Beleza e grandeza na lentidão em silêncio

Beleza e grandeza na lentidão em silêncio

Por Lourival Antonio Cristofoletti

Duas atitudes internas que comandam ações com naturais predicados mostram-se representativas na captação de sinais que nos encorajam a refletir sobre a própria existência: abre-se espaço para se pensar na lentidão tendo como companhia o silêncio.

Quando se fala da lentidão está se abordando a permissão e o convite a um olhar mais calmo para si, buscando captar emblemáticos sinais e mensagens esclarecedoras que o Imponderável e a Natureza lhe sussurram – sim, eles não gostam de gritar – a todo instante.

Mostra-se necessário desprendimento e estar atento a harmonizações para entrar em sintonia com a desaceleração: romper a inércia da agitação para transitar na calma da apreensão: são maneiras delicadas de esvaziar-se um pouco , estabelecer sintonias, buscar compreender-se e aceitar-se, compreender melhor as coisas.

Curiosa lógica da sociedade, que exige ação contínua e comunicação efetiva em tempo real e integral, em um alinhamento com a nova realidade tecnológica que ampara, vigia, cobra e angustia, para um pretenso ajuste às exigências do mercado. Há quem tenha dificuldade para ficar em silêncio, nem que seja por alguns instantes, pois o silêncio propicia que se ouça a voz interna, e isto é algo que se teme: “Não me deixem sozinho comigo: não vai ser bom”.

Mesmo no estresse do dia-a-dia caber reservar disponibilidade interior e prudente tempo para perceber as novidades e observar despreocupadamente ao redor. Entrar em sintonia com a lentidão interna é perceber a sua própria existência, as chegadas e partidas, os ritos de passagem, as mudanças das estações interiores.

Estabelecer uma convivência consigo é se permitir enveredar pelo silêncio, virtude que nos conecta com as emoções, que nos alimenta, nos supre em momentos inquietos. Descobrir maneiras de fazer do silêncio uma necessidade, um alimento. Quando a China invadiu o Tibet, há mais de 50 anos, e o som alto dos carros dos invasores apregoava as virtudes do regime do novo governo, o Dalai Lama disse: ”Roubaram-nos o que tínhamos de mais precioso: o silêncio”.

Surgem expectativas para quem ouse reconceituar o tempo e limitar os ruídos: são provas do desejo de reaprender lições sobre leveza na existência. “Como é importante o reaprendizado da lentidão! O sonho é que, um dia, a humanidade descubra, esse luxo inaudito: a lentidão no meio do silêncio!”, disse Denis de Rougemont (1906-1985), escritor e ambientalista suíço, crítico, já à época, da submissão humana à tecnologia.

Os convites para desfrutar de oportunidades de revisitação estão formulados e respondem a quem lhes acenar: basta querer neles prestar atenção. Quem resolver aderir poderá entender que a busca de alguma paz interior será descompromissado requisito; o recolhimento, exercício de virtude; o silêncio, preciosa moeda de troca com a verdade interior; a lentidão, oportunidade de sintonia com o seu tempo, o seu espaço, a sua maneira de saber viver.

(a partir de texto de Luiz G. A. de Sant´anna)

Lourival Antonio Cristofoletti, colunista Conti outra

contioutra.com - Beleza e grandeza na lentidão em silêncio
Fotografia: Anne Beringmeier

LOURIVAL  ANTONIO CRISTOFOLETTI

contioutra.com - Beleza e grandeza na lentidão em silêncioPaulista de Rio Claro e residente em Vitória/ES. É mestre em Administração pela UnB – Universidade de Brasília, Analista Organizacional e Consultor em Recursos Humanos. Atualmente atua como professor na Graduação e MBA na FAESA – Faculdades Integradas Espírito-Santenses; Instrutor na UFES – Universidade Federal do ES e na ESESP– Escola de Governo do ES.

Livro publicado: COMPORTAMENTO: INQUIETAÇÕES & PONDERAÇÕES
Livraria Logos (vendas pelo site)

E-mail de contato: : [email protected]
No Facebook: Lourival Antonio Cristofoletti No Instagram: lourivalcristofoletti

7 diferenças entre religião e espiritualidade

7 diferenças entre religião e espiritualidade

Por Dejan Davchevski

Muitas pessoas confundem Espiritualidade com Religião ou mesmo com algo misterioso ou alguma ocorrência sobrenatural. Alguns chegam a pensar em Espiritualidade como uma seita e não raro muitos temem ser manipulados.
Se deixamos essas concepções equivocadas no passado e tentarmos estudar e entender o que realmente é a espiritualidade, chegaremos à compreensão de que não há nada de misterioso ou sobrenatural, e nem mesmo se refere a uma seita qualquer.
Faremos, então, 7 distinções básicas entre religião e espiritualidade que poderão ajudá-lo a entender o que realmente é Espiritualidade.

