Somos todos eternas crianças

Imagem de capa: debasige/shutterstock

Com o tempo, você se torna aquela pessoa que está sempre perguntando se tem algum lugar pra sentar. Com o passar dos anos, o melhor da festa passa a ser o after. Quando você vai comer em alguma lanchonete, ou chega em casa, toma um banho e se deita. Você passa a preferir café com biscoitos de padaria a Ruflles com refrigerante. Aquele chá já parece não ser tão ruim assim. Você deixa de se envolver em brigas infantis e para de usar o tempo que passa com uma pessoa como medidor de tamanho de amizade. Você começa a pagar contas, a resolver problemas em bancos, a preencher formulários vários, a fazer o pedido nos restaurantes da vida e a não se dar ao luxo de sair de casa sem carteira e documentos.

Paramos de fazer isso ou aquilo, deixamos de lado costumes, verdades e vários “para sempre” e “nunca” e, de repente, vemo-nos com uma lista de novos afazeres, uma nova rotina. Uma “rotina adulta”.

Vem a vida adulta e nos vemos “independentes”.

Ora, não temos mais dúvidas sobre o sabor do sorvete, mas a indecisão continua nos engolindo, por dentro, quando o assunto é nos demitir ou não daquele emprego que nos cansa.

Deixamos de fazer birra para ficar com os dois brinquedos (o nosso e o do colega), mas também não conseguimos abrir mão de um sonho para correr atrás de outro.
Não choramos mais escandalosamente por causa do “não” de nossos pais, porém, deixamos escaparem algumas lágrimas no travesseiro, por conta de uma rejeição por parte de alguém que amamos.

Não nos permitimos mais correr para os braços de nossa mãe quando o tiro sai pela culatra, todavia, estamos sempre à procura de alguém para nos consolar.
Deixamos de temer os monstros que vivem debaixo de nossas camas, entretanto, passamos a morrer de medo dos que vivem dentro de nós.

“Vou dizer uma coisa importante para você. Os adultos também não se parecem com adultos por dentro. Por fora, são grandes, desatenciosos e sempre sabem o que estão fazendo. Por dentro, eles se parecem com o que sempre foram. […] A verdade é que não existem adultos. Nenhum, no mundo inteirinho.”, diz uma personagem de “O oceano no fim do caminho”, livro de Neil Gaiman.

O fato é que, até certo ponto estamos, todos perdidos, desorientados, exatamente como crianças.

Muda a rotina, mudam os costumes, mudam as pessoas ao nosso redor, mas nossos medos, dúvidas, inseguranças, continuam lá. A diferença é que eles vão se repaginando ao longo dos anos.

Recorro, enfim, a David Gilmor e a Roger Waters, em um trecho de “Wish You Were Here”, para me explicar: No final das contas, somos todos almas perdidas nadando em aquários, ano após ano, correndo sobre o mesmo velho chão. E o que sempre encontramos? Nossos mesmos velhos medos.

O que nos resta é aceitar o desafio de continuar a enfrentar esses mesmos velhos medos. Talvez sejam eles que deem sentido à nossa caminhada aqui na Terra, não é?







Paraibana (Campinense) estudante de Psicologia que tem a cabeça nas nuvens, pés no chão e um fraco por causas perdidas.