O Xadrez das Cores, um curta metragem que fala sobre preconceito, perdas e superação

O Xadrez das Cores, um curta metragem que fala sobre preconceito, perdas e superação

O filme O Xadrez das Cores, de Marco Schiavon, foi lançado em 2004 e traz uma história tensa, que se desenvolve como um jogo de xadrez. A temática, séria e profunda, fala prioritariamente de descriminação racial.

Entretanto, a história ultrapassa a questão racional e aborda questões como a pobreza,  a solidão, a velhice, a perda, e, o que considero mais importante, a superação.

O elenco apresenta Anselmo Vasconcellos, Mirian Pyres, Zezeh Barbosa.

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A incrível geração de mulheres que foi criada para ser tudo o que um homem NÃO quer

A incrível geração de mulheres que foi criada para ser tudo o que um homem NÃO quer

NOTA da CONTI outra: como todo texto de opinião amplamente compartilhado na internet, os posicionamentos de Ruth Manus não agradam a todos. Entretanto, trazem em si a reflexão de uma jovem que, a partir sua própria realidade, empresta a voz para toda uma geração de homens e mulheres que buscam seu lugar social em um mundo em constante transformação.

Vale a reflexão!

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Do original: A incrível geração de mulheres que foi criada para ser tudo o que um homem NÃO quer

Por Ruth Manus

Às vezes me flagro imaginando um homem hipotético que descreva assim a mulher dos seus sonhos:

“Ela tem que trabalhar e estudar muito, ter uma caixa de e-mails sempre lotada. Os pés devem ter calos e bolhas porque ela anda muito com sapatos de salto, pra lá e pra cá.

Ela deve ser independente e fazer o que ela bem entende com o próprio salário: comprar uma bolsa cara, doar para um projeto social, fazer uma viagem sozinha pelo leste europeu. Precisa dirigir bem e entender de imposto de renda.

Cozinhar? Não precisa! Tem um certo charme em errar até no arroz. Não precisa ser sarada, porque não dá tempo de fazer tudo o que ela faz e malhar.

Mas acima de tudo: ela tem que ser segura de si e não querer depender de mim, nem de ninguém.”

Pois é. Ainda não ouvi esse discurso de nenhum homem. Nem mesmo parte dele. Vai ver que é por isso que estou solteira aqui, na luta.

O fato é que eu venho pensando nisso. Na incrível dissonância entre a criação que nós, meninas e jovens mulheres, recebemos e a expectativa da maioria dos meninos, jovens homens, homens e velhos homens.

O que nossos pais esperam de nós? O que nós esperamos de nós? E o que eles esperam de nós?

Somos a geração que foi criada para ganhar o mundo. Incentivadas a estudar, trabalhar, viajar e, acima de tudo, construir a nossa independência. Os poucos bolos que fiz na vida nunca fizeram os olhos da minha mãe brilhar como as provas com notas 10. Os dias em que me arrumei de forma impecável para sair nunca estamparam no rosto do meu pai um sorriso orgulhoso como o que ele deu quando entrei no mestrado. Quando resolvi fazer um breve curso de noções de gastronomia meus pais acharam bacana. Mas quando resolvi fazer um breve curso de língua e civilização francesa na Sorbonne eles inflaram o peito como pombos.

Não tivemos aula de corte e costura. Não aprendemos a rechear um lagarto. Não nos chamaram pra trocar fralda de um priminho. Não nos explicaram a diferença entre alvejante e água sanitária. Exatamente como aconteceu com os meninos da nossa geração.

Mas nos ensinaram esportes. Nos fizeram aprender inglês. Aprender a dirigir. Aprender a construir um bom currículo. A trabalhar sem medo e a investir nosso dinheiro. Exatamente como aconteceu com os meninos da nossa geração.

Mas, escuta, alguém lembrou de avisar os tais meninos que nós seríamos assim? Que nós disputaríamos as vagas de emprego com eles? Que nós iríamos querer jantar fora, ao invés de preparar o jantar? Que nós iríamos gostar de cerveja, whisky, futebol e UFC? Que a gente não ia ter saco pra ficar dando muita satisfação? Que nós seríamos criadas para encontrar a felicidade na liberdade e o pavor na submissão?

Aí, a gente, com nossa camisa social que amassou no fim do dia, nossa bolsa pesada, celular apitando os 26 novos e-mails, amigas nos esperando para jantar, carro sem lavar, 4 reuniões marcadas para amanhã, se pergunta “que raio de cara vai me querer?”.

“Talvez se eu fosse mais delicada… Não falasse palavrão. Não tivesse subordinados. Não dirigisse sozinha à noite sem medo. Talvez se eu aparentasse fragilidade. Talvez se dissesse que não me importo em lavar cuecas. Talvez…”

Mas não. Essas não somos nós. Nós queremos um companheiro, lado a lado, de igual pra igual. Muitas de nós sonham com filhos. Mas não só com eles. Nós queremos fazer um risoto. Mas vamos querer morrer se ganharmos um liquidificador de aniversário. Nós queremos contar como foi nosso dia. Mas não vamos admitir que alguém questione nossa rotina.

O fato é: quem foi educado para nos querer? Quem é seguro o bastante para amar uma mulher que voa? Quem está disposto a nos fazer querer pousar ao seu lado no fim do dia? Quem entende que deitar no seu peito é nossa forma de pedir colo? E que às vezes nós vamos precisar do seu colo e às vezes só vamos querer companhia pra um vinho? Que somos a geração da parceria e não da dependência?

E não estou aqui, num discurso inflamado, culpando os homens. Não. A culpa não é exatamente deles. É da sociedade como um todo. Da criação equivocada. Da imagem que ainda é vendida da mulher. Dos pais que criam filhas para o mundo, mas querem noras que vivam em função da família.

No fim das contas a gente não é nada do que o inconsciente coletivo espera de uma mulher. E o melhor: nem queremos ser. Que fique claro, nós não vamos andar para trás. Então vai ser essa mentalidade que vai ter que andar para frente. Nós já nos abrimos pra ganhar o mundo. Agora é o mundo tem que se virar pra ganhar a gente de volta.

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Na imagem, Amelie Poulain, pensonagem emblemática por sua busca de um lugar no mundo e de sua própria função social no filme O fabuloso destino de Amelie Poulain

Antiautoajuda: Neste mundo, sentir-se mal é sinônimo de excelente saúde mental

Antiautoajuda: Neste mundo, sentir-se mal é sinônimo de excelente saúde mental

“É no cinema e na literatura que nos enternecemos e derrubamos nossas lágrimas ao testemunhar as sutilezas que esquecemos de enxergar ou não somos capazes de enxergar nos nossos dias de autômatos. Os personagens da ficção têm mais carne que nós, precisamos deles para nos lembrar de quem somos. Os robôs já estão aí, temos agora de reinventar os humanos.” Eliane Brum em A delicadeza dos dias

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NOTA da CONTI outra: É com a frase acima que a jornalista e escritora Eliane Brum define no artigo A delicadeza dos dias a fuga que, muitos de nós, ainda encontramos no mundo das artes. Busca-se algo com o quem se identificar, onde aliviar o mal estar constante que, dia a dia, mina o encanto pela vida e pela existência.

