corpo da mulher, ele é um ser próprio que está instalado no corpo da mulher. Ele é um ser tal e qual alguém que teve morte cerebral ou ficou tetraplégico. De alguma forma, ele não pode se defender e se tirarmos a sua vida é uma vida que estamos tirando e isso significa matar sim senhor.

Não acho que “se o aborto for legalizado ninguém mais vai usar camisinha pois vai poder abortar“. Não acho possível que alguém ache que abortar é igual tirar um cravo. Entendo que, em certa medida, a criminalização do aborto pune apenas e exclusivamente mulheres já em situação de risco. Sei que mulheres ricas abortam e que elas só não morrem ou ficam inférteis por isso (ao menos não na maioria das vezes) porque o fazem em condições melhores. Ainda assim, elas sofrem em silêncio, muitas vezes sem apoio psicológico e passam a vida se sentindo criminosas pois não podem desabafar com praticamente ninguém.

Então, descriminalizar o aborto seria dar uma certa condição de igualdade para que todas as mulheres façam essa “escolha” e não se sintam criminosas – ainda que esse ato seja algo deplorável e digno de pena de quem vai ser submetido a ele. Aborto e legalização do aborto são coisas diferentes, nessa esteira, porque o primeiro significa ser a favor de envenenar fetos indefesos ou interromper uma vida que, dizem, ainda não tem sentido. O segundo é ser a favor de legalizar a primeira em algumas ou em todas a situações mesmo que se concorde que é um ato, literalmente, execrável.

Voltando a minha opinião de que escolhas não existem, perguntaria você: “se eu não posso escolher como posso ser julgado?” Justamente. Eu acho que essa ideia de ‘escolha’ leva diretamente a outras como de julgamento e moral que eu não aceito como objetivas e universais. Mas, continuaria você, se não há certo nem errado, matar, por exemplo, seria lícito? O aborto seria lícito? Se estou criticando a escolha, estou dizendo exatamente que quem mata não teve outra alternativa; o que não quer dizer que um assassino não deva ser condenado porque entendo que o ‘mal’ pode ser considerado como aquilo que prejudica o outro.

No caso da mulher, eu não estou querendo julgar ninguém. Pelo contrário. Quero acabar com esse julgamento sendo ou não legalizado o aborto. Acho, friso, que legalizar é, por um ângulo, fazer com que nós mulheres nos tornemos mais ainda submissas a uma sociedade machista pelos motivos pelos quais as  mulheres recorrem ao aborto. O ponto é que penso na mulher em si, no que a movimenta, no que a engrandece e a diminui e dispenso um critério exterior e moral para julgar as coisas.

Legalizar o aborto, penso eu, nos enfraquecerá e nos tirará muitas essências. Há muita coisa por detrás dessa discussão que não vi sendo colocado em nenhum dos textos feministas. Ou essas mulheres estão sendo muito ingênuas ou eu, realmente, ando vendo cabelo em ovo.

Compreendo, vale observar, que a liberdade da vontade não poder ser coerentemente pensada através de conceitos (uma vez que, em última instância sempre caímos ou no determinismo ou no acaso) não significa que sua possibilidade esteja negada. Mas não consigo desistir da ideia de que a metáfora da bifurcação e de caminhos escolhidos é uma invenção que só nos serve para nos gerar culpa e medo. No caso do aborto ser legalizado, essa metáfora do caminho fará parte da decisão (como já faz parte de todos os discursos) e eu não posso aceitar que isso fará que a mulher (ou o ser humano) esteja, de fato, pensando corretamente. Acho, sinceramente, que não estão nem pensando.

Se entendo que agi mal em uma situação é pelo fato de ter feito uma coisa de uma determinada maneira e ter tido um resultado ruim.  Neste caso, tentarei mudar, digamos, a química de meu corpo ou o meu modo de pensar para que eu seja capaz de agir de uma forma diferente quando submetida a uma situação similar. Isso vale para o aborto. A mulher quando engravida se ela se sente mal ou desprotegida ou apavorada… seria exatamente por quê? Se estamos querendo ser, digamos, iguais aos homens ou não sermos tão condenáveis assim por que defender a atitude de poder abortar e não atacamos o comportamento de todos que levam a mulher a ter essa atitude quando outras seriam possíveis (ainda que também nada fáceis) como o encaminhamento da criança para adoção?

Como disse no início, sou contra o aborto e a sua legalização. Acho, sinceramente, que isso só vai contribuir para que retrocedamos como seres humanos e seres pensantes. Se quero que a mulher viva melhor, eu desejo que nenhuma tenha que passar por isso.

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*Como disse Mário Quintana, o aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato. É um roubo… Nem pode haver roubo maior. Porque, ao malogrado nascituro, rouba-se-lhe este mundo, o céu, as estrelas, o universo, tudo! Fernando Sabido corrobora: “matar não é tão grave como impedir que alguém nasça, tirar a sua única oportunidade de ser“.

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