A criação do mundo

A criação do mundo

Por Tarso Araújo

Do original: A criação do mundo

Todos os livros sagrados têm uma resposta sobre a natureza e a origem do Universo. Por que isso é tão importante para as religiões?

No começo, era o nada. Então alguém resolveu contar a origem de tudo. E assim nasceu a tentativa do homem de explicar a origem do Universo. As civilizações mais antigas já tinham essa questão existencial. E as religiões, preocupadas em dar respostas a seus fiéis, não poderiam deixar de formular suas respostas. “Como surgiu tudo? Como é a origem do planeta, das coisas, do homem? Essas são as primeiras perguntas que o homem faz a si mesmo. Sejam indígenas, africanas, orientais, grandes ou pequenas, novas ou antigas, todas as religiões terão respostas para isso”, diz o teólogo da PUC-SP, Rafael Rodrigues, especialista no Antigo Testamento, que começa com a narrativa do livro do Gênese.

Na falta de referências, os homens costumam usar como matéria-prima dos mitos o mundo real para responder essas perguntas transcendentais. Por isso, a cosmologia de cada grupo social é um reflexo da cultura e do momento histórico de quem a inventa. “Os mitos colocam o que é mais importante na cultura local com uma importância proporcional nos mitos de criação”, diz Rodrigues. Logo o sol e a água, essenciais para a produção agrícola e a sobrevivência, sempre ocuparam lugar de destaque na mitologia das civilizações antigas. Muitas histórias sobre a origem do mundo começam contando como esses recursos foram criados ou controlados pelo homem.

Segundo a mitologia iorubá, no início dos tempos havia dois mundos: Orum, espaço sagrado dos orixás, e Aiyê, que seria dos homens, feito apenas de caos e água. Por ordem de Olorum, o deus supremo, o orixá Oduduá veio à Terra trazendo uma cabaça com ingredientes especiais, entre eles a terra escura que jogaria sobre o oceano para garantir morada e sustento aos homens. Para a tradição religiosa chinesa, o caos inicial era como um ovo no qual entraram em equilíbrio os princípios opostos, yin e yang. Desse equilíbrio nasceu Pangu, gigante de cujo corpo se formou a água, a terra e o Sol.

Às vezes os mitos de criação são verdadeiros tratados políticos de sua época. “Só compreendemos o 1º capítulo do Gênese se entendemos a catástrofe dos povos que o escreveram”, diz Rodrigues. A cosmologia judaico-cristã foi escrita por povos dos antigos territórios de Israel e Judá, levados à força para a Babilônia, onde pagavam tributos. “Quando dizem que ‘antes a terra estava vazia e sem forma’, eles não se referem ao planeta, mas ao território deles, que ficou devastado e abandonado após a invasão dos povos assírios.” A ordem de criação das coisas no mito é uma provocação ao poder local. A primeira frase dop Gênese diz que Deus fez a luz. Só no 4º dia Ele criaria o Sol, contrariando a cosmologia dos opressores babilônios, para quem Marduk, o Sol, era o deus supremo e criador de todas as coisas, inclusive da luz.

Ainda contando a tragédia dos povos de Israel e Judá, os capítulos 2 e 3 do Gênese mostram o que acontece quando um camponês perde aquilo que é mais primordial para sua sobrevivência: a horta. “O sentido da palavra que traduzimos para jardim, em hebraico, é horta”, diz Rodrigues. Ao ser expulso do Éden e perdê-la, Adão comerá “o pão com o suor do rosto” e Eva sentirá aumentar “as dores do parto” porquê, em vez de ter filhos de 7 em 7 anos, como era o hábito, terá de engravidar mais vezes para o casal ter mais filhos e mão-de-obra. Trabalhando para os babilônios, eles precisavam produzir mais para pagar impostos. “O mito nasce como uma crítica ao sistema produtivo da época. É um texto antitributarista”, afirma Rodrigues.

A versão de quem lê

A cosmologia das religiões geralmente é elaborada a partir de mitos mais antigos. Ao se apropriar deles, elas se alimentam do mito e ao mesmo tempo o fortalecem. Afinal, elas transformam as lendas em algo mais que a realidade: a verdade de Deus. E é nesse processo de assimilação que geralmente os mitos são organizados em livros sagrados, quando também entram em jogo as interpretações e tradições orais e escritas que vão orientar sua leitura pelos fiéis.

Os mitos do Gênese, por exemplo, foram escritos entre os séculos 8 e 5 a.C., mas a organização deles numa Torá só começaria no século 2 a.C. Nessa época, é provável que o texto tenha sofrido mudanças e adaptações, segundo os ideais do judaísmo nascente. A própria escolha dos textos também obedece os critérios da religião que o organiza, como aconteceria com o Novo Testamento, no início do cristianismo.

Mesmo fora dos livros sagrados, as tradições e interpretações dos mitos de criação fundamentam valores, regras morais e de comportamento para seus seguidores. “Há textos rabínicos que interpretam cada linha do Gênese para mostrar que a mulher não pode dar testemunho em público. Porque, quando ela tomou alguma decisão, levou o homem ao erro e ao pecado. A partir daí aparece toda a questão da sujeição da mulher”, diz Rodrigues. As tradições construídas a partir do texto às vezes se tornam mais fortes no imaginário do que os originais. Quando lembramos de Adão e Eva no paraíso, é comum pensarmos na maçã, como retratado na imagem da página anterior. Apesar de a palavra maçã não aparecer no texto do Gênese.

A cosmologia do hinduísmo também explica, além da origem do mundo, sua organização social. Segundo os Vedas, 3 divindades são responsáveis pelos ciclos de criação e destruição do Universo: Brahma cria, Vishnu preserva e Shiva o destrói para que o ciclo recomece. Para criar o mundo e os humanos, Brahma fez dois deuses de si: Gayatri e Purusha, o homem cósmico de onde foram feitas todas as coisas. Mas, enquanto alguns homens nasceram da boca de Purusha, e se tornaram sacerdotes, outros nasceram dos pés, e se tornaram os escravos da sociedade indiana.

O exemplo da sociedade hindu é apenas mais um exemplo de como os mitos sobre a criação do Universo fazem bem mais que resolver questões existenciais ao estabelecer relações de poder e detalhar códigos de conduta. O que faz deles ferramentas importantes para a coesão social, como parte indispensável da cultura e da identidade de um povo.

O viajante clandestino, Mia Couto

O viajante clandestino, Mia Couto

– Não é arvião. Diz-se: avião.

O menino estranhou a emenda de sua mãe. Não mencionava ele uma criatura do ar? A criança tem a vantagem de estrear o mundo, iniciando outro matrimónio entre as coisas e os nomes. Outros a elas se semelham, à vida sempre recém-chegando. São os homens em estado de poesia, essa infância autorizada pelo brilho da palavra.

– Mãe: avioneta é a neta do avião?

