Não te preocupes com quem se ocupa em maldizer-te. O carma é dele, não é teu

Não te preocupes com quem se ocupa em maldizer-te. O carma é dele, não é teu

Te avexe, não. Agorinha mesmo, enquanto tu dás de comer a teu espírito operário, um canalha qualquer está maldizendo tua vida em tuas costas. Não há o que fazer. Ele vai continuar sua marcha mesquinha para trás, para baixo. É um escroto, um verme, uma alma penada, um encosto. Não te preocupes. Respira, prossegue. O carma é dele, não é teu.

Patifes que se reproduzem feito as baratas, no escuro do esgoto, por baixo, é para lá que tentam arrastar desesperados tudo aquilo e todo aquele sobre os quais pousam seus olhos gordos e azedos de mosca varejeira. Porque são pobres criaturas afeitas a rebaixar e destruir o que tu constróis aqui, sob o calor do sol, com a Graça de Deus e todo o tempo que tens.

Os subreptícios jamais enxergam a si mesmos, viram o rosto, tapam os olhos para não ver sua própria miséria. Seu olhar viciado está fixado na labuta alheia. É contra ela que os pulhas disparam suas metralhadoras de ódio e cuspe. Porque veem o outro como ameaça, são incapazes de “viver e deixar viver”. Preferem destruir o que seu olhar estrábico enxerga como concorrência injusta. Disparam para cima, nivelam por baixo.

Aos escroques, tudo é motivo para amaldiçoar o outro. Ousa tu encerrares um relacionamento amoroso falido e serás transformado em “falso”, “cafajeste”, “psicopata”. Demite um funcionário mal intencionado e incompetente e serás julgado “explorador”. Afasta uma fruta podre e malcheirosa da caixa e serás um “antidemocrático”, um medonho vilão inimigo dos bonzinhos. Não adianta. Tudo o que fizeres será considerado maldade pela corja dos que se julgam perfeitos.

Pobres minhocas de chifres. Sua covardia patética as impede de mostrar a verdadeira face, por isso se escondem no rosnar das matilhas, avançam em grupo, atacam em bando. Não têm amigos, têm cupinchas com quem se reúnem para zangar e falar mal dos outros. Insistem em confundir os seres que têm amor com capachos que tudo devem aceitar, do contrário serão perseguidos como odiosos escravos fujões. Teimam em classificar os seres livres como malditos arrogantes. Essa é a lógica das mulas: o inimigo é sempre o outro.

Quando tu fores “o outro”, não te preocupes. Encosta teu joelho no chão e te ocupa em agradecer a teu Anjo da Guarda. Vão dizer que teu amor é mentira, que tua fé é falsa, que teu jeito de trabalhar é ditatorial. É o preço que pagarás por não mentir quanto a teu jeito de ser e fazer aquilo em que acreditas.

Que falem o que quiserem. Que xinguem, gritem, acusem, julguem, esperneiem. Importa a ti é a tua consciência. Eleva-a para além do subsolo dos cretinos. Limpa-a na água corrente do trabalho honesto, do empenho justo, do caráter firme. Passa ao largo das bestas e vai. Vai em frente. Deixa que falem. O carma é deles, não é teu. Vai em teu caminho no movimento santo das águas. Porque essas, ahh… essas a lama dos bandidos não há de alcançar jamais. Jamais.

Imagem de capa: Dzmitry Rasiukevich/shutterstock

Ninguém entre nós é perfeito. Exceto o perfeito cretino.

Ninguém entre nós é perfeito. Exceto o perfeito cretino.

Parabéns, ó criatura perfeita. Tu conseguiste. Teu empenho valeu. Por teu esforço em te mostrares superior, conseguiste evoluir à categoria dos seres alados, como os dinossauros voadores, que não mais existem, as baratas de asas e os mosquitos de banheiro que continuam aí, perseverantes em sua chatice, aporrinhando como ninguém mais.

Tu que nunca erras, que tanto te orgulhas de teu quilate e de tua coragem de cuspir em nossa face imperfeita tua integridade, tu que adoras apontar e julgar e condenar os erros alheios. Tu mereces um diploma, uma distinção divina, a chave de todas as cidades. Tu és, sim, o melhor de nós. Afinal, quem somos nós para discordar de ti?

Daqui deste lado de baixo do mundo, onde resistem aqueles que ainda não chegaram ao Olimpo onde resides, impera apenas uma incerteza colossal. E um desejo honesto de, entre um erro e outro, tropeçar uma hora dessas num acerto qualquer. Por menor que seja, um acerto há de nos redimir e nos manter no caminho.

É que os erros da gente são nada senão acidentes de percurso, sabes? Ninguém erra por vontade própria, não. Erra-se por descuido. Erros são acidentes. Humano é seguir adiante e insistir no acerto. Mas isso as criaturas sobre-humanas como ti desconhecem. Porque nunca erram, não é mesmo?

Mas aqui, enquanto tentamos dar jeito na vida, faz bem imaginar a tua figura impecável caminhando por entre as nuvens. Tu que tanto te imaginas um animal formoso, uma águia norte-americana, quando és menos que um urubu brasileiro. Bem menos. Tu és uma anta do tamanho de um elefante. É que tu mal imaginas, criatura mesquinha e pesada, que o ódio que compartilhas por aí, em comentários irresponsáveis nas redes sociais, desejando a morte de um e o sofrimento de outro, é o mesmo, escandalosamente o mesmo ódio que na esquina seguinte desaba em uma criança inocente, atingida por uma bala perdida, disparada por um cretino que também se acredita juiz da vida e da morte. As doses desse ódio podem ser diferentes, mas o sentimento é o mesmo.

Como os mosquitos de banheiro que voam de encontro ao nosso nariz, tu não te enxergas. Tu mal sabes, mas és um bom e velho inseto de lavabo. Podes conferir. Até nos sanitários mais limpos do mundo, desses que os maníacos por higiene mantêm impecáveis por capricho doentio, uma hora aparece ninguém sabe de onde um tipinho curioso de voador, uma minimosca acinzentada e ridícula que pousa sobre a toalha ou num canto gelado e fica ali. Inútil como o quê. És tu, ó idiota de asas frágeis.

Do alto de tua nulidade, serves para nada além de causar efeito breve esvoaçando de repente na direção do nariz da gente. Pousas na parede, levas um sopro e te desfazes em meio grama de cinzas. Como uma criatura feita de nada.

Teu parente mais próximo na família dos seres enfadonhos são as criaturas capazes de ponderar “ah, mas se o bichinho está ali é porque você invadiu o hábitat dele!”. São os arremedos de bons samaritanos, conhecidos como “gente boazinha”, sempre agitando o estatuto de defesa das mamangavas, dos escorpiões, das sanguessugas, das baratas e dos afins.

Eu tenho medo de tua gente, ó descendente direto de Moisés. Tenho medo de tua gente boazinha. De um lado, sempre pronta a defender em retóricas inflamadas todas as criaturinhas da natureza. Do outro, capaz de jogar comida envenenada para o gato do vizinho porque não quer limpar de seu quintal o cocô do animal alheio.

Tua gente boazinha é mera caricatura das pessoas boas. Uma pretensão, um fingimento. O sujeito bonzinho é quase sempre um cínico, um dissimulado, um pateta. Aplaude de perto e agride de longe. Conta ao mundo que chorou com as imagens de bois e vacas no matadouro e vive na churrascaria, refestelando-se em rodízios de carne, descendo o pau no governo corrupto e contando como pagou menos imposto com a ajuda de recibos médicos forjados, reunindo a turma do clube para comprar meia dúzia de cestas básicas e levar na comunidade carente uma vez por ano, porque assim é possível renovar seu visto de gente boazinha.

Sonso completo, lobo em pelo de cordeiro, o ser bonzinho é capaz das piores atrocidades. “Aiii… desculpa. Enfiei a faca em você, mas foi sem querer, viu…”. Gente do tipo que acredita que a bondade é uma utopia e que ninguém precisa mais ser bom, leal, amigo. Basta ser bonzinho e sair divulgando por aí. Alma penada, dedica seus dias medonhos a infernizar a vida daqueles que, simplesmente, não fizeram o que a casta boazinha queria, não se comportaram como a gente boazinha mandara, não seguiram a cartilha esquizofrênica que um perfeito cretino escrevera com seus recursos pequenos, seus gestos rasteiros e seu feitio de réptil. Assim é o sujeito bonzinho.

E sabes tu, ó ser perfeito, quem são os únicos capazes de suportar um humano bonzinho? As pessoas irretocáveis. Os seres evoluídos como tu.

Por tudo isso, seres infalíveis, gente boazinha e mosquitos de banheiro são nascidos uns para os outros. Vós vos mereceis. Então, que sejam felizes. E quanto a nós, os imperfeitos confessos, que nos deixem errar, aprender, acertar… e usar o banheiro em paz.

O importante não é a casa onde moramos. Mas onde, em nós, a casa mora.

O importante não é a casa onde moramos. Mas onde, em nós, a casa mora.

Alguns lugares permanecem vivos dentro da gente. independente do tempo em que vivemos neles. Sobrevivem ao tempo, às despedidas e desistências, às necessidades de se seguir em frente, ao desapego. Resistem como alicerces tão firmes quanto foram as lembranças, e mesmo sendo objetos, perduram repletos de memórias.

Não morei naquela casa, mas durante algum tempo foi o lar de meus pais. Antes do bilhete de despedida, era lá que passávamos os finais de semana, entre pães de queijo do sul de Minas e conversas na varanda, enquanto meu filho e sobrinho experimentavam as primeiras brincadeiras.

Era uma casa grande, centenária, tombada pelo patrimônio histórico, com janelões do tamanho de portas, e altura do teto a perder de vista. Uma casa bonita do interior que se destacava na descida da Matriz em direção à praça do coreto.

Ainda me lembro da última noite.

Já tinha fotografado seus cômodos e agora a estante da sala reinava vazia, restando apenas a televisão. Preferimos nos distrair da realidade e assistimos ao filme recém lançado de Arnaldo Jabor: “A Suprema felicidade”. De lá vinha a frase: ‘Nada é só bom”, e entendiamos que aquele momento era o nosso “não bom”, mas ainda assim seria revisitado muitas outras vezes, como um refúgio de lembranças e saudades.

Um ano depois, de férias pela região, esbarramos na casa aberta à visitação pública*. Era época de natal, e ali funcionava uma feirinha de artesanato comemorativa. Entrei de mãos dadas com o filhote e na cozinha chorei. Chorei não pela falta da casa, mas sim pela presença viva dela dentro de mim. Por enxergar minha mãe abrindo o forno e eu ajudando com a louça. Por ouvir a voz dos meus irmãos através da musiquinha natalina e imaginar momentos que não tiveram chance de existir. Por sentir vapores que só eu conhecia.

Vapores de vida, amor, nascimentos, despedidas, alegrias e tristezas.

Não havia mais nada de nosso lá. Ainda assim, aquelas paredes tinham tanto a dizer. Sabiam de um tempo nem sempre fiel ao que se esperava dele, mas um tempo bom.

A casa permanece à venda. Espero que os novos proprietários tenham sonhos, muitos deles, e que todos se realizem naqueles corredores e varandas. Que coloquem uma mesa grande na sala de jantar e discutam desde o preço da empadinha do Vadinho até os rumos da política atual. Que as crianças andem de patins pelos cômodos e façam uma sessão de cinema no tapete da sala. Se houver um casal, que saibam envelhecer juntos, e passeiem de mãos dadas pelas ruas da vizinhança. Que as flores do jasmim manga sejam colhidas no chão e oferecidas pelas crianças às suas mães. E que as paredes contem um pouco de nossa história àqueles que virão, para que cuidem com delicadeza daquilo que um dia quis ser parte de nossa eternidade.

Mia Couto tem razão. Já não importa mais a casa onde morei. Importa sim, a casa dentro de mim. Sabendo que vou me lapidando a partir do que existe, mas também daquilo que vivi e deixei partir. Entendendo que minha fachada não é somente o reboco visível, mas sim muitos outros alicerces imperceptíveis aos olhos. Descobrindo que também abrigo palavras não ditas, caminhos não escolhidos, sonhos não realizados. Aceitando a vida como ela é. cheia de acertos e imperfeições, percalços e contradições, desafios e realizações…

Imagem de capa: magda_shutterstock/shutterstock

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Solte as cordas que os manipuladores amarraram em você

Solte as cordas que os manipuladores amarraram em você

Vivemos presos a tantas coisas e pessoas, que nem nos damos conta do quanto estamos tolhidos e amarrados, andando aos passinhos curtos e lentos, presos às cordinhas, muitas vezes frágeis, mas muito bem amarradas.

