Era o que faltava. Tanta coisa com que implicar e tem gente perseguindo quem fala de amor. Deixemos de coisa, vai. Ô, espécie estranha somos nós!
Ora nos queixamos de que o povo só alimenta o ódio quando lê maldade, fofoca, futilidade, ora reclamamos que tem gente demais falando de amor. Bendita falta do que fazer!
Cá pra nós, é melhor o mundo todo falando de amor que meia dúzia falando mal de todo mundo. É tão óbvio! Mas não. Tem sempre um gênio dedicado à masturbação pseudo-filosófica com questões do gênero “tem muita gente dizendo que ama e pouca gente sabendo amar” num chatíssimo tom acusatório, generalizando como se todos os que ousam falar de sentimentos fossem alienados, hipócritas ou enganadores.
Se estão “sabendo amar” ou não, quem sabe? Quem pode afirmar? Ninguém! Deixa o povo falar de amor, ué! Lê e ouve quem quer! Melhor falar de amor que encher a cabeça de minhoca e sair por aí odiando quem passa na frente.
Concordo. Tem gente que fala uma coisa e faz outra. Tagarela que ama aqui e odeia na prática ali. Acontece muito. Mas isso não torna falar de amor uma coisa ruim.
Generalizar desse jeito é feio. É insistir na confusão. É entrar numa casa barulhenta, repleta de pessoas berrando, e gritar mais alto ainda. Pura desonestidade intelectual. Questão de caráter. Mau caráter.
É incrível a nossa capacidade de banalizar questões essencialmente importantes. O uso da palavra “empoderamento”, é um exemplo claro disso. O termo ganhou popularidade por meio dos movimentos de emancipação e garantia de direitos a grupos que, por alguma razão sofram algum tipo de discriminação, seja social, política, educativa, de gênero ou religiosa. E, nunca será demais ou suficiente alertar a sociedade para o perigo de qualquer tipo de discriminação.
No entanto, o desgaste imposto às questões de caráter feminista, por exemplo, podem gerar efeitos exatamente contrários às intenções originais e legítimas de garantir às mulheres lugares de atuação, manifestação e trânsito em todo e qualquer espaço da sociedade. O termo traduzido do inglês empowerment não é novidade; na realidade, remonta do século XVI, e tem origem nas ideias contidas na Reforma Protestante, cujo cerne era a luta por justiça social. A ideia de “empoderamento” ganhou nova forma de representação quando passou a ser utilizado para manifestar o repúdio à opressão e o apoio à conquista da autoridade, sobre a maneira de cada um interagir socialmente e determinar a história atual e futura de suas vidas.
Ideais de equidade e liberdade são a base dos movimentos feministas, tão presentes e atuantes num momento em que se faz absolutamente indispensável depositar nas mãos femininas o poder social. Poder esse que lhes garantirá a força política necessária para que seus corpos, direitos, desejos, ideias e destinos sejam respeitados.
O ânimo dos ideais feministas alimenta-se da consciência do quanto ainda são frágeis as nossas garantias de segurança, independência e liberdade. Passamos por situações de violência que nos atingem desde a hora do parto, quer sejamos nós a mulher que dá à luz ou a menina que é trazida a ela. Enfrentamos todos os dias circunstâncias que nos colocam em desvantagem; ainda temos salários inferiores aos homens; ainda há quem nos considere seres que precisam encarnar uma espécie de heroínas domésticas que nunca se cansam e, em hipótese alguma se queixam das inúmeras tarefas acumuladas, dentro e fora de casa.
O uso do pejorativo termo “feminazi”, por exemplo, revela o quanto ainda se faz necessário discutir e trazer à público os inúmeros contextos políticos e sociais que ilustram as incontáveis formas de discriminação contra as mulheres. A intenção por trás do termo encerra, em si mesma, a determinação em calar o debate, em rotular as mulheres que ousam ultrapassar os limites impostos a elas, em desacreditar o quanto seja possível a nossa voz e o que temos a dizer.
A falta de conhecimento histórico, e ainda pior, a falta de interesse em reconhecer que feminismo e nazismo são, em sua essência, termos antagônicos revela o quão alienados são aqueles que usam o termo “feminazi” com a disfarçada intenção de fazer crítica, a posicionamentos feministas supostamente radicais. No fundo, e no raso, quem faz uso desse tipo de expressão reducionista e preconceituosa, não passa de um pobre ignorante que acredita que ainda é possível silenciar a nossa voz.
Com grandes nomes na indústria cinematográfica, o cinema nórdico vem nos presenteando com trabalhos cada vez mais envolventes. Estamos falando de filmes dirigidos por Ingmar Bergman, Lars von Trier, Thomas Vinterbeg, Susanne Bier, dentre outros, que nos oferecem algo para pensar. Muitos dos longos dessa lista são difíceis de digerir, alguns são polêmicos, mas todos valem a pena assistir.
Não estão em ordem cronológica, nem de preferência.
FESTA DE FAMÍLIA
Nacionalidade: Suécia / Dinamarca
Do aclamado diretor dinamarquês Thomas Vinterberg. O patriarca de uma família (Henning Moritzen) resolve comemorar seu aniversário de 60 anos num hotel. Contudo, após a revelação chocante de um dos seus filhos, o que era para ser uma simples comemoração se transforma num evento cheio de surpresa, raiva e muito ressentimento.
A CAÇA
Nacionalidade: Dinamarca / Suécia
Dirigido também por Thomas Vinterberg, retrata a história de Lucas (Mads Mikkelsen) que trabalha em uma creche. Um homem querido pela comunidade que está reorganizando sua vida após o divórcio. Um certo dia, uma criança de cinco anos mente para a diretora da creche ao falar que Lucas mostrou suas partes íntimas para ela. A acusação resulta no afastamento dele do trabalho. Sem qualquer chance de defesa, ele começa a ser hostilizado pelos habitantes da cidade, numa verdadeira caça às bruxas. O filme é muito forte e somos tomados por uma crescente sensação de injustiça na medida em que a trama vai se desenrolando.