Vamos para a sala de espera, ordenou a mãe. Sala de esperas? Que o miúdo acreditava que todas as sa¬las fossem iguais, na viscosa espera de nascer sempre menos. Ela lhe admolestou, prescrevendo juízo. Aquilo era um aeroporto, lugar de respeito. A senhora apon¬tou os passageiros, seus ares graves, sotúrnicos. O me¬nino mediu-se com aquele luto, aceitando os deveres do seu tamanho. Depois, se desenrolou do colo ma¬terno, fez sua a sua mão e foi à vidraça. Espreitou os imponentes ruídos, alertou a mãe para um qualquer espanto. Mas a sua voz se arfogou no tropel dos mo¬tores.

Eu assistia a criança. Procurava naquele aprendiz de criatura a ingenuidade que nos autoriza a sermos estranhos num mundo que nos estranha. Frágeis onde a mentira credencia os fortes.

Seria aquele menino a fractura por onde, naquela toda frieza, espreitava a humanidade? No aeroporto eu me salvava da angústia através de um exemplar da in¬fância. Valha-nos nós.

O menino agora contemplava as traseiras do céu, seguindo as fumagens, lentas pegadas dos instantâneos aviões. Ele então se fingiu um aeroplano, braços esten¬didos em asas. Descolava do chão, o mundo sendo seu enorme brinquedo. E viajava por seus infinitos, roçan¬do as malas e as pernas dos passageiros entediados. Até que a mãe debitou suas ordens. Ele que recolhesse a fantasia, aquele lugar era pertença exclusiva dos adultos.

– Arranja-te. Estamos quase a partir.

– Então vou despedir do passaporteiro

A mãe corrigiu em dupla dose. Primeiro, não ia a nenhuma parte. Segundo, não se chamava assim ao senhor dos passaportes. Mas só no presente o menino se subditava. Porque, em seu sonho, mais adiante, ele se proclama:

– Quando for grande quero ser passaporteiro.

E ele já se antefruía, de farda, dentro do vidro. Ele é que autorizava a subida aos céus.

– Vou estudar para migraceiro.

– És doido, filho. Fica quieto.

O miúdo guardou seus jogos, constreito. Que crian¬ça, neste mundo, tem vocação para adulto?

Saímos da sala para o avião. Chuviscava. O me¬nino seguia seus passos quando, na lisura do alca¬trão, ele viu o sapo. Encharcado, o bicho saltiritava. Sua boca, maior que o corpo, traduzia o espanto das diferenças. Que fazia ali aquele representante dos primórdios, naquele lugar de futuros apressados?

O menino parou, observente, cuidando os perigos do batráquio. Na imensa incompreensão do asfalto, o bicho seria esmagado por cega e certeira roda.

– Mãe, eu posso levar o sapo?

A senhora estremeceu de horror. Olhou vergonhada, pedindo desculpas aos passantes. Então, começou a disputa. A senhora obrigava o braço do filho, os dois se teimavam. Venceu a secular maternidade. O meni¬no, murcho como acento circunflexo, subiu as escadas, ocupou seu lugar, ajeitou o cinto. Do meu assento eu podia ver a tristeza desembrulhando líquidas missangas no seu rosto. Fiz-lhe sinal, ele me encarou de soslado. Então, em seu rosto se acendeu a mais grata ban¬deira de felicidade. Porque do côncavo de minhas mãos espreitou o focinho do mais clandestino de todos os passageiros.

Mia Couto in Cronicando, Caminho

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Felicidade Clandestina, Clarice Lispector

Felicidade Clandestina, Clarice Lispector

Clarice Lispector é, sem dúvida, um dos maiores gênios da literatura brasileira. No conto abaixo, a escritora conseguiu registrar o que certamente todos nós, apaixonados pela leitura, sentimos quando temos em mãos esse tão querido objeto de desejo: o livro.

Felicidade Clandestina

Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como “data natalícia” e “saudade”. Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.

Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía “As reinações de Narizinho”, de Monteiro Lobato.

Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E, completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.

Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam. No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.

Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono da livraria era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do “dia seguinte” com ela ia se repetir com meu coração batendo.

E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra. Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.

Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!

E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: “E você fica com o livro por quanto tempo quiser.” Entendem? Valia mais do que me dar o livro: “pelo tempo que eu quisesse” é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.

Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.

Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar… Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.

Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.

Este conto faz parte do livro “Felicidade Clandestina e outros contos”, Editora Rocco, 1998.

10 maiores consequências dos contos infantis na formação da personalidade das crianças

10 maiores consequências dos contos infantis na formação da personalidade das crianças

Na última semana nós publicamos o texto Uma reflexão psicológica da animação Frozen, da psicóloga Viviane Lajter Segal. A aceitação dos leitores foi incrível pois, mesmo que no fundo, todo mundo saibe da importância e das lições que as historias infantis têm na vida das crianças. É lá que, junto com seus personagens prediletos, elas enfrentam medos, superam obstáculos, sofrem perdas e lutam por seus objetivos.

Na lista abaixo, elaborada pela Juliana, mãe do Olavinho e administradora do Blog Just real Moms, você encontrará 10 consequências dos contos infantis na formação da personalidade das crianças.

Vale conferir.

1- Ajudam a criança a lidar com as dificuldades e seus sentimentos!

Os contos ajudam a criança a lidar com as dificuldades do seu dia a dia e a elaborar melhor os sentimentos negativos tão comuns na primeira infância, como medo, frustração, abandono, rejeição, rivalidade entre irmãos, inveja, relação com os pais, inferioridade, vingança etc. Por isso, elas pedem para ler diversas vezes a mesma história.

2- Aprendem a diferença entre o bom e o mau!

Os contos mostram que existem os bons e os maus, deixando transparecer valores sempre atuais. A bruxa, o lobo, o pirata e outros personagens maus, representam sentimentos ruins, são arquétipos desses sentimentos, portanto querer que estes personagens morram não é uma atitude violenta, mas sim a necessidade de acabar com estes sentimentos ruins. É preciso lembrar que nas histórias a morte não é violência, é o símbolo da transformação que vai ajudar a criança a elaborar os sentimentos ou sensações que a incomodam.

Não devemos nos preocupar quando a criança festeja a morte desses personagens, eles representam seus medos e esta é a forma que ela tem de vencê-los ou elaborar estes sentimentos que a angustiam.

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Fotografia: Elena Shumilova

3- Aprendem a lidar com as frustrações!

Reconhecer a dor e aceitá-la é um meio de superá-la e assim ser feliz. As crianças aceitam com mais naturalidade as desilusões que encontrarão no dia a dia, pois sabe que, à semelhança do que acontece nos contos de fadas, os esforços desprendidos hão de ter uma grandiosa recompensa.

4- Por meio das histórias podemos trabalhar sentimentos e sensações muito presentes nas crianças!