Em família sempre há um expoente, que muito embora se pareça com um líder, pode também ser um manipulador ditando comportamentos, costumes, rotinas e até emoções. Para se livrar dessa corda não é preciso romper, apenas afrouxar, manter um espaço aceitável para todos.

No trabalho, é muito comum a ação dos manipuladores. Muitas vezes com jeitinho, agrados e elogios, e lá estamos nós, obedecendo cegamente, fazendo o que sequer avaliamos se queremos ou se devemos, porque mais uma vez nos deixamos amarrar.

Nos relacionamentos… as chantagens, a tirania, a manipulação da autoestima, do ego, a imposição, o medo, a falta de respeito…

As notícias, os vícios, as manias, a moda, a tecnologia, a necessidade de inserção, de aceitação, de pertencimento, tudo pode nos levar a estender os braços e dizer: amarre-me, manipule-me, me coloque em uma forma e só me tire quando eu estiver completamente moldado. Se assim escolhermos, assim será.

Por tudo isso, quando tomamos consciência das incontáveis cordas que nos enredam, da teia em que nos permitimos colocar e dos movimentos obtusos que fazemos por não sabermos mais como nos colocar em equilíbrio por nossos próprios pés, desejamos romper, rasgar, cortar as cordas com os próprios dentes se preciso for. O perigo de fazermos isso num ímpeto é descobrirmos que não sabemos mais ficar de pé sem as amarras.

Clarisse Lispector em uma carta à sua secretaria, Olga, escreveu: “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso – nunca se sabe qual o defeito que sustenta o nosso edifício inteiro.”

Assim, também nós, tenhamos cuidado ao cortar as cordas que nos prendem e sufocam a liberdade de pensar, agir, decidir, escolher, viver.

Sejamos delicados, como nos jogos de equilibrio. Uma decisão após a outra, uma conquista, nova avaliação, mais uma tentativa, e vamos, pouco a pouco, soltando amarras de uma vida inteira, deixando de crer no manipulador de qualquer natureza, tirando-lhe todas as permissões, permitindo-se enfim, governar a própria vida.

Imagem de capa: Lia Koltyrina/shutterstock

12 coisas que somente pessoas que saíram de sua cidade natal entenderão

12 coisas que somente pessoas que saíram de sua cidade natal entenderão

Nas cidades do interior, como a minha, é normal que os jovens saiam de suas casas para estudar fora e cursar uma universidade.

A partir daí, os anos fora, e depois as oportunidades de emprego que surgirão por seus caminhos, muitas vezes oferecerão diferentes perspectivas às suas vidas, e morar na cidade em que cresceram talvez não seja mais a melhor opção.

Abaixo, conheça 12 coisas que somente pessoas que saíram de sua cidade natal entenderão.

1. Você aprende muito sobre a vida.

Não há nada melhor do que mergulhar fora de sua zona de conforto para fazer você perceber que você, independente da idade, é um novato na vida.

2. Você encontra pessoas inesquecíveis.

Morar em um mesmo lugar promove segurança e pode proporcionar relações sólidas e profundas. Entretanto, conhecer gente nova (pessoas que vieram de lugares diferentes e tiveram experiências de vida até opostas às suas) fornece uma visão mais ampla de diferentes realidades e possibilidades de vida.

3. A vida não é estática.

 Aventurar-se faz o coração se sentir revigorado e novo outra vez. 

4. Você tem que tentar coisas novas.

 É tudo sobre se meter em situações novas e transformá-las em experiências surpreendentes. Quando você estiver em lugar diferente, posturas diferentes serão tomas por você – mesmo que não queira.

5. Você encontra o valor em se perder.

Realmente! Se perder em uma cidade, em seguida, passear. Já aprendi a dirigir em cidades simplesmente me perdendo por elas. Eu tinha que ir a um lugar e me lembrava que já tinha me perdido por aquela região.

Outra coisa deliciosa quando você se perde é descobrir onde ficam alguns lugares que você nem imaginava como encontrar.

6. Você pode redefinir a relação que você tem consigo mesmo e até com os outros.

Todo mundo precisa de um tempo sozinho, e mudanças de cidade podem promover isso. A distância e algum tempo sem as companhias habituais permitem que valorizemos mais quem gostamos e tenhamos momentos mais construtivos com elas, quando as oportunidades permitem.

7. Você aprende a falar com as pessoas.

Ah, a “ocasião faz o monge”. Mesmo os mais tímidos precisam aprender a se virar em locais diferentes.

8. Você fica menos preconceituoso (a).

Morar fora permite conhecer coisas novas e ter contato com mundos e pessoas diferentes. Ao conhecê-los, em vez de temê-los e evitá-los, você perceberá que eles só têm a somar. Preconceito é fruto de ignorância e medo.

9. Você desenvolve confiança.

Depois de se adaptar em lugares diferentes, você começa a perceber como você é inteligente. Afinal, você chegou ao seu destino, se acomodou, pediu ou aprendeu a fazer comida e, de alguma forma, fez isso através de uma nova experiência. Você é muito engenhoso!

10. Você descobre que pode ser livre como os pássaros.

Você é o capitão do barco, você é seu próprio guia, seu próprio patrão. Toda decisão que você faz é sua, assim como as consequências dela. 

11. Você descobre que todos nós somos um só povo.

Não há nada como se mudar ou viajar para fazer você perceber que, onde quer que você esteja, você desenvolverá laços afetivos e passará a se preocupar com pessoas diferentes, e, a parte boa: elas também se preocuparão com você.

12.Voltar para cidade natal será maravilhoso

Rever os amigos, a família e os velhos cenários é algo indescritível para quem mora fora. Do cheirinho da comida à maneira como o clima impera naquela região, tudo tem o seu toque particular e você perceberá que, mesmo que não queira mais viver lá, aquilo faz parte de você.

Imagem de capa: Kristel Van den Broeck/shutterstock

Sabe aquela pessoa que não vai com a sua cara? De repente, ela tem razão!

Sabe aquela pessoa que não vai com a sua cara? De repente, ela tem razão!