EM UM MUNDO MELHOR
Nacionalidade: Dinamarca / Suécia
Dirigido por Susanne Bier, com Mikael Persbrandt no papel de Anton, um médico que divide sua vida entre o trabalha em um campo de refugiados na África e a família na Dinamarca. Em casa, ele enfrenta problemas com sua esposa Marianne (Trine Dyrholm) com quem tem dois filhos, Elias (Markus Rygaard) e Morten (Toke Lars Bjarke). Em paralelo, o garoto Christian (William Jøhnk Nielsen) chega na Dinamarca com seu pai Claus (Ulrich Thomsem), após a morte da mãe. Elias e Christian se tornam amigos e a partir daí as consequências dos seus atos marcarão as duas famílias.
Dirigido pelo polêmico diretor Lars von Trier, o filme conta a história de Selma, interpretada pela cantora e compositora islandesa Björk, uma mãe solteira que tem uma doença degenerativa hereditária cuja consequência é a perda gradativa da visão, mal herdado também pelo seu filho de doze anos. Ela, imigrante tcheca, mora e trabalha duro nos Estados Unidos com a intenção de juntar dinheiro para a cirurgia do filho. Mas, algo muito sério acontece… Não é um filme para aqueles que gostam de tramas sobre superação, mas um filme profundo e intenso que nos faz pensar sobre as graves distorções éticas da sociedade.
A FESTA DE BABETTE
Nacionalidade: Dinamarca
Filme dirigido por Gabriel Axel, conta a história da francesa Babette que fugindo da guerra vai viver numa pacata vila onde arruma trabalho de cozinheira e faxineira na casa de duas irmãs. Após anos de trabalho para a família, Babette ganha um prêmio e resolve preparar um jantar francês que transformará para sempre a vida dos moradores da vila.
DEIXA ELA ENTRAR
Nacionalidade: Suécia
Dirigido por Tomas Alfredson, o filme mostra parte da infância de Oskar (Kare Hedebrant), um garoto solitário que sofre bullying na escola. Contudo, tudo muda quando Oskar conhece a pálida Eli (Lina Leandersson) que acabou de se mudar para a vizinhança. Enquanto as duas crianças tornam-se cada vez mais próximas e a amizade entre elas cresce, uma série de mortes acontece na região. Acontece que Eli está envolvida com os macabros acontecimentos, o que não parece ser um problema para o frágil garoto.
O SÉTIMO SELO
Nacionalidade: Suécia
De direção de Ingmar Bergman, considerado um dos maiores representantes do cinema sueco. No filme, um cavaleiro participa de um jogo de xadrez com a Morte, cujo resultado determinará o seu destino. O clássico nos faz pensar sobre o significado da vida e também traz reflexões sobre a perda da fé e a crença em Deus.
PARA SEMPRE LILYA
Nacionalidades Dinamarca / Suécia
Dirigido por Lukas Moodysson, o filme conta um pedaço da vida de Lilya (Oksana Akinshina), uma garota de 16 anos que é deixada na União Soviética após a sua mãe partir com o namorado para os Estados Unidos. Sem receber qualquer dinheiro da mãe, Lilya passa a morar em um apartamento no subúrbio sem energia elétrica e aquecimento. Nesse meio tempo ela conhece e se apaixona por Andrey (Pavel Ponomaryov) que a convence de que o melhor seria recomeçar a vida na Suécia, onde teria uma oportunidade de emprego. Lilya aceita e se muda, mas ela nem imagina o sofrimento que a espera.
DEPOIS DO CASAMENTO
Nacionalidade: Dinamarca /Suécia
Dirigido por Susanne Bier, o filme começa nos mostrando a luta do dinamarquês Jacob Petersen (Mads Mikkelsen) para manter um orfanato numa região muito pobre da Índia. Sem recursos para seu trabalho social, Jacob recebe uma proposta de doação por parte de um magnata sueco chamado Jorgen (Rolf Lassgard), mas para receber ele precisa ir até a Dinamarca. Jacob viaja para Copenhague, porém Jorgen avisa que somente decidirá sobre a doação depois do casamento da sua filha e convida Jacob para a festa. No casamento virão grandes surpresas.
Dirigido por Lars von Trier, o filme se passa na década de 30, quando uma desconhecida chamada Grace chega numa comunidade em busca de refúgio, pois está sendo perseguida por bandidos. Ela é escondida na comunidade e em troca trabalha para as pessoas que vivem no local. O acerto é de que após duas semana haverá uma votação para decidir se ela poderá ficar ou não. Grace é “aceita” na vila, mas os moradores começam a exigir abusivamente algumas coisas em troca pelo risco de escondê-la. O que ninguém imagina é que o segredo de Grace pode ser perigoso demais.
O AMANTE DA RAINHA
Nacionalidade: Dinamarca
Dirigido por Nikolaj Arcel, o filme se passa no século XVIII e conta a história da jovem britânica Carolina Mathilde (Alicia Vikander) que se torna rainha da Dinamarca depois de casar com o perturbado e fragilizado rei Christian VII (Mikkel Boe Folsgaard). Por conta da doença do rei, o alemão Johann Struensee (Mads Mikkelsen) é escolhido como o médico da corte, momento em que se aproxima da rainha. O romance entre o médico e Carolina é retratado no filme, bem como a forma em que o casal, aproveitando-se da doença do monarca, assume o poder e inicia uma reforma no país. É a entrada do Iluminismo no norte da Europa. O idealismo político de Struensee também é muito bem destacado na história.
