E a gente ainda pergunta por que o mundo vai mal.

E a gente ainda pergunta por que o mundo vai mal.

Imagem: Olya Steckel/shutterstock

Dia desses, eu quase presenciei um atropelamento. Um senhor atravessava a rua na faixa de pedestres, duas sacolinhas do mercado nas mãos, o farol recém-fechado para os veículos motorizados, e um motoqueiro avançou entre dois carros, ignorando o sinal vermelho. O velhinho, decerto um ninja aposentado, deu um passo rápido para trás num reflexo espetacular e só por isso a moto não o atingiu em cheio. Seguiu acelerando impune, para chegar mais cedo sabe Deus aonde.

O detalhe é que a moto não era do tipo popular, de preço acessível a todos. Era uma motocicleta de corrida, sabe? Dessas que o piloto conduz abaixado e que fazem um barulho ensurdecedor. E sobre ela não havia um entregador de comida. Havia um casal passeando a toda velocidade, nem aí para as leis do trânsito.

Outro dia alguém disse que o ser humano está em extinção e uma tropa de faladores ferozes se levantou para acusá-lo de catastrofista, vitimista, mimimista e outros insultos.

Mas será mesmo catastrofismo, vitimismo e mimimi observar o óbvio, que tem muita, mas muita gente jogando no ralo as melhores possibilidades da nossa espécie?

Será que um sujeito que assusta, fere, tortura e mata o outro sem compaixão já não extinguiu em si mesmo o mínimo de humanidade que lhe restava?

Será que o cinismo de um político que tira dinheiro dos serviços públicos, da saúde, da educação e da segurança só para manter os privilégios de seus pares não é um sinal de que em seu coração já não restam sequer migalhas de solidariedade humana?

Enquanto milhares de pessoas sofrem de fome, doença e ignorância, um chefe de estado se ocupa de abastecer com comida cara seu gabinete e seu avião. Deputados e senadores assoviam, fazem cara de paisagem e empurram com barrigas enormes os projetos de reforma política que, se conduzidos da maneira certa, demolirão uma montanha de mamatas, reduzirão o número de deputados e senadores por estado e economizarão bilhões de reais por ano, dinheiro que bem gerido pode tirar tanta gente da rua, do crime, da miséria, do desespero.

Mas não. Eles preferem “corrigir” os próprios salários com argumentos técnicos rasteiríssimos, como acompanhar as variações da inflação, a mesma inflação que obriga milhões de pessoas a escolher se a sua única refeição diária vai ser no almoço ou no jantar.

Será mesmo que essa indiferença não quer dizer nem de longe que os seres humanos estão acabando uns com os outros aos pouquinhos?

Você já viu estatísticas medonhas dando conta de absurdos como o fato de que 1% dos homens mais ricos do planeta detém coisa de 40% do patrimônio mundial? Pesquise por aí! As três pessoas físicas com o maior saldo bancário da Terra têm um patrimônio superior ao das 48 nações mais pobres do mundo somadas!

E será mesmo que essas três pessoas especiais, assim como os milhares e milhares de bilionários com fortunas menores, mas que ainda assim ajudariam países inteiros a viver melhor, será que eles estão só um pouquinho assim preocupados com as consequências da desigualdade e da concentração de renda?

Entre essas consequências, é claro que não falta gente achando que destruir o outro é o único jeito de sobreviver.
Ao mesmo tempo, sobram teorias vagabundas de tão superficiais, generalizando covardemente ao afirmar que toda pessoa pobre só é pobre por culpa dela. Porque não se esforçou como devia, não levantou mais cedo para trabalhar.

Que mentira! É claro que por aí tem gente que não quer nada com nada, em todas as classes sociais. Mas há também uma multidão de operários, agentes da limpeza pública, trabalhadores braçais, pedreiros, pintores, empregadas domésticas, eletricistas, motoristas de ônibus e tantos outros profissionais que a vida inteira levantaram cedo, a vida inteira se esforçaram como deviam, sim, porque afinal alguém precisa fazer esse trabalho, e ainda assim sempre serão pobres. Honestos, trabalhadores, cumpridores de suas obrigações. Mas pobres! Muitos deles esperando ganhar na loteria para serem ricos.
Muitos deles engolidos pela ignorância absoluta e a incapacidade de pensar. Porque, você sabe, para os que concentram dinheiro e poder não é interessante que aqueles que não têm nem um nem outro sejam educados, esclarecidos, cidadãos no franco exercício de sua inteligência.

É mais útil que sejam muito pobres para outros serem muito ricos. É melhor que se reduzam à sua insignificância eterna, disfarçada de um protagonismo falso só de dois em dois anos, às vésperas das eleições.

Ao mesmo tempo, a cada nova eleição, a gente sonha que tudo vai melhorar, que a reforma política vai fazer sobrar dinheiro para mudar a vida de todo mundo. A gente acredita que enfim vai ter casa, carro do ano, viagem pra fora. Como se isso fosse condição indispensável de felicidade e, sobretudo como se isso fosse cair do céu.

Aí as eleições passam, nada muda, a gente se frustra, se magoa e volta com mais força ainda a odiar uns aos outros. E a se ferir, a se matar, a se atropelar na faixa de pedestres.

Não será tudo isso um sinal da progressiva extinção dos valores que deveriam compor o ser humano?

Em algum momento a gente acreditou que os pouquíssimos políticos honestos que realmente existem serão capazes de fazer uma transformação que deve, necessariamente, começar aqui dentro de cada um de nós. Pensando, reformulando, superando perdas, descartando o que não serve mais, abrindo espaço para o novo. E talvez deixando de acreditar nessa balela segundo a qual é preciso ter mais dinheiro do que o outro para ter o mínimo de felicidade.

Eu não quero muito, não. Mas o pouquinho que me interessa eu quero de verdade. Eu quero bem.

Sei lá. Eu só acho que tem muita gente querendo tudo e pouca gente querendo bem. Poucas pessoas querendo bem umas às outras.

E a gente ainda se pergunta por que o mundo vai mal. E se é mesmo verdade que o ser humano anda fazendo de tudo pela extinção da sua espécie. A gente ainda se pergunta por quê.

Passei a ser seletivo por amor próprio

Passei a ser seletivo por amor próprio

Imagem de capa: everst, Shutterstock

Chega um certo tempo na vida que, ou você permite o mundo ditar regras ou abraça o melhor de si e segue em frente. Porque não dá para agradar ninguém a todo momento. Mas em compensação, isso não significa que deva ser menos para quem desconhece o significado de ser mais.

A primeira coisa que passa na cabeça dos outros é que o problema está com você e que não está enxergando o lado positivo e bonito da vida. Lamento, mas não é assim que funciona. O fato de estar em desacordo com o assunto que for não lhe torna alguém insensível. Pelo contrário, saber identificar pessoas, situações e simples futilidades que venham a incomodar, nada mais é do que amor próprio. É respeito pela pessoa mais importante que conhece, você. E antes dos julgamentos e acusações de egoísmos pense, é verdade. Bom, no que diz respeito ao egoísmo, por que não?

Amor próprio é um indício de egoísmo, mas passa distante da gravidade proposta. Isso acontece porque para você alcançar algum resquício de felicidade e tranquilidade para si, infelizmente – para os mesmos que julgam previamente, você precisa estar disposto a conhecer-se. Precisa ter consciência das coisas que já não te enchem os olhos. Precisa e deve escolher, sobre quem fica e quem vai embora da sua vida.

Ainda parece ser um desconhecimento ou descontentamento, mas antes do amor sair vagando liberdade, afeto e proximidades, ele reside primeiro em cada um. É disso que se trata ser seletivo. Não é um estado momentâneo que acorda do seu lado, mas um aprendizado contínuo e reconhecível por todos os gestos, pensamentos e sentimentos que nutre.

Deixe que apontem, invejem e diminuam a sua leveza, o seu despertar. Para alguns, amor próprio é algo que você toma somente quando está para baixo. Para outros, o ser seletivo não passa de um alguém entupido de chatices. Siga sorrindo, não por maldade, mas porque sabe o que realmente lhe faz bem. E nunca bastou nada além disso.

“Nós aceitamos o amor que achamos que merecemos”

“Nós aceitamos o amor que achamos que merecemos”

“Nós aceitamos o amor que achamos que merecemos”. A frase famosa dita no filme “As Vantagens de Ser Invisível” nos faz refletir sobre o porquê de nos submetermos muitas vezes a determinados tipos de relacionamento, os quais em pouco ou quase nada nos agregam, quando não retiram o que possuímos de bom ou como é dito no próprio filme – nos tratam como nada.

O medo da solidão pode ser uma boa resposta para que aceitemos nos subjugar a relacionamentos que não permitem que o nosso melhor venha à tona. Ficar sozinho é um problema para a maior parte de nós, de modo que estar com alguém para simplesmente não ter que ficar só e lidar com certos monstros, acaba sendo uma opção seguida por muitos.

O comodismo também pode ser determinante no “mergulho” em relacionamentos rasos. Não raras vezes, preferimos estar em um relacionamento, mesmo que seja ruim e nos deixe péssimos, por preguiça de arregaçar as mangas e correr atrás de algo que realmente valha a pena e seja transformador de alguma maneira.

Há, ainda, a falta de coragem que faz com que se tenha medo de arriscar, de sair da zona de conforto, de buscar outros lugares, outras pessoas, outras experiências. O medo de falhar novamente, de se magoar de novo, de só encontrar pessoas completamente iguais às que se afastou.

O resultado desses sentimentos e dessas fobias é a insegurança e a total autodepreciação, o que implica o apequenamento do indivíduo por ele mesmo, como se não merecesse mais do que possui ou como se não fosse capaz de ter alguém ao seu lado que o faça se sentir infinito.

Por isso, aceitamos tão pouco em nossos relacionamentos, já que ao se tornar menor, acabamos nos contentando com migalhas, deixando a alma faminta e, por conseguinte, desnutrida. Assim, pouco importa se você está em um relacionamento, o sentimento de vazio será ainda maior, uma vez que ele sequer é capaz de fazê-lo sentir o que há de mais vivo na sua interioridade – e algo fundamental em qualquer relação é permitir que as potencialidades e belezas do outro sejam afloradas – de tal maneira que se o relacionamento não consegue ser um agente criativo, torna-se um contrassenso permanecer nele.

Entretanto, nós permanecemos e nos autodepreciamos ainda mais, tornamo-nos ainda menores e mais subjugados a uma relação escravizadora, uma solidão compartilhada, que nos mata a cada dia por ser incapaz de oferecer algo vivo.

É preciso olhar para dentro de si e perceber o que existe de belo e oferecer apenas a quem esteja disposto a, como diria o velho Bukowski, “aguentar a sobrecarga psíquica”, já que se relacionar com alguém de verdade é estar disposto a aguentar tudo que uma alma traz, todas as lágrimas que serão derramadas, todos sorrisos singelos, todas alegrias mais simplórias; bem como, ser alguém que sempre vai lembrar ao outro quão grande e belo ele é.

Toda vez que aceitamos algo menor do que isso, aceitamos o amor que achamos que merecemos e ao contrário do se busca, retroalimenta-se a tristeza, a solidão e a finitude, posto que, como disse, se alguém não é capaz de explorar o seu melhor, ele jamais vai fazê-lo sentir-se amado e grande, porque isso só ocorre quando estamos em uma relação que toca a nossa alma em sua completude, fazendo-nos merecedor de sentimentos profundos, que nos afaste qualquer ideia de que não somos nada e, portanto, faça-nos maiores e infinitos.

O que eu chamo de amor

O que eu chamo de amor

Imagem:  Alexandra Lande/shutterstock

É preciso que tu entendas que o que eu chamo de amor é a anestesia que percorre minhas dores a cada vez que elas encontram descanso no teu peito.

O que eu chamo de amor é o desejo constante de que toda beleza que eu for capaz de encontrar nesse mundo tenha teu par de olhos castanhos como testemunha.

O que eu chamo de amor é o cuidado espontâneo com as tuas feridas; é quando, por ser capaz de sentir no meu próprio peito aquilo que machuca o teu, empresto o que em mim for esperança, para, de mãos dadas, driblarmos a dureza dos caminhos.

O que eu chamo de amor é a saudade que minha pele grita da tua quando tudo que a abraça é a distância; é urgência pelo único beijo que sacia, pois tem gosto de lar.

O que chamo de amor é a coragem extra para enfrentar meus monstros que advém da certeza de que, ao final do dia, sonharemos sob a mesma cama.

O que eu espero do amor é reciprocidade.

Das nossas batalhas, perdas e ganhos, sabemos nós, e mais ninguém.

Das nossas batalhas, perdas e ganhos, sabemos nós, e mais ninguém.

Como seria magnífico se tivéssemos, acerca do tratamento de nossos próprios dilemas, a mesma desenvoltura que temos com relação aos dilemas alheios.

As histórias vividas pelo outro parecem sempre menos desafiadoras do que as nossas. Temos sempre a impressão de que a sorte dos vizinhos, dos colegas, dos familiares, do pessoal que aparece na revista, nas fotos pelo mudo postadas nas redes sociais, é sem nenhuma sombra de dúvida mais brilhante do que a nossa.

A questão é que a gente vê um episódio ou outro e acha que tem recursos para interpretar toda a temporada. Ora, ora… isso é, para dizer o mínimo, uma tremenda sacanagem.

Basta que a gente faça um exercício breve ao contrário. Pense em quantas vezes você deu um duro danado para conquistar coisas, que foram avaliadas por pessoas que mal o conhecem como um golpe de sorte ou “super valorização” (hehehehe) – acontece até com a Meryl Streep, não vai acontecer com você, por quê?! Pense em quantas vezes você foi silenciosamente forte diante de situações impensáveis, que foram julgadas como corriqueiras pelos demais.

Nem é preciso fazer muito esforço, não é mesmo? Das nossas batalhas, perdas, ganhos, períodos de secas ou enchentes, sabemos nós, e mais ninguém.

E ainda que sejamos aquele tipo de pessoa que é “pau pra toda obra” e que se possa contar a qualquer momento, seja de vitória, derrota ou tédio… ainda assim, o que podemos ofertar é a nossa mão, nosso ombro, algum recurso material ou amoroso. E é só!

E não, eu não acho que isso seja pouco. É muito, até! Principalmente se levarmos em conta que cada um vive a própria vida, na maior parte das vezes, e pouco se mexe para socorrer os aflitos ou desvalidos.

O fato é que esse “muito”, essa tão bem-vinda ajuda, suporte ou apoio, são externas ao sofrimento. A gente pode se alinhar à dor do outro, a gente pode – e deve -, exercitar a empatia. Mas a gente NUNCA vai saber exatamente a dimensão do estrago.

Sendo assim, antes de sair por aí tecendo, em pensamentos ou palavras, verdadeiras análises dos tropeços, enganos, deslizes, acertos e conquistas dos nossos companheiros, próximos ou nem tanto, contemos até mil.

Ninguém é capaz de entender todo um livro, baseado na leitura de alguns capítulos. Sobretudo se essa tal leitura for feita assim “por alto”, não é mesmo?!

Imagem meramente ilustrativa: cena do filme Carol, 2015.

Ensaio sobre ela

Ensaio sobre ela

Imagem de capa: Versta, Shutterstock

Eu me pergunto, o que é que eu fiz para merecer alguém como ela? Ainda há dias em que acordo ao seu lado e questiono se aquele instante é fruto da minha imaginação ou se é consequência da nossa entrega. Apenas sei que quando ela abre qualquer sorriso de manhã, o tempo torna-se cúmplice desse amor tranquilo. Nunca acreditei em destino, mas encontrá-la não foi por acaso.

Ela não veio para construir o que já foi feito. Ela veio para ser o melhor de mim em quatro mãos. Para deitar no meu peito por vontade própria e carinho dado, e não por proteção ou imposição. Ela sente sono em qualquer filme e não vê problema algum nisso. Ela salta os olhos para o novo do mesmo jeito que para o gasto. Para ela, não há diferença quando se trata de demonstrar afeto pelo que gosta. Ela ainda fica emocionada com o breve, mas deixa nascer uma cachoeira quando você cita o futuro.

Ela é saudade sem até logo marcado. Quero-a por perto para poder vê-la indo para onde quiser. O mundo é grande demais para ela ficar enclausurada num único fim de tarde. Ela é dessas almas que carregam um universo de emoções, disponíveis apenas para os interessados e interessantes. E ela canta porque transborda. Ela é muitas histórias em uma só. Ela é uma só em muitos versos.

Ela é sonho. Sonho daqueles que a gente sonha junto porque não quer mais perseguir separado. Ela é gratidão em domingos ensolarados, onde perdemos a noção dos carinhos e talvez incomodemos os vizinhos. Ela é fogo que incendeia e há de ser.

Eu ainda me pergunto o que é que eu fiz para merecer alguém como ela, verdade. O importante é que agora sou feliz de novo. Nem a vi chegar, mas que bom que ela aqui está. De resto, fica o amor.