Você não está imune de provocar a antipatia nas pessoas. Não é raro acontecer de, justamente aquele seu jeito inusitado de ver o mundo e de lidar com ele, que tanto encanta seus amorosos seguidores voluntários, causar a ira alheia. Conforme-se, sempre vai ter alguém que não vai com a sua cara. Relaxe. E tudo bem se você não for com a cara de alguém também. É a vida!

A impressão que nós causamos em outras pessoas depende muito pouco do nosso desejo de agradar. Na realidade, quanto mais ansiosos estivermos para angariar afetos, menores serão as nossas chances de sucesso. A ansiedade pela aceitação produz reações adversas em nossa maneira de agir; perdemos a naturalidade, passamos a interpretar uma personagem baseados naquilo que julgamos ser o que o outro espera de nós. Catástrofe total: adormecendo nossa espontânea maneira de interagir com o mundo, soamos falso e causamos no outro uma vaga sensação de desconfiança. O outro enxerga em nós uma ameaça, uma fraude. A partir daí, nossas chances de aproximação caem abaixo de zero.

A antipatia gratuita pode acontecer com qualquer um de nós. Dificilmente haverá sobre a terra alguém que nunca tenha vivido a experiência de conhecer uma pessoa e, por razões inexplicáveis, sentir-se desconfortável em sua presença. Essa sensação de aversão à primeira vista pode ser explicada de algumas maneiras. Por vezes, olhamos para um desconhecido e, sua maneira de falar ou expressões gestuais, nos faz recordar alguém ou alguma vivência desagradável. Nossa memória emocional reconhece a sensação e projeta na imagem da nova pessoa a lembrança mal sucedida. Enxergamos ali uma reprodução da experiência ruim e, sem que o outro suspeite, praticamente anulamos suas chances de nos causar uma boa impressão.

Outra arma de sabotagem muito eficiente para arruinar novos relacionamentos é assumirmos crenças limitadoras acerca da interpretação do mundo. Quando fechamos questão sobre o que reconhecemos como verdade, reduzimos drasticamente a chance de recebermos em nossos espaços de relacionamento pessoas cujos pontos de vista sejam diferentes dos nossos. É como se fizéssemos de nossa vida um espaço privado e secreto. Passamos a tratar o outro como candidatos a membros de nossa seita pessoal. Aqueles que apresentarem crenças similares às nossas ganham uma carteirinha de sócio, os que discordarem de nós ficam barrados na porta.

Os rejeitados ficam lá do lado de fora. Presos em nossas preciosas convicções perdemos a chance de vislumbrar uma salvadora flexibilidade para nossa visão de mundo. Olhamos para o “diferente” e só enxergamos o absurdo de sua insurgência: se não pensa de acordo com os nossos critérios só pode estar errado. Simples assim! Ora, nada poderia ser mais estúpido em termos de postura relacional. Ao rejeitarmos as ponderações diversas, abrimos mão da possibilidade de ver o mundo por outros ângulos, perdemos a chance de mudar de ideia, compramos a garantia da rigidez, deixamos de ser pessoa em construção pra virar um monumento estático em honra à nossa tacanha verdade. Quanta burrice!

Abrir as portas para o que parece estranho pode ser altamente libertador. Portas abertas trazem luz, ar fresco, vida nova. Portas abertas nos tiram do claustro das certezas absolutas. Portas abertas abrem espaço para mudarmos de ideia, de vontade, de lugar.

Da próxima vez que não for com a cara de alguém, faça um esforço, tente enxergar além. Quem sabe a antipatia instantânea não esteja diretamente ligada ao seu desejo de rebelar-se contra as grades que você mesmo construiu pra se proteger dos desafios. Estenda a mão, convide, baixe a guarda. Afinal, existe por aí uma porção de gente interessante que também não vai com a sua cara. Abra a mente, feche os olhos e se jogue. O desconhecido é, no mínimo, a saída pra uma experiência inusitada. E o inusitado é o que nos salva da mediocridade de viver eternamente no conforto do lugar comum.

Imagem de capa: racorn/shutterstock

As mãos da minha mãe

As mãos da minha mãe

O tempo insiste em ser verdadeiro no dorso das mãos. O rosto despista, atenua os anos corridos com corretivos simples e semblante suave, mas as pregas das mãos denunciam o tempo dos ganhos e das perdas, dos dias vividos e irremediavelmente vencidos.

O tecido que recobre suas mãos conta os anos de magistério com o giz em punho, a sensação de sentir-se segura no entrelaçamento de dedos com meu pai, o tempo de gerar e criar, o sol diário na despreocupação com o protetor solar, o carinho ao cair da noite, a firmeza ao volante, os gestos exagerados durante as costumeiras piadas, os movimentos contidos na desavença, o calor na menopausa, o frio na tristeza, o suor na espera, a suavidade resignada na prece e recomeço.

Sabe mãe, carrego alguma nostalgia da época em que suas mãos eram lisas e uniformes. Mas é no hoje, porém, que aprendi a respeitar o significado do desenho das veias que saltam através do tecido fino, e das manchas salpicadas como gotas de tinta decorando a fina estampa de sua superfície. Trazem mais história que ambição, exemplo de uma vida de coragem e superação.

Observo seu rosto mas a sinto em suas mãos. Sei que carregam o tempo e a vivência, o que deixou pra trás e o que tem guardado dentro de si. E admiro os sulcos que traduzem o amadurecimento e o olhar reciclado perante a vida; a sabedoria de entender-se completa, ainda que lhe faltem pedaços.

Talvez os sulcos sejam mais que deficiências cutâneas provocadas pelos raios de sol. Talvez sejam faltas que lhe acompanham e hoje fazem parte daquilo que se tomou.

Sinais de uma vida repleta de presença e ausência, orfandade e resiliência, alturas e tombos. Sei de seus voos, mãe, mas também acompanhei sua perda de altitude. Você, que sempre esteve no comando, teve que aprender a ser conduzida também. E isso lhe tornou uma pessoa melhor. Com mais marcas, mas melhor.