OS HOMENS QUE NÃO AMAVAM AS MULHERES
Nacionalidade: Dinamarca / Suécia / Noruega / …
Baseado no primeiro livro da Trilogia Millennium, o filme nos mostra a eletrizante investigação particular sobre o desaparecimento de Harriet Vanger há 36 anos. A polícia não teve sucesso sobre o paradeiro da jovem e o caso permanece em aberto. Porém, mesmo após longos anos, seu tio ainda está à procura de Harriet, razão pela qual contrata Mikael Bomkvist (Michael Nyqvist), um jornalista investigativo que trabalha na revista Millennium. Ele aceita o trabalho e recebe ajuda de Lisbeth Salander (Noomi Rapace), uma moça talentosa e nada sociável.
Sim, temos que nutrir esperanças de que as coisas vão melhorar, de que tudo há de arrumar um jeito de chegar até nós, porém, sem que fiquemos passivamente à mercê do sabor dos ventos, achando que presentes cairão do céu diretamente em nosso colo. A regra básica é clara: o mais sábio é esperarmos de nós mesmos o que queremos, na certeza de que aquilo que fizermos por merecer estará ao nosso alcance.
Espere o retorno de tudo aquilo por que você lutou, pelo que perdeu horas de sono e de diversão, dedicando-se com força de vontade e dedicação extrema. Colhemos os louros das conquistas nas quais investimos precioso tempo de nossas vidas, porque colocamos verdade nessa busca. Porém, não perca tempo aguardando que as chances de sua vida tocarão a campainha de sua porta, enquanto você fica sentado no sofá.
Espere o momento certo de falar com as pessoas por quem você tem consideração, por quem nutre afeto sincero e recíproco. Temos que alertar quem amamos das atitudes destrutivas que possam estar tomando, repreender seus comportamentos inadequados, aconselhando com carinho. Entretanto, não perca tempo tentando conversar com quem não consegue ouvir ninguém além de si próprio, ou colherá apenas ingratidão.
Espere ser entendido e acolhido pelas pessoas que caminham ao seu lado com entrega e verdade, pois aceitarão as suas escolhas de vida e as apoiarão, interessando-se por nada mais do que sua felicidade, do seu jeito, que eles tanto prezam. No entanto, não perca tempo tentando se explicar para quem não se importa com o seu bem estar, para aquelas pessoas que se prendem a preconceitos diminutos e insustentáveis, incapazes que são de olharem para si mesmas.
Espere gratidão e reconhecimento das pessoas que não pedem, mas se encontram abertas ao que o outro possui, pois têm consciência de que necessitarão do outro, uma ou outra hora. Mas não perca tempo esperando retorno de quem sempre pede mais do que você pode ofertar, de quem suga suas forças, exigindo sua atenção integral, como se ele fosse o centro do mundo, do universo. Esses não enxergam nada além do próprio umbigo e jamais serão capazes de olhar além dos limites do próprio egoísmo.
Sem que reservemos um bocado de nossas vidas a esperanças e sonhos, tudo se tornará meramente mecânico, isentando-se do prazer mágico das agradáveis surpresas que enriquecem o nosso caminhar. Porém, tão somente nos enchermos de esperanças em relação a coisas pelas quais não lutamos e a pessoas vazias de retorno afetivo nos impedirá o fortalecimento de nosso amanhecer renovado na fé e no amor que nos alimentarão o seguir adiante, sempre e incansavelmente.
Em meio a muitas andanças pelas escadas do MoMa (The Museum of Modern Art), e à horas de análises de obras de arte, fotografias, Kahlo, Dalí, Picasso, Gauguin, Monet, e muitos outros artistas que não é possível recordar, deparo-me com um burburinho de pessoas se empurrando freneticamente, olhos se arregalando, vários “com licença” em ao menos cinco línguas diferentes, que logo me chamam a atenção. Sem nada a perder, e fugindo do frio de -2º de NYC, vou com minha mãe para ver o porquê de tanto estardalhaço.
Noite. 1889. Vicent Willen Van Gogh. Não era para menos, estava ali, bem à frente de todos, “A Noite Estrelada”. Tiro minhas fotos como qualquer um naquele lugar, e salvo em quatro app’s diferentes para evitar que perdesse tamanha preciosidade.
Mais tarde no hotel, passo a observar a obra, que sem sombra de dúvidas, está em primeiro lugar dentre as minhas pinturas preferidas. Não digo isso pelas pinceladas, ou pela tinta que foi usada, nem pela qualidade da tela e beleza da moldura, mas pela mensagem que ela traz.
Há nesse quadro um belo contraste. O Carpe Diem e o Carpe Noctem reunidos em um mesmo espaço. A noite vagarosa e profunda é marcada pela insegurança, instabilidade, pelo medo, e em certa proporção, pela tristeza. Isso se pode constatar olhando o céu; tão grande, tão imenso, que toma o maior plano do quadro. É incerto, é inalcançável. Talvez, Van Gogh preferiu retratar a insignificância de nosso tamanho em relação à outras coisas, ou a nossa incapacidade de controlar o mundo, ao invés de grandes feitos humanos. Por outro lado, vê-se a beleza, a tranquilidade, e a esperança, as luzes ao fundo, e a união entre as casinhas, passaram essa ideia de “você não está só”, de que o amanhã está à porta.
É difícil olhar para “A Noite Estrelada” e não ter um sentimento ambíguo ou se imaginar num paradoxo. É provável que isso se dê pelo estado em que o artista se encontrava – depressão e transtorno bipolar marcaram a vida do holandês – e de certa forma, naquele momento de maneira empática, fui solidária à sua dor. Enquanto observava o quadro, meus pensamentos se dividiam em dois caminhos: a noite e o dia, e como deveriam ser vividos cada um.
Enfim, foi uma experiência magnífica, uma análise do eu e o outro, somente através de um quadro. Obtive diversas conclusões que contribuíram muito para o meu intelecto e visão. Agora, percebo que esse paradoxo é constante, é real. Sei que devemos passar pelos nossas manhãs e madrugadas, sem espantar a bagagem de emoções que com elas vêm. Mesmo durante o dia, temos períodos de noite, recaídas. E mesmo durante as noites, temos paz e calma, e a clara certeza de um amanhã que logo virá. Cada antítese deve ser aproveitada ao seu modo, uma diferente da outra.