É assustador que, ao contrário de inspirar, a arte tenha se tornado rota de fuga existencial. No texto que transcrevo abaixo, a autora segue na construção do raciocínio sobre o mal estar geral da humanidade com outra crítica relevante, a necessidade da antiautoajuda e do enfrentamento do mal estar no sentido de impacto com a realidade.

As ilustrações que selecionamos para acompanhar o texto são de John Holcroft e falam por si.

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Antiautoajuda para 2015

Por Eliane Brum

Em defesa do mal-estar para nos salvar de uma vida morta e de um planeta hostil. Chega de viver no modo avião

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Não tenho certeza se esse ano vai acabar. Tenho uma convicção crescente de que os anos não acabam mais. Não há mais aquela zona de transição e a troca de calendário, assim como de agendas, é só mais uma convenção que, se é que um dia teve sentido, reencena-se agora apenas como gesto esvaziado. Menos a celebração de uma vida que se repactua, individual e coletivamente, mais como farsa. E talvez, pelo menos no Brasil, poderíamos já afirmar que 2013 começou em junho e não em janeiro, junto com as manifestações, e continua até hoje. Mas esse é um tema para outra coluna, ainda por ser escrita. O que me interessa aqui é que nossos rituais de fim e começo giram cada vez mais em falso, e não apenas porque há muito foram apropriados pelo mercado. Há algo maior, menos fácil de perceber, mas nem por isso menos dolorosamente presente. Algo que pressentimos, mas temos dificuldade de nomear. Algo que nos assusta, ou pelo menos assusta a muitos. E, por nos assustar, em vez de nos despertar, anestesia. Talvez para uma época de anos que, de tão acelerados, não terminam mais, o mais indicado seja não resoluções de ano-novo nem manuais sobre ser feliz ou bem sucedido, mas antiautoajuda.

Quando as pessoas dizem que se sentem mal, que é cada vez mais difícil levantar da cama pela manhã, que passam o dia com raiva ou com vontade de chorar, que sofrem com ansiedade e que à noite têm dificuldade para dormir, não me parece que essas pessoas estão doentes ou expressam qualquer tipo de anomalia. Ao contrário. Neste mundo, sentir-se mal pode ser um sinal claro de excelente saúde mental. Quem está feliz e saltitante como um carneiro de desenho animado é que talvez tenha sérios problemas. É com estes que deveria soar uma sirene e por estes que os psiquiatras maníacos por medicação deveriam se mobilizar, disparando não pílulas, mas joelhaços como os do Analista de Bagé, do tipo “acorda e se liga”. É preciso se desconectar totalmente da realidade para não ser afetado por esse mundo que ajudamos a criar e que nos violenta. Não acho que os felizes e saltitantes sejam mais reais do que o Papai Noel e todas as suas renas, mas, se existissem, seriam estes os alienados mentais do nosso tempo.

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John Holcroft’s work

Olho ao redor e não todos, mas quase, usam algum tipo de medicamento psíquico. Para dormir, para acordar, para ficar menos ansioso, para chorar menos, para conseguir trabalhar, para ser “produtivo”. “Para dar conta” é uma expressão usual. Mas será que temos de dar conta do que não é possível dar conta? Será que somos obrigados a nos submeter a uma vida que vaza e a uma lógica que nos coisifica porque nos deixamos coisificar? Será que não dar conta é justamente o que precisa ser escutado, é nossa porção ainda viva gritando que algo está muito errado no nosso cotidiano de zumbi? E que é preciso romper e não se adequar a um tempo cada vez mais acelerado e a uma vida não humana, pela qual nos arrastamos com nossos olhos mortos, consumindo pílulas de regulação do humor e engolindo diagnósticos de patologias cada vez mais mirabolantes? E consumindo e engolindo produtos e imagens, produtos e imagens, produtos e imagens?

A resposta não está dada. Se estivesse, não seria uma resposta, mas um dogma. Mas, se a resposta é uma construção de cada um, talvez nesse momento seja também uma construção coletiva, na medida em que parece ser um fenômeno de massa. Ou, para os que medem tudo pela inscrição na saúde, uma das marcas da nossa época, estaríamos diante de uma pandemia de mal-estar. Quero aqui defender o mal-estar. Não como se ele fosse um vírus, um alienígena, um algo que não deveria estar ali, e portanto tornar-se-ia imperativo silenciá-lo. Defendo o mal-estar – o seu, o meu, o nosso – como aquilo que desde as cavernas nos mantém vivos e fez do homo sapiens uma espécie altamente adaptada – ainda que destrutiva e, nos últimos séculos, também autodestrutiva. É o mal-estar que nos diz que algo está errado e é preciso se mover. Não como um gesto fácil, um preceito de autoajuda, mas como uma troca de posição, o que custa, demora e exige os nossos melhores esforços. Exige que, pela manhã, a gente não apenas acorde, mas desperte.

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John Holcroft’s work

Anos atrás eu escreveria, como escrevi algumas vezes, que o mal-estar desta época, que me parece diferente do mal-estar de outras épocas históricas, se dá por várias razões relacionadas à modernidade e a suas criações concretas e simbólicas. Se dá inclusive por suas ilusões de potência e fantasias de superação de limites. Mas em especial pela nossa redução de pessoas a consumidores, pela subjugação de nossos corpos – e almas – ao mercado e pela danação de viver num tempo acelerado.

 

Sobre essa particularidade, a psicanalista Maria Rita Kehl escreveu um livro muito interessante, chamado O Tempo e o Cão (Boitempo), em que reflete de forma original sobre o que as depressões expressam sobre o nosso mundo também como sintoma social. Logo no início, ela conta a experiência pessoal de atropelar um cachorro na estrada – e a experiência aqui não é uma escolha aleatória de palavra. Kehl viu o cachorro, mas a velocidade em que estava a impedia de parar ou desviar completamente dele. Conseguiu apenas não matá-lo. Logo, o animal, cambaleando rumo ao acostamento, ficou para trás no espelho retrovisor. É isso o que acontece com as nossas experiências na velocidade ditada por essa época em que o tempo foi rebaixado a dinheiro – uma brutalidade que permitimos, reproduzimos e com a qual compactuamos sem perceber o quanto de morte há nessa conversão.

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John Holcroft’s work

Sobre a aceleração, diz a psicanalista: “Mal nos damos conta dela, a banal velocidade da vida, até que algum mau encontro venha revelar a sua face mortífera. Mortífera não apenas contra a vida do corpo, em casos extremos, mas também contra a delicadeza inegociável da vida psíquica. (…) Seu esquecimento (do cão) se somaria ao apagamento de milhares de outras percepções instantâneas às quais nos limitamos a reagir rapidamente para em seguida, com igual rapidez, esquecê-las. (…) Do mau encontro, que poderia ter acabado com a vida daquele cão, resultou uma ligeira mancha escura no meu para-choque. (…) O acidente da estrada me fez refletir a respeito da relação entre as depressões e a experiência do tempo, que na contemporaneidade praticamente se resume à experiência da velocidade”. O que acontece com as manchas escuras, com o sangue deixado para trás, dentro e fora de nós? Não são elas que nos assombram nas noites em que ofegamos antes de engolir um comprimido? Como viver humanamente num tempo não humano? E como aceitamos ser submetidos à bestialidade de uma vida não viva?