Ingenuidade: Branca de Neve e Pinóquio (acreditam no personagem do mal)

Feiura: Patinho Feio (um irmão mais bonito do que o outro)

Medo: Chapeuzinho Vermelho, Aladim (medo de estranhos)

Inexperiência: Os Três Porquinhos (o irmão mais velho sabe tudo)

Insegurança: Alice no Pais das Maravilhas, Mogli, Peter Pan (sentir-se inseguro diante de situações novas)

Rejeição: Cinderela

Culpa: Rei Leão, Pinóquio

Dor: A Pequena Sereia

Abandono: João e Maria (sentimento de abandono pela ausência dos pais)

5- Podemos trabalhar o conceito de “finitude”!

Tudo na vida tem um começo, meio e fim. As crianças precisam saber que as pessoas não são como os personagens dos desenhos ou jogos eletrônicos, que nunca morrem. Diante de tanta tecnologia, nunca os contos foram tão importantes e necessários na vida da criança como hoje.

6- Aprendem o “limite”!

Por meio dos contos de fadas a criança consegue discernir o certo do errado, o que pode e o que não pode fazer, enfim, reconhece o sim e o não.

7- Aprendem a ética e valores importantes da vida humana! 

Os contos de fada sobreviveram ao tempo justamente porque contêm ensinamentos que falam à alma da criança, falam de valores imutáveis, caso contrário já teriam desaparecido, apagados pelo tempo e caídos no esquecimento.

Passar valores à criança é algo complexo. As histórias são, por isso, um meio facilitador de resolver algumas das questões que esta tarefa nos coloca. Se, por um lado, divertem as crianças, estimulam a sua curiosidade e promovem competências cognitivas e de oralidade, por outro lado são também a forma de concretizarmos alguns dos valores que consideramos aceitáveis e oportunos transmitir à criança.

Por isso, os pais devem usar e abusar dos contos. Só assim poderão sonhar com um final feliz para nossa sociedade tão carente dos verdadeiros valores.

8- Tornam-se otimistas e com vontade de vencer obstáculos!

Os contos de fadas exercem uma influência muito benéfica na formação da personalidade porque, pela assimilação dos conteúdos da estória, as crianças aprendem que é possível vencer obstáculos e saírem vitoriosas (o herói sempre vence no final). Isso ocorre porque, durante o desenrolar da trama, a criança se identifica com as personagens e “vive” o drama que ali é apresentado de uma forma geralmente simples, porém impactante.

Essas estórias de contos de fadas normalmente começam com “Era uma vez…” e terminam com “viveram felizes para sempre”. Essa ideia cria a esperança de que as coisas na vida podem dar certo e elas podem ter sucesso em suas dificuldades.

9- Cada criança interpreta a estória da sua forma, entenda qual o significado do conto para seu filho! 

Os contos de fadas possuem significados e significantes diferentes em determinadas faixas etárias, como por exemplo, ter um significado para uma criança de cinco anos e outro para uma de treze na mesma estória, já que as situações, os sentimentos, os desejos e anseios são outros.

10- Serão adultos mais felizes!

Os contos de fadas são para serem escutados, apreciados e internalizados, cumprindo desta forma com seu papel que é a construção da personalidade infantil, criando bases sólidas que favoreçam o desenvolvimento intelectual, moral e psíquico. Dessa forma, ao se tornarem adultos, saberão resolver dificuldades, terão uma estrutura mais forte para aguentar seus problemas e saberão que mesmo depois de tantas amarguras terão uma recompensa que será a resolução do que os afligia. Pode não ser a resolução esperada, mas uma coisa é certa: sempre haverá a possibilidade para uma nova descoberta e um recomeço, pois a beleza da vida é justamente lutar por seus ideais e conquistá-los. E isso, só os contos de fadas são capazes de proporcionar ainda na tenra idade!

A menina sem palavra, de Mia Couto

A menina sem palavra, de Mia Couto

A menina não palavreava. Nenhuma vogal lhe saía, seus lábios se ocupavam só em sons que não somavam dois nem quatro. Era uma língua só dela, um dialecto pessoal e intransmissível? Por muito que se aplicassem, os pais não conseguiam percepção da menina. Quando lembrava as palavras ela esquecia o pensamento. Quando construía o raciocínio perdia o idioma. Não é que fosse muda. Falava em língua que nem há nesta atual humanidade. Havia quem pensasse que ela cantasse. Que se diga, sua voz era bela de encantar. Mesmo sem entender nada as pessoas ficavam presas na entonação. E era tão tocante que havia sempre quem chorasse.

Seu pai muito lhe dedicava afeição e aflição. Uma noite lhe apertou as mãozinhas e implorou, certo que falava sozinho:

— “Fala comigo, filha!”

Os olhos dele deslizaram. A menina beijou a lágrima. Gostoseou aquela água salgada e disse:

— “Mar”…

O pai espantou-se de boca e orelha. Ela falara? Deu um pulo e sacudiu os ombros da filha. “Vês, tu falas, ela fala, ela fala!” Gritava para que se ouvisse. “Disse mar, ela disse mar”, repetia o pai pelos aposentos. Acorreram os familiares e se debruçaram sobre ela. Mas mais nenhum som entendível se anunciou.

O pai não se conformou. Pensou e repensou e elaborou um plano. Levou a filha para onde havia mar e mar depois do mar. Se havia sido a única palavra que ela articulara em toda a sua vida seria, então, no mar que se descortinaria a razão da inabilidade.

A menina chegou àquela azulação e seu peito se definhou. Sentou-se na areia, joelhos interferindo na paisagem. E lágrimas interferindo nos joelhos. O mundo que ela pretendera infinito era, afinal, pequeno? Ali ficou simulando pedra, sem som nem tom. O pai pedia que ela voltasse, era preciso regressarem, o mar subia em ameaça.

— “Venha, minha filha!”

Mas a miúda estava tão imóvel que nem se dizia parada. Parecia a águia que nem sobe nem desce: simplesmente, se perde do chão. Toda a terra entra no olho da águia. E a retina da ave se converte no mais vasto céu. O pai se admirava, feito tonto: por que razão minha filha me faz recordar a águia?

— “Vamos filha! Caso senão as ondas nos vão engolir”.

O pai rodopiava em seu redor, se culpando do estado da menina. Dançou, cantou, pulou. Tudo para a distrair. Depois, decidiu as vias do facto: meteu mãos nas axilas dela e puxou-a. Mas peso tão toneloso jamais se viu. A miúda ganhara raiz, afloração de rocha?

Desistido e cansado, se sentou ao lado dela. Quem sabe cala, quem não sabe fica calado? O mar enchia a noite de silêncios, as ondas pareciam já se enrolar no peito assustado do homem. Foi quando lhe ocorreu: sua filha só podia ser salva por uma história! E logo ali lhe inventou uma, assim:

Era uma vez uma menina que pediu ao pai que fosse apanhar a lua para ela. O pai meteu-se num barco e remou para longe. Quando chegou à dobra do horizonte pôs-se em bicos de sonhos para alcançar as alturas. Segurou o astro com as duas mãos, com mil cuidados. O planeta era leve como um baloa.

