Que a leveza que liberta nos encontre desarmados

Que a leveza que liberta nos encontre desarmados

Vivemos a projetar a nossa felicidade em grandes feitos no tempo futuro. Quando eu tiver dinheiro suficiente para uma vida mais confortável serei feliz. Quando eu encontrar o amor perfeito da minha vida serei feliz. Quando eu tiver mais tempo disponível serei feliz. Quando eu conquistar o emprego dos sonhos serei feliz. Quando tudo estiver estabilizado eu finalmente serei feliz.

A rigor, o que estamos fazendo é de uma burrice sem tamanho, percebe? Projetamos a idealizada felicidade, segundo o roteiro de um filme desses de ficção científica. O problema desses filmes é que eles mostram terras áridas, construções monumentais em ruínas, cenários acinzentados para personagens acinzentados. O futuro é absolutamente incerto, essa é a nossa única certeza.

E não passa de utopias tolas essas condições limitantes a que nos submetemos por nossa própria conta e risco. O dinheiro nunca será o suficiente, posto que a nossa relação com os bens materiais é de total submissão: queremos sempre mais do que temos.

O amor da vida é tão subjetivo quanto uma bolha de sabão. Que vida? Em qual momento dela? Amor não é “da vida”, amor é construção de afeto. Perfeito? Como assim, perfeito?

O emprego dos sonhos só existe até a página quatro; a partir da página cinco você já estará às voltas com desafios de relacionamento entre hierarquias e achando que ninguém te dá o devido valor.

E essa história de estabilidade? Ah, fala sério… É da nossa natureza arranjar alguma coisa para se coçar, ainda que seja sarna. Basta algum setor da nossa existência ficar “estável” que a gente começa a pinicar por toda parte. Aliás, “estável” é uma palavra padrão para boletins médicos que se referem a pacientes em longos períodos de internação – “O paciente está estável.” –, desejo com todas as minhas forças, que os deuses (todos eles, antigos e novos) me defendam disso!

E toda essa expectativa em relação aos dias que estão por vir, sobre os quais não temos controle e a respeito dos quais pouco sabemos, só serve para nos colocar um peso insuportável nos ombros. Acabamos como vítimas de nossa própria eterna necessidade de adiar a felicidade, simplesmente porque não sabemos identificar as pequenas e inefáveis alegrias presentes.

Baixemos a guarda, as armas, as mãos. Paremos de nos assaltar em emboscadas, cujo único propósito é nos colocar contra uma parede que parece encolher a cada dia. Tenhamos a gentileza de nos estender a própria mão, num auto amor que já passou da hora de acontecer.

Marquemos um encontro com nosso riso fácil, nossos ombros relaxados, nossas pernas bambas do prazer dos afetos simples. Sejamos adoráveis a ponto de nos convidarmos, a nós mesmos para uma dança libertadora, sem passos demarcados, ritmos acertados, nenhuma coreografia. Corpo solto namorando a melodia.

Encontremos tempo para nos redescobrir enquanto é tempo. Enquanto ainda não nos corrompemos o suficiente para servir às coisas que nos matamos de trabalhar para conquistar. Enquanto ainda somos capazes de rir sem querer e chorar quando tiver vontade.

E que a leveza que liberta nos encontre desarmados, para que não nos reste nenhuma outra alternativa, a não ser nos entregarmos a ela. Brisa, sol de fim de tarde, noites de temperatura amena. Que seja leve tudo o que não for breve; e o que for breve que seja ainda mais leve!

Todo filho é pai da morte de seu pai.

Todo filho é pai da morte de seu pai.

” Há uma quebra na história familiar onde as idades se acumulam e se sobrepõem e a ordem natural não tem sentido: é quando o filho se torna pai de seu pai.

É quando o pai envelhece e começa a trotear como se estivesse dentro de uma névoa. Lento, devagar, impreciso.

É quando aquele pai que segurava com força nossa mão já não tem como se levantar sozinho. É quando aquele pai, outrora firme e intransponível, enfraquece de vez e demora o dobro da respiração para sair de seu lugar.

É quando aquele pai, que antigamente mandava e ordenava, hoje só suspira, só geme, só procura onde é a porta e onde é a janela – tudo é corredor, tudo é longe.

É quando aquele pai, antes disposto e trabalhador, fracassa ao tirar sua própria roupa e não lembrará de seus remédios.

E nós, como filhos, não faremos outra coisa senão trocar de papel e aceitar que somos responsáveis por aquela vida. Aquela vida que nos gerou depende de nossa vida para morrer em paz.

Todo filho é pai da morte de seu pai.

Ou, quem sabe, a velhice do pai e da mãe seja curiosamente nossa última gravidez. Nosso último ensinamento. Fase para devolver os cuidados que nos foram confiados ao longo de décadas, de retribuir o amor com a amizade da escolta.

E assim como mudamos a casa para atender nossos bebês, tapando tomadas e colocando cercadinhos, vamos alterar a rotina dos móveis para criar os nossos pais.

Uma das primeiras transformações acontece no banheiro.

Seremos pais de nossos pais na hora de pôr uma barra no box do chuveiro.

A barra é emblemática. A barra é simbólica. A barra é inaugurar um cotovelo das águas.

Porque o chuveiro, simples e refrescante, agora é um temporal para os pés idosos de nossos protetores. Não podemos abandoná-los em nenhum momento, inventaremos nossos braços nas paredes.

A casa de quem cuida dos pais tem braços dos filhos pelas paredes. Nossos braços estarão espalhados, sob a forma de corrimões.

Pois envelhecer é andar de mãos dadas com os objetos, envelhecer é subir escada mesmo sem degraus.

Seremos estranhos em nossa residência. Observaremos cada detalhe com pavor e desconhecimento, com dúvida e preocupação. Seremos arquitetos, decoradores, engenheiros frustrados. Como não previmos que os pais adoecem e precisariam da gente?

Nos arrependeremos dos sofás, das estátuas e do acesso caracol, nos arrependeremos de cada obstáculo e tapete.

E feliz do filho que é pai de seu pai antes da morte, e triste do filho que aparece somente no enterro e não se despede um pouco por dia.