Ana Luisa Borba
15 anos e cursa o 1º ano do Ensino Médio.
Amante das artes e da literatura, fascinada por Klimt e Frida Kahlo, apaixonada pela Hungria e sua cultura. Adora escrever textos que retratem seus pensamentos, visitar novos lugares e conhecer pessoas diferentes. Amadora na questão ‘fotografia’. Café, por favor, não camomila.
Existe uma tendência em analisar o amor de forma topográfica, ou seja, como se esse sentimento fosse perceptível através de observação direta ou medição. Por esse ângulo, afirma-se que gostar até seis meses é paixão, ou se envolver por mais tempo é amor. Criamos linhas imaginárias para determinar o que ocorre com nossos sentimentos e ainda colocamos a paixão em lugar menor e improvisado. Desta forma, saindo da realidade, estabelecemos conceitos engessados sobre o amor e suas limitações.
Há quem diga que o amor deva ser sereno, dotado de calmaria, ambiente perfeito para a prática de uma união e não geraria desconforto. Pode ser, mas existem outros amores.
Existe um amor com fuoco, aquele que tem a exigência imediata da paixão e a paciência de quem ama. O prazer pede constante saída, mas a realidade impede o brotar de tais instintos sinceros. O tempo dos amantes é apressado e injusto; não atende ao desejo. Um simples encontro é motivo de tanta alegria, a despedida parece o fim, mesmo sabendo que se verão minutos depois. Os meses passam e tais sentimentos despertam outros mais fortes, e esse amor inflamado ganha relevância. Sentimento de condensações que abriga todas as formas de paixões e amores; um amor híbrido, em essência.
Nesse calor nos acolhemos como se fosse o centro da terra, mas os psicanalistas diriam que estamos nos acolhendo no centro do útero. Uma sensação de retorno e aconchego – uma busca de proteção. Em alguns casos, para amar, é melhor deixar o divã de lado.
Nesse amor condensado que transita entre a ternura e a passione é impossível não ter apego. Necessitamos estar próximos, saber o que o outro faz, como está sua família, se o ar que respira está agradável. Temos delírios de ciúme, aspectos infantis nos assaltam, ficamos inseguros ao tentar segurar. E no fim do dia, a sensação de que não irá amanhecer de tanta saudade.
Como dizer às pessoas que estão neste cenário para não se apegarem na tentativa de evitar o sofrimento? É melhor correr o risco. O amor apaixonado tem apego sim, impossível que não haja o profundo desejo desses dois assumirem uma unidade. Eles querem agir como uma ciência exata; um estar contido no outro, ou A pertence a B. Criar uma interseção ou União. Um conjunto que admite todas as formas de explorar esses sentimentos amorosos que demandam o infinito.
Tenta-se diferenciar, de forma arbitrária, o amor de paixão. Feliz é quem vive os dois ao mesmo tempo, sabendo das conseqüências do incêndio, mas dispostos a reparar, perdoar, incendiar novamente; viver em brasas e não se consumir.
Sabe quando bate aquela canseira enorme, aquele desânimo com o mundo, aquela sensação de que nada vai muito bem: o coração meio capenga, o corpo solitário, a mente bagunçada, o bolso furado, o trabalho instável e a vida cheia de problemas a serem solucionados?
E vem aquele dia em branco e preto, que você sai de casa sem guarda-chuva e chove, a tpm aperta o estômago e o choro, você perde o último ônibus, acaba a bateria do celular, e tudo em volta parece não fazer sentido.
A energia esgotada, e a gente quer sentar na sarjeta, chorar e deixar de segurar a barra de tudo. Como se a vida, desse jeito, pudesse ir para o buraco.
Daí vem uma amiga (ou algum nível escondido de consciência) e diz: vamos fugir daqui, vamos mudar de vida, vamos para um retiro hinduísta, vamos fazer pacto de silêncio, vamos largar o emprego, vamos sair correndo?!
E eu, num lapso de consciência e coragem, digo: quer saber de uma coisa, não! Vou é me dar um banho morno, uma boa noite de sono, um momento para recuperar as forças do corpo e do pensamento. E amanhã vou reformular tudo.
E vou ficar aqui mesmo, vou seguir em frente. Para voltar a mesma rotina, fazer tudo igual, aceitar e acomodar? Não!
Para dar uma guinada de verdade, perder os medos, falar alto o que penso, abrir novas portas onde pareciam só haver paredes. Para personalizar a minha própria vida.
Vou criar meu espaço, vou dizer que está tudo bem até realmente ficar, vou dar risada das merdas todas e vou valorizar as coisas boas. Vou escutar as críticas e pensar que é inveja enrustida, vou fazer plantão perto das energias negativas até que virem amor ou boas piadas. Não vou me assustar com o clima cinza, com as caras feias e com a opinião alheia. Vou ficar surda e cega para o que não agrega nada.
Porque eu não preciso dar um tempo, eu preciso é ir à luta.
Eu não quero férias para a alma, eu quero é resolver os problemas.
Eu não quero ter autopiedade, ficar doente e me arrastar num sem sentido. Eu quero desenhar mandalas no aparentemente impossível.
Eu não estou a fim de doses de reclamação diárias vindas de mim mesma, eu quero é passar de fase!
Eu não preciso de um efeito paliativo, eu preciso é transformar minha realidade em algo que tem a ver comigo. E quem além de mim mesma vai por as mãos na massa para que isso aconteça?
Por isso, me desculpe amiga, mas eu não preciso de um retiro zen budista, eu preciso me enfiar no meio disso tudo e sair duplamente mais viva.