Hoje me parece que algo novo se impõe, intimamente relacionado a tudo isso, mas que empresta uma concretude esmagadora e um sentido de urgência exponencial a todas as questões da existência. E, apenas nesse sentido, algo fascinante. A mudança climática, um fato ainda muito mais explícito na mente de cientistas e ambientalistas do que da sociedade em geral é esse algo. A evidência de que aquele que possivelmente seja o maior desafio de toda a história humana ainda não tenha se tornado a preocupação maior do que se chama de “cidadão comum” é não uma mostra de sua insignificância na vida cotidiana, mas uma prova de sua enormidade na vida cotidiana. É tão grande que nos tornamos cegos e surdos.

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John Holcroft’s work

Em uma entrevista recente, aqui publicada como “Diálogos sobre o fim do mundo”, o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro evoca o pensador alemão Günther Anders (1902-1992) para explicar essa alienação. Anders afirmava que a arma nuclear era uma prova de que algo tinha acontecido com a humanidade no momento em que se mostrou incapaz de imaginar os efeitos daquilo que se tornou capaz de fazer. Reproduzo aqui esse trecho da entrevista: “É uma situação antiutópica. O que é um utopista? Um utopista é uma pessoa que consegue imaginar um mundo melhor, mas não consegue fazer, não conhece os meios nem sabe como. E nós estamos virando o contrário. Nós somos capazes tecnicamente de fazer coisas que não somos nem capazes de imaginar. A gente sabe fazer a bomba atômica, mas não sabe pensar a bomba atômica. O Günther Anders usa uma imagem interessante, a de que existe essa ideia em biologia da percepção de fenômenos subliminares, abaixo da linha de percepção. Tem aquela coisa que é tão baixinha, que você ouve mas não sabe que ouviu; você vê, mas não sabe que viu; como pequenas distinções de cores. São fenômenos literalmente subliminares, abaixo do limite da sua percepção. Nós, segundo ele, estamos criando uma outra coisa agora que não existia, o supraliminar. Ou seja, é tão grande, que você não consegue ver nem imaginar. A crise climática é uma dessas coisas. Como é que você vai imaginar um troço que depende de milhares de parâmetros, que é um transatlântico que está andando e tem uma massa inercial gigantesca? As pessoas ficam paralisadas, dá uma espécie de paralisia cognitiva”.

O fato de se alienar – ou, como fazem alguns, chamar aqueles que apontam para o óbvio de “ecochatos”, a piada ruim e agora também velha – nem impede a corrosão acelerada do planeta nem a corrosão acelerada da vida cotidiana e interna de cada um. O que quero dizer é que, como todos os nossos gritos existenciais, o fato de negá-los não impede que façam estragos dentro de nós. Acredito que o mal-estar atual – talvez um novo mal-estar da civilização – é hoje visceralmente ligado ao que acontece com o planeta. E que nenhuma investigação da alma humana desse momento histórico, em qualquer campo do conhecimento, possa prescindir de analisar o impacto da mudança climática em curso.

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John Holcroft’s work

De certo modo, na acepção popular do termo “clima”, referindo-se ao estado de espírito de um grupo ou pessoa, há também uma “mudança climática”. Mesmo que a maioria não consiga nomear o mal-estar, desconfio que a fera sem nome abra seus olhos dentro de nós nas noites escuras, como o restante dos pesadelos que só temos quando acordados. Há esse bicho que ainda nos habita que pressente, mesmo que tenha medo de sentir no nível mais consciente e siga empurrando o que o apavora para dentro, num esforço quase comovente por ignorância e anestesia. E a maior prova, de novo, é a enormidade da negação, inclusive pelo doping por drogas compradas em farmácias e “autorizadas” pelo médico, a grande autoridade desse curioso momento em que o que é doença está invertido.

São Paulo é, no Brasil, a vitrine mais impressionante dessa monumental alienação. A maior cidade do país vem se tornando há anos, décadas, um cenário de distopia em que as pessoas evoluem lentamente entre carros e poluição, encurraladas e cada vez mais violentas nos mínimos atos do dia a dia. No último ano, a seca e a crise da água acentuaram e aceleraram a corrosão da vida, mas nem por isso a mudança climática e todas as questões socioambientais relacionadas a ela tiveram qualquer impacto ou a mínima relevância na eleição estadual e principalmente na eleição presidencial. Nada. A maioria, incluindo os governantes, sequer parece perceber que a catástrofe paulista, que atinge a capital e várias cidades do interior, é ligada também à devastação da Amazônia. O tal “mundo como o conhecemos” ruindo e os zumbis evolucionando por ruas incompatíveis com a vida sem qualquer espanto. Nem por isso, ouso acreditar, deixam sequer por um momento de ser roídos por dentro pela exterioridade de sua condição. A vida ainda resiste dentro de nós, mesmo na Zumbilândia. E é o mal-estar que acusa o que resta de humano em nossos corpos.

É de um cientista, Antonio Nobre, um texto fundamental. Ler “O futuro climático da Amazônia” não é uma opção. Faça um favor a si mesmo e reserve uma hora ou duas do seu dia, o tempo de um filme, entre na internet e leia as 40 páginas escritas numa linguagem acessível, que faz pontes com vários campos do conhecimento. Há trechos de grande beleza sobre a maior floresta tropical do planeta, território concreto e simbólico sobre o qual o senso comum, no Brasil alimentado pela propaganda da ditadura civil-militar, construiu uma ideia de exploração e de nacionalismos que só vigora até hoje por total desconhecimento. É também por ignorância nossa que o atual governo, reeleito para mais um mandato, comanda na Amazônia seu projeto megalômano de grandes hidrelétricas com escassa resistência. E causa, agora, neste momento, um desastre ambiental de proporções não mensuradas em vários rios amazônicos e o etnocídio dos povos indígenas da bacia do Xingu.

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John Holcroft’s work

Antonio Nobre mostra como uma floresta com um papel – insubstituível – na regulação do clima do Brasil e do planeta teve, nos últimos 40 anos, 762.979 quilômetros quadrados desmatados: o equivalente a três estados de São Paulo ou duas Alemanhas. Ou o equivalente a mais de 12 mil campos de futebol desmatados por dia, mais de 500 por hora, quase nove por minuto. Somando-se a área de desmatamento corte raso com a área degradada, alcançamos a estimativa aterradora de que, até 2013, 47% da floresta amazônica pode ter sido impactada diretamente por atividade humana desestabilizadora do clima. “A floresta sobreviveu por mais de 50 milhões de anos a vulcanismos, glaciações, meteoros, deriva do continente”, escreve Nobre. “Mas em menos de 50 anos está ameaçada pela ação de humanos.” A Amazônia dá forma ao momento da História em que a humanidade deixa de temer a catástrofe para se tornar a catástrofe.

Como é possível que isso aconteça bem aqui, agora, e tão poucos se importem? Se não despertarmos do nosso torpor assustado, nossos filhos e netos poderão viver e morrer não com a Amazônia transformada em savana, mas sim em deserto, com gigantesco impacto sobre o clima do planeta e a vida de todas as espécies. Para se ter uma ideia da magnitude do que estamos fazendo, por ação ou por omissão, por alienação, anestesia ou automatismo, alguns dados. Uma árvore grande transpira mais de mil litros de água por dia. A cada 24 horas a floresta amazônica lança na atmosfera, pela transpiração, 20 bilhões de toneladas de água – ou 20 trilhões de litros de água. Para se ter uma ideia comparativa, o rio Amazonas lança menos que isso – cerca de 17 bilhões de toneladas de água por dia– no oceano Atlântico. Não é preciso ser um cientista para imaginar o que acontecerá com o planeta sem a floresta.

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John Holcroft’s work

Nobre defende que já não basta zerar o desmatamento. Alcançamos um nível de destruição em que é preciso regenerar a Amazônia. A floresta não é o “pulmão do mundo”, ela é muito mais do que isso: é o seu coração. Não como uma frase ultrapassada e clichê, mas como um fato científico. É o mundo e não só o Brasil que precisa se engajar nessa luta: o cientista defende que, se não quisermos alcançar o ponto de não retorno, deveríamos empreender – já, agora – um esforço de guerra: começando por uma guerra contra a ignorância. Fazer uma campanha tão forte e eficaz como aquela contra o tabaco. Isso, claro, se quisermos continuar a viver.

Nessa época de tanta conexão, em que a maioria passa quase todo o tempo de vigília conectado na internet, há essa desconexão mortífera com a realidade do planeta – e de si. Como cidadão, a maioria no máximo recicla o seu lixo, achando que está fazendo um enorme esforço, mas não se informa nem participa dos debates e das decisões sobre as questões do clima, da Amazônia e do meio ambiente. Neste e em vários sentidos, é como existir no “modo avião” do celular. Um estar pela metade, o suficiente apenas para cumprir o mínimo e não se desligar por completo. Um contato sem contato, um toque que não toca nem se deixa tocar. Um viver sem vida.

É preciso sentir o mal-estar. Sentir mesmo – e não silenciá-lo das mais variadas maneiras, inclusive com medicação. Ou, como diz a pensadora americana Donna Haraway: “É preciso viver com terror e alegria”.

Só o mal-estar pode nos salvar.

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Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes – o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos e do romance Uma Duas.

Depressão, o segredo que compartilhamos, Andrew Solomon

Depressão, o segredo que compartilhamos, Andrew Solomon

“O oposto de depressão não é felicidade, e sim vitalidade, e ela parecia fugir de mim naquele momento.”

Em uma palestra tão eloquente quanto devastadora, o escritor Andrew Solomon nos leva aos cantos mais escuros de sua mente, nos anos em que lutou contra a depressão. Isso o levou a uma reveladora jornada pelo mundo, entrevistando pessoas com depressão, descobrindo, para sua surpresa, que quanto mais ele falava, mais as pessoas queriam contar suas histórias. (Filmado no TEDxMet.)

Valores morais são fixos? Molly Crockett

Valores morais são fixos? Molly Crockett

O seu senso de justiça depende do que você comeu no café da manhã?

O Prozac pode influenciar o seu julgamento do que é certo ou errado?

Como nós podemos encorajar as pessoas a se importarem com o bem-estar de outros?

A pesquisa de Molly Crockett aborda essas questões.

Ela acredita que compreender o cérebro pode nos permitir criar ambientes que promovam a cooperação em vez do egoísmo.

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A menina e o pássaro encantado, Rubem Alves

A menina e o pássaro encantado, Rubem Alves

Por Rubem Alves

Era uma vez uma menina que tinha um pássaro como seu melhor amigo.
Ele era um pássaro diferente de todos os demais: Era encantado. Os pássaros comuns, se a porta da gaiola estiver aberta, vão embora para nunca mais voltar.
Mas o pássaro da menina voava livre e vinha quando sentia saudades…
Suas penas também eram diferentes. Mudavam de cor. Eram sempre pintadas pelas cores dos lugares estranhos e longínquos por onde voava.
Certa vez, voltou totalmente branco, cauda enorme de plumas fofas como o algodão.
“- Menina, eu venho de montanhas frias e cobertas de neve, tudo maravilhosamente branco e puro, brilhando sob a luz da lua, nada se ouvindo a não ser o barulho do vento que faz estalar o gelo que cobre os galhos das árvores. Trouxe, nas minhas penas, um pouco de encanto que eu vi, como presente para você…”.
E assim ele começava a cantar as canções e as estórias daquele mundo que a menina nunca vira. Até que ela adormecia, e sonhava que voava nas asas do pássaro.
Outra vez voltou vermelho como fogo, penacho dourado na cabeça.
“… Venho de uma terra queimada pela seca, terra quente e sem água, onde os grandes, os pequenos e os bichos sofrem a tristeza do sol que não se apaga.
Minhas penas ficaram como aquele sol e eu trago canções tristes daqueles que gostariam de ouvir o barulho das cachoeiras e ver a beleza dos campos verdes.”
E de novo começavam as estórias.

A menina amava aquele pássaro e podia ouvi-lo sem parar, dia após dia. E o pássaro amava a menina, e por isso voltava sempre.
Mas chegava sempre uma hora de tristeza.
“- Tenho que ir”, ele dizia.
“- Por favor não vá, fico tão triste, terei saudades e vou chorar….”.
“- Eu também terei saudades”, dizia o pássaro. “– Eu também vou chorar.Mas eu vou lhe contar um segredo: As plantas precisam da água, nós precisamos do ar, os peixes precisam dos rios… E o meu encanto precisa da saudade. É aquela tristeza, na espera da volta, que faz com que minhas penas fiquem bonitas. Se eu não for, não haverá saudades. Eu deixarei de ser um pássaro encantado e você deixará de me amar.
Assim ele partiu. A menina sozinha chorava de tristeza à noite, imaginando se o pássaro voltaria. E foi numa destas noites que ela teve uma ideia malvada.
“- Se eu o prender numa gaiola, ele nunca mais partirá; será meu para sempre. Nunca mais terei saudades, e ficarei feliz”.
Com estes pensamentos comprou uma linda gaiola, própria para um pássaro que se ama muito. E ficou à espera.
Finalmente ele chegou, maravilhoso, com suas novas cores, com estórias diferentes para contar.
Cansado da viagem, adormeceu.
Foi então que a menina, cuidadosamente, para que ele não acordasse, o prendeu na gaiola para que ele nunca mais a abandonasse. E adormeceu feliz.
Foi acordar de madrugada, com um gemido triste do pássaro.
“- Ah! Menina… Que é que você fez? Quebrou-se o encanto. Minhas penas ficarão feias e eu me esquecerei das estórias…”.
Sem a saudade, o amor irá embora…
A menina não acreditou. Pensou que ele acabaria por se acostumar. Mas isto não aconteceu. O tempo ia passando, e o pássaro ia ficando diferente. Caíram suas plumas, os vermelhos, os verdes e os azuis das penas transformaram- se num cinzento triste. E veio o silêncio; deixou de cantar.
Também a menina se entristeceu. Não, aquele não era o pássaro que ela amava. E de noite ela chorava pensando naquilo que havia feito ao seu amigo…
Até que não mais aguentou.
Abriu a porta da gaiola.
“- Pode ir, pássaro, volte quando quiser…”.
“- Obrigado, menina. É, eu tenho que partir. É preciso partir para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na saudade, muitas coisas boas começam a crescer dentro da gente. Sempre que você ficar com saudades, eu ficarei mais bonito.
Sempre que eu ficar com saudades, você ficará mais bonita. E você se enfeitará para me esperar…”
E partiu. Voou que voou para lugares distantes. A menina contava os dias, e cada dia que passava a saudade crescia.
“- Que bom, pensava ela, meu pássaro está ficando encantado de novo…”.
E ela ia ao guarda-roupa, escolher os vestidos; e penteava seus cabelos, colocava flores nos vasos…
“- Nunca se sabe. Pode ser que ele volte hoje…
Sem que ela percebesse, o mundo inteiro foi ficando encantado como o pássaro.
Porque em algum lugar ele deveria estar voando. De algum lugar ele haveria de voltar.
AH! Mundo maravilhoso que guarda em algum lugar secreto o pássaro encantado que se ama…
E foi assim que ela, cada noite ia para a cama, triste de saudade, mas feliz com o pensamento.
– Quem sabe ele voltará amanhã….
E assim dormia e sonhava com a alegria do reencontro.