Meu amigo José Klein acompanhou o pai até seus derradeiros minutos.

No hospital, a enfermeira fazia a manobra da cama para a maca, buscando repor os lençóis, quando Zé gritou de sua cadeira: e

— Deixa que eu ajudo.

Reuniu suas forças e pegou pela primeira vez seu pai no colo.

Colocou o rosto de seu pai contra seu peito.

Ajeitou em seus ombros o pai consumido pelo câncer: pequeno, enrugado, frágil, tremendo.

Ficou segurando um bom tempo, um tempo equivalente à sua infância, um tempo equivalente à sua adolescência, um bom tempo, um tempo interminável.

Embalou o pai de um lado para o outro.

Aninhou o pai.

Acalmou o pai.

E apenas dizia, sussurrado:

— Estou aqui, estou aqui, pai!

O que um pai quer apenas ouvir no fim de sua vida é que seu filho está ali. ”

-Autor desconhecido

Lembra-se da última vez que respondeu com amor?

Lembra-se da última vez que respondeu com amor?

Responder com amor sim, não necessariamente com o coração porque nem sempre responder com o coração é responder com amor.

Uma vez escrevi um texto sobre esta questão sublinhando que o melhor desarme é o amor: ‘Responde com amor sobretudo quando não esperam que o faças. Não porque é o “correto”, não porque és fiel a determinada religião, mas porque só pode ser esse o caminho (…)’. O certo é que, revisitando esse texto, posso dizer que a estrada da vida tem continuado a mostrar-me isso mesmo.

O amor contagia. A bondade tem vontade própria, vontade de se multiplicar e crescer exponencialmente quando alimentada por pessoas do bem; não boas pessoas, pessoas do bem, porque todos nós temos as nossas imperfeições. O que distingue as pessoas é que quem é do bem disciplina o seu coração para não ceder ao ódio, à raiva ou ao rancor e para lembrar o melhor que cada um tem e traz à nossa vida.

O amor cura. Uma vez vendo um programa da Oprah (Winfrey) há alguns anos lembro-me de ouvir uma frase que me marcou: “Basta um pouco de amor para acabar com a loucura”…. Eu acredito nisso, no poder do amor para ajudar a Humanidade a encontrar o seu caminho.

Deparo-me por vezes com a situação incômoda de ver a importância do amor ser menosprezada e talvez para mim própria no passado essa relevância não fosse tão evidente como me é hoje.

É também para mim evidente que é tão mais difícil mantermo-nos “do bem” quando se olha em redor e não deixar corromper a nossa essência continuando a lutar pelos valores que nos fazem dormir com a consciência tranquila no final do dia. Admiro todos aqueles que se mantêm fiéis a si mesmos por mais que se sintam por vezes esmagados. E mais: ser do bem não é querer agradar a todos mas tratar com amabilidade todos aqueles que conhecemos ou desconhecemos a sua dor. É isso que faz de nós humanos, apenas.

Como terminei o texto que referi acima continua a fazer sentido dizer que ‘talvez escreva como vivo, no mundo da lua, mas ainda quero acreditar nos meus sonhos de criança, que este mundo pode ser melhor se assim o quisermos, que tu podes realmente melhorar se o desejares e que, juntos, podemos preservar o que de melhor este planeta tem…o amor”.

15 frases inspiradoras de “Comer, rezar, amar”

15 frases inspiradoras de “Comer, rezar, amar”

“Comer, Rezar, Amar” é um livro da escritora Elizabeth Gilbert e um filme de 2010, que narra a história da jornalista que troca a segurança de um casamento não muito feliz por uma viagem de redescobrimento. Muita gente se encantou com o livro e filme, e muitas frases foram eternizadas. Nós, da Soma de todos os Afetos, nos identificamos em diversos momentos, e percebemos que as situações vividas pela protagonista contam a história de todos nós. Por isso, selecionamos 15 frases que nos inspiram. Espero que gostem!

“A gente precisa ter o coração partido algumas vezes. Isso é um bom sinal, ter o coração partido. Quer dizer que a gente tentou alguma coisa.”

“Há momentos que temos de procurar o tipo de cura e paz que só podem vir da solidão.”

“Todo mundo fica assim no começo de uma história de amor: quer felicidade demais, prazer demais, até adoecer.”

“- Sinto sua falta.
– Então sinta minha falta. E me mande amor e luz toda vez que pensar em mim. Depois esqueça. Não vai durar pra sempre, nada dura.”

“Aprenda a lidar com a solidão. Aprenda a conhecer a solidão. Acostume-se a ela, pela primeira vez na sua vida. Bem-vinda à experiência humana. Mas nunca mais use o corpo ou as emoções de outra pessoa como um modo de satisfazer seus próprios anseios não realizados.”

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Julia Roberts as “Elizabeth Gilbert” in Columbia Pictures’ EAT, PRAY, LOVE.

“Para chegar ao castelo, você precisa nadar pelo fosso.”

“Se houve sofrimento é porque você tentou.”

“Olhe o mundo através do seu coração, assim encontrará Deus.”

“Esses dois têm muitos problemas, problemas sérios que precisam resolver; mas juntos, são perfeitos um para o outro, existe sentimento, vai entender…”

“Há momentos que temos que procurar o tipo de cura e paz que só podem vir da solidão.”

“Melhor viver o seu próprio destino de forma imperfeita do que viver a imitação da vida de outra pessoa com perfeição. Então agora comecei a viver a minha própria vida. Por mais imperfeita e atabalhoada que ela possa parecer, ela combina comigo, de alto a abaixo.”

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“Tem que aprender a escolher seus pensamentos da mesma forma que escolhe suas roupas todos os dia, trabalhe sua mente é a única coisa que deve controlar porque se não dominar seus pensamentos terá problemas sempre.”

“E se a gente simplesmente reconhecesse que nosso relacionamento é ruim, e mesmo assim ficasse junto? […] Dai a gente poderia passar a vida inteira junto… infelizes, mas felizes por não estarmos separados.”