O mundo anda lotado de arrogância e de presunção, de gente que se acha, de gente que se coloca como dona da razão, acima do bem e do mal, que não enxerga nada nem ninguém, a não ser a si mesmo, priorizando as próprias necessidades, em detrimento de qualquer forma de convivência com troca. É difícil encontrar alguém que cede, que repensa e assume estar errado. E fica difícil encontrar amor nesse contexto.
Esbarramos o tempo todo com pessoas que apressadas, indo para não sei onde, sem saber por quê. Lemos declarações raivosas e ofensivas nas redes sociais, em que se julgam os outros de maneira rasa e preconceituosa, sem que se ouça qualquer versão da história que não seja a que convém aos próprios princípios. É como se a verdade de cada um fosse absoluta, inquestionável, inegável.
Talvez toda profusão de aconselhamentos sobre afirmação de autoestima, aliada à cultura do status material, tenha concorrido ao endurecimento dos sentimentos, à disseminação do pavor a ter dúvida, a ter medo, a ter erros, a ser, enfim, humano. Com isso, vamos nos afastando de nossa essência acolhedora e solidária, tornando-nos fechados aos encontros recíprocos, afinal, o outro pode usar nossas ofertas contra nós.
É preciso que nos conscientizemos de que somos parte de um todo, de que não podemos nos desvincular do coletivo ao caminharmos, ou nos tornaremos cada vez mais egoístas e impossibilitados de encontrar as pessoas certas com quem compartilharemos nossas conquistas e frustrações. Nada tem sentido se confinado tão somente ao eu, pois o que se restringe a si só fica desprovido de alcance, de influência benéfica sobre quem está ao lado.
Temos que ser mais humildes, para que enxerguemos o outro e possamos nos ver com os olhos alheios, pois é assim que nos aprimoramos, é assim que aprendemos, é assim que nos tornamos mais gente, no sentido de conseguirmos mudar o mundo para melhor. Caso nos fechemos na arrogância da falsa autossuficiência, ficaremos parados no mesmo lugar, solitários e com a sensação de que sempre falta algo.
Ser humilde, no entanto, não significa enxergar-se como menos merecedor, menos capaz, menos qualquer coisa que seja, muito pelo contrário: é ter a certeza de todas as suas potencialidade e também do que precisa ser mudado. É valorizar-se sem se vangloriar, é gostar de si mesmo, saber dizer não quando tiver de ser dito e ajudar com prazer quando for necessário. Sempre agindo em favor de si mesmo e dos outros, sem machucar nem ferir ninguém pelo caminho.
Como se vê, é necessário pautarmos as ações pelo olhar além de nós mesmos, mas jamais deixando de nos preservar no que for necessário, pois, caso priorizemos somente o outro, a bondade provavelmente se transformará em servidão, haja vista o encontro com aqueles que não fazem nada mais do que se aproveitar dos outros. A humildade é essencial para que consigamos ser alguém feliz e realizado, que ajuda quem precisa; porém, sempre tomando o cuidado de não nos anularmos por completo, para satisfazer vontades descabidas de gente pequena.
A catarinense Bruna Uncini estava próxima de sua casa quando avistou, num dia frio, vários cachorros amontoados tentando se aquecer em uma calçada. Ficou marcada na sua memória também a cena de uma ninhada de filhotes sendo atacada por formigas.
A partir dali, ela sabia que precisava fazer algo pelos animais da cidade de Lages, em Santa Catarina.
Assim surgiu o projeto “Ajude Um Animal de Rua” que visa conscientizar as pessoas sobre a existência de animais abandonados que na maioria das vezes são ignorados pelas pessoas.
Como não podia levar todos os cachorros para casa, ela decidiu espalhar dezenas de casinhas para que os cães pudessem descansar e se abrigar.
Claro que no começo ninguém esperou que os animais fossem “aderir” à proposta, mas se enganaram completamente. Eles realmente começaram a ir para as casinhas.
O projeto contou com a ajuda de Bruno Hartmann, da Gerência de Proteção Animal de Lages, e Clênia Souza, voluntária do grupo Adote.
Dentro das casinhas haviam rações e cobertores para os cachorros.
Atualmente, há 80 casinhas pela cidade. Mas eles querem chegar a 500!!!! E o objetivo desses voluntários é ainda maior: no futuro, poder cadastrar, vacinar e castrar os animais.
Conheça mais sobre o projeto clicando aqui. E não se esqueça de fazer a sua parte!
E, se alguém ainda duvidava disso, agora um estudo vem esclarecer de vez essa questão. Segundo uma pesquisa realizada pela universidade japonesa Azabu, de fato existe um vínculo especial entre o homem e seu melhor amigo. Esse vínculo é construído a partir de um processo hormonal ativado quando se olham, que funciona de maneira muito semelhante ao que se dá entre mãe e filho.
É que esse olhar dispara tanto no cachorro quanto no seu dono os níveis de ocitocina no cérebro, hormônio relacionado a conduta paternal e maternal. A ocitocina atua também como neurotransmissor no cérebro e tem um papel importante no reconhecimento e estabelecimento de vínculos sociais, assim como na formação de relações de confiança.
Para realizar a pesquisa, os cientistas colocaram vários cachorros com seus donos em um quarto, e analisaram cada interação entre eles durante 30 minutos. Depois, mediram os níveis de ocitocina tanto na urina dos cães como na de seus donos, e descobriram que o contato visual constante entre eles elevava os níveis do hormônio nos cérebros de ambos. Em um segundo experimento, os pesquisadores passaram ocitocina nos focinhos de alguns cachorros e os colocaram em um quarto com seus donos e alguns desconhecidos. A resposta nos animais foi que eles passaram mais tempo olhando para seus donos, o que após meia hora, fez com que os níveis de ocitocina crescessem também nos donos.
“O mesmo mecanismo de conexão, baseado no aumento da ocitocina ao se olharem, que fortalece os laços emocionais entre mães e seus filhos, ajuda a regular também o vínculo entre os cachorros e seus donos”, concluiu o estudo.