É por isso que admiro tanto suas mãos, mãe. Porque me mostram que você não é de ferro. Você é de verdade, assim como eu e meus irmãos. E descobri-la mais humana tem me ajudado a entender a vida também. Porque assim é mais fácil compreender que todos nós _ até você_ carregamos dúvidas, incertezas, desilusões. Mas tudo isso é superável também. Apesar dos cabelos brancos e das pintinhas coloridas, estamos diariamente tentando resistir. E você é dura na queda, mãe. Você é porreta. De uma fé e certeza tão grandes que a gente duvida se é feita do mesmo tecido. Mas então eu tenho as suas mãos. E elas dizem que sim, que você também enfrenta desafios, você também sente na carne cada uma de suas dores. A diferença é que aprendeu a lidar bem com elas, e não está nem aí se lhe causaram algum dano _ visível ou invisível. Você só quer saber do que virá depois.

Agora recordo uma história que aconteceu há aproximados dois anos. Fomos visitar minha amiga que tinha perdido a mãe no dia anterior. Eu perdi o apetite porque sentia a perda da mãe dela dentro de mim, como se fosse você que não estivesse mais ali. Mas você estava. E ao ser confrontada pela sobrinha da minha amiga, que não entendia o porquê do sofrimento e morte da avó, disse-lhe mais ou menos isso: Você ainda não entende porque tem muito chão pela frente. Quando tiver a minha idade, vai aprender e conseguir aceitar também”. Acho que naquele momento, as mãos da menina começavam a rachar também, só que de um jeito imperceptível. Mas você soube apaziguar um pouco a dor. Do alto de seus sessenta e poucos, soube colocar aquelas mãos tão jovens entre as suas e doar uma ponta de serenidade…

Minhas mãos começam a mudar também. Estão mais finas, e o esverdeado das veias faz contraste com o caramelo de minha pele. Meu filho chama atenção para elas. Diz que estão mais magras e entendo que o colágeno vai indo embora enquanto se aproximam outras noções acerca do meu tempo e espaço.

Aos poucos sigo seu caminho e desejo assemelhar-me a você. Nos gestos, nas andanças, na vontade de responder ao mundo como você tem respondido.

Mostrando ao Bemardo que, ainda que não haja remédio para a perda de gordura e saliência dos tendões, há delicadeza e poesia no tempo que chega de mansinho, de um jeito ou de outro, irremediavelmente.

Obrigada mãe, por não tentar esconder o traçado de suas mãos. Por não querer disfarçar os sinais de um tempo que se desenrolou cheio de promessas e desfechos nem sempre fiéis ao que se esperava deles. Por me mostrar que a vida nos aproximou como meninas crescidas, e hoje posso me preocupar com você tanto quanto você se preocupa comigo. Obrigada por me ensinar a não censurar o que o tempo traz sem o nosso consentimento, perdoando as marcas que não podemos controlar, reagindo com alegria aos dias que nem sempre são só bons.

Acima de tudo, por me dar a mão e mostrar que nossos sinais são resquícios de uma vida que se viveu _ intensa e plenamente.

Amo você.

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Você sabe quem anda ao seu lado?

Você sabe quem anda ao seu lado?

Quando você esvazia a carteira, retira os acessórios, cala as frases de efeito, apaga os sorrisos diplomáticos, quem está ao seu lado? O que sobra para você? Quem afinal é você?

Isso não é uma provocação, nem sequer uma afirmação de que sem o verniz social não sobra nada. É sobre justamente o oposto. Quem somos quando não precisamos provar nada a ninguém?

Uma pergunta daquelas que só se responde a si mesmo, a mais ninguém.

Mas necessária. Vital. Precisamos saber com quem andamos fazendo tratos na vida, precisamos avaliar de quem realmente precisamos por perto, quem faz nosso coração bater mais rápido mesmo sem celebrações ou conquistas, apenas por puro afeto.

Quando retiramos a maquiagem, vemos as imperfeições que tentamos esconder, reconhecemos nosso rosto original, aceitamos que ao natural somos a pessoa que vemos no espelho e nenhuma outra mais. Assim é a nossa vida, que inúmeras vezes retira a nossa pintura, nos deixa tão descoloridos, quase nada…

E quando nossa alma está nua, quando passamos pelas mais difíceis fases da vida, quando o sol não entra na nossa janela, quem somos para nós mesmos e para quem cultivamos uma vida de relações? Quem estaria ao nosso lado, quem nos ofereceria um abraço para abrigar, o ombro para chorar, o tempo, os recursos, a alegria para dividir?

É importante fazer uma análise antes de proferir acusações e lástimas, pois, sejam quem forem os nossos afetos e as expectativas que colocamos neles, lembremos sempre que nós os escolhemos e nos ligamos a eles pelo que achamos importante no momento. E se o importante hoje não for o bastante, é porque eles não conseguem reconhecer quem somos quando não somos nada, quando estamos sem maquiagem.

Imagem de capa: Africa Studio/shutterstock

As vantagens de ser diferente

As vantagens de ser diferente

Todos os dias acordamos na companhia de um estranho. Pouco interessa se você é branco, colorido, ou mesmo, invisível. Tanto faz se você anda apaixonado por sua própria ou por outra pessoa. Não interessa se você é meio perdido, totalmente resolvido ou louco para se perder de vez. O estranho estará ali, com você; enquanto você dorme; assim que você desperta; ao longo das mais doidas aventuras ou enlouquecedoras situações entediantes de sua vida; o estranho estará sempre ali.

Quantas vezes não tivemos a estranha sensação de estar vestindo um corpo que veio no modelo errado. O nariz bem poderia ser mais delicado; um sorriso mais amplo e iluminado cairia tão bem; braços de uma bailarina de flamenco seriam um sonho; a postura e tranquilidade de um mestre budista seriam extremamente bem-vindas; cabelos mais obedientes, quem sabe (!?); que os sinais no rosto fossem apenas lembranças dos momentos em que não conseguimos segurar o riso; que a imagem que temos de nós mesmos fosse menos, bem menos importante.

Passamos uma eternidade da vida perdidos em horas de preocupação para exibirmos uma figura mais interessante. Vivemos ansiando pela notoriedade, seja ela passageira, breve ou meteórica. O sucesso funciona em nossas veias qual uma droga poderosa de prazer; o coração tremelica, a pele arrepia; e por alguns instantes, ainda que tão ligeiros, parecemos ser tão adequados, tão merecedores da atenção do outro. O outro. Ahhhhh essa pessoa que tem a sorte de viver fora de nós; de olhar por outro ângulo; de tecer sobre o que somos as mais criativas versões de nós mesmos. O outro nos interessa tanto, mas tanto, que somos capazes de vender, rifar, ou simplesmente doar a nossa alma para qualquer gênio da lâmpada que nos garanta o seu afeto.