“Sabe o que senti quando acordei hoje de manhã? Nada. Nem paixão, nem entusiasmo, nem fé, nem emoção. absolutamente nada. Eu acho que eu passei do ponto onde se poder chamar isso de um mal momento e isso me apavora. Meu Deus, essa ideia é pior do que a ideia da morte. É essa pessoa que eu vou ser de agora em diante?”

“Quanta gente já ouvi dizer que os filhos são a maior realização e o maior reconforto de suas vidas? São aqueles com quem eles sempre podem contar durante uma crise metafísica, ou em um momento de dúvida quanto a sua relevância – Se eu não tiver feito mais nada nesta vida, então pelo menos terei criado bem os meus filhos.”

A cumplicidade do amor em 22 ilustrações que te farão suspirar

A cumplicidade do amor em 22 ilustrações que te farão suspirar

A Soma de Todos os Afetos, em parceria com a CONTI outra, separou para vocês uma seleção de trabalhos do artista coreano Puuung que vem fazendo muito sucesso com a sua maneira delicada e aconchegante de ver o amor.

Tendo como protagonistas um jovem casal, a série “Love is…” explora a rotina e o convívio dentro de um pequeno apartamento ou mesmo pelos arredores do bairro. As cores são quentes e os detalhes sempre apresentam uma gentileza ou demonstração de afeto.

Os pontos mais marcantes são a atenção e sintonia do casal ilustrando deliciosamente um ambiente de cumplicidade.

Confiram o vídeo e depois uma super seleção de ilustrações. Para cada detalhe, um suspiro!

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Todas as ilustrações Puuung

Vasilisa, A Bela – Uma iniciação feminina nos vales profundos do inconsciente

Vasilisa, A Bela – Uma iniciação feminina nos vales profundos do inconsciente

Vasilisa, A Bela é um conto russo de Alexander Afanasyev, que conta a história de uma menina – Vasilisa – que perdeu sua mãe e dela ganhou uma boneca que a auxiliou a lidar com sua madrasta e irmãs postiças e também com a bruxa Baba Yaga.

Vasilisa ou Vassilissa, a Bela ou a Sábia, juntamente com a bruxa Baba Yaga, são duas das figuras mais famosas do folclore russo, utilizadas em vários contos de fadas. O início do conto se assemelha bastante a outro conto famoso: Cinderela.

A menina fica órfã de mãe e passa a viver com uma madrasta e suas três filhas, que passam a persegui-la e a infringir todo tipo de tortura emocional e escravidão.

A morte da mãe e a substituição por uma madrasta é um tema recorrente em contos de fadas. Vemos isso em Cinderela, Branca de Neve e em Rapunzel, onde a mãe verdadeira some da história e uma bruxa assume seu lugar.

O diferencial é que nesse conto temos a boneca. Ao morrer sua mãe lhe dá uma boneca que a auxilia em sua jornada. Essa boneca pode ser uma herança psíquica, uma intuição e conhecimento interior, passados de mãe para filha. Algo sobrenatural que sobrevive a morte da mãe boa simbólica.

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Esses contos onde a mãe morre, mostram que deve morrer a identificação da mulher com sua mãe, para que possa desenvolver sua personalidade. É a saída do paraíso materno da infância. Essa benção materna junto com a boneca formam um par de opostos à bruxa e à madrasta. Esse duplo aspecto feminino é que inicia a menina.
A mãe boa se transforma em símbolo, em benção, que passa a auxiliar a estruturação da personalidade da menina, que está se tornando mulher.

Ai entra em cena a madrasta ou a bruxa, que simboliza a mãe terrível, ou seja, a realidade cruel da vida, o ciclo vida e morte, as doenças do corpo, a crueldade da natureza e o quanto somos meros mortais frágeis.

Mas a mãe terrível é extremamente importante para o nosso desenvolvimento psíquico; sem ela não assumimos a responsabilidade de ir para o mundo, de estar só. Assim aprendemos a deixar morrer o que precisa morrer.

A iniciação de Vasilisa, com a morte da mãe boa, ensina a mulher a ficar só para que descubra sua forma de cuidar de si mesma, e assim posteriormente se tornar ela própria mãe.

O nome Vasilisa é de origem grega e significa “Rainha”. A Rainha é uma mulher madura, que já não é menina e está pronta para assumir seu reino, ou seja, sua vida, seu trabalho, seus amores e sua riqueza de alma. É segura de si e de sua feminilidade. É mãe, mulher, senhora e soberana dentro do seu reino, da sua casa.

A iniciação feminina, diferentemente da masculina, acontece, como nesse conto, no aprendizado do ciclo da vida e da morte, pois a mulher contem em si os atributos da Grande Mãe naturalmente em seu corpo e psique.

O protótipo da iniciação feminina seria o parto, quer a mulher dê a luz ou não literalmente, pois a mulher sente a natureza em seu corpo como um todo, diferentemente do homem.

A bondade extrema de menina, é um aspecto do arquétipo feminino visto em vários mitos e contos de fadas. A bondade e a generosidade extremas, precisam ser combatidas por meio do confronto com nosso lado sombrio, que vemos no egoísmo da madrasta e das irmãs. Ser boazinha demais não é positivo para o desenvolvimento da mulher.

Esse egoísmo reprimido – simbolizado pela madrasta e irmãs –pode ser muito positivo para a mulher. Sem isso a mulher passa a atender os desejos de qualquer pessoa e esquece de si mesma entrando em uma alienação profunda.

Um aprendizado que temos também com essas princesas que realizam os serviços domésticos sem se queixar, é o de que precisamos algumas vezes aceitar a situação como ela é, limpa-la, organizá-la e colocá-la na rotina. Limpar e organizar nossa casa psíquica, nossas emoções.

Outro fator de muita relevância para compreendermos também é o significado da boneca. Para a menina, a boneca é considerada um suporte para a projeção dos fantasmas da maternidade e da relação com a mãe, pois se observarmos bem, elas imitam em suas brincadeiras a relação mãe e filha.

contioutra.com - Vasilisa, A Bela – Uma iniciação feminina nos vales profundos do inconscienteNa verdade, a relação da criança com qualquer objeto, como boneca, ursinho, paninho, ou qualquer outro objeto, é a primeira projeção onde a criança deposita uma força mágica e transcendente.