Essa pesquisa veio só pra afirmar o que a gente já sabia, né?
Alice através do Espelho é um filme estadunidense, que traz a continuação hipotética de Alice no País das Maravilhas, sendo baseado no romance homônimo de Lewis Carroll.
O filme inicia com Alice navegando em alto mar com o navio de seu pai. Ela passa três anos em uma expedição que foi até a China. Após o seu regresso ela descobre que seu ex-noivo, Hamish Ascot, assumiu a empresa de seu pai e planeja vendê-la, junto com o navio de seu pai em troca da hipoteca da casa.
Alice então se mostra independente, audaciosa e muito apegada a imagem do pai que nesse filme já faleceu. Ela ainda se mostra bastante resistente a mãe, que ela enxerga como passiva e dependente.
Isso sugere uma característica daquilo que Carl Jung nomeia de complexo materno negativo.
A mulher com esse tipo de complexo tem como lema: qualquer coisa menos ser como a mãe! (Jung, 2008). E são exatamente essas palavras que Alice profere contra a mãe – ela não quer ser como ela.
Jung (2008), ainda diz que seus instintos concentram-se na mãe, sob a forma de defesa, produzindo uma violenta resistência ou falta de interesse por tudo o que representa família, comunidade, sociedade, convenção, etc. A resistência contra a mãe, enquanto uterus, manifesta-se muitas vezes através de distúrbios da menstruação, dificuldade de engravidar, horror da gravidez, hemorragias e vômitos durante a gravidez, partos prematuros, etc.
No entanto, a partir da defesa contra a mãe verifica-se um desenvolvimento espontâneo da inteligência, com o intuito de criar uma esfera em que a mãe não exista. O propósito é quebrar o poder da mãe através da crítica intelectual e cultura superior, de modo a mostrar-lhe toda a sua estupidez, seus erros lógicos e formação deficiente. O desenvolvimento intelectual é acompanhado de uma emergência de traços masculinos (Jung, 2008).
Com o avento do Patriarcado em nossa sociedade Ocidental – que reprimiu o Matriarcado e tudo o que se relaciona ao Matriarcado – esse parece ser o modelo padrão da maioria das mulheres modernas. Às nossas mães e avós foi-lhes negado o direito de desenvolver o lado masculino de sua personalidade, e o movimento feminista trouxe a tona, em uma emergência emocional intensa, essa faceta a tona. E isso teve conseqüências benéficas e maléficas às mulheres atuais. E essa Alice espelha bem essa faceta, fazendo com que as mulheres se identifiquem com o personagem.
No aspecto patológico essa mulher pode se tornar desagradável, exigente e insatisfeita, principalmente no campo amoroso, uma vez que todo o seu ímpeto é um rebelar-se contra o que brota do fundo originário natural. Ela lesa seu mundo instintivo. Mas se ela renunciar a combater a mãe no sentido pessoal e mais restrito, ela se tornará inimiga de tudo o que é obscuro, pouco claro e ambíguo, preferindo colocar em primeiro plano o que é seguro, nítido e razoável. Ela superará sua irmã feminina no tocante à objetividade e clareza de julgamento (Jung, 2008).
Alice então, após entrar em conflito com o ex – noivo e a mãe, foge através de um espelho, retornando ao País das Maravilhas.
O espelho possui um aspecto simbólico muito forte. Significa o olhar para si mesmo, pois se vê a própria imagem.
Jung (2008) diz sobre o espelho:
“Quem caminha em direção a si mesmo corre o risco do encontro consigo mesmo. O espelho não lisonjeia, mostrando fielmente o que quer que nele se olhe; ou seja, aquela face que nunca mostramos ao mundo, porque a encobrimos com a persona, a máscara do ator. Mas o espelho está por detrás da máscara e mostra a face verdadeira. Esta é a primeira prova de coragem no caminho interior, uma prova que basta para afugentar a maioria, pois o encontro consigo mesmo pertence às coisas desagradáveis que evitamos, enquanto pudermos projetar o negativo à nossa volta.”
foto divulgação
Por isso, Alice pode ser considerada uma heroína, pois para resolver seus conflitos, ela busca ajuda em si mesma e não fora.
Alice empreende uma viagem ao inconsciente, em um movimento regressivo. Lá ela reencontra seus antigos amigos. Sendo que um deles, O Chapeleiro Maluco, que se encontra com problemas: ele acredita que sua família ainda está viva. E a única forma de ajudar o Chapeleiro é voltando ao passado. E assim Alice parte ao encontro do Tempo.
O tempo é algo muito ligado a psique feminina herdado de nossas antepassadas. No filme a mãe de Alice se diz preocupada com a idade dela, pois segundo os padrões daquela sociedade a mulher em certa idade se torna inapta a arrumar um bom casamento. Em um nível inconsciente, herdamos essa preocupação, pois a mulher possui um relógio biológico natural, que é o tempo que duram os seus óvulos e seu tempo fértil.
Alice então entra em confronto no inconsciente com esse conflito relacionado ao tempo cronológico.
O tempo cronológico é parte da consciência. Nosso ego, nossa mente é capaz de se locomover pelo para o passado e para o futuro. E o que é pior, de vivermos constantemente neles.
Alice então parte em uma jornada para alterar o passado, para evitar que a família do Chapeleiro seja morta. Mas suas tentativas são frustradas e o que aconteceu não muda. Na verdade ela percebe que voltar ao passado não vai mudá-lo, mas ela pode aprender com ele.
De fato, o único momento que podemos mudar é o presente.
Tentamos conservar a infância e a eterna juventude, e fugimos da realidade da vida. Mas essa só acontece no momento presente.