Pessoas livres não enclausuram outras pessoas

Pessoas livres não enclausuram outras pessoas

Imagem: Jacob Lund/shutterstock

Pessoas livres têm uma perspectiva interessante do mundo e das relações. Não cultivam o medo dos rompimentos, não constroem armadilhas para prender outras pessoas.

Pessoas livres enxergam beleza na fragilidade dos encontros, se fortalecem de momentos felizes, vivenciam as fases difíceis e comemoram intensamente as superações e progressos.

Não alimentam neuroses, não sentam ao lado de paranoias, não dão conversa para os pensamentos possessivos. Sabem que nada nem ninguém lhes pertence e jamais pertencerão. Pessoas livres convivem com idas e vindas sem grandes dores. No máximo, saudades e recordações, até mesmo as tristes e doloridas.

Ninguém jamais será aprisionado por uma pessoa livre! Ainda que possa parecer desamor, uma pessoa livre não concebe a prisão como forma de vida. E tanta gente se querendo aprisionar, obedecer, se submeter… Uma ordem não natural das coisas que a gente acaba se acostumando, e as pessoas livres transgridem, ainda bem.

Da mesma forma, nunca será possível encarcerar uma pessoa livre. As mais fabulosas e criativas maneiras terminarão em fracasso e frustração. A pior das notícias para os dominadores de plantão.

Ser livre é estado de espírito. Estar livre é momento sublime. Quando nada prende, a gente sabe exatamente onde e com quem quer estar. Pessoas livres nos mostram o caminho, mas quase sempre preferimos as correntes e os segredos dos cadeados. E damos passos tão curtos quanto pequena é a corda que nos aprisiona.

Se o mundo é dos que não se acovardam, a liberdade é para os que enfrentam o que vida lhes oferece. Aceites, recusas, êxitos, fracassos, amores intensos, infidelidades, mentiras, verdades… Liberdade é conviver com tudo o que faz parte da vida sem negociar o direito de viver plena e pessoalmente.

Não há proteção nem conforto, tampouco promessas e esperanças, que paguem o preço de uma liberdade. Pessoas livres sabem disso e aprendem bem cedo que, mais valem passos errantes no mundo, do que uma bola de ferro nos tornozelos.

Quando os pais atrapalham os filhos

Quando os pais atrapalham os filhos

Imagem: Breslavtsev Oleg/shutterstock

A menina tem 13 anos e o menino 15. Estão sempre juntos, na companhia dos amigos, dos pais, dos responsáveis, do grupo de jovens da igreja.

Mal se tocam, nem pegam na mão, mas todo mundo sabe que ali se formou uma duplinha inseparável. Riem ao mesmo tempo. Ficam vermelhos ao mesmo tempo. Acham graça de tudo. Dançam sem se tocar.

Não se importam de andar sempre em grupos de amigos ou de parentes. No meio da festa, de repente, ambos se voltam para o celular, para uma plataforma digital qualquer, e silenciam. Pare o mundo que eles estão jogando. A prioridade é o jogo. Jogos de ação, tiros, fugas, explosões cinematográficas. Abstraídos da realidade voltam a ser crianças ganhando, perdendo, esboçando reações de alegria, de raiva, de medo ,buscando resultados e placares que só a cada um deles interessa.

São namorados ou são amigos? São os dois.
São jovens ou são crianças? São os dois.
É amor ou é paquera? É amor e é paquera.
Uma fase que veio para NÃO ficar. Uma experiência sazonal, dessas que não deixam marcas.

Um dia, acaba: deixam de se ver. No outro, mal se cumprimentam. E mais um outro, são capazes de jurar que nem se conhecem. Trocam de igreja, são transferidos de colégio, mudam de cidade. Acaba.

Poderia ser diferente? Poderia!

Poderia ser o principio de um namoro adulto, de um noivado adulto, de um casamento adulto, que fosse eterno enquanto durasse, ou até para sempre, desde que a relação ganhasse estabilidade e contornos de uma realidade estável e planejada.

Aos poucos e sempre, um passo de cada vez. E por que não ganha? Por falta de interesses comuns? Nem sempre!

Muitas vezes o que falta é o crédito dos adultos. Sem o crédito emprestado, o jovem casal recém formado não tem estrutura emocional para vencer as fases da vida.

Quando se conheceram, a menina acreditava no menino, e o menino acreditava na menina. Ambos acreditavam em si e nem sabiam que estavam em construção. Ele se viam prontos, porque se correspondiam, porque estavam ombreados, no mesmo estágio.

Ela o via como sempre viu: um menino divertido. Não percebia as pernas finas, a voz que ora falava grosso, ora falava fino, o rosto imberbe, o corpo desengonçado.

O menino não reparava que ela era a gordinha da sala, que tinha espinhas no rosto, e uma barriguinha que se insinuava sob a camiseta baby look.

Ele olhava para ela e a via como amenina mais legal da terra.Ela olhava para ele e o via como um porto seguro, um cara que a defenderia em qualquer circunstância, e se fosse preciso, partiria para a porrada.

Até que chega a irmã mais velha, o irmão mais velho, a mãe, a prima, o primo, ou qualquer pessoa da família, e aponta o primeiro defeito. Depois outro, e outro, e mais outro, quase todos relativos à aparência física, ou à forma de se portar. A sabotagem começa.

Nessa idade, os relacionamentos se desfazem por nada. Por um tênis. Por uma botina. Por um jeito de dançar. Por um jeito de sentar sem jeito. Por uma postura relaxada. Por comer com muita fome. Por não comer. Por falar que tem preguiça de estudar. Por não falar nada.

Os pais não têm paciência para cozinhar em banho-maria uma nora ou um genro em construção. As famílias não percebem que todo edifício começa com um alicerce e se constrói tijolinho a tijolinho. Querem ver o edifício pronto da noite para o dia. E desse jeito, sob uma montanha de censuras veladas ou declaradas, um jovem de boa família, e uma jovem de boa família, se perdem por culpa das respectivas famílias: o envolvimento acaba.