Criaturas estranhas que somos. Cortamos e colorimos os pelos da cabeça em diferentes formatos e cores; pintamos as unhas das mãos e dos pés nas mais bizarras tonalidades; brincamos de pintar os olhos, a boca, as bochechas, e até os cílios, numa busca sem fim por uma imagem mais possível de ser amada, ou cobiçada, ou desejada. E, tudo bem se for apenas uma vaidade humana. Porque também é da nossa natureza, adornar o corpo para receber os inúmeros rituais de passagem tão necessários no transcorrer da vida.

Cuidemos apenas de não ficar demais confortáveis em um espaço-tempo no qual a coisa mais importante seja igualar-se a bonecas perfeitas e adoráveis. Buscar virar uma cópia de modelos universalmente eleitas como belas. E acabar virando outras de nós mesmas, prontas para a exposição no mundo; nunca prontas para entender que a vaidade física não passa de uma armadilha, dispendiosa e sufocante que rouba de nós a liberdade de sair à rua com os cabelos molhados e o rosto original.

O mais irônico em toda essa história é que o que mais nos iguala é exatamente esse medo de ser diferente. E, todos os artifícios que usamos para nos destacar, acaba nos uniformizando. Ficamos inseguros porque temos pavor que o outro descubra nossos pontos de fraqueza. Secretamente julgamos o outro, sua aparência, comportamento ou conduta, imbuídos de um desejo inconfesso de que nossas falhas passem desapercebidas.

Bem que podíamos parar de correr atrás do nosso próprio rabo, feito filhotinhos perdidos e começar a tirar as cascas de soberba, que tão habilmente utilizamos para disfarçar nossa ridícula falta de jeito para nos aceitar. Que maravilha seria, andar por aí livre do peso do incômodo de se achar inadequado, fora da curva ou do padrão. Guardar na memória afetiva imagens de nós que nenhuma câmera fotográfica é capaz de captar. Sorrir por nada; olhar-se sem pudor; mostrar-se sem reserva; parar de medir os gestos e as poses; e, finalmente descobrir que é uma delícia ver a beleza indiscutível que mora nas nossas adoráveis e inegáveis diferenças.

Cresci com déficit de atenção e hiperatividade! E agora?!

Cresci com déficit de atenção e hiperatividade! E agora?!

Viver às voltas com esquecimentos, distrações, falta de foco e tarefas que quase nunca são terminadas, são apenas alguns dos obstáculos diários enfrentados por aqueles que já chegaram à fase adulta e, ou não foram diagnosticados e tratados, ou tiveram diagnóstico, mas não receberam a oportunidade de ter o apoio necessário para desenvolver estratégias eficientes para lidar com as inúmeras peculiaridades daqueles que sofrem de Transtorno de Déficit de atenção, com, ou sem Hiperatividade.

Ao contrário do que se pensa comumente, TDAH não é exclusividade infantil. A descoberta de marcadores diagnósticos desse transtorno tem muito pouco tempo de vida. Até mais ou menos 15 ou 20 anos atrás, os profissionais envolvidos com esses estudos, acreditavam que com a maturidade, as crianças disfuncionais em atenção, ou controle da impulsividade e agitação física e mental, teriam uma melhora nos sintomas e, por consequência, no comportamento.

Hoje, sabe-se que todos os adultos com TDAH trazem esse transtorno da infância e, assim como os pequenos, sofrem com um esmagador sentimento de inadequação, incompreensão e incompetência. Entretanto, sabe-se também que 50% das crianças diagnosticadas e tratadas assertivamente, chegam à vida adulta contando com recursos para identificar e administrar comportamentos advindos desse transtorno.

O fato é que, seja você adulto ou criança, a descoberta de que tem um nome para sua falta de concentração, tendência a adiar decisões e tarefas, incapacidade de tolerar atividades prolongadas ou monótonas, impaciência a ponto de não conseguir ler um livro inteiro, ficar na mesa batendo papo depois de finda a refeição de família, ou ver um filme até o fim, trazem uma bem-vinda sensação de alívio.

O diagnóstico feito com critério, revela que todas essas dificuldades têm explicação científica, caracterizam uma doença tão palpável quanto uma enxaqueca, por exemplo. E, assim como a enxaqueca, o TDAH vai acompanhar o indivíduo por toda uma vida, só que com um bom prognóstico de controle e capacidade de ter uma vida plena e integrada, como qualquer outra pessoa, desde que sejam feitas as adaptações necessárias.

Se um paciente portador de enxaqueca precisa tomar certos cuidados com a alimentação, a postura, a tensão psicológica ou muscular; o paciente de TDAH terá de encontrar também sua própria maneira de conviver com o transtorno, tais como: planejar tarefas por escrito e criar o hábito de checar as anotações, evitar fazer mais de uma atividade ao mesmo tempo, estabelecer pequenas pausas ao longo do dia, fixar metas a serem cumpridas a cada período do dia, reservar momentos para praticar alguma atividade física que lhe traga prazer, gasto energético e relaxamento, dormir bem e por tempo suficiente.

A descoberta e nomeação do transtorno colocam o paciente num outro patamar, em uma posição mais favorável, a partir da qual ele pode perceber que todos os percalços que vem enfrentando e que desorganizam sua vida afetiva, profissional, acadêmica e social, têm solução. Com a ajuda profissional adequada; o apoio e compreensão das pessoas mais próximas – principalmente os familiares e amigos -, em alguns casos, o uso de medicamentos, comprometimento pessoal e postura positiva, aquele que sofre de TDAH encontrará estratégias próprias para ir ao encontro de uma vivência e convivência amplamente satisfatórias.

É importante ter em mente que por trás de um adulto com TDAH, há uma criança e um adolescente que chegaram à maturidade com uma história de menos valia, cuja origem vem tanto da própria autoimagem distorcida, quanto das etiquetas que foram sendo colocadas na testa de sua personalidade em desenvolvimento.

A grande maioria dos adultos portadores de TDAH cresceu com fama de preguiçoso, briguento, folgado, sem caráter e tantas outras pechas atribuídas por aqueles que olharam, mas não foram capazes de enxergar ali alguém que sofria, porque simplesmente não conseguia funcionar de outro jeito. E uma vez incorporadas essas crenças, fica muito mais difícil ressignificar comportamentos e lutar contra a tendência iminente de jogar a toalha e se encaixar num padrão de pensamentos que martelam ideias auto impostas e limitantes: “Eu sou burro!”; “Eu não tenho conserto!”; “Nunca terei sucesso em nada!”; “Sou desinteressante!”.