A madrasta e as irmãs são também um poder persecutório que começa a combater a realização interior desde seu aparecimento. Muitas vezes quando estamos nos desenvolvendo, o exterior começa a se levantar em críticas e gerar dúvidas em nós, isso porque em nosso interior há dúvidas também, medos e insegurança.

O conto mostra como sermos heroínas e enfrentarmos nossos medos e dúvidas. Vasilisa é então, enviada a floresta para se encontrar com esse um aspecto sombrio feminino, a Baba Yaga.

A Baba Yaga apresenta características da Grande Mãe antiga. Ela é boa e má ao mesmo tempo, tudo depende da atitude do herói ou heroína frente a ela.

A atitude de bondade excessiva, cultivada principalmente em sociedades patriarcais que primam por um feminino subserviente, precisa se encontrar com esse lado Megera da Grande Mãe, que vemos principalmente na natureza.

Ao ir para a floresta entra em contato com seus instintos e aprende a confiar neles. Ela alimenta a boneca, ou seja, ela alimenta esse instinto de preservação herdado da mãe e segue em rumo a individuação.

Ao chegar à casa da bruxa ela encontra um cavaleiro branco, um vermelho e um negro, remetendo as fases alquímicas albedo, rubedo e nigredo. Vasalisa vai sofrer uma transformação profunda, ela vai passar da inocência (albedo) à noite escura da alma (nigredo).

A casa de Baba Yaga pousa sobre pernas de galinha, que gira quando bem entende. Nos sonhos, o símbolo da casa reflete a organização do espaço psíquico habitado por uma pessoa, tanto no consciente quanto no inconsciente. Essa casa é um ser vivo, transbordante de entusiasmo, de alegria e vivacidade. Próxima ao nível animal, a casa é a estrutura do inconsciente que despertará em Vasilisa a chama do insight.

A Baba Yaga então surge em um pilão voador, que representa um útero simbólico. Algo feminino onde se mói os grãos, simbolizando o ato de nos sentirmos triturados, moídos por algo e reduzidos a pó.
Quando iniciamos nosso desenvolvimento nos confrontamos com nossas sombras, nossos “pecados”, nosso lado obscuro, e isso causa culpa e contrição.

O ego é reduzido a pó para então renascer de forma mais madura. O ato de o ego ser moído e reduzido a pó é necessário para que amadureçamos. É isso o que o arquétipo da mãe terrível faz, ela nos amassa e nos mói para que nos desidentifiquemos da nossa persona iluminada e infantil. Quem não está a altura desse desafio é engolido por ela.

Vasalisa então é deixada a noite para separar os grãos. O tema da separação dos grãos vemos também no conto Cinderela e Amor e Psique.

Esse ato é muito importante na vida da mulher. É um trabalho de discriminação, estabelecer ordem e leis internas. Saber aquilo que é seu e o que é do outro, o que é de si própria e o que ela herdou da família, o que ela gosta, o que ela busca e não o que lhe impuseram como verdade.

Isso representa então, esclarecer uma situação, separar as coisas. Isso evita que as situações fiquem confusas, mas se elas ficarem a mulher deve se perguntar por que a situação chegou a ficar daquele jeito.

Os grãos estão ligados a terra e a Grande Mãe. Sendo símbolo dos mortos e da ancestralidade. Grãos de papoula se associam ao mundo dos mortos e dos espíritos.

A mulher então aprende sobre o ciclo morte e vida, pois ela tem o poder da vida e da morte sobre os seres que a cercam, tanto psíquica como física também. É então importante tomar consciência de que ela tem poder sobre o clima ao seu redor. Em toda mulher a parte escura do Self tem o poder de desejar a vida e a morte.

O par de mãos que aparecem no conto, indica que se trata da crueldade da Baba Yaga e seu espírito sanguinário, que também se refere a natureza e seus aspectos cruéis. É a sombra abissal da natureza por trás da Baba Yaga, que só podemos olhar com terror. A natureza mata cruelmente e dá a luz a belas coisas.

Vasalisa também faz algumas perguntas à velha bruxa, e Baba Yaga que “saber demais pode envelhecer a pessoa antes do tempo”.
A curiosidade feminina nos contos de fadas costuma ser punida, diferentemente da masculina. A heroína quase sempre paga com a vida.

Isso significa que há uma quantidade determinada de coisas que todos deveríamos saber em cada idade e cada estágio das nossas vidas. E isso é um grande aprendizado para o feminino.

A menina pergunta sobre os cavaleiros e não sobre as mãos; nesse momento ela refreia sua curiosidade graças à boneca. Existem mistérios sobre a natureza feminina que devem permanecer um mistério. Ai é que reside o encanto feminino.

O feminino deve aprender a guardar seus segredos, principalmente em relação aos seus mistérios de vida e morte. No campo dos relacionamentos a curiosidade indiscriminada pode ser fatal.
Baba Yaga então dá a menina uma caveira com o fogo, quando descobre a benção em sua casa – a boneca.

A bruxa não repele a benção em si, mas o lado “mãe boa demais” presente ali. Sua natureza não aceita aquilo. Ela prefere não estar próxima demais da luz, ela é um lado sombrio, mas assim como a mãe de Vasalisa, a bruxa dá à menina uma espécie de benção também, que a auxilia assim como a boneca. Ela recebe uma parte do poder selvagem da Deusa Megera, pois aprendeu com ela.

Ambas – boneca e caveira – formam a completude do materno: o lado luz e sombra, assimilados e integrados pela menina.

Ao retornar à casa da madrasta ela sente medo, o que é bastante natural, mas a caveira a tranquiliza. Isso mostra que ela assimilou e respeitou essa força da natureza.

A caveira é um símbolo da morte e da ancestralidade. A caveira traz a luz para a casa e seus olhos fixam na madrasta e nas filhas até que elas virem cinza. Seu olhar queima, destrói.