Dica da Conti outra: Conheça o Instituto Rubem Alves e acompanhe seus projetos.

O astrofísico Neil deGrasse Tyson explica “o sentido da vida” para criança de 6 anos

O astrofísico Neil deGrasse Tyson explica “o sentido da vida” para criança de 6 anos

Você já pensou com carinho sobre qual é o sentido da vida? E se uma criança lhe fizesse essa pergunta?

Durante uma  palestra no Wilbur Theatre, de Boston, o astrofísico Neil deGrasse Tyson* foi interrompido por Jack, de 6 anos, que  lhe perguntou qual era o sentido da vida.

Vejam como ele se saiu com a resposta e entenda as palmas da platéia.

Como a literatura pode mudar sua vida – Alain de Botton.

Como a literatura pode mudar sua vida – Alain de Botton.

Nunca é tarde para aprender algumas coisas básicas e embaraçosamente óbvias sobre si mesmo.”

Alain de Botton

Alain de Botton é um escritor e produtor residente em Londres, famoso por popularizar a filosofia e divulgar seu uso na vida cotidiana.

Nesse vídeo, Alain de Botton descreve a literatura como uma série de lentes que podem mudar significativamente a forma como vemos o mundo.

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Uma reflexão psicológica da animação Frozen

Uma reflexão psicológica da animação Frozen

Por Viviane Lajter Segal

Do original: Frozen uma lição de vida

As histórias infantis são repletas de mensagens interessantes sobre a vida, as relações afetivas e familiares. Por esse motivo costumam ser tão encantadoras não somente para as crianças, mas também para os adultos. O filme Frozen é um bom exemplo disso. Possui inúmeras situações e dilemas pessoais e familiares que valem a pena ser analisados mais profundamente.

O filme conta a história de duas irmãs Elsa e Ana que vivem em um castelo com seus pais. Elas são muito amigas quando crianças. Elsa, a mais velha, tem o poder de transformar tudo o que toca em gelo e produzir neve. Isso era motivo para muitas brincadeiras entre elas. Até que um dia ocorre um acidente e Elsa quase mata Ana. Apartir daí seus pais resolvem isolar Elsa até que ela consiga controlar seus poderes e fecham os portões do castelo, para que ninguém saiba dos poderes da filha.  Apagam a memória de Ana sobre os poderes da irmã e não explicam para Ana o motivo do isolamento. Para complicar ainda mais seus pais morrem em um passeio de barco e as irmãs ficam sozinhas e isoladas dentro do castelo.

Relacionamento entre pais e filhos

Um primeiro ponto a ser analisado no filme é a relação familiar. Os pais, movidos pelo medo de Ana se machucar, decidem separar as irmãs sem conversar com elas e explicar seus motivos e intenções. Isso é muito comum nas famílias, os pais tomarem decisões importantes sobre os filhos e não compartilharem com eles. As crianças são bastante sensíveis aos acontecimentos e ao clima do ambiente em que vivem. Apesar de não terem um entendimento completo e profundo como o dos adultos, conseguem entender o suficiente para elas. Por isso, precisam que seus pais expliquem o que está ocorrendo em suas vidas. É uma forma de aproximar as relações, de incluir a criança na família e, principalmente, dessa criança não se sentir desamparada ou esquecida pelos pais.

O que foi exatamente que acabou ocorrendo com Ana. Cresceu solitária, conversando com os personagens dos quadros e gerando uma necessidade enorme por contato com o outro, o que a leva a procurar um romance com o primeiro “príncipe” que surge na história.

“Encobrir, não sentir, nunca saberão”

Outro ponto muito interessante do filme é o de pensarmos de que forma lidamos com as diferenças. É mais fácil esconder e isolar o diferente do que aprender a lidar com ele e aceitá-lo do jeito que ele é? A primeira reação, e a mais fácil, é sempre negar o problema. O pai da Elsa a orienta a encobrir e a não sentir, pois assim nunca saberão da sua diferença. Mas, como isso poderia dar certo? Quando temos alguma característica diferente precisamos primeiramente nos aceitar como somos, entender essa diferença e aprender a conviver com ela. Esconder não vai fazer com que deixemos de ser como somos e, pelo contrário, só vai gerar mais sofrimento. Não é uma tarefa fácil e requer muito autoconhecimento e, muitas vezes, ajuda profissional. Como Elsa não teve nenhuma dessas opções quando pequena cresceu sentindo-se cada vez mais assustada com ela mesma e, consequentemente, tendo os seus poderes mais descontrolados.

Em um determinado momento do filme todos descobrem o poder de Elsa. Ela, apesar de amedrontada, sente-se liberta! Apesar de sozinha, percebe que não precisará mais se esconder. É nesse momento, já adulta, que ela começa a testar os seus limites e a se descobrir.

“Um ato de amor verdadeiro”

Outra parte interessante dessa história é que Ana só conseguiria sobreviver ao congelamento do seu coração através de “um ato de amor verdadeiro” que todos pensam ser um beijo do príncipe como geralmente encontramos nos contos de fadas.

Mas, na verdade Ana é a responsável por sua própria salvação ao ter um ato de amor verdadeiro pela sua irmã e tentar salvá-la da morte. É bastante comum verificarmos esse tipo de atitude quando nos deparamos com algum dilema ou decisão importante a ser tomada. Temos a tendência de esperar que outra pessoa nos salve ou nos mostre o caminho certo para resolução dos nossos problemas. Esperamos ou até mesmo pedimos que alguém decida e a resolva por nós! Mas, será que essa é uma boa tática?

Essa é uma estratégia de fuga, já que o medo nos paralisa e não permite que tomemos uma decisão. Com isso, é mais fácil responsabilizar o outro por algo que não deu certo do que a nós mesmos. O problema é que essa atitude reforça a insegurança que já existia dentro de nós, além de gerar muita frustração, pois quando o medo acaba conseguimos perceber a nossa fraqueza. Portanto, como o filme nos mostra, somos nós que temos a chave para a solução dos nossos problemas.

Esse filme, apesar de infantil, é muito intenso e repleto de lições de vida. Recomendo àqueles que ainda não tiveram a oportunidade de assisti-lo que o façam pelo menos uma vez. É um belo filme. Vale a pena!

Fonte: Frozen: Uma aventura congelante. 2013, Walt Disney Animation Studios.

“É tempo de viver sem medo”, Eduardo Galeano

“É tempo de viver sem medo”, Eduardo Galeano

Por Nara Rúbia Ribeiro

Em 2011 ocorreu, em Estoril, uma Conferência cujo tema era “Segurança”. Nessa ocasião, o escritor Mia Couto proferiu um festejado discurso, intitulado: “Murar o medo”.