E esse cocktail formado por comportamentos típicos do transtorno, mais o sentimento cristalizado de incompetência, mais a desvalorização vinda das pessoas no entorno, podem produzir outras comorbidades, como: transtorno de ansiedade, compulsões e depressão. A falta de motivação, causada pelo acúmulo de insucessos e tentativas frustradas para tirar a cabeça para fora do caos, produz indivíduos exaustos e prostrados diante dos desafios da vida.

Em verdade, aquele que sofre de TDAH e já é adulto, quase sempre não tem condições de buscar ajuda por conta própria, posto que um dos traços mais marcantes do transtorno na maturidade é a procrastinação, ou o adiamento crônico. A pessoa vai sempre deixar para amanhã, para a semana que vem, o mês que vem. Enquanto isso, continua sendo tragada pelo mar de tarefas inacabadas, obrigações esquecidas, oportunidades perdidas, relacionamentos negligenciados e falta de amor próprio.

É um enorme nó para ser desfeito, verdade seja dita. Mas é indispensável olhar-se e ser capaz de vislumbrar caminhos mais acertados para lidar com as demandas de uma vida adulta, cheia de desafios e recheada de vivências prazerosas com o outro e com a felicidade de conseguir chegar a termo em seus projetos.

Se você chegou até aqui nesse texto e se identificou com as ideias expostas, ou identificou alguém do seu convívio, talvez você esteja diante do momento exato para recolher medos ou reservas, enfrentar a verdade e buscar ajuda, ou oferecê-la, conforme o caso. Nada é melhor e mais eficiente para nos alçar a uma vida mais plena, do que a posse de nossas reais necessidades.

Pense nisso! Mas não fique só pensando, não… aja. E aja com a mente e o coração abertos. Assim, amanhã, daqui uma semana, ou daqui um mês terá uma história inteiramente nova para contar.

Imagem de capa meramente ilustrativa: Tigrão

Taxa de sinceridade

Taxa de sinceridade

“Quando quis tirar a máscara, estava pegada à cara. Quando a tirei e me vi no espelho, já tinha envelhecido.” Essa crua constatação está no poema Tabacaria, do intenso Fernando Pessoa (1888-1935).

Pensando melhor, nem se trata de uma única máscara. Bem mais, de um conjunto. Já que usamos várias. Pregamos na cara, máscaras que vão se alternando conforme os cenários.

O uso de máscaras é estimulado desde a infância. Uma máscara de boa menina para a menina rebelde. Uma máscara de menino machinho para o menino gentil. A escola, em geral, é uma fábrica de disfarces.

Na vida adulta, o mascaramento continua no mundo do trabalho. Nele, somos encorajados a disfarçar maneiras autênticas de ser. Somos engessados em modos de vestir, sorrir, conversar. As pessoas chamam isso de cultura da empresa.

Mas no fundo sabemos que é a cultura da uniformização, do pensamento único e do modo hierárquico das tomadas de decisões. E todos desfilam mascarados pelos corredores e pelo cafezinho. O alto executivo, a chefe do RH, o motoboy.

Quem mais perde com tudo isso é a sinceridade. A expressão do que cada um é sem filtros ou véus. Aqui também vale citar o poeta Paulo Leminski (1944-1989): “Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é, ainda vai nos levar além.”

Fato! A sinceridade nos leva além do que temos. Ela desafia o coro dos fingidos. Põe verdades na mesa das convenções. Demonstra que ocultar o que somos é um mau negócio. Nos torna infelizes.

Faz algum tempo que resolvi escrever com sinceridade. Não mais tentando ser Clarice Lispector ou Lygia Fagundes Telles. Muito menos ser aquela que experimentará máscaras para dar certo. Descobri que a gente só dá certo assumindo a cara limpa.

É claro que a sinceridade nos coloca em risco real. Haverá aqueles que se decepcionarão, pois esperavam algo maior de nós. Paciência! Pois também haverá os que se identificarão com nosso jeito de ser e fazer. Nada mais bonito do que um rosto sem máscara.

Imagem de capa: Alex Valent/shutterstock

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Há pessoas que são possibilidades, outras aprendizagens

Há pessoas que são possibilidades, outras aprendizagens

“Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem”. Tão verdadeira quanto sarcástica, a frase de Millôr Fernandes revela um fato sobre o comportamento humano: a convivência une ou separa, definitivamente, as pessoas.

Não fomos criados a partir de uma linha de produção, com gostos, inteligências, personalidades e crenças iguais. Portanto, além de sermos diferentes fisicamente, nossas diferenças intelectuais nos permitem crescer como sociedade, permitindo que a ciência e a tecnologia acompanhem esse crescimento.

Conviver é uma necessidade e um exercício diário de respeito e compreensão. Ninguém vive isolado em uma ilha, conversando com uma bola, como no filme Náufrago.

Precisamos da convivência, das conversas jogadas foras, da mesa do bar, do happy hour depois do trabalho, de risadas despretensiosas. Precisamos de pessoas de verdade, que chegam sem avisar e mudam os rumos das nossas vidas. Pessoas que sejam possibilidades de recomeços, de novas chances, de finais felizes.

A vida tenta nos ensinar coisas que, somente vivenciando-as, somos capazes de aprender. Como em um curso de graduação, onde a graduação é representada pela vida e o estágio pelas pessoas, boas ou más, que nos ensinam, na prática, que o convívio social e os interesses particulares, influenciam nossa vida mais do que podemos imaginar.

Lembro de Saramago quando afirmava que o convívio social é o responsável pela formação do caráter humano já que é, através dele, que a vida acontece e não, apenas, nos anseios individuais: “a vida, que parece uma linha reta, não o é. Construímos a nossa vida só nuns cinco por cento, o resto é feito pelos outros, porque vivemos com os outros e, às vezes, contra os outros.” (La Vanguardia, 1997)

É através da convivência que entendemos que as relações são trocas mútuas de sentimentos e que, selecionar as pessoas que entram em nossas vidas, é um respeito à própria vida e um cuidado à própria alma. Começamos a perceber que agressão verbal não é demonstração de afeto, que ciúmes não é amor e que respeito não é atitude facultativa.