Anos depois aquele jovem desabrochou, atingiu a maturidade, virou um profissional competente, ganhou músculos e nervos de aço, aprendeu a sentar, a falar, a conduzir-se na vida. Está noivo, vai se casar. A noiva lembra um pouco o amor da sua adolescência. Que ele nunca mais viu.

Aquela jovem ganhou altura, emagreceu, as espinhas sumiram, o corpo ganhou contornos de feminilidade, o trabalho fez dela uma mulher segura que não precisa de um protetor, mas oh mundo cruel, ela ainda precisa de um homem para chamar de seu, e não consegue vislumbrar nenhum no seu horizonte de executiva.

Os homens sumiram. Os que ficaram, querem só FICAR.

Sem querer parecer dramática, mas já colocando na vitrola o Luciano Paravarotti cantando O Sole Mio – e você que me aguente -, quero encerrar dizendo isto:

Pais não atrapalhem a vida dos seus filhos .Deixem que eles decidam por si o que lhes for melhor, no momento da decisão.

Se o amor acabar no meio do caminho, eles saberão. Se o amor se fortalecer no meio do caminho, eles também saberão. Mas se vocês atrapalharem, no início do caminho, eles nunca saberão.

Um perverso tipo parasita pode ser aquele que habita sua casa

Um perverso tipo parasita pode ser aquele que habita sua casa

Imagem: ferasphoto/shutterstock

Algum tempo atrás falei a respeito do narcisista bem sucedido, endinheirado e como ele usa sua posição e recursos para convidar seus alvos para dentro de sua vida, assumindo não só todas as obrigações financeiras, mas também o controle, exercendo poder ilimitado sobre o outro indivíduo.

Proporcionam uma boa vida ao custo da identidade e dignidade do outro. Para esse tipo, tudo o que é de seu alvo é inferior ou inadequado: família e amigos não prestam, seus pertences são defeituosos ou não bons o suficiente, suas conquistas não têm valor, ou seja, sem ele seu alvo não é nada.

No outro extremo encontramos o perverso narcisista do tipo parasita que também roubará a identidade e dignidade de seus pares, mas não só. O parasita é charmoso, sociável e vitimista. Ele encanta por onde chega, é simpático, carismático, faz amigos com muita rapidez e ganha facilmente a confiança de todos.

O parasita pode ter ou não boa formação acadêmica, mas invariavelmente é mal sucedido na vida profissional. Ele é instável, não consegue, a despeito dos estudos ou oportunidades que surjam, crescer profissionalmente e se firmar de alguma forma.

Todos os seus empreendimentos acabam por ruir, pois é péssimo administrador. Sua grandiosidade não lhe permite seguir o curso natural do crescimento e a manutenção estável de dedicação diária. Quer tudo para ontem e muito. Seu senso de merecimento lhe diz que deve de pronto ocupar um alto cargo ou ganhar mais que os outros, ser ajudado ou favorecido.

Esforço e dedicação são coisas para mortais. O parasita narcisista merece mais, tudo e rápido. Ele é especial. Vitimista, atribui seu insucesso às outras pessoas, às circunstâncias ou a planos futuros que “logo serão colocados em prática”, o que nunca ocorre, por culpa de todos ao seu redor, é claro.

Exatamente por ser eloquente, articulado, carismático e vitimista, o perverso parasita encontrará com facilidade alvos que lhe proporcionem um vida boa enquanto ele “ajeita as coisas” ou “fecha aquele grande negócio”. Para ser sustentado e cuidado, colocará sua mira egoística sobre pessoas bem sucedidas ou com emprego estável, de preferência que morem sozinhas e se mostrem solitárias, sem uma boa rede de apoio ou carentes.

Antes de encontrar esse alvo provedor, parasitam em cima dos pais, que não percebem que são adultos de 30, 40 anos ou mais, e não criancinhas incapazes. Outras vezes, os pais até percebem o fracasso que é a personalidade de seu rebento, mas carregam esse peso insuportável, pois se sentem ameaçados, reféns, culpados ou simplesmente não conseguem impor limites à cria parasita e vitimista.

Rapidamente, o enredamento, bombardeamento de amor e aparente interesse numa relação séria vão deixar o alvo tão distraído e confiante que não perceberá que em questão de semanas ou meses, o parasita já terá se instalado em sua casa, onde passa a se comportar como dono ou já estará usando seu carro, seu cartão, suas coisas como se o alvo tivesse a obrigação de prover seu conforto como pagamento por “aquele ser incrível tê-lo escolhido”.

Muitas vezes, com a crueldade e manipulação que lhes são peculiar, dará a entender que escolheu seu alvo por admirá-lo e não pelos atributos físicos, fazendo referências a “pessoas lindas e maravilhosas que já passaram por sua vida”, minando a autoestima do par, de modo que se esmere cada vez mais para agradá-lo já que não tem beleza suficiente para manter a atenção do parasita. O alvo se compara e trabalha para ser cada vez melhor aos olhos do insaciável parasita.

Algumas vezes, não se trata de um alvo que more sozinho, mas com potencial econômico para tal. Quase sempre é alguém em busca de um ideal de amor que os leve para fora de casa para viver um sonho. O parasita chega sedutor e, em tempo record, propõe “morar junto e dividir as despesas”. Nos 2 ou 3 primeiros meses cumprirão sua parte no trato, mas eu pouco tempo as desculpas e lamentações chegarão e quando o alvo se dá conta, está bancando tudo “temporariamente”. Veja, isso é diferente de assumir a casa quando ocorre uma doença ou desemprego. Bem diferente!

Os jantares serão pagos pelo alvo, o supermercado, a padaria, a pizza ou a comida japonesa pedida no delivery, o motel, as viagens. O parasita está sempre quebrado ou “em transição” e a pessoa empática, muito compreensiva, vai atravessar essa “fase” como uma heroína incansável. Mesquinho com seu próprio dinheiro, se sentirá muito à vontade em usar o dinheiro de seus alvos, oferecendo presentes, festas e favores aos outros às custas do empático, já que para o perverso parasita o que é dele é dele e o que seu é nosso.

Os meses avançam e quando o alvo se dá conta está pagando por cada pãozinho que o perverso parasita come. O dinheiro dele não dá para nada, somente para seus interesses pessoais. Ele parece bem a vontade em ser bancado. Num desenrolar natural, contará tantas misérias e desgraças, insinuará que precisa ou gostaria de ter ou fazer certas coisas para que o alvo, empático por natureza, se adiante para lhe satisfazer as “necessidades”, caprichos e desejos. Quase nunca pedem abertamente, dão a entender e o alvo empático se mostrará sempre um ótimo entendedor.

Quando se der conta, o alvo já terá feito financiamentos e empréstimos em seu nome e terá uma parte substancial, quando não toda, de sua receita empenhada com gastos e necessidades do parasita. Vaidosos, não se contentam com pouca coisa: adoram grifes, bons restaurantes e conforto. Para conseguir esses favorecimentos, algumas vezes lançarão mão de chantagens emocionais e outras; de promessas de amor eterno e elogios jamais antes ouvidos pela parte empática, bem sucedida, mas insegura e desejosa de validação.

Não raro, o alvo será sugado e explorado também por outros membros da família. A pessoa empática, que faz qualquer coisa para agradar e ser aceita, passará a cobrir a todos de presentes e mimos, buscando ser vista como especial e insubstituível por todos. Quando presentear, dirá que é um presente “do casal”, para enaltecer o parasita que em nada colabora, apenas recebe os créditos.

Em sua mente, ainda que inconscientemente, a parte empática acredita que aquela servidão lhe garantirá que o parasita não a deixará, a menos que seja maluco de largar tantas benesses e uma pessoa “tão boa e compreensiva” que o “apoia tanto”. Ao estender sua doação à família e amigos do parasita, busca aprovação e apoio dos mesmos para ajudá-la na empreitada de mantê-lo por perto.

O que esse empático não sabe é que está compartilhando a vida com um indivíduo dono de um buraco negro onde toda e qualquer doação de amor ou material se perderá. São incapazes de amar, estabelecer laços afetivos reais e desinteressados; reconhecer e retribuir. Todas as suas ações são pensadas segundo sua conveniência e agenda de interesses.

Para eles, só o fato de estarem com seus alvos já é uma grande retribuição, afinal, “são pessoas incríveis, especiais, extraordinárias e qualquer pessoa daria tudo para estar no lugar privilegiado do alvo”…

Em pouco tempo, toda energia e patrimônio do alvo serão sugados e, quando não restar nada, será substituído ou reiteradamente desrespeitado. Nesse ínterim, sua conta engorda, seus bens aumentam e, quando se encontrarem em situação privilegiada ou com um alvo que ofereça mais vantagens em vista, fará movimentos de desvalorização e descarte, deixando novas vítimas em potencial em pole position, caso necessitem, sejam desmascarados ou simplesmente não tenham mais o que sugar do alvo atual.

Aos poucos, a situação do alvo começa a ficar insustentável. Nesse momento, ao ousar questionar a falta de apoio financeiro ou perguntar o porquê de, depois de ter ajudado e feito tanto pelo perverso parasita, está sendo tratado daquela forma, receberá respostas como: “eu não lhe pedi nada”, “nunca precisei de você para nada”, “você deu ou fez porque quis” , “fez ou deu porque queria me comprar ou me atrair para essa relação”, deixando o alvo tonto diante de tanto cinismo. Passado um tempo, tendo havido ou não o descarte, mal poderá funcionar ao compreender o quanto permitiu ser usado.

O perverso parasita reúne em si todas as características de outros perversos narcisistas e mais a capacidade de devorar seu patrimônio por completo sem nunca parecer que o está fazendo. Eu costumo dizer que o perverso do tipo parasita tem alto potencial lesivo porque além da devastação emocional, devastam materialmente a ponto de deixar seus alvos sem nada, nem mesmo a noção de quem eram antes daquela relação.

Consegui meu equilíbrio cortejando a insanidade

Consegui meu equilíbrio cortejando a insanidade

Imagem de capa: KIRAYONAK YULIYA, Shutterstock

Não foi por pouco, mas por muito. Precisei entender que a minha felicidade só depende do olhar no qual enxergo o mundo. É quando permito que a alma fique aos cuidados de um coração corajoso, disposto e sonhador. É sobre deixar transparecer o que importa.

Marasmos não me inspiram. Faço questão de recolher, em cada vida tocada, vontades e quereres. Um bocado de liberdade para respirar, uma xícara de amor para recordar e duas colheres de sentimentos cheios para compartilhar. A receita é das mais antigas, mas funciona. Porque é necessário acreditar que, até nos dias mais pesados, sempre existirá uma ponta de sobrevivência a ser reconhecida.

E ainda que o corpo esteja dolorido e imerso num estado profundo de decepções, nada fará desaparecer essa minha reviravolta de completude. Porque sou capaz de externar sorrisos quando o mundo me dá lágrimas. E também por saber que fins justificam novos inícios.

Então preste atenção, não interceda. Não tente me calar. Não tente nem mesmo me fazer mudar de ideia. Sou tempestade e compreendo o meu próprio ritmo. Atingi um nível de maturidade que flerta com a ousadia. Cheguei em um patamar onde invento a melhor forma de amar. Porque, para tudo isso sair, tive que alcançar um pouco mais de mim. Consegui meu equilíbrio cortejando a insanidade. Agora começo a viver de verdade.

Título inspirado na canção Sereníssima, de Renato Russo e Dado Villa-Lobos.

“Aquilo que faz “tic… tac…” no seu pulso não é o relógio, é a sua vida.”

“Aquilo que faz “tic… tac…” no seu pulso não é o relógio, é a sua vida.”

Muito da sabedoria, talvez o que existe de mais sábio no mundo, acontece no hoje e pode ser visto através da simplicidade.

Como disse Sadhguru.: “Aquilo que faz “tic… tac…” no seu pulso não é o relógio, é a sua vida.”

Confiram o vídeo!


Vídeo via Mensagem Espírita.

A vida muda num instante

A vida muda num instante

Imagem: Alena Ozerova/shutterstock

Nem só de doce se faz a vida. Nem só de poesia. Nem só de amor. Nem só de felicidade. Há dias amargos, tristes, sombrios, desesperadores.

E não é preciso que façamos nada para alterar o rumo das coisas.
De repente a bússola da felicidade aponta para a direção da infelicidade, e ela nos colhe dentro de casa, sem que tivéssemos nos movido meio centímetro do nosso caminho feliz.

O contraponto nos pega no contrapé da normalidade, dizendo assim:

– “Ei você, você que está sossegado na praia, jogando frescobol com a família, a maré mudou, o céu se tingiu de chumbo, aguente esse Tsunami que estou mandando em sua direção, esse raio que vai cair sobre a sua cabeça, neste exato segundo.”

São os contrapontos do caminho: o claro se torna escuro, o céu se faz de bronze, como de bronze é o gongo anunciando secamente, mecanicamente, que a vida mudou, que ela acabou de mudar.

– Não dá para retroceder um segundo em direção ao passado? – você pergunta.
– Há algum buraco negro na próxima esquina, onde eu possa entrar na máquina do tempo, de volta para o passado?

-Infelizmente, não há. A vida acabou de mudar. Siga em frente. Quem sabe ao final do arco-íris possa haver um pote de ouro.

A vida muda num instante, como tão lindamente descreveu a escritora americana Joan Didion, em seu livro autobiográfico O Ano do Pensamento Mágico:

“A vida se transforma rapidamente. A vida muda num instante. Você se senta para jantar e aquela vida que você conhecia acaba de repente.”

O que fazer com o jantar da noite em que a vida muda de repente?

Jogue fora. Não há reaproveitamento possível.

Aquela comida que estava sobre a mesa, preparada com tanto carinho, jamais poderá ser degustada de novo.

Aquela toalha, aquele serviço de jantar, os cristais transparentes, os lugares demarcados, a familiaridade entre sons, cheiros, e sabores, jamais será recuperada.

Por mais que você queira, quando a vida muda, impede a substantificação de percepções felizes e gratuitas, das quais antes você usufruía e nem agradecia, sequer percebia.

É o tal negócio: “ eu era feliz e não sabia.”

Se você quer saber se é possível ser feliz de novo, eu posso responder:

Não daquele jeito. Não como naquele tempo.

Mas sim, depois de muitos dias que parecem anos, e depois de muitos anos que parecem dias, – porque uma das coisas que se altera é a percepção do tempo – voltam alguns instantâneos de felicidade.

Algumas novas amostras grátis para testar se a terra ja foi sarada, se é possível voltar a semear, se ela está apta – de novo – para produzir frutos.

A terra sempre volta a produzir frutos.
A sementeira sempre exibe a sua força germinativa.
A produção de frutos precisa prosseguir porque o tsunami não mata a todos.

Sobram alguns.

E os que ficam, têm fome. Fome de você.

E por causa deles, um dia, você volta a matar a fome daqueles que ainda te amam.

É preciso encontrar um novo jeito para continuar.
É preciso dar tempo ao tempo, para que a mente assimile que a vida, como você a conhecia, não volta mais e uma outra vida lhe espera.

Há que reconstruir um novo cenário, o cenário de um novo tempo. E esse novo tempo, essa nova vida que lhe foi oferecida no meio do caminho, sem que lhe fosse perguntado se você aceitaria a troca, essa vida, – de modo algum, na verdade,- representa o frescor de algo novo, mas o ranço de um mundo velho, feio, antigo, assustador, e muito, muito solitário, temperado com o amor de Deus e a fraternidade dos homens.

É tão estranho que Deus nos ame antes, durante, e depois do Tsunami e mais estranho ainda que sejamos capazes de reconhecer esse amor. Mas somos. E ele é quem nos salva.

Por isso, se você conhece alguém que teve a sua vida mudada num instante, acolha-o como a um recém nascido no planeta Terra.

Trate-o com a delicadeza de um bebê, não se escandalize com o choro fora de hora, não se espante se no melhor da festa ele quiser ir embora, não se ofenda com o seu silêncio repentino, e se ele dormir durante o dia, compreenda: é porque a insônia o venceu nas madrugadas.

Acostume-se com as novas latitudes desse habitante, com os novos parâmetros desse sobrevivente, com os estranhos hábitos desse exilado, até que a memória lhe desbote, e as lembranças se confundam, e ele não saiba mais a qual dos dois mundos pertence, por não pertencer a nenhum.

Quando a solidão aperta, quem tem lembrança boa não passa apertado

Quando a solidão aperta, quem tem lembrança boa não passa apertado

Imagem: RPBaiao / Shutterstock, Inc.

Eu não estou só. Estou sempre na companhia de uma saudade. Vê esse meio sorriso, esse olhar distante, esse jeito quieto? É a lembrança que me visita agora. Veio cheia de histórias e presentes, disposta a me fazer sentir alegria. Eu agradeço e retribuo.