Afirmou Mia Couto, dentre outras tantas verdades:
“Há muros que separam nações, há muros que dividem pobres e ricos. Mas não há hoje no mundo muro que separe os que têm medo dos que não têm medo.”

Ao encerrar sua fala, o escritor menciona palavras de Galeano:
“Os que trabalham têm medo de perder o trabalho. Os que não trabalho têm medo de nunca encontrar trabalho. Quando não têm medo da fome, tem medo da comida. Os civis têm medo dos militares e os militares têm medo da falta de armas e as armas têm medo da falta de guerras.”

E encerrou: “E se calhar, acrescento eu. Há quem tenha medo que o medo acabe.”

Vale, aqui, conhecermos integralmente as palavras citadas por Eduardo Galeano, na fala citada por Mia Couto.

Dicas para mudar nosso jeito de pensar – Flávio Gikovate

Dicas para mudar nosso jeito de pensar – Flávio Gikovate

As pessoas parecem ser governadas por uma série de crenças, ideias pré-moldadas que ocupam um espaço enorme na subjetividade.

Curiosamente elas se apegam a esses modos de pensar como se fossem verdades mesmo quando os frutos são negativos…

Por que as pessoas não aprendem a buscar novas soluções para velhos problemas?

Esse blog possui a autorização de Flávio Gikovate para reprodução desse material.

Para mais informações sobre Flávio Gikovate
Site: www.flaviogikovate.com.br
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Livros: www.gikovatelojavirtual.com.br

Uma visão otimista sobre as redes sociais

Uma visão otimista sobre as redes sociais

Por Marcela Picanço

Estamos todos conectados. De uma forma física, eu quero dizer. A internet possibilitou encurtar tempo e espaço que conhecíamos como “real”. Algo que você diz aqui no Brasil pode ser lido por alguém no Japão, no segundo em que algum conteúdo foi postado online. Isso todo mundo já está cansado de saber, mas, mesmo assim, insistem em falar mal das redes sociais e afirmar como a vida era melhor antes do Facebook. Casais se separam por causa do Whatsapp, a inveja da vida alheia começa a parecer algo comum e a ideia de que não estamos vivendo algo real nos apavora. E adivinha? Ainda assim, continuamos postando nossas fotos no Instagram, com um filtro legal, para dizer onde estávamos.

Falar mal dessas redes sociais é uma forma de não saber lidar com essa nova maneira de se comunicar. Achar que uma realidade virtual é menos real do que a fora do mundo online pode ser uma ilusão, porque não é como um sonho em que você vive certas coisas e depois elas não existem mais. Nas redes sociais, a vida continua bem viva e é possível trocar ideias, manter contato com velhos amigos e se apaixonar perdidamente. Se isso é irreal, então não sei o que é real. Vivem nos dizendo que temos que aproveitar mais a nossa vida off-line, mas acho que a gente já aproveita a nossa vida off-line quando estiver a fim. Às vezes, a discussão no Facebook está realmente mais interessante do que o papo furado da mesa. Vai saber.

As redes sociais são apenas novas formas de comunicação, que, claro, estão transformando o mundo e nossas relações. Mas nós as criamos. Nós é que temos a capacidade e o poder de decidir quando podemos ficar online. Nossos smartphones são realmente uma forma de dividir esse tempo, mas eu não considero isso uma coisa ruim. E alguns vão dizer: “a parte ruim é que a pessoa está lá, mas ao mesmo não está lá. Ela está conversando com outra pessoa pelo whatsapp e não com quem está à sua frente”. De fato isso acontece, mas cabe a ela saber o momento de dividir a atenção. Ela pode estar com você e compartilhando esse momento com outra pessoa, fazendo com que a outra pessoa também faça parte do momento. E isso é mágico. É como se a gente tivesse superado os limites da distância. Essa comunicação à distância nunca vai ser o necessário para matar a saudade, mas ajuda bastante. É uma bobagem achar que a gente vai se acostumar com isso e que as relações vão ficar mais frias. Nós é que devemos criar os limites, porque somos nós que nos comunicamos e nós é que usamos todas essas ferramentas online.

Talvez a gente esteja só com medo do que essa nova forma de comunicação pode nos causar. É um novo espaço para nos comunicarmos e criamos ideias a partir daí. Estamos apenas facilitando as coisas. Não há nada de irreal na vida online, por mais que afirmem que todo mundo posta só coisas boas, que querem passar a ideia de uma falsa vida e que ninguém é tão feliz assim. Mas, por que as pessoas vão postar sobre as coisas ruins? Talvez uma pessoa querendo mostrar uma vida incrível pelas redes sociais tenha realmente uma vida incrível, ou pode estar com a auto-estima tão baixa, que precise de atenção constantemente. Mas ela daria um jeito de conseguir isso mesmo fora do Instagram. Talvez fulaninho não esteja postando uma foto para mostrar que a vida dele é melhor do que a sua, mas para simplesmente compartilhar um momento com os amigos, para que, de certa forma, todos estejam conectados. Agora, você tem a capacidade de saber onde as pessoas que você conhece estão, ou o que fazem. A gente pode não falar com uma pessoa há séculos, mas sabe que ela teve neném recentemente e está feliz. Descobre que o outro amigo foi promovido, que o outro encontrou o amor da vida. Às vezes, a gente nem conhece a pessoa direito, mas curte um monte de coisas engraçadas que ela posta. Você se sente mais perto de todo mundo. Agora, é possível ter uma visão geral do que está acontecendo. E algumas pessoas vão dizer que isso é ruim, porque a gente deveria estar vivendo a própria vida. Mas, sabe, uma coisa não exclui a outra. O fato de você saber o que fulaninho está fazendo não deveria interferir na sua vida de uma forma ruim. Se interfere, a culpa não é das mídias sociais.

Essa nova forma de comunicação é apenas uma expansão dos nossos conhecimentos e da nossa vivência. É um novo jeito de compartilhar tudo isso e receber mais informação em troca. A gente ainda está meio perdido, mas muita gente já criou várias coisas bacanas por causa dessa troca que a Internet nos proporciona. A gente deve encontrar formas de encaixar essa vida virtual na nossa vida off-line e construir ideias que vão além disso. Devemos olhar para as mídias sociais como uma ferramenta e não como algo que nos aliena do mundo real ou que nos distancia das pessoas. É justamente o contrário. Precisamos agregar. Nunca, na história da humanidade, tivemos tantas oportunidades escancaradas à nossa frente. Isso assusta, mas ao mesmo tempo é o que temos de mais valioso na nossa geração. Vamos olhar para essas novas formas de comunicação como uma opção e não como um fardo da humanidade egoísta e mesquinha. Tudo que você postar ali vai começar a fazer parte da história do mundo. Cada um usa a ferramenta da forma que lhe convém. Faça bom uso das redes sociais.

Preconceito e estereótipo

Preconceito e estereótipo

“Muitas pessoas pensam que estão a pensar quando estão apenas a re-arrumar os seus preconceitos.”

William James

No youtube existe um canal chamado Minutos Psíquicos onde podemos encontrar diversos vídeos ilustrados de poucos minutos falando sobre temáticas da área da Psicologia.