Vasalisa desceu até as suas sombras, conheceu sua crueldade. Ela era vítima dos outros por ser ingênua. Na verdade, ela era cruel consigo própria. O elemento sombrio nos faz sermos mais íntegros conosco mesmo. Conhecer nossa sombra nos traz o conhecimento da sombra dos outros.

Vasalisa não age por conta própria em sua vingança, mas quem age é caveira, com seu olhar que queima. Ela dá a corda para as mulheres se enforcarem.

O conto diz que devemos nos abster de nossa ânsia de poder, e que a própria psique se encarrega de trazer a vingança. A pessoa cai em sua própria avidez, o mal acaba sempre se destruindo.

A seguir Vasalisa volta a encontrar a mãe boa que cuida dela na cidade. Ela simboliza uma velha sábia que intermédia entre Vasalisa e o rei, que é o lado masculino positivo da mulher.

O conto então, nos ensina, que precisamos descer até a nossa natureza mais interior, encontramos com a Megera para aprendermos a deixar morrer aquilo que não nos serve mais. Aprendermos os mistérios da vida e da morte e o organizar de nossas emoções e ideias. Algo que somente o feminino consegue fazer com maestria.

Gente desinteressada desinteressa a gente

Gente desinteressada desinteressa a gente

É fato que não poderemos dar ouvidos a tudo o que nos chega, tampouco levar em conta a opinião de qualquer um, porém, mantermos uma atitude totalmente desinteressada e distante de tudo e de todos nos tornará uma pessoa desagradável e chata. Não poderemos deixar de nos importar com algumas pessoas que nos são especiais, ou a solidão será a nossa companhia enquanto vivermos.

O mundo de hoje nos cobra o mergulho no trabalho, o consumismo desenfreado e a harmonia estética. Com isso, muitas vezes nos afundamos em horas estendidas nos escritórios e nas academias, cuidando de nossa aparência, enquanto nos distanciamos mais e mais dos contatos humanos. Preocupados com as economias e com as contas pendentes, esquecemo-nos de olhar o nosso entorno, tornando-nos cegos frente a quem está ali nos amando e precisando de nós.

Da mesma forma, uma vez que esse mundo de aparências é por demais frívolo e superficial, além de competitivo em todos os setores, acabamos nos fechando, deixando-nos de nos abrir, de partilhar, de viver os encontros mágicos que a vida nos oferta, por medo de sermos usados como os objetos que tanto prezamos. Parece estar sendo valorizada, nesse contexto, a ideia de que não podemos nos apegar, de que devemos nos bastar tão somente sozinhos.

Talvez por conta dessa competitividade acirrada no trabalho e na vida, disseminam-se aconselhamentos que nos direcionam ao isolamento, ao “dane-se com tudo”, ao não se importar com o mundo lá fora. Logicamente, existe muita coisa e muita gente que precisaremos ignorar para manter nossa sanidade, no entanto, é preciso dar importância a quem realmente merece nossa consideração, pois existe quem precisa de nós, quem espera algo de nós, quem quer ser parte de nós, com verdade e amor.

Todos necessitamos de alguém com quem contar durante os tombos que levaremos, pois é quase impossível sair sozinho das ciladas que permeiam a nossa jornada de vida. Nosso equilíbrio, portanto, dependerá exatamente da forma como encararemos o que nos acontece, trazendo para junto de nós gente do bem, gente que traz luz, que sorri e faz sorrir, que abraça a nossa alma. Porque pessoas que não se interessam por nada neutralizam o amor em seus corações, tornando a felicidade algo que não se pode alcançar. E felicidade é possível, sim, para quem se importa com o que é de fato importante. Não mais.

Os apaixonados que me desculpem, mas o amor não é uma aposta

Os apaixonados que me desculpem, mas o amor não é uma aposta

Relacionamentos não podem ser um jogo de querer, onde quem demonstra mais, vence. Quando colocamos a vontade de estar junto sob essa perspectiva, perdemos o fio da meada. Abrimos mão de um possível encontro por uma migalha de carinho qualquer, num dia qualquer. Os apaixonados que me desculpem, mas o amor não é uma aposta.

É triste perceber que os amores já não carregam a mesma importância. Se antes, abraços, beijos e outras sinfonias românticas embalavam os apaixonados, hoje o que vemos é um distante desvencilhar entre quatro paredes. Os desencontros estão mais vivos do que nunca. Os dissabores, estes, cada vez mais constantes. Porque ninguém parece ter paciência para ouvir. Porque ninguém parece ter coragem para dizer. E nesse samba descompassado e líquido, o amor anda dando de cara no chão na primeira tentativa de sobressair-se frente a multidão. Nas conversas estabanadas, os apaixonados perdem a linha no quesito sincronia. Empurram-se de um lado para o outro e esperam que a sua companhia esteja ali, na mesma frequência. Mas o amor não é só sintonia. Nunca foi. E tampouco um lançar de dados. Esperar ao acaso que os dados da vida o coloquem nos pés dessa efervescência amorosa é, antes de mais nada, uma arrogância. Porque mesmo sendo necessárias gotas de sorte, o amor é também entrega, escolha e atitude.

Direcionar o coração para algo tão onírico pode parecer algo presunçoso, e talvez seja. Talvez ainda estejamos batendo cabeça para entender como tudo isso funciona. As carícias, a vontade de ficar, os sonhos em conjunto. De repente, tais encontros sejam mitos embutidos por corações que acreditam somente nos finais felizes. Mas, deixando os olhos bem abertos, até os infelizes são capazes de transbordar sorrisos. Mesmo eles, nas mais anestesiadas relações, conseguem encontrar refúgios sentimentais a serem expressados.

Às vezes, os apaixonados não são amor. Quem sabe um estágio inicial do que pode vir a ser, mas não o que de fato é. Almejar a imensidão prolífera do sentir por dois requer calma. É conhecimento das coisas simples e dos instantes não ignorados. Sem amarras ou vantagens previamente construídas, o descaminho dos futuros amantes deve ser pautado na sinceridade. Os apaixonados que me desculpem, mas o amor não é uma aposta. O amor é vivência.