1 – Religião faz com que você se curve – Espiritualidade aponta para as suas asas

A Religião diz que se deve seguir uma ideologia e obedecer a certas regras, do contrário haverá punição. A Espiritualidade permite que você siga o seu coração. O que você sente está certo. Ela diz que você é livre para ser quem realmente é, sem se curvar a qualquer coisa que não entenda intimamente que seja o certo e bom para si mesmo e para todos os demais, já que todos somos um.

2 – Religião faz com que você tema – Espiritualidade lhe mostra a coragem

A Religião lhe diz o que temer e indica as consequências dos seus erros. Espiritualidade torna você consciente das consequências, mas não quer que você se concentre no medo. Ela mostra como enfrentar o medo, como mover-se para fazer o que você sente que é correto, apesar das consequências que poderão advir. Ela mostra como agir no amor e não no medo, mostra como controlar o medo e usá-lo a serviço do Bem.

3 – Religião diz o que é a Verdade – Espiritualidade permite que você descubra a sua própria Verdade

A Religião lhe diz no que se deve acreditar. O que é certo e o que é errado. A Espiritualidade permite que você descubra isso por si mesmo e compreenda a suas próprias verdades de modo criativo e original. Ela permite que você se conecte ao seu Eu Superior e observe e medite, em cada circunstância, no que é correto e verdadeiro, sabedor que a Verdade, como um todo, é a mesma a para todos os indivíduos. Ela permite que você visualize a sua verdade com os olhos do seu coração.

4 – Religião separa de outras religiões – Espiritualidade une

Temos hoje, no mundo, muitas religiões. Todas apregoam as suas verdades e, para cada uma, a sua visão é que é a correta. Espiritualidade vê a Verdade em todas as religiões e as enxerga de modo unitário, posto que, como já dissemos, a Verdade é a mesma para todos nós, apesar é observada de modo diferente por cada grupo, em sua singularidade. Concentra-se na qualidade da mensagem divina que eles compartilham e não nas diferenças de detalhes doutrinários.

5 – Religião o torna dependente – Espiritualidade faz com que você seja independente

Somente se você participar ativamente de dado grupo religioso é que você, aos olhos da religião, será havida por religiosa e digna da felicidade. A Espiritualidade mostra que você não precisa ou não depende de nada para ser feliz. A Felicidade existe no íntimo de cada um e nós é responsável por encontrar essa benesse, não os outros. Esteja onde ou com quem estivermos, a divindade está em nós e é por isso que merecemos ser felizes.

6 – Religião apregoa punição – Espiritualidade explica o karma

A religião diz que se não obedecer a certas regras seremos castigados. A Espiritualidade nos permite compreender que toda ação tem sua reação e perceber que o castigo de nossas ações será a reação vinda das ações que executamos. E isso independe de nossa crença.

7- Religião faz com que você siga um determinado caminho – Espiritualidade permite que você crie seu próprio caminho

As religiões se baseiam em histórias sobre um Deus ou deuses, mostrando dado caminho para a sua iluminação e dizendo que você deve seguir determinados passos. A Espiritualidade permite que você siga na sua própria jornada de iluminação e descobrimento da verdade.

Toda religião veio pela espiritualidade, pela jornada através da qual uma pessoa se tornou Deus. Os detalhes da história de cada divindade não são tão importantes, apenas narram o caminho que o personagem percorreu. A mensagem que compartilhada, sim, é que é importante. Há um Código Divino que ressoa harmoniosamente através de cada um de nós. É por isso que cada religião tem uma centelha da Verdade.

Traduzido e adaptado pela CONTI outra. Do original 7 DIFFERENCES BETWEEN RELIGION AND SPIRITUALITY

contioutra.com - 7 diferenças entre religião e espiritualidade

7 dicas para formar filhos leitores

7 dicas para formar filhos leitores

Por Denise Guilherme

Via contioutra.com - 7 dicas para formar filhos leitores

1. Comece a ler desde a gestação.

Pode parecer estranho fazer a leitura de textos em voz alta para a barriga, mas está provado que – desde os primeiros meses de vida – os bebês são capazes de ouvir. E mais importante do que a escuta, é a criação do vínculo que pode se estabelecer entre pais, filhos e livros.

2. Defina um tempo para leitura no dia a dia.

Torne essa experiência algo que faça parte da rotina da família. Não é preciso criar grandes rituais, mas a frequência ajuda na construção do hábito.

3. Deixe a vergonha de lado.

contioutra.com - 7 dicas para formar filhos leitores
Alba Marina Rivera

Não tenha medo de resgatar o ator/atriz que há em você. Faça vozes, crie brincadeiras, divirta-se.

4. Fique atento à escolha de livros.

O mercado está repleto de livros para crianças que não possuem qualidade literária e que subestimam a inteligência do leitor. Deixe de lado critérios como idade e gênero. Procure indicações que contemplem a experiência leitora, os interesses do seu filho e os temas que gostaria de apresentar a ele.

5. Frequente bibliotecas e livrarias.

Acompanhe blogs e sites especializados, como A Taba. Garimpe, procure além dos livros que estