Sobre ter de sorrir quando se está em frangalhos

Os outros apenas nos imaginam. Olham para nossa camada mais superficial – aquela capa de força que usamos para enfrentar o mundo -, e tecem sobre nós as mais fantasiosas conjecturas.

Já cansei de ouvir de bocas muito bem-intencionadas a frase: “Mas, você é tão forte!”. Não, eu não sou forte. Pelo menos, não todas as vinte e quatro horas do dia. Sou forte, muitas vezes, porque tenho de ser, porque é o que esperam de mim, porque não há outra alternativa.

E assim acontece com todos nós. Quantas vezes não saímos da cama de manhã por falta de escolha? Quantas vezes não ofertamos um sorriso porque não temos condições de mais nada? Quantas vezes não calamos nossa voz, simplesmente porque não há nada de bom para se dizer?

Somos todos sobreviventes. E ainda temos de lidar com a culpa real de entendermos que há milhões de pessoas em situação muito, muito pior do que a nossa.

Penso que para aqueles que têm algum tipo de apego às religiões ou a Deus, a coisa fique um tantinho menos penosa. Deve ser um real alento acreditar que há alguém ou algo acima de nós com poderes sobrenaturais, e que seja capaz de nos ajudar a carregar o peso da bagagem.

Deve ser bom acreditar que ao ficar de joelhos e orar, há um ser supremo que nos olhe e escute e que venha aliviar o nosso coração. Sorte dos que creem, penso eu… Porque não crer gera uma enorme solidão.

Crer-se por conta própria nesse mundo aumenta um bocado a carga de responsabilidade. Conta-se com os semelhantes para carregar o jugo de cada dia. Só que os semelhantes têm seus próprios pesos a carregar; raramente estão disponíveis para estender a mão, emprestar um ombro ou oferecer alguma escuta amorosa.

Porque tem hora que só precisamos mesmo é desaguar. Botar para fora um pouco dos rejeitos internos, dividir, esvaziar.

Este texto é sobre os corajosos que juntam seus caquinhos de manhã para dar conta da vida e, de alguma forma miraculosamente incrível, retornam às suas casas inteiros no final do dia.

Este texto é para você que, apesar da dor, encontra um jeito de permanecer de pé. Porque há dias que estar de pé é simplesmente um feito extraordinariamente heroico!







"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"