Talvez a gente se esbarre e se conheça de novo com o olhar mais maduro e o coração mais decidido

Talvez a gente se esbarre e se conheça de novo com o olhar mais maduro e o coração mais decidido

“Talvez a gente se esbarre e se conheça de novo com o olhar mais maduro e o coração mais decidido.” Tatiane Argenta

Eu achava que, aos poucos, a gente morria de amor, depois do fim, depois da despedida, mas não, ninguém morre. Dói muito e a angústia chega a apertar o peito; você chora baixinho pra ninguém ouvir antes de dormir e a saudade invade de um jeito avassalador. Quantas vezes eu quis saber como você estava sem mim, se encontrou outro alguém ou se ainda pensava em nós. Mas todas as dores, as feridas, as noites em claro, a angústia que se fazia presente em meu peito, a dor que persistia em ficar, tudo isso passou, a tempestade acabou e deixou-me ainda mais forte. Depois do fim, é difícil recomeçar e como dói lembrar daquele adeus.

Eu nunca precisei esbanjar sorrisos de graça para parecer bem quando eu não estava. Nunca escondi a saudade e evitei a todo custo fazer pose para parecer feliz, quando de fato eu não estava. Portanto, se eu sorrir é porque estou bem, não preciso declarar a minha felicidade aos quatro cantos do mundo como quem precisa mostrar a todos que, depois do fim, superei de forma mágica, não sofri e que estou melhor do que nunca. Sinceramente, acho desnecessário querer parecer feliz e realizado logo após uma história tão bonita, quanto a nossa foi, ter se acabado. Também não vou me abrigar no primeiro abraço, nem me entregar ao primeiro beijo que me aparecer.

Não vou me tornar uma pedra e não vou me fechar para a vida, eu só quero um tempo. Um tempo não para ficar sofrendo, chorando e pensando em tudo que acabou, mas um tempo para aproveitar e sugar tudo o que há de bom, recarregar as energias, descobrir novos lugares para ir num sábado à noite, conhecer pessoas que nunca quis conhecer, terminar a minha lista de séries no Netflix, descobrir onde tem o melhor cappuccino, fazer um tour gastronômico pela cidade e planejar a minha próxima viagem. Esse meu coração teimoso precisa aprender a reencontrar o tal do amor próprio.

Hoje, tive um encontro comigo e descobri coisas que antes, sei lá, passavam despercebidas talvez. Mas sabe, meu sorriso é mesmo bonito, as minhas piadas são realmente muito ruins e eu não sou tão simpática assim. Não tenho preferência musical e meu gosto é um tanto quanto diferente, estranho talvez. Meu abraço é o melhor do mundo e sei apoiar alguém, como ninguém. Realmente, você tinha razão quando dizia que fico linda de pijama. Você tinha razão quando dizia que minha risada era engraçada e que sou a melhor companhia de viagem que alguém poderia ter.

Você estava certo quando dizia que me faltava coragem, às vezes, para lutar pelo que eu queria e que eu precisava não me esconder tanto do mundo, não precisava me defender tanto das pessoas e, por mais que as feridas fizessem morada em mim, eu precisava me esvaziar da dor. Lembrei de quando você me dizia o quanto eu era incrível e que eu merecia tudo de melhor. Eu realmente mereço e é por isso que eu não posso deixar o meu mundo desmoronar, é por isso que não posso criar um bloqueio e impedir que coisas boas cheguem até mim, pois a dor não pode ser maior do que as possibilidades tão lindas que vejo por aí, e não posso permitir que essa insegurança tire as coisas boas de mim.

Então, eu lhe desejo abraços calorosos, sorrisos que fazem a gente ganhar o dia, um cafuné num domingo à tarde, abraços de moletom no inverno, mensagens de bom dia e risadas que fazem doer a barriga. Seja feliz, porque eu também vou ser. Mantenha a sua fé, sua coragem e sua ousadia de viver, porque eu também vou manter a minha alegria, minha paz e meu sorriso encantador. Quero me encantar de novo com a vida, quero continuar me descobrindo, sei que, para pessoas como eu e você, sempre há coisas boas reservadas. E não pense que “não demos certo”, nós demos sim, e muito certo, por um tempo. E agora, outras coisas, pessoas e momentos vão aparecer em nossa vida e vai dar certo novamente, de uma forma diferente, mais intensa talvez ou mais devagarinho; mas vai, acredite.

Talvez a gente se esbarre por aí novamente, com o coração mais feliz e maduro, talvez a gente sinta falta e, depois de tantos e reencontros, decida pousar no mesmo lugar. Aprendendo a aceitar aquilo que não soubemos aceitar, amando aquilo que não conseguimos amar, descobrindo aquilo que tentamos esconder e resolvendo tudo aquilo que deixamos para depois. Talvez a gente se esbarre novamente com o coração mais calmo e decidido a lutar, a ficar, mas, por hoje, é melhor alçarmos voo.

O jardim das amizades. Um oásis entre pedras e desertos.

O jardim das amizades. Um oásis entre pedras e desertos.

Vasos, jardineiras, jardins e campos. Amizades plantadas e florescidas!

Amizades são plantas que oxigenam a vida! Enfeitam, nutrem, curam, dão sombra, oferecem frutos e flores!

Amigos são ervas medicinais. Dão por vezes os chás mais amargos e curadores que remédio algum surte efeito igual.

Amigos são flores de beleza rara. Os únicos que conseguem mostrar as verdadeiras cores da vida naquele momento difícil de continuar.

Amigos são temperos frescos que perfumam a vida.

Amigos são árvores frondosas que acolhem e convidam pra gente descansar na sombra.

Amigos são vegetais e hortaliças da melhor qualidade que nutrem e ajudam a manter nossa saúde.

Muitas amizades brotam cedo. E nos acompanham por toda a vida.
Outras, ganhamos de repente, como vasos de flores que nos trazem imensa alegria e nos esforçamos para manter as floradas.

Essa flora diversa de bons amigos exige pouco. Um pouco de água, outro pouco de luz, uma mexida na terra de vez em quando, atenção e carinho.

Se exigirem mais do isso, podem ser plantas daninhas. E cada um sabe o que lhe cabe cultivar.

É nossa responsabilidade manter o frescor e a vida plena das amizades que cultivamos pela vida afora. É trabalho sério, o retorno digno por tanto o que recebemos, que não é pouco.

Ser grato a um amigo é ser também a plantinha que de vez em quando perfuma o seu dia e o faz lembrar da importância dessa amizade.

A terra é boa, o sol é generoso, sementes e água estão disponíveis.
É nossa escolha plantar ou colecionar pedras.

Autocrítica em demasia pode fazer mal a saúde

Autocrítica em demasia pode fazer mal a saúde

Muitas pessoas confundem autoavaliação com autocrítica. A autoavaliação é fundamental para uma vida saudável, para o crescimento. É preciso fazer constantemente um balanço dos nossos erros e acertos para que possamos corrigir o que não vai bem. Mas a autocrítica em demasia pode ser altamente nociva para a autoestima e sempre resulta em paralisia, sentimento de menos valia e doenças como depressão e síndrome do pânico.

Na autoavaliação, um erro é apenas algo que deve ser corrigido e superado. Como quando fazemos um doce e erramos o ponto: aprendemos que da próxima vez devemos desligar o fogo alguns minutinhos antes e pronto.

Na autocrítica, um erro torna-se sinal de falha e fracasso e ao acreditarmos que falhamos somos tomados pelo sentimento de culpa. E a culpa, como sabemos, paralisa.

Somos deveras criticados por todos ao nosso redor: amigos de trabalho, chefes, pais, namorado, filhos, irmãos, cachorro e papagaio. Sempre haverá alguém com o dedo em riste apontando nossas falhas e/ou julgando nossos traços de personalidade como se fossem falhas.

Para quê, então, sermos mais um nessa roda insana de críticas diárias?

A literatura apresenta diversos tratados sobre a inexorável experiência de sermos julgados e criticados pelos outros (e por nós mesmos). O livro Crime e Castigo, de Dostoiévski, talvez seja o mais emblemático, mas Albert Camus, em A Queda, nos entrega de maneira mastigada a proposta de reflexão do escritor russo ao dizer, por exemplo: “Não é necessário existir Deus para criar a culpabilidade, nem para castigar. Para isso, bastam os nossos semelhantes, ajudados por nós mesmos”; “Não espere pelo Juízo Final. Ele se realiza todos os dias”; “Quando formos todos culpados, será a democracia”.

Pois bem, proponho um exercício. Imagine que você está num show de rock, no Rock in Rio, no meio daquela multidão de pessoas e estímulos visuais, e, de repente, avista uma criança de três anos de idade perdida e chorando muito. Qual a sua primeira reação ao se deparar com essa criança?

Pegá-la no colo, pedir para que ela se acalme, dizer que vai ajudá-la a encontrar a mamãe e o papai, certo? Provavelmente você tentará ofertar água, tentará distraí-la e acolhê-la.

Qual seria o segundo passo? Buscar ajuda. Procurar algum segurança, pedir para anunciarem no microfone, etc.

Quando cometemos um erro que provoca vergonha, um erro que gera consequências desagradáveis, sentimos tanto medo e terror quanto a criança de três anos perdida no Rock in Rio. E o que fazemos com a nossa criança medrosa?

Gritamos com ela. Xingamos ela de idiota, dizemos que ela tinha a obrigação de “não soltar a mão dos pais”, chacoalhamos ela e dizemos “a culpa é toda sua” e mais, dizemos a ela que por conta do seu erro “ela ficará sozinha para sempre e nunca mais vai encontrar os pais”.

Se fizéssemos isso com a criança hipotética do Rock in Rio, o que aconteceria? A criança apenas choraria ainda mais e poderia até morrer sufocada diante de tanto terror. No mínimo ficaria paralisada sem conseguir sair do lugar.

Pois é exatamente o que acontece conosco quando nos autocriticamos, nos julgamos, sentimos culpa e nos punimos: paralisamos.

E a paralisia vira mais culpa, que vira impotência, que vira medo, que vira pânico, que vira ansiedade, que vira tristeza e distorção da autoimagem (autoestima baixa), que vira doença, que vira depressão.

Que tal da próxima vez que cometer um erro, seja ele qual for, acolher sua criança interna? Ouvir o que ela tem a dizer, acalmá-la e depois buscar uma solução?
Você não tentaria ajudar uma criança perdida e aterrorizada de medo no Rock in Rio? Não tentaria uma solução para ajudá-la, como pedir para anunciarem no microfone?

Que tal fazer o mesmo com você? Acalmar, acolher e depois buscar ajuda e solução, buscar um “anúncio no microfone”?

A culpa embota os sentidos. Cega. Distorce as coisas. Imbuído de culpa, ninguém consegue corrigir um erro, e sem corrigir nossos erros jamais vamos crescer.
Parafraseando Drummond, digo que a autoavaliação é inevitável (fundamental!), mas a autocrítica é opcional.

Lembrando que: é errando que se aprende.

Não seja opção, seja prioridade

Não seja opção, seja prioridade

Em tempos de relacionamentos fugazes, interesses líquidos e amores fracos, fica difícil mantermos nossa autoestima em um nível minimamente coerente. Fica difícil conseguir encontrar pessoas que conseguem se aproximar da gente de forma transparente e incondicional, saindo de si, do próprio mundinho, doando-se com generosidade sincera, mostrando-se disposta a fazer concessões, a parar bem de pertinho.

As pessoas, entre outras coisas, também são movidas por interesses, no entanto, ultimamente, parece que somente o que temos a oferecer em termos de materialidade e o que mais pesa na aproximação de quem nos procura. As necessidades atrelam-se majoritariamente ao que traz conforto material, popularidade, visibilidade social e status; ou seja, aquilo de mais precioso que temos dentro de nós não chega a valer nada.

Por isso é que algumas pessoas deixam de nos procurar, simplesmente porque o que temos é tão somente o que somos e podemos oferecer de humano, de sentimento, de afetividade. Isso é pouco, isso não tem etiqueta, o dinheiro não compra, isso não revela nosso salário mensal. E, assim, vamos deixando de ser prioridade na vida dos outros, enquanto assistimos aos amigos, parceiros, colegas de trabalho saindo à procura de alguém com quem possam desfrutar de conforto e pretenso sucesso.