Ser só é viver na companhia de nossas lembranças. É encher a casa de risos largos e saudades longas. Vozes familiares apontam de longe, cheiros carinhosos voltam no vento, gostos há tanto partidos retornam no pão com manteiga sem graça de um dia qualquer. Sentimentos chegam de manhã cedo como visita rara, desavisada, cheirando a banho, vestindo roupa de domingo.

Ficam conosco até a noite, ajudam no almoço, caminham ao nosso lado até o mercado, cochilam no sofá, falam do tempo. Quando partem fazem tanta falta que dão na gente um desejo de voltar as horas na marra. As lembranças também partem, sim. Lembranças têm vida própria.

Logo chegam outras, carregando sentimentos em sacolas coloridas de supermercado e carrinhos de feira. Quem vive só anda envolto em tanta saudade que quase nunca sobra espaço para mais ninguém. Não cabe mais ninguém na casa tão cheia de nostalgias alegres, gargalhando pelas janelas, jorrando felicidade eterna para um mundo triste.

Pessoas sozinhas nunca estão sós. Apartam-se do mundo em apartamentos silenciosos, casulos de quarto, sala e cozinha que abotoam em si mesmas como casacos ao fechar a porta e tirar os sapatos, sabendo que vão trombar nos corredores com lembranças vivas, prendas do tempo que nos liberta de obrigações corriqueiras e prazos curtos para sermos quem somos: bichos humildes feitos de saudade e esperança, sentimentos e lembranças se abraçando com carinho, como velhos amigos de infância comovidos de gratidão e de amor na alegria do reencontro.

Ahh… quando chega essa hora eu sinto saudade de tanta coisa, tanta gente. Ficou tudo aqui, guardado numa tardinha que jamais passou, com o sol se pondo para sempre sobre nós e os nossos sonhos. Quando a solidão aperta, quem tem lembrança boa não passa apertado.

Por que a morte de um animal de estimação dói igual a de um familiar?

Por que a morte de um animal de estimação dói igual a de um familiar?

Imagem capa: Nick Chase 68/shutterstock

Quando o nosso cão ou gato morre, sentimo-nos tão vazios como se tivéssemos perdido um filho, um irmão ou um de nossos pais. Experimentamos uma dor imensa que não se pode comparar a nada e que é difícil de explicar. Neste artigo, contaremos por que a morte de um animal de estimação dói igual à de um familiar.

A dor pela morte de nosso animal de estimação

Aqueles que amam os animais sabem que não existe uma dor maior do que a de perdê-los. Os cães e os gatos passam muitos anos ao nosso lado para que a morte deles nos seja indolor. Só o ato de pensarmos que algum dia eles morrerão, nos dá um nó na garganta. Entretanto, temos que levar em conta que cedo ou tarde isso acontecerá e que é preciso que estejamos preparados.

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A conexão que experimentamos com os animais de estimação é tão grande que não podemos imaginar a vida sem eles. Nada será como antes, porque seu amor e sua lealdade eram como um bálsamo entre os nossos problemas.

Infelizmente, o ciclo de vida destes animais de companhia é muito menor do que o nosso. Portanto, é natural que sejamos nós que venhamos a sofrer pela morte de nosso animal de estimação. De acordo com psicólogos, isso gera um grande impacto emocional nas pessoas, tal e como acontece quando um membro de nossa família morre. Por quê? Porque o cão ou o gato também formam parte desse núcleo íntimo.

Além disso, como indica um estudo da Universidade do Havaí, a dor provocada pela morte do animal de estimação não só é intensa e profunda, mas também dura bastante tempo. Uma em cada três pessoas consultadas disseram que sofreram pelo menos seis meses depois da perda.

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Lenkadan/shutterstock

A morte de um animal de estimação, o final de uma relação mais que especial

Os animais de companhia nos oferecem seu amor, seu apoio e sua lealdade (em muitos casos, mais do que recebemos de outras pessoas). Devido a isso, quando eles morrem, perdem-se ou são roubados, experimentamos o que os cientistas chamam de “fim de uma relação especial”.

A dor pela perda do animal de estimação não costuma ser compreendida por aqueles que não têm um cão ou um gato. Eles acham estranho que alguém chore desconsoladamente por um animal, se o que morre é um cão ou um felino, desprezam os sentimentos.

Como cada vez mais casais e famílias adotam um animal de estimação e o transformam em um membro a mais da casa, é habitual que se organizem funerais e enterros como se se tratasse de uma pessoa. Inclusive há cemitérios especiais para animais de companhia.

Como superar a morte de um animal de estimação

Não importa se seus amigos ou familiares não lhe entendem ou dizem que você é exagerado por se sentir triste pela morte de um animal de estimação. Se seu cão ou gato morreu, você deve expressar sua tristeza e confrontar a perda. Tire o tempo que necessitar para atravessar este horrível momento.

Embora não tenha que derramar milhares de lágrimas, não as reprima. Alivie toda sua dor através do choro.

Não se deve assumir a culpa pelo ocorrido, já que essa não é a melhor maneira de encontrar alívio. Simplesmente seu animal de estimação morreu e isso não é sua responsabilidade. É melhor que você esteja tranquilo consigo mesmo e que se perdoe.

Seja paciente, já que, durante as primeiras semanas, você se sentirá realmente triste. Se não tiver vontade de falar do assunto, não fale, se preferir passar o final de semana dentro de casa, faça isso. Mas leve em conta que, em algum momento, você deverá retomar a sua vida habitual.

Por último, lembre-se de seu cão ou gato fazendo travessuras e estando feliz ao seu lado. Tente não guardar nenhum elemento que ele utilizava, porque isso causará mais dor. Certamente há muitos animais sem lar que necessitam de comida, camas e brinquedos. E espere um tempo prudencial para levar outro animal de estimação para casa. Uma vez que você saiba que não será uma substituição, você estará preparado para dar a oportunidade para essa nova vida entrar em seu lar.

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