Jorge Luis Borges levava isso tão a sério que dizia que “cada pessoa que passa pela nossa vida é única. Sempre “deixa um pouco de si e leva um pouco de nós”. Há os que levaram muito, mas há os que não deixaram nada. Esta é a prova evidente de que duas almas não se encontram por casualidade” (Argentina,1899-1986).

A verdade é que ninguém passa por nossa vida em vão. A diferença é que algumas pessoas são possibilidades de felicidade, outras de lições.

Imagem de capa: Rawpixel.com/shutterstock

Somos o recorte de tudo o que vivemos

Somos o recorte de tudo o que vivemos

 

“Aqueles que passam por nós não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.”

– Antoine de Saint-Exupéry.

Nós somos o recorte de tudo o que vivemos. Somos a síntese de todas as nossas escolhas, de todas as nossas contradições, de todos os caminhos que percorremos e também dos que evitamos. Pablo Neruda já dizia que somos livres para fazer as nossas escolhas, mas que, na mesma medida, somos prisioneiros das consequências. Dessa forma, não há como fugir do que somos, daquilo que decidimos, tampouco há como apagar as nossas histórias, já que são elas que nos formam, em seus ritmos contínuos de construção.

É a partir do contato com o mundo, com o outro, com as decisões que invariavelmente temos que tomar, que nós nos tornamos o que somos. E, por mais que isso pareça óbvio, nem sempre o é, já que, tantas vezes, tentamos voltar no tempo para mudar as coisas, tomar rumos diferentes, cruzar outros sorrisos e percorrer outros olhares. Entretanto, isso apenas nos levaria por outros lugares, que também possuiriam imperfeições e coisas a serem melhoradas. Porque somos seres contraditórios e finitos, tentando imprimir sentido e completude ao caos e ao infinito.

Somos, como fala Galeano, “fodidos, mas sagrados”. E é dessa síntese entre o profano e o sagrado, o real e o misterioso, o humano e o divino, que nos constituímos. Constituição que se dá, sobretudo, por todas as pessoas que cortam a nossa alma. Pois é por elas, com elas, e a partir delas, que nós decidimos ir ou permanecer, virar à esquerda ou à direita, caminhar ou correr, continuar ou voltar. É no encontro com o mundo, mas de sobremaneira, com o que há de humano, demasiado humano nele, que a nossa identidade é formada e que nós respondemos por nosso nome e não por qualquer outro.

Sendo assim, não há como apagar nenhuma das pessoas que passam pela nossa vida, tampouco há necessidade. Todas elas, as melhores e as piores, as que trouxeram alegrias e as que trouxeram tristezas, as sorridentes e as melancólicas, as que produziram orgulho e as que produziram mágoas, as que repentinamente chegaram e vagarosamente se foram, as que vagarosamente se instalaram e de modo repentino foram embora. Elas, todas elas, foram e são importantes para que possamos nos olhar no espelho e nos reconhecer.

Ninguém é inútil na nossa existência. Tudo que sentimos ou deixamos de sentir por alguém, todas as portas que abrimos e que fechamos, ensinam-nos algo ou, pelo menos, possui algo a nos dizer, se estivermos interessados em ouvir. Como disse Exupéry: “Aqueles que passam por nós não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós”.

Há de se aprender, portanto, que, na vida, até o definitivo é transitório, de modo a estarmos em constante transformação e aprendizado por meio das pessoas que nos cruzam, dos caminhos que fazemos, das escolhas que tomamos e das mudanças que nos formam.

Imagem de capa: Myvisuals/shutterstock

Nem sempre quem se sente ofendido está com a razão

Nem sempre quem se sente ofendido está com a razão

Geralmente, quem se ofende demais, com tudo e com todos, é a pessoa que pensa ser o centro do universo, ser a causa e a consequência das ações de quem quer que seja, como se todo mundo agisse pensando nela.

Durante os nossos dias, passaremos por situações várias, que nos agradarão ou nos deixarão irritados, magoados, ou mesmo ofendidos. Primeiramente, ninguém tem a obrigação de agradar a ninguém, a não ser que esteja prestando algum tipo de serviço, ou num relacionamento afetivo, por exemplo. Temos obrigação de ser cordiais sem ultrapassar a dignidade alheia, no entanto, ninguém precisa gostar ou concordar, basta manter o respeito entre as partes.

Ainda assim, existem pessoas que parecem necessitar de paparicos por parte de todos, como se qualquer um tivesse a obrigação de medir as palavras, o tom da voz, a linguagem que seja, ao se comunicar com elas. E, assim, temos que pisar em ovos ao falarmos com elas sobre qualquer assunto, uma vez que tudo o que não as contenta soa a ofensa pessoal, a grosseria, a perseguição.

Geralmente, quem se ofende demais, com tudo e com todos, é aquele tipo de pessoa que pensa ser o centro do universo, ser a causa e a consequência das ações de quem quer que seja, como se todo mundo agisse pensando nela. Esses indivíduos enxergam indiretas até mesmo em um simples “bom dia”, pois, na sua mente egoísta, o que acontece no universo conspira contra eles. Que bom se pudessem se conscientizar do seguinte: na verdade, ninguém liga!

Porque poucos se lembrarão de nós ou se importarão de verdade conosco, e quase ninguém ficará do nosso lado quando não tivermos nada a oferecer, quando precisaremos receber. O dia a dia caótico e acelerado nos impede de ficar agindo de acordo com o que fulano ou ciclano pensarão a respeito, de articularmos nossas atitudes a fim de atingirmos os outros. A grande maioria das pessoas age conforme aquilo que possui dentro de si e pretendendo atingir algum fim que em nada tem a ver com os outros.

Embora existam aqueles que terão prazer em provocar qualquer um que lhes atravessar o caminho, são poucos, em comparação com a maioria de nós, que segue a vida cumprindo com as obrigações e buscando a felicidade. Sentir-se ofendido quando se é diretamente atingido pela maldade alheia é saudável e útil para se defender, porém, sentir-se ofendido com qualquer palavra que disserem, mesmo por parte de quem nem sabe que a gente existe, é descabido e incoerente. Uma pena que quem age dessa forma dificilmente reverá seus conceitos. Uma pena mesmo.

Imagem de capa: Syda Productions/shutterstock

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