Cabe-nos, nesse contexto, manter por perto somente quem vem com verdade e despretensão, quem vem somar, quem vem porque sim, sem interesses, sem cobrar por mais, quem nos enxerga além do que aparentamos. Os demais, que nos procurarão quando em vez, nos momentos em que não encontrarão ninguém e então se lembrarão de nossa existência, deixemos que o tempo e a vida se encarreguem de ensinar-lhes a ser mais gente – se é que pessoas assim são capazes de aprender com os tombos.

Somos humanos, somos sentimentos, não podemos achar que conseguiremos ficar tranquilos sendo opções últimas das pessoas, aceitando o desprezo que convém aos interesses alheios, o descaso de quem só nos enxerga quando quiser, quando estiver sozinho. Sempre seremos prioridade para a pessoa certa, para quem nos ama por inteiro e se entrega sem nem pensar em porquês. Já quem vier com menos, que se apequene para lá, bem longe de nossa felicidade.

Quem quer ser mais feliz do que o outro não sabe nada de felicidade. Sabe da vida do outro.

Quem quer ser mais feliz do que o outro não sabe nada de felicidade. Sabe da vida do outro.

Felicidade quando vem com tudo é bom. Vem enorme, generosa, imensa que não cabe nem na gente. Felicidade boa de dividir. E a gente divide com gosto, reparte com o vizinho, feito jabuticaba rolando pela boca da bacia. Felicidade grande faz bem a todo mundo.

Mas se ela for pequenininha, mirrada, humilde, a gente também aceita. Feliz da vida, a gente recebe a felicidade do tamanho que for. Porque não tem régua feita pra medir sentimento, né? Não há balança que revele o peso do que a gente sente. Só a gente sabe. De qualquer tamanho, felicidade é sempre leve, não pesa na alma, não dói na consciência. Mesmo quando se esparrama por tudo que há, como um cano que estoura e alaga a casa toda. Ser feliz é bom de qualquer jeito, em qualquer tempo.

Feito ave migratória, vem e vai quando quer. De nós só espera uma boa acolhida. Felicidade é uma visita envergonhada. Só volta para quem for bom anfitrião. É um passageiro clandestino. E recebê-la é um gesto generoso. A gente agradece e toca o barco adiante, sorrindo de orelha a orelha, a cara no vento, o coração feliz.

Se a tristeza vem e toma a nave de assalto, assume o comando e muda o rumo, tudo bem. Fazer o quê? A gente vive, vive com gosto, com a Graça de Deus e uma saudadinha boa de ser feliz, sentimento que alimenta o espírito, encoraja, motiva, dá sentido ao movimento das pernas, fortalece os braços, estufa as velas do barco e nos empurra para frente com uma esperança irrecusável, porque a vida só dá pé pra quem tem fé!

Eu não sei como acontece com você, mas comigo se passa assim. Eu não quero ser mais feliz do que ninguém. Quero ser feliz e pronto. Do jeito que puder. Da sorte que vier. Aceito felicidade de qualquer tamanho. Nem quero saber o jeito dela. Eu abro os braços e abraço.

Agorinha mesmo, minha felicidade clandestina não transbordou como querem as receitas prontas, absolutas, segundo as quais não existe felicidade que não transborde. A minha passou bem longe disso. Ficou ali quietinha, satisfeita, no fundo do copo. Felicidade modesta mas grandiosa, enorme em sua humildade, sintética e poderosa como bebida forte que se consome num só trago ou aos golinhos, de acordo com a vontade e o temperamento de cada um. Felicidade é visitante educada. Respeita os modos do anfitrião.

A minha é assim. Quando vem, não sei até quando fica. Eu só agradeço e cuido para que ela esteja em casa. Ela chega e eu me lembro de que, apesar de tudo, eu sou feliz. Desde sempre, até quando estou triste, eu tenho sido feliz. Sou feliz com ela assim, sinhá moça generosa, que vai mas sempre volta. Vai ver, quem sabe, ela também goste de mim.

O mundo faz sentido quando deixamos de invejar o outro

O mundo faz sentido quando deixamos de invejar o outro

Não sei vocês, mas tenho aceitado a ideia de não exigir demais do outro e, com isso, de perceber que o mais importante nessa vida é despir-se da inveja. O mundo não faz sentido com ela. Porque machuca, entristece e impede de ver, lá na frente, que cada um carrega a sua própria visão de universo.

Entendo vivermos em tempos velozes e com uma diversidade de informações impressionantes, mas, quando ao permitimos esse mar de rostos e comportamentos, acabamos nos esquecendo da nossa importância individual para fazer do convívio com outros, melhor. Invejar status, posses e tantas trivialidades, enfraquece o coração. Num primeiro momento, você pode até pensar ser algo produtivo. Afinal, defende a ideia da inveja sendo uma espécie de movimento. Mas não é isso. No fundo, o que existe é uma tristeza preocupante sobre a própria vida. E eis que surgem conversas acerca do merecimento. Como pôde, o ser em questão, conseguir algo que eu deveria ter? Mensuramos qualidades, analisamos defeitos. Todo e qualquer argumento a ser utilizado entra em pauta no momento de interrogar a vida. Os porquês criam raízes profundas e, a inveja, cresce.

Chegamos num ponto do qual desejar o bem do próximo flerta com a inveja. Melhor, disfarça-a. Em vez de buscarmos evoluir e abraçar o que nos é proposto, tanto por orgulho quanto afeição, escolhemos o caminho mais fácil e medíocre. Colocamos essa máscara emocional da subtração. De energia e carinho para com àqueles que dizemos nos importar. Desculpa, mas assim não quero mais. Não posso mais.

Porque quando falamos de soma, é justamente na ausência da inveja o seu surgimento. E para quem desconhece o significado de mundo, o amor esteve lá desde o início. Sem inveja, mas repleto de querer bem. Genuinamente, o mundo. Agora tudo faz sentido.

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