Aceitar que iremos envelhecer, que os cabelos brancos aparecerão e a pele enrugará é uma dificuldade imensa para o homem ocidental e principalmente para a mulher. Amadurecer em nossa sociedade atual é um grande problema, pois não aprendemos a lidar com a morte. No entanto, como diz Jung, a fuga da vida não nos liberta da lei do envelhecimento e da morte.
Negamos à libido o fluxo da vida quando negamos os estágios inevitáveis da vida. É por isso que atualmente, doenças psíquicas como a depressão e a ansiedade crônica, atingem números alarmantes.
E Alice no filme tenta fugir do Tempo e assim tentar impedir de assumir a responsabilidade de suas escolhas. A noção do tempo chegou e com isso as responsabilidades.
Alice fracassa em mudar o passado e voltando ao presente, descobre que é tarde demais, e que o Chapeleiro está à beira da morte. No entanto, ela aprendeu com a experiência.
A beira da morte o Chapeleiro perdeu suas cores e se tornou branco, sugerindo uma alusão a alquimia. O branco na alquimia se refere a albedo.
A albedo representa a brancura, à claridade, à purificação, à prata e à água.
Após um embate com fortes emoções como paixão, raiva, inveja, começamos a ter insights de como essa emoção surgiu. Fazemos um exame mental e mais racional dessas emoções e de como enfrentá-las. Isso é a albedo; fase onde temos clareza das emoções do que nos motivou a agir. Aceitamos nossa impotência, com uma pausa e uma sabedoria profundas.
No filme, após uma raiva intensa, uma indignação que moveu todos os outros personagens, o Chapeleiro, entra na albedo.
Se em Alice temos a heroína, que simboliza um modelo arquetípico a ser rentamenaspecto do seu Animus – seu lado masculino – que chama a sua atenção para o conflito.
O Animus, na mulher – quando desenvolvido – é a ponte que liga o ego feminino ao inconsciente e ao Self. E esse processo da Albedo, enquanto pausa é um rito de passagem, pois não se consegue permanecer nesse estado para sempre. Por isso, Alice está em um rito de passagem, de amadurecimento. Ela está em uma transição de vida.
Alice ao compreender seu conflito com o Tempo, com a imagem materna. Encarar e mudar suas crenças, ideias ultrapassadas, permite que o Chapeleiro volte a vida, e retome sua cor. O vermelho vivo de seus cabelos, mostra uma alusão a rubedo, outra fase da Alquimia.
A rubedo se associa ao vermelho, sangue, vida. É a ressurreição de uma nova identidade após o momento de reflexão, com mais consciência e alegria. Momento onde renasce em um fogo maior, que nos liga mais profundamente à vida. Aqui se volta a ter desejo, nos sentimos heróicos novamente.
Alice então parte na jornada de resgate da família do Chapeleiro e após o enfrentamento com a Rainha Vermelha e o Tempo, ela volta à consciência, assimilando a porção materna rejeitada em si e promovendo a transformação dela e da própria mãe.
Ela se torna mais madura, mais integrada e pode partir em sua nova jornada ao mar.
Referências bibliográficas:
EDINGER, E.F. – Anatomia da psique:O simbolismo alquímico na psicoterapia. São Paulo, Cultrix: 2006.
JUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2008.
É praticamente unânime a percepção das pessoas de que tem algo nelas que não está direito, não está bom. Como se fosse uma parte torta. Pode ser o nariz, a orelha, as pernas, os pés, enfim, cada um tem sua queixa. Uma ou várias. E pode ser bem difícil, em alguns casos, aceitar alguma parte de nosso corpo que não está conforme a mídia dita como modelo ou até mesmo algo de que nós mesmos não gostamos em nós.
Claro que não precisamos gostar de absolutamente tudo. Mas será mesmo que existe alguém totalmente satisfeito com seu próprio corpo? Ou melhor, será mesmo que existe algum corpo completamente perfeito? Para começar, o que é a perfeição, considerando que vivemos repetindo que ela não existe, exceto no Criador?
Será mesmo que faz sentido sofrermos ou nos depreciarmos por conta de algo que não nos parece como deveria ser? Esse julgamento pode render algo de positivo ou criativo? Cada vez mais tenho certeza de que não! E essa reflexão me veio ainda mais clara porque recentemente visitei um ponto turístico muito famoso no mundo inteiro justamente por ser torto. Por não ser certo, direito ou perfeito. Mas é exatamente sua ‘tortice’ que a faz tão encantadora. Trata-se da Torre Pisa, na região da Toscana, na Itália.
O mais interessante é que há quem acredite que a Torre foi construída propositalmente torta, mas o fato é que se trata de um erro. Ela foi construída em um terreno instável e, durante a construção, até tentaram reparar essa instabilidade com algumas medidas de engenharia, mas as tentativas não deram certo e a Torre terminou inclinando ainda mais durante algum tempo.
Hoje, estável, tornou-se cartão postal da cidade e visitada por milhares de pessoas todos os anos, rendendo lucro para trabalhadores, comerciantes e moradores do local. E a reflexão que me vem é: e se os idealizadores da Torre não tivessem aceitado a sua ‘tortice’ e a tivessem destruído? E se tivessem insistido em construí-la num outro local para que pudesse ser direita, reta? Será que sua fama seria a mesma? Será que os ganhos seriam tantos?
Usando essa mesma reflexão, fiquei me perguntando: quantas coisas em nós mesmos que despendemos tanto esforço para tentar arrumar quando, na verdade, poderiam ser nossos diferenciais? Algumas pessoas até sofrem e se revoltam pelo fato de alguma parte sua não ser igual a dos outros ou por não corresponder ao modelo de reto ou direito, perdendo a chance de enxergar o charme que existe em sua “tortice”.
Mais do que isso, raramente conseguimos perceber que é na instabilidade que amadurecemos e descobrimos mais sobre nós mesmos. É no momento de fazer ajustes e adequações que mais podemos reconhecer nossos talentos e nosso potencial. E isso acontece especialmente no amor.