Você sabe qual é a diferença entre preconceito, estereótipo e discriminação? E você sabia que é possível possuir preconceito contra um grupo sem ter consciência desse preconceito?

Abaixo, em 4 minutos, uma explanação sobre o assunto.

As ilustrações são de Pedro Francisco, vídeo/edição de Pedro Costa e voz e texto de André Rabelo.

Espero que seja útil!

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Você é linda. Obrigada. Eu te amo.

Você é linda. Obrigada. Eu te amo.

Por Tatiana Nicz

Alguns anos atrás, para ser mais precisa oito, minha mãe começou a agir de maneira estranha e confusa. Minha irmã, que convivia mais com ela, foi a primeira a notar. Com o tempo também comecei a reparar que minha mãe andava muito confusa. Esse foi o começo de uma longa dura jornada ao desconhecido mundo da neurociência. Eu digo desconhecido porque o que aprendi nesse tempo é que, apesar de tantos estudos envolvendo o funcionamento do cérebro humano, ele ainda é território misterioso. Claro, tivemos muitos avanços, mas muita coisa permanece ainda inexplicável e isso torna qualquer doença nessa área mais complicada.

A primeira dificuldade já veio de cara em encontrar um diagnóstico convincente. Levamos minha mãe em muitos psicólogos, psiquiatras e neurologistas, todos admitiam que o comportamento dela era anormal, mas nenhum soube diagnosticar o que acontecia. Afinal ela tinha 55 anos e uma saúde física impecável sem nenhum histórico aparente de doenças neurológicas na família. Como ela continuava confusa, continuamos fazendo exames. Até que nos indicaram um médico conceituado que só atendia via particular, após alguns exames de cintilografia o médico renomado sem nos decepcionar, deu o diagnóstico: demência no lobo fronto temporal, mais conhecida como demência frontotemporal e usou a palavra degenerativa.

Eu lembro que sai do médico bem atordoada, parecia que tinha levado uma pancada na cabeça. Não lembro exatamente se minha mãe, que estava comigo, se deu conta. A verdade é que eu não tinha entendido a magnitude do que exatamente isso implicaria na sua vida e na minha e pelo visto, os médicos também não. Quando você recebe uma notícia dessas passa mil coisas pela cabeça, na verdade vai um bom tempo para digeri-la, para falar a verdade, dez anos se passaram e acho que até hoje ainda não digeri tudo.

Uma rápida pesquisa na internet e descobri que a demência frontotemporal tem causas desconhecidas e sintomas muito parecidos com Alzheimer, é também uma doença degenerativa que afeta a memória, entre outras coisas, por isso o tratamento é o mesmo. Eu nunca convivi com pacientes de Alzheimer, mas pelo pouco que sei, apesar de ser parecida é diferente e acho que deveria ser melhor estudada e entendida. De lá para cá trocamos de médicos muitas vezes, o coquetel de remédios não parece fazer muito efeito, mas segundo o médico se ela não tomar a doença terá progressão mais rápida ainda e eu não quero fazer esse teste. Então sigo à risca o que os médicos falam.

Existe muita, mas muita desinformação nessa área e informação “torta”, existe também, no meu leigo entendimento, um certo comodismo da medicina e dos médicos, eles dizem é esse o tratamento e pronto. “Não há o que fazer”, dizem eles em unanimidade. E há dez anos seguimos o mesmo tratamento. E ninguém tenta nada diferente e ninguém dá soluções práticas para te ajudar no dia-a-dia. Então tive que me virar sozinha.  Porque isso eu aprendi, dar nome para doença não quer dizer que você vai receber também uma cartilha de como lidar com ela. O que sei, aprendi no dia-a-dia, na base de (muito) erro e acerto. O problema é que fazer isso com a tua própria vida até dá para encarar, fazer isso com a vida da sua mãe é um pouco mais difícil.

Então se não havia o que fazer me concentrei em fazer com que ela tivesse qualidade de vida. E graças ao trabalho duro do meu avô, na medida do possível, nós podemos proporcionar isso à ela. Nesse momento eu penso  e sinto pelas famílias e pacientes economicamente menos favorecidos, sim porque doença é igual para o pobre e para o rico. O governo dá um dos remédios que é caro para Alzheimer. Todos os outros, também caros, nós compramos. Equipe de cuidadores, tudo isso tem um custo alto.

Eu escrevo esse relato porque tudo que aprendi, aprendi sozinha sem muita orientação. O que os médicos não souberam explicar nem orientar eu fui fazendo por instinto. Porque todos nós temos esse instinto de cuidar do outro. E sei que nem sempre acertei. Então quem sabe minha história (e meus erros) ajude quem também está passando por isso, segue alguns sinceros conselhos:

1. Não subestime a doença:

Qualquer doença que acomete a mente é difícil de entender, mas deve ser levada a sério. A gente se engana com uma aparência saudável. Então tome as devidas providências para evitar acidentes. Um dos meus erros foi ter sido reativa, tomar atitudes só quando a “água batia na bunda” e tentar sempre escutar e respeitar a vontade da minha mãe. Ela morava sozinha, eu sabia que não era bom, mas ela não queria ninguém e eu não soube insistir. O problema é que ela já não tinha total consciência do que era bom ou não. Um dia me ligaram do hospital dizendo que minha mãe havia sido atropelada. Do caminho de casa até o hospital eu sofri muito, eu senti culpa, muita culpa. Esse erro poderia ter lhe custado a vida, felizmente foi apenas um braço quebrado e mais alguns arranhões. A partir desse dia ela nunca mais ficou sozinha. Então não espere para sentir culpa por algo que você poderia ter antecipado e feito, quando achar que tem que fazer, não procrastine, não titubeie, apenas  faça.

 

2. Você vai sentir raiva, tudo bem, sinta raiva.

Você sentirá raiva e se você é capaz de sentir empatia, você também sentirá culpa, muita culpa. Aprenda a conviver pacificamente com elas (acho que quem é mãe entende melhor isso). Viva isso porque faz parte. Se conseguir, seja mais gentil consigo mesmo, perdoe-se. Tente ser paciente, a falta de paciência gera mais culpa. Eu me arrependo de não ter tido mais paciência com minha mãe quando ela esquecia as coisas, quando ela demorava para contar algo e trocava tudo, enfim, em vários momentos. Mas eu sentia raiva, raiva de Deus, raiva dela, raiva de mim porque não conseguia ser melhor e mais paciente com ela. E daí com a raiva vinha a culpa. Enquanto eu lutava contra a raiva e a culpa, elas ganhavam mais força e era uma bola de neve, porque quanto mais raiva eu sentia, menos paciência eu tinha. Então permita-se sentir raiva, sentir culpa e entenda de onde elas vêm. Quando nos permitimos sentir qualquer sentimento mesmo que “ruins”, os sentimentos perdem força. Tome cuidado para não descontar em ninguém e para que esses sentimentos não tomem conta de você. Se fizer, ou melhor, quando fizer, perdoe-se e peça perdão. Respire. Espere. Com o tempo a raiva não passa, mas ela diminui até o ponto de ficar bem mais fácil de conviver com ela e controlá-la.