Quando ele puxou para arrancar aquele fruto do céu se escutou um rebentamundo. A lua se cintilhaçou em mil estrelinhações. O mar se encrespou, o barco se afundou, engolido num abismo. A praia se cobriu de prata, flocos de luar cobriram o areal. A menina se pôs a andar ao contrário de todas as direções, para lá e para além, recolhendo os pedaços lunares. Olhou o horizonte e chamou:

— “Pai!”

Então, se abriu uma fenda funda, a ferida de nascença da própria terra. Dos lábios dessa cicatriz se derramava sangue. A água sangrava? O sangue se aguava? E foi assim. Essa foi uma vez.contioutra.com - A menina sem palavra, de Mia Couto

Chegado a este ponto, o pai perdeu voz e se calou. A história tinha perdido fio e meada dentro da sua cabeça. Ou seria o frio da água já cobrindo os pés dele, as pernas de sua filha? E ele, em desespero:

— “Agora, é que nunca”.

A menina, nesse repente, se ergueu e avançou por dentro das ondas. O pai a seguiu, temeroso. Viu a filha apontar o mar. Então ele vislumbrou, em toda extensão do oceano, uma fenda profunda. O pai se espantou com aquela inesperada fractura, espelho fantástico da história que ele acabara de inventar. Um medo fundo lhe estranhou as entranhas. Seria naquele abismo que eles ambos se escoariam?

— “Filha, venha para trás. Se atrase, filha, por favor”…

Ao invés de recuar a menina se adentrou mais no mar. Depois, parou e passou a mão pela água. A ferida líquida se fechou, instantânea. E o mar se refez, um. A menina voltou atrás, pegou na mão do pai e 0 conduziu de rumo a casa. No cimo, a lua se recompunha.

— “Viu, pai? Eu acabei a sua história!”

E os dois, iluminados, se extinguiram no quarto de onde nunca haviam saído.

10 dicas para melhorar sua mente através da leitura

10 dicas para melhorar sua mente através da leitura

A leitura é uma ótima maneira de desenvolver o seu cérebro. Além de aumentar o seu vocabulário e capacidade de interpretação, também ajuda no armazenamento de informações importantes. Ao ler os clássicos da literatura mundial, você aumenta suas habilidades de escrita e compreensão de textos.

Se você deseja melhorar a sua mente por meio da leitura, veja como os clássicos da literatura podem ajudar:

1. Aumento de vocabulário

Ao ler os clássicos, você vai encontrar muitas palavras que não fazem parte do seu cotidiano. Aprender novas palavras ajuda a enriquecer o seu vocabulário. Ter um amplo vocabulário é como ter um grande arsenal de palavras. Isso permite que você se expresse de maneira mais eloquente. Desenvolvendo essa habilidade você será capaz de se comunicar com precisão e criar uma percepção de mundo inteligente.

2. Melhorar a escrita

Ler os clássicos da literatura é a maneira mais fácil de melhorar a sua escrita. Durante a leitura você acaba absorvendo a gramática e o estilo do autor. Isso contribui para o desenvolvimento da sua escrita melhorando a concordância e gramática.

3. Desenvolver a fala

Antes de se tornar um bom orador, você precisa ser um bom escritor. Estudar as obras que foram desenvolvidas por gênios vai ensinar você a se expressar com clareza e estilo. Ao melhorar seu domínio do idioma, você vai se tornar mais persuasivo, e poderá desfrutar de uma vantagem sobre as pessoas menos articuladas.

4. Novas ideias

Observar as mesmas ideias que as outras pessoas gera um pensamento genérico e repetitivo. Para ser original você precisa desenvolver novas ideias, e isso você pode retirar dos clássicos da literatura. Ao ler os livros você desenvolve a sua inspiração e tem a oportunidade de melhorar a sua criatividade.

5. Perspectiva histórica

Uma pessoa que apenas lê jornais e revistas fica dependente dos preconceitos e modas do seu tempo. Por isso, a leitura de livros antigos é importante para aumentar a sua perspectiva história e desenvolver o senso crítico. Os clássicos são importantes para estimular a sua mente a partir de pensamentos e experiências de outras pessoas.

6. Entretenimento educativo

A leitura de grandes livros é um passatempo divertido. Você pode encontrar muitas curiosidades sobre a história e também o vocabulário da época em que a obra foi escrita. Outra opção é procurar as versões mais modernas dos clássicos, isso também ajuda a aumentar o entretenimento durante a leitura.

7. Sofisticação

Se você gosta de se destacar nas conversas entre amigos, ter conhecimento dos clássicos da literatura é essencial. Você aprofundará suas ideias e desenvolve o senso crítico. Além disso, quando você tem propriedade para falar sobre certo assunto você pode até ganhar uma discussão.

8. Leitura mais eficiente

Ler diversos livros aumenta a sua rapidez na leitura. Por isso, a ideia é procurar livros de diferentes épocas e temas para desenvolver uma leitura mais eficiente.

9. Desenvolve o senso crítico

Se você é um escritor ou blogueiro ignorar os clássicos é um erro. Independentemente do tema que você aborda em seus textos, você precisa ser persuasivo e desenvolver seu senso crítico. A melhor maneira de aprender é com os mestres. Portanto, não perca tempo! Passe algum tempo com os clássicos e tire vantagem sobre isso.

10. Aumenta o repertório

Ler é um ato valioso para o nosso desenvolvimento pessoal e profissional. A literatura clássica é forma de ter acesso às informações e, com elas, buscar melhorias para o mundo. Repertório cultural é importante para escrever bons textos e ser crítico.

Aproveite!

Fonte: Universia Brasil

Feminismo para leigos. Informações e teste

Feminismo para leigos. Informações e teste

Você por acaso está entre aqueles que tem medo da palavra “feminismo”? Sente um frio no estômago, falta de ar, taquicardia…

Que acha que feminista é o inverso de feminina, que se trata de “guerra dos sexos”, na qual a mulher busca a supremacia? Então, você não leu o “Feminismo para leigos”, publicado na Carta Capital, por Clara Averbuck.

Trata-se de um texto claro, lúcido, explicativo. 

Confira.

Feminismo para leigos

Por Clara Averbuck

É comum escutar: “Não sou feminista, sou feminina”; “Não sou feminista e nem machista”. Mas será que você sabe o que é feminismo? Descubra.

É assustadora a quantidade de gente que não sabe o que é feminismo. Ninguém tem a obrigação de saber, é claro, mas a partir do momento em que você decide opinar sobre um assunto, é de bom tom saber do que se trata.  As pessoas são “contra” o feminismo sem sequer saber o que significa.

É comum escutar:

“Não sou feminista, sou feminina”,

“Não sou feminista e nem machista”,

“Não sou feminista e nem machista, sou humanista”,

“Não sou feminista, acho que todos deveriam ser tratados igualmente e ter os mesmos direitos”.

Bom, vamos lá.contioutra.com - Feminismo para leigos. Informações e teste

Feminismo não prega ódio, feminismo não prega a dominação das mulheres sobre os homens. Feminismo clama por igualdade, pelo fim da dominação de um gênero sobre outro. Feminismo não é o contrário de machismo. Machismo é um sistema de dominação. Feminismo é uma luta por direitos iguais.

Então se você diz “não sou feminista, acho que todos deveriam ser tratados igualmente e ter os mesmos direitos” você está dizendo, exatamente: “não sou feminista, mas sou feminista”. E se você se diz humanista, bom, acredito que saiba então que o humanismo é uma filosofia moral baseada na razão humana e na ética, que coloca o ser humano acima do sobrenatural, de deuses, de dogmas religiosos, da pseudociência e das superstições e que não tem nada a ver com o assunto.

Existe essa grande falha lógica que é o sujeito achar que você tem que ser contra uma coisa pra ser a favor de outra; neste caso, “contra” os homens para ser “a favor” das mulheres. O feminismo não luta contra os homens, e sim contra o supracitado sistema de dominação, que, veja só, privilegia os homens e foi criado por… homens. Fica clara a diferença entre lutar contra um sistema e lutar contra todo um gênero?

Feminismo não tem nada a ver com deixar de usar batom, salto ou dar de quatro. Ninguém vai confiscar sua carteirinha de feminista se você usar rímel. Mas te abre para a possibilidade de só usar maquiagem quando quiser, não porque tem que obrigatoriamente estar impecável e linda todos os dias a enfeitar o mundo.

Feminismo não tem nada a ver com ser inimiga dos homens. É claro que existem feministas misândricas, mas você não é obrigada a ser uma delas.

Feminismo não tem nada a ver com esconder o corpo; muito pelo contrário, exigimos o direito de andar com a roupa que bem entendermos sem assédio ou constrangimentos. Taí a Marcha das Vadias que não me deixa mentir.

Feminismo não tem nada a ver com não ter filhos, e sim com a escolha de como e quando esses filhos virão, e se virão.

Feminismo não tem nada a ver com não ser feminina. E nem com ser.

Feminismo tem a ver com liberdade, com eu, você, elas e eles podermos todos viver e ser sem ninguém dando pitaco em como devemos nos portar, como devemos nos vestir, o que devemos dizer, do que devemos fazer com nossos corpos.

Outra coisa importante: nem todas as feministas estão de acordo a respeito de todos os tópicos. Cada um constrói seu feminismo. Como disse a Tavi Gevinson, a jovem editora da RookieMag, em uma palestra do TEDxTeen, o feminismo não é um livro de regras, mas uma discussão, uma conversa, um processo. E cada um tem o seu. Feminismo, caros, não é uma seita que reprime e excomunga quem quebra seus preceitos.

Vale sempre lembrar que o mundo machista também oprime os homens com esse negócio de que eles têm que ser os provedores, que eles têm que ser durões, que não podem chorar, que não podem demonstrar nenhuma característica atribuída ao feminino porque isso é considerado uma fraqueza – já que as mulheres são consideradas mais fracas, logo, inferiores. Gay é “xingamento” porque ser gay é ser um homem mulherzinha. Gente, não dá mais isso, 2013, sabe? Chega de reproduzir conceitos sem sequer parar para pensar neles.

Há um teste simples pra saber se você é uma pessoa que se identifica com o feminismo.

1. Você concorda que uma mulher deve receber o mesmo valor que um homem para realizar o mesmo trabalho?

2. Você concorda que mulheres devem ter direito a votarem e serem votadas?

3. Você concorda que mulheres devem ser as únicas responsáveis pela escolha da profissão, e que essa decisão não pode ser imposta pelo Estado, pela escola nem pela família?<

4. Você concorda que mulheres devem receber a mesma educação escolar que os homens?

5. Você concorda que cuidar das crianças seja uma obrigação de ambos os pais?<

6. você concorda que mulheres devem ter autonomia para gerir seu dinheiro e seus bens?

7. Você concorda que mulheres devem escolher se, e quando, se tornarão mães?

8. Você concorda que uma mulher não pode sofrer violência física ou psicológica por se recusar a fazer sexo ou a obedecer ao pai ou marido?

9. Você concorda que atividades domésticas são de responsabilidade dos moradores da casa, sejam eles homens ou mulheres?

10. você concorda que mulheres não podem ser espancadas ou mortas por não quererem continuar em um relacionamento afetivo?

Respondeu sim pra tudo?

Está confortável na cadeira?

Você é pró-feminismo, ou até… Feminista! Uau!

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Você não precisa ser ativista para ser feminista. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Se você acredita na igualdade de direitos entre homens e mulheres, você é feminista.

As pessoas confundem feminismo com um monte de coisas. As pessoas têm medo da palavra FEMINISMO.

Feminismo. Feminista. Feminismo. Feminista. FE-MI-NIS-MO.

Feminismo é sobre liberdade.

E é difícil ser realmente livre neste mundo.

__________________________________________

Sobre a autora

Clara Averbuck é escritora, feminista e encontrável em www.lugardemulher.com.br

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Por que namoramos umas pessoas e outras não?

Por que namoramos umas pessoas e outras não?

As características pessoais de cada pessoa são fruto de uma conglomerado fascinante de atitudes, crenças, desejos e aspirações. Compreender por que alguém se apaixonou por um homem ou uma mulher- e não por outros- é um desafio que tem atraído a atenção de psicólogos ao longo dos tempos.

Vamos dar uma olhada mais de perto …

O CÉREBRO NO AMOR

Ao nos indagarmos sobre os processos que ocorrem em nosso cérebro quando estamos apaixonados, a magia pode perder um pouco de seu encanto  e a ciência trará informações sobre os neurotransmissores que são capazes de causar a sensação conhecido como “estar nas nuvens”. As endorfinas, encefalinas e feniletilamina são responsáveis por nossa euforia e felicidade, elas nos dão uma injeção de emoções positivas.

Mas o que ativa esses processos? O que faz com que o nosso cérebro obtenha essas respostas químicas frente a algumas pessoas e não a outras?

Teoria 1: similaridades familiares

Às vezes, nós nos sentimentos atraídos por pessoas que nos fazem sentir bem  porque elas nos lembram, em algum aspecto, os nossos pais. Algo nelas nos dá segurança e confiança. Sentimos atração por elas porque, de alguma forma, elas nos são familiares e estar com eles nos envolve uma agradável sensação de afinidade e/ou familiaridade.

Nota CONTI outra: Outras vezes essa atração, que tende a algum tipo de repetição, também pode gerar escolhas de pares que trazem consigo características familiares, porém não positivas como da mulher, filha de pai alcoolista, que casa-se com marido alcoolista (e vice-e-versa).

Teoria 2: correspondência

Outra teoria é a da “correspondência”. De acordo com cientistas o que teria um peso primordial nesses casos seriam as afinidades, as experiências semelhantes. A atração seria fruto da identificação e compartilhamento de gostos e valores semelhantes.

Teoria 3: admiração

Às vezes, a admiração por alguém se traduz em amor. É aquela pessoa que serve como um espelho, onde identificamos fortes aspirações ou dimensões que sempre quisemos para nós mesmos e que de alguma forma ainda não alcançamos. Seria aqui, por exemplo, onde as atrações com pessoas que são muito diferentes de nós aparecem. Podemos nos sentir atraídos por pessoas confiantes, extrovertidas e empreendedoras, enquanto nós somos mais inseguros e até um pouco tímidos. Os opostos se atraem porque, no fundo, complementar é uma tentativa de suprir as necessidades de cada um.

Teoria 4: questão de química, questão de glândulas

Muitos estudos mais atuais falam na importância dos chamados feromônios . Eles são secretados por certas glândulas presentes nos lábios, axilas, pescoço, virilha. São substâncias aparentemente imperceptíveis, mas que são percebidas por nossos corpos e permitem o reconhecimento mútuo e sexual dos indivíduos. Os feromônios são algo único em cada pessoa e que, de alguma forma, também nos determinada.

Estas são as teorias mais comuns quando se fala em paixão. Se, após a atração e o início da relação, os relacionamentos serão bem sucedidos só o tempo dirá, pois, é só quando o estágio da cegueira da paixão perde sua intensidade, suas nuvens e flashes … é que voltamos a ver a realidade.

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Arte: Madame Butterfly de Benjamín Lacombe

Traduzido e adaptado por Josie Conti

Do original em espanhol ¿Por qué nos enamoramos de unas personas y no de otras?

Um simples ato de amor, cria uma onda sem fim

Um simples ato de amor, cria uma onda sem fim

Seja também um propagador de gentilezas, de amor, de carinho, de ajuda… faça de coração, sem esperar nada em troca. Porque um dia, sem que você espere, a vida se encarrega de te devolver todo bem que fizeste ao outro.

Afinal…

“Um simples ato de amor, cria uma onda sem fim.”

Essa é uma campanha Care and Share.

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Agressivo, passivo ou assertivo? Onde será que você se encaixa?

Agressivo, passivo ou assertivo? Onde será que você se encaixa?

No youtube existe um canal chamado Minutos Psíquicos onde podemos encontrar diversos vídeos ilustrados de poucos minutos falando sobre temáticas da área da Psicologia.

Além de indicar o canal, selecionei para você um vídeo em especial que, em 5 minutos, faz a diferenciação entre pessoas de comportamento agressivo, passivo e assertivo.

Entenda a diferença e aproveite as sugestões para a melhora da comunicação.

As ilustrações são de Pedro Francisco, vídeo/edição de Pedro Costa e voz e texto de André Rabelo.

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Ninguém pode alegar ter sucesso sozinho

Ninguém pode alegar ter sucesso sozinho

Leymah Gbowee, a ativista liberiana que ajudou a dar fim à Segunda Guerra Civil da Libéria, discute a percepção do “eu fiz sozinho”, que torna a contemporaneidade um período de individualismo ilusório. Para Gbowee, Prêmio Nobel da Paz, a ideia de ter alcançado algo sozinho representa uma falta de pensamento crítico sobre as situações e sobre todas as pessoas que ajudaram, mesmo que indiretamente, o indivíduo a conquistar suas metas. Conferencista do Fronteiras do Pensamento 2013.

Citações de Milan Kundera, pinturas de Vladimir Kush

Citações de Milan Kundera, pinturas de Vladimir Kush

Milan Kundera é um escritor tcheco de 85 anos, naturalizado francês e que ficou conhecido mundialmente após a publicação do livro “A insustentável leveza do ser”.

Vladimir Kush é um artista russo que, através de suas imagens, retrata mitos, metáforas e poesias.

Da soma desses dois artistas surpreendentes, segue a homenagem abaixo.

***

“Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo ‘esboço’ não é a palavra certa porque um esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada, é um esboço sem quadro.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
contioutra.com - Citações de Milan Kundera, pinturas de Vladimir Kush
Vladimir Kush
“Não estava certo de ter agido bem, mas estava certo de ter agido como queria.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
contioutra.com - Citações de Milan Kundera, pinturas de Vladimir Kush
Vladimir Kush
“O homem não é mais do que a sua imagem. Os filósofos bem podem explicar-nos que a opinião do mundo pouco conta e que só importa aquilo que somos. Mas os filósofos não percebem nada. Enquanto vivermos entre os seres humanos, seremos aquilo que os seres humanos considerarem que somos. Passamos por velhacos ou manhosos quando não paramos de perguntar a nós próprios como nos vêem os outros, quando nos esforçamos por ser o mais simpáticos possível. Mas entre o meu eu e o do outro, existirá algum contacto directo, sem a mediação dos olhos? Será pensável o amor sem uma perseguição angustiada da nossa própria imagem no pensamento da pessoa amada? Quando deixamos de nos preocupar com a maneira como o outro nos vê, deixamos de o amar.”
Milan Kundera, in “A Imortalidade”
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Vladimir Kush
“Caminho: faixa de terra sobre a qual se anda a pé. A estrada distingue-se do caminho não só por ser percorrida de automóvel, mas também por ser uma simples linha ligando um ponto a outro. A estrada não tem em si própria qualquer sentido; só têm sentido os dois pontos que ela liga. O caminho é uma homenagem ao espaço. Cada trecho do caminho é em si próprio dotado de um sentido e convida-nos a uma pausa. A estrada é uma desvalorização triunfal do espaço, que hoje não passa de um entrave aos movimentos do homem, de uma perda de tempo.
Antes ainda de desaparecerem da paisagem, os caminhos desapareceram da alma humana: o homem já não sente o desejo de caminhar e de extrair disso um prazer. E também a sua vida ele já não vê como um caminho, mas como uma estrada: como uma linha conduzindo de uma etapa à seguinte, do posto de capitão ao posto de general, do estatuto de esposa ao estatuto de viúva. O tempo de viver reduziu-se a um simples obstáculo que é preciso ultrapassar a uma velocidade sempre crescente.”
Milan Kundera, in “A Imortalidade”
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Daisy Games, Vladimir Kush
“As perguntas verdadeiramente importantes são as que uma criança pode formular – e apenas essas. Só as perguntas mais ingénuas são realmente perguntas importantes. São as interrogações para as quais não há resposta. Uma pergunta para a qual não há resposta é um obstáculo para lá do qual não se pode passar. Ou, por outras palavras: são precisamente as perguntas para as quais não há resposta que marcam os limites das possibilidades humanas e traçam as fronteiras da nossa existência.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
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Fauna in La Mancha
“Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está a nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semi-real, que seus movimentos sejam tão livres quanto insignificantes. Então, o que escolher? O peso ou a leveza?”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
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Metamorphosis
“Mas o amor nascente aguçou nela a percepção da beleza, e ela jamais esquecerá essa música. Toda vez que a ouvir, tudo o que acontecer em torno dela, nesse momento, ficará impregnado com seu brilho.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
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Ocean Sprouts
“Primeiro título pensado para A Insustentável Leveza do Ser: «O Planeta da Inexperiência». A inexperiência como uma qualidade da condição humana. Nascemos uma vez por todas, nunca poderemos recomeçar uma outra vida com as experiências da vida anterior. Saímos da infância sem sabermos o que é a juventude, casamo-nos sem sabermos o que é ser casado, e mesmo quando entramos na velhice, não sabemos para onde vamos: os velhos são crianças inocentes da sua velhice. Neste sentido, a terra do homem é o planeta da inexperiência.”
Milan Kundera, in “A Arte do Romance”
contioutra.com - Citações de Milan Kundera, pinturas de Vladimir Kush
Vladimir Kush
“Mas o homem, porque não tem senão uma vida, não tem nenhuma possibilidade de verificar a hipótese através de experimentos, de maneira que não saberá nunca se errou ou acertou ao obedecer a um sentimento.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
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Vladimir Kush
“No começo do Gênese está escrito que Deus criou o homem para reinar sobre os pássaros, os peixes e os animais. É claro, o Gênese foi escrito por um homem, e não por um cavalo. Nada nos garante que Deus desejasse realmente que o homem reinasse sobre as outras criaturas. É mais provável que o homem tenha inventado Deus para santificar o poder que usurpou da vaca e do cavalo.”
Milan Kundera, in A Insustentável leveza do ser
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Walnut Of Eden, Vladimir Kush

Vladimir Kush – Metaphorical Voyage Trailer

Editorial Josie Conti

3 coisas para se fazer lentamente no final de semana

3 coisas para se fazer lentamente no final de semana

Por Nara Rúbia Ribeiro

“Felicidade se acha é em horinhas de descuido”

Guimarães Rosa

A pressa cotidiana nos sufoca os sentidos. Já não vemos direito. A beleza do mundo nos passa sem que a percebamos, as cores já não fazem mais efeito, as delicadezas nos fogem por completo à observância. Mal sentimos o sabor das refeições. Comemos rapidamente, olhando a TV, chegando o celular, observando a contagem do tempo para voltar ao trabalho, já não há tempo para saborearmos a vida e ela segue, como se insípida. Nossos ouvidos andam destreinados a ouvir o que não é o necessário, o que não é o essencial. Se o seu filho te diz: “mãe, olha que lindo aquele azul em torno da nuvem!”, adivinha? Você nem o escuta. Afinal, nos ouvidos precisam estar livres para ouvir as coisas sérias do mundo. Os nossos dedos já não buscam a espessura do que tocam, a leveza do que afagam… Nosso olfato anda descordado para as essências mais sublimes. Então, exercitemos a calma… Serenemos o espírito e façamos o seguinte exercício.

Caminhe lentamente

Vale caminhar, ao menos uma vez por dia, sem a pressa do agora. Lentamente. Ver as frestas dos muros. Talvez exista vida nas frestas dos muros. Que insetos vivem ali? Como vivem. O que será que eles fazem enquanto você passa por eles, sem dar fé de suas existências, todos os dias? Os espaçamentos da calçada… A senhora que caminha devagar do outro lado da rua. A criança que chora e grita para que a sua babá a leve no colo: – Vai andando mesmo, já é mocinha! O branco encardido do meio-fio. Tudo isso integra a sua vida e você nem se apercebe disso.

Responda lentamente

Seguramente uma resposta imediata pode dar a você ares de quem detém as soluções do mundo em prontidão, no cérebro. Contudo, essa resposta não trará ao interlocutor a sensação que, certamente, você deseja causar. Quando você responde muito rapidamente, você supervalora a resposta em detrimento da pergunta. Se você para, medita, faz uma pausa antes de responder, você valoriza a conversa, dá ao outro a sensação de que o que perguntou é algo importante que merece ponderação. E isso fortalece os laços entre vocês. Mas, o mais importante, é que você poderá, mesmo, pensar melhor no que responder. Muitas respostas prontas transformam-se em pesadelos eternos… Responda lentamente pesando a intensidade e aferindo a dimensão de cada palavra.

Cultive o silêncio a dois

Quando você consegue estar ao lado de alguém em silêncio, mas percebe que o silêncio não é lacuna. Que o silêncio apenas adorna o momento, enfeita a circunstância, alicerça as palavras que ainda virão. Você percebe que o silêncio pode dizer muito. Pode ser elo. Pode ser o corolário de um sentimento que, de tão grande e intenso, não necessita, no momento, da concreção de qualquer palavra. Então você olha o silêncio com a calma de quem está de flerte com a vida, num namoro com o que ela tem de eterno e encantado. Você não tem pressa para dizer nada. Tudo está dito e é infinito.

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Nara Rúbia Ribeiro: colunista CONTI outra

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Escritora, advogada e professora universitária.
Administradora da página oficial do escritor moçambicano Mia Couto.
No Facebook: Escritos de Nara Rúbia Ribeiro
Mia Couto oficial

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Mamedjane, um conto moçambicano

Mamedjane, um conto moçambicano

Por Hirondina Joshua

Levantou os olhos como se alcançasse o céu. Sua felicidade atingia o mar, o movimento das ondas, o brilho do dia, a cor das plantas, toda uma beleza natural nela se fazia em metamorfose. Ia casar. Ia mudar de vida e ter a sua própria família. Ia ser outra neste espaço sem lugar.

Nas vésperas do seu casamento, Mbale não se bastando do presente e dos conselhos dados pela mãe pôs-se a fazer um pedido, queria um presente não surpresa como o que recebera, mas um proposto por ela. O que Mbale pediu foi de assustar mesmo muito singular, de arrepeiar as veias da mente.

Ela pediu uma cabra, sim… uma cabrita. Mas o que uma cabra podia mudar na sua vida? Que de diferente podia ter isso?

Para a mãe da Mbale isso era radicalmente diferente, era o mesmo que lhe pedir ouro em estado animal ou mágico se prefirirem. Esse pedido foi extremamente ousado para o entender dela.

–”O quê?! … Tu sabes que a Mamedjane é como se fosse minha filha. Não a quero perder principalmente agora que te vais embora.” –Disse a mãe da Mbale.

Mamedjane era a cabra. Ela é que fazia todos os trabalhos domésticos e era a melhor companheira da mãe da Mbale. Linda, de cores nunca antes vistas, uma verdadeira harmonia celestial. Para além da beleza extra  gozava igualmente de  uma outra; a intra essa que descrevia o Ser de Mamedjane por completo, conquistava o mundo dentro de um um outro mundo,  qualquer um que se fizesse perto dela; arrancava-se a razão, muito apesar de que isso nunca se tenha vindo a suceder (estar perto dela).

–”Mamedjane não pode ser vista por ninguém…” –Comentou a mãe, por saber que Mamedjane era uma “cabrita mágica”, e seria um verdadeiro escândalo se a vissem.
Todos que visitavam a casa da Mbale nunca a viram. Mamedjane vivia no mato perto da casa. Na verdade, não vivia morava no mato. Mamedjane vivia mesmo era no seu interior, rodeiada da humana-animal que era. Mamedjane se parecia com ela mesma.