Quando doemos por causa de um relacionamento que acaba, de um amor não correspondido ou até de uma traição é quando mais podemos nos dar conta do que existe de iluminado e também de escuro em nós. É quando temos mais condições e até disponibilidade de enxergar o que fizemos de ‘certo’ e de ‘torto’ e quanto isso mostra quem a gente é e quem queremos ser. O que temos de diferente e que pode encantar o mundo ao nosso redor.
Minha sugestão é para que você comece a aceitar mais o que existe de ‘torto’ em você.
A ideia não é se acomodar ou ser menos do que você pode, mas transformar o torto em beleza, em charme. Para reconhecer a sua singularidade e capacidade de ser feliz sendo você mesmo, sendo do seu jeito. Assim, ser você pode se tornar uma experiência bem mais interessante, leve e gostosa.
* Rosana Braga é consultora de relacionamento do ParPerfeito, psicóloga, palestrante, jornalista e escritora.
Eu tenho saudade, sim. Mas é saudade de tanta coisa, saudade de tanta gente que eu já nem sei dizer de quem. É saudade que não cabe na lembrança. Porque saudade não se guarda na memória mesmo. Saudade vive é no coração da gente.
E o coração quando lembra é só sentimento. Faz a gente dar de cara com saudade que nem sabe de onde vem, a quem pertence. Não se pergunta “alguém esqueceu uma lembrança aqui?”, assim, feito guarda-chuva. Saudade vem e fica ali, zanzando qual cachorro que caiu da mudança. Coração sente cada saudade estranha!
Vez em quando aperta uma saudade tão funda aqui dentro que a gente nem pensa. A gente para, sente e espera passar. Alguém pergunta as horas e a gente responde baixinho, faz gesto de silêncio, caminha na ponta do pé, vai embora quieto, se cala, se fecha, cerra as cortinas, desliga a tv, apaga as luzes da casa. Não por nada. É só silêncio de ninar saudade.
Mentira. É só a gente andando devagar pra não cair no choro.
Saudade, quando dá, carrega a gente pra longe ou até ali do lado. Não importa. Não importa porque é tudo lugar que só existe aqui dentro. E aqui dentro tem tanto lugar bonito! Tanta gente linda caminhando devagar, de tardinha, tanta manhã conversando na cama, tanta noite atravessada na alegria e na tristeza.
Na casa da minha infância não tinha geladeira. Tinha um pé de dama-da-noite, uma flor que Deus encarregou de borrifar perfume na gente. Minha mãe fazia gelatina depois do almoço e levava gelar na casa de uma vizinha generosa, Dona Carmem, mulher do Seu Antonio. Mais tarde ficava pronta, bem na hora da dama se perfumar para a noite. Até hoje, gelatina para mim tem gosto de flor. E tudo, casa, vizinha, família, noitinha, tudo tem perfume de saudade.
É tanta saudade, minha gente! Tanta saudade antiga abraçando lembranças novas. Saudades adolescentes virando jovens adultas. Saudades envelhecendo quietas, sem perceber. Tanta saudade nascendo agorinha.
Eu tenho saudade, sim. Tanta que eu já não sei de quem, não sei de onde. Não importa. Saudade não é só de onde. É de quando. Nem é só de alguém. É da gente. Saudade é sempre da gente.
Consolar um amigo com frases feitas é aumentar os decibéis do choro. Quem foi não vai voltar com ajuda desses arranjos verbais mal feitos.
Um amigo costuma silenciar na hora do choro gritado do outro, pois compreende que a palavra nesse momento, pode equivaler a um “eu avisei” na hora da raiva. A tendência é piorar a situação. O jeito é ficar ao lado, quieto e evitar a cara de paisagem.
Demonstre que está pronto para fazer qualquer coisa, inclusive passar o café no coador de pano, que o seu amigo tanto gosta. Evite comentários idiotas sobre o lançamento da versão magnífica do coador com tecnologia de ponta disponível no mercado. Isso não é importante e ele não quer saber. Sirva o café. Seja generoso. Compre as bolachas que ele adora. Traga aquele bolo com recheio de calda de morango e não fale sobre as taxas de glicose no sangue. Não é da sua conta. Ele gosta assim.
Se tem uma coisa que a tristeza costuma fazer com louvor é abrir as comportas do apetite. Uma pessoa triste encontra ânimo no alimento de sua preferência. A palavra do amigo sobre a situação nem sempre ajuda. A companhia, sim. Esteja disposto a dividir a dor e o lanche. Responda apenas o que for perguntado e opine somente se ele pedir. Evite as frases: “vai passar”, “vamos rir disso tudo depois” e “a vida é assim mesmo”. O que pode passar é a vontade de ele manter um amigo inconveniente e falastrão.
Comporte-se com a destreza de quem já viveu situação semelhante, mas não faça comparações. Seja flexível se o seu amigo disparar a falar demais, como se quisesse rebobinar o passado e encontrar o erro. Lembre-se que ele está sofrendo e você é o melhor amigo dele. O responsável por manter o coração dele sóbrio. Seja um bom ouvinte. Ouça a ladainha do relacionamento falido sem demonstrar incômodo. Quem perde um amor precisa contar a história diversas vezes para convencer a si mesmo que não faz mais parte dela.
Ofereça o ombro, lenços e os ouvidos sem titubear. Saiba que você está numa importante missão de resgate, qualquer erro pode colocar tudo a perder.
Se o seu amigo lembrar de um acontecimento feliz da infância, embarque nessa viagem. Sempre dá certo. Fale sobre como ele era habilidoso com a bola nos pés, o herói do time. O aluno mais dedicado e inteligente da turma.
Daqui a pouco, você vai perceber que o choro se mistura ao riso e já é possível falar sobre outros assuntos sem resvalar na mágoa exposta.
Cuidar de um amigo que jura ter perdido um amor é saber devolvê-lo a ele mesmo, antes que ele se perca de vez.