3. Viva a sua vida.

Essa parte é difícil, porque as pessoas julgam e muito. Porque você se julga, muito. Um paciente com demência não conhece mais limites. E a impressão que tenho é que quanto mais você dá, mais você precisa dar e esse espiral não tem fim. As pessoas olham de fora e pensam que talvez algumas atitudes tuas são egoístas ou injustas. Seja egoísta. Coloque sua vida em primeiro lugar. A pergunta que eu me faço é longa, porém simples: quem está vivendo a minha vida por mim enquanto eu preencho a minha vida com a vida da minha mãe? Então na medida do possível e com amor, coloque limites. E esses limites machucam, mas são necessários. Saiba assumir suas fraquezas e conhecer seus limites, ninguém é super-herói. Aprenda a perder batalhas pelo outro em seu prol. Também aprenda a delegar. Eu levei tempo para fazer isso, com isso sofri mais do que devia, passei mais tempo com raiva do que devia. Quando aprendi, resolvi encerrar essa jornada com minha mãe, por agora. Então minha irmã vai cuidar dela. Quando consegui assumir que cheguei no meu limite sem me sentir derrotada, pude finalizar essa etapa com o coração tranquilo. E quando você não conseguir fazer algo que a “sociedade” acha certo fazer, não se sinta tão culpado, sempre vai ter alguém para apontar seus atos falhos, mas a verdade é que ninguém sabe exatamente o que se passa no seu coração.

contioutra.com - Você é linda. Obrigada. Eu te amo.

4. Para todos e para a vida: não julgue uma batalha que você não está lutando.

Muita gente acha cruel que eu tenha pensado em um lar para minha mãe. Ou que eu não vá visitá-la todos os dias. Moro perto, ligo sempre, vou quando posso. Hoje sei que o maior presente que posso dar para ela é viver minha vida e ser feliz, só assim também valerá a pena o sofrimento dela. Tenho uma consciência tranquila de que fiz o melhor que pude com os recursos que tinha. Algumas vezes não era muita coisa, mas foi o que consegui fazer. Hoje não julgo ninguém que tenha que deixar um parente em um lar. Porque não é uma decisão fácil. Mas independente de idade e em qual momento da vida alguém está, ninguém deve ser privado de viver sua própria vida. E cuidar de alguém com demência toma tempo e dedicação, além de muita paciência. E requer amor, muito amor, um amor incondicional diariamente, coisa que nem sempre estamos bem e somos capazes de dar.

 5. As pessoas se vão. Poucos são os que ficam. Não julgue.

Muita gente não sabe lidar com a dor do outro. O que me faz não contar sobre a minha mãe para muita gente é o olhar de pena dos outros. Ninguém sabe validar a dor do outro nem como agir diante de momentos difíceis, o que sabemos é sentir pena e a pena não constrói ninguém, nem quem sente, nem por quem é sentida. Eu falo isso porque comprei esse “papo” e também tive pena de mim, até que entendi que me fazer de vítima não ia curar minha mãe e nem me fazer feliz, porque felicidade é um propósito de vida, é uma escolha que fazemos todos os dias, independente do que está acontecendo em nossas vidas. Então aceite o que a vida lhe traz e na medida do possível viva bem com isso. Não dá para entender o sentido de tudo racionalmente. É triste? Sim. Como muitas outras histórias também são. O que é, é. E o melhor que podemos fazer quando nos deparamos com a dor de outro é dizer: “não posso fazer muito para diminuir sua dor, mas obrigada por compartilhar isso comigo, estou aqui”. O amor deve ser espontâneo e mora nos pequenos gestos, como em um abraço ou no silêncio. O que aprendi com minha mãe é que a maior prova de amor que damos é conseguir amar alguém que não pode lhe dar nada (ou quase nada) em troca. E apesar de parecer que não existe troca hoje, um dia ela existiu. Entre muitas outras coisas, a minha mãe me deu a vida.

 6. Cuide de você e viva sua vida com amor.

O Budismo fala muito sobre a impermanência da vida. Aprenda a enxergar a beleza nisso e a aceitar o que lhe é ofertado. É clichê, mas a gente esquece. Não sabemos o dia de amanhã, nem quando um médico vai te dar um diagnóstico que mudará sua vida, nem a vida de quem você ama. Esteja presente e aceite o presente que é a vida. Cuide bem de sua saúde e de sua cabeça. Eu levei tempo para aprender isso.

 

 7. Guarde e conte as boas histórias.

 “Malba Tahan conta que dois amigos, Salim e Fahid, viajavam numa caravana para a Pérsia.  Ao cruzarem um rio, Salim foi pego na correnteza, e teria morrido se o amigo não o ajudasse. Agradecido, pediu que seus empregados gravassem numa rocha que ficava na margem do rio: “Aqui, Fahid salvou a vida de seu amigo”. Quando voltavam da Pérsia, depois de atravessarem o mesmo rio, uma discussão tola fez com que os dois brigassem.  Fahid puxou uma espada, e quase mata o amigo a quem havia salvo meses antes.  Depois que os ânimos serenaram, Salim chamou de novo seus empregados e pediu que escrevessem na areia: “Aqui, Fahid tentou matar seu amigo”. “Quando o salvei, você gravou meu gesto numa rocha.  Agora, que quase o matei, você escreve na areia.  Não vê que o vento logo apagará?”, perguntou Fahid. “Esta é a sabedoria”, respondeu Salim,  “Escrever as boas coisas na rocha, e as coisas negativas na areia”.

Como na história, tente guardar os bons feitos e qualidades. Esforce-se para esquecer as historias ruins. Minha mãe nem sempre foi boa para mim, reclamei disso por muito tempo. Hoje nem sempre consigo ser uma boa filha para ela. Porque ser bom o tempo todo é difícil mesmo. Então nós precisamos aprender a guardar as coisas boas e com o tempo isso vai acontecendo naturalmente, hoje lembro com muita clareza de como ela era bela e valente, vaidosa, honesta e de como gostava de fazer caridade.

 8. Cada paciente é diferente.

Com o tempo aprendi a entender os médicos, realmente não existe uma receita pronta que vai te ajudar a lidar com a doença. É puro instinto e bom senso. Porque mesmo que a doença seja uma ela se manifesta de algumas maneiras diferentes de acordo com o paciente. Minha mãe apresenta sintomas que os médicos não sabem explicar. Por exemplo, mesmo em estágio mais avançado da doença, ela se alimenta bem, faz tudo sozinha (claro, com orientação) e é extremamente carinhosa, não tem nenhum traço de agressividade.

 9. Conte com a ajuda de profissionais.

Se você tiver condições financeiras contrate profissionais para te ajudar. Os familiares têm uma relação diferente com o paciente e carregam uma carga emocional muito grande. Cuidadores profissionais podem ter paciência e calma que nem sempre nós familiares temos. E o paciente precisa de pessoas pacientes e calmas. Eu tive muita sorte com todas as cuidadoras e só tenho boas histórias. Elas amam minha mãe e cuidam com muito cuidado dela.

 10. Aprenda o valor das palavras “mágicas” e use-as.

Palavras que aprendemos desde criança e que fazem diferença em nosso dia-a-dia. Não as esqueça, pois minha mãe não as esqueceu. Hoje ela não fala mais nada com coerência, ou melhor, quase nada. Existem três frases que ela usa com muita coerência: todos os dias que ela me vê ela me olha e repete “Você é linda. Obrigada. Eu te amo”.

Mãe: você é linda. Obrigada. Eu te amo.

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