Chegou o dia do casamento, e Mbale suplicou, pediu de  joelhos a Mamedjane.
–”Por favor dê–me a …sabe que não cozinho bem ainda, e lá no meu lar há muita coisa por fazer…muitos trabalhos domésticos… por favor  não quero passar vergonha, não quero perder o lar…” – Disse Mbale disse lacrimejando.

–”Está bem…dar–te–ei…mas com uma condição: Mamedjane não ficará todo o dia com contigo, trabalhará até ao meio–dia, e não deixes que alguém a veja por nada, ouviste bem?… Prometa–me…prometa–me isso”. –Disse a mãe de Mbale.
E Mbale prometeu cumprir com a promessa.

 Assim já tinha quem lhe ajudasse nas tarefas domésticas do lar.
“Ghu…ghu…ghu”, chegava a cabra na casa da família Mhuhere.

–”Hiiiii… é uma cabra, olha a cabra com a lenha na cabeça” –Dizia uma criança chamando as outras. Enquanto isso Mamedjane descarregava a lenha atrás da casa.

Todas as crianças aproximaram–se ao redor de Mamedjane, obeservando–a admirando a situação.
Todos os dias Mbale acordava para ir à machamba e quando voltasse não mais se preocupava com nenhum trabalho caseiro. Pois Mamedjane já os tinha feito todos. Mamedjane cartava água, arrumava a casa, recolhia lenha, e pilava.

Mbale encontrava tudo feito. Todos os dias Mamedjane descarregava lenha atrás da casa. E sempre que fizesse isso era vista pelas crianças da família Mhuhere.
Passado algum tempo ela já era conhecida por todas crianças. A alegria e simpatia de Mamedjane eram radiantes, enfeitiçava qualquer um.

Mamedjane conversava muito, cantava, ria, contava estórias, enfim… era uma óptima amiga. As crianças gostavam tanto da sua canção que nalgumas vezes davam–lhe comida para que Mamedjane cantasse para elas.

–”Mamedjane, canta para nós! Leva esta manga e este pedaço de xima” –Pedia uma criança.
Mamedjane cantava e dançava mas não parava de fazer os seus trabalhos. Enquanto cantava, as crianças aplaudiam radiantes de alegria…

Dias alegres passavam Mamedjane e as crianças naquela casa. De nenhuma maneira o marido de Mbale deveria descobrir, senão se separava dela.

Dias passaram…passaram dias… e organizou–se uma festa na casa da família Mhuhere. E como era normal e habitual as mulheres da família tinham que trabalhar triplicamente nos dias de festa. E Mbale quis poupar esforços, usando a Mamedjane para trabalhar nos preparativos da festa (como sempre faziam os trabalhos quando todos estivessem na machamba).
Já se tinha feito todas as compras: bebidas, comidas, roupas… pois era uma festa de convívio. Havia muito milho por pilar… . Enquanto Mbale ia à machamba, Mamedjane fazia parte dela nos  preparativos da festa. Mbale foi ao mato onde vivia Mamedjane avisar para que Mamedjane não fosse trabalhar no dia da festa.
–”Como já sabes, amanhã teremos festa,  trouxe comida e bebida já que não deves vir porque ninguém te pode ver. Fiz a questão de seleccionar as melhores partes das comidas e bebidas para ti”. –Explicou Mbale.
Feito isto, Mamedjane deciciu fazer a festa na sua “casa”, começou então a comer e beber. Bebeu…bebeu…bebeu… embriagou tudo que podia.  Mamedjane não resistiu a bebida que se encontrava nos potes, aliás a bebida é que não a resistiu e, a bebeu primeiro, num acto assim: metido na vontade quase confundido com tudo que é  inabalável, humano e mundano e insano.

Uma das crianças da família Mhuhere, deixou escapar contando ao pai tudo que acontecia quando ele se encontrava ausente.

–”Pai quando não estás cá em casa vem uma cabra descarregar lenha atrás da casa, e ainda por cima ela faz  todos trabalhos domésticos”. –Contou uma das  crianças, de forma ingénua.

–”O quê?…Que estória é essa? Deves estar a delirar” –Respondeu o pai.

–”Ė verdade pai… ” Insistiu a criança e o pai continuava a não acreditar, pensado que aquilo era apenas uma imaginação infantil.

No dia seguinte, o Sol acordou mais belo que nunca antes tinha se visto. A anunciar a grande  e esperada festa na família Mhuhere. Galinhas, vacas, bebidas…e muito mais eram transportados de um lado para o outro.

A correria era intensa, e até se podia ver poeira em todo o quintal. O barulho era mais do que sons gritantes. Muita dança e cantoria faziam–se sentir, a casa estava completamente em orgia.

No meio daqueles tumultos apareceu Mamedjane com lenha nas costas como era habitual, descarregou atrás da casa, só que desta vez todo o mundo estava a ver.

Mamedjane não perdeu tempo, foi levar o pilão e começou a pilar, a cantar … e a rir.

As crianças que lá estavam começaram a saltar de alegria ao ver a sua querida amiga. Puseram–se então a cantar a famosa canção de Mamedjane:

Oooh…Gumba nhfuuu…
Vha ca Mhuhere gumba nhfuuu…
Va hê mhacinwine gumba nhfuuu…

Tradução:

Oooh… (som do pilar)

A família Mhuhere… (som do pilar)

Foi à machamba… (som do pilar)

Aquilo foi um autêntico escândalo. Ver uma cabra a pilar e cantar! E ainda por cima embriagada… Não é normal. E é quase inacreditável.

–” Olhem…olhem…é uma ca…cab…cabra… a pilar…”
–”Que tipo de feitiçaria é essa?” Gritavam e comentavam apavoradas as pessoas.
O mais engraçado de tudo isto foi toda a gente ver que Mamedjane era conhecida por todas as crianças da família.
O marido da Mbale não levou tempo com a sua arma de caça  Bhum…bhum…bhum…atirou no animal matando–o.
Isso era a última coisa que não devia ter acontecido à Mamedjane.
Mbale desesperou–se, pois, já tinha perdido a Mamedjane e não tinha conseguido cumprir com a promessa da sua mãe. Do lado de fora podia-se ouvir alto:
–”Leva o teu animal e SAIA JÁÁA daqui…SUA PREGUIÇOSA…afinal casei–me com quem, contigo ou com a tua cabra?”

Enquanto isso um outro lado se abria dentro dela para que se ouvissem outras vozes: a da dor gritada pelo olhar; e da lágrima num silêncio…

contioutra.com - Mamedjane, um conto moçambicano
Quadro do pintor Norberto Geraldes

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Hirondina Joshua

contioutra.com - Mamedjane, um conto moçambicanoNasceu em Maputo, Moçambique, a 31 de Maio de 1987.
Está integrada em várias antologias, revistas, jornais, sites, blogues nacionais e internacionais. Teve Menção Extraordinária no Premio Mundiale di Poesia Nósside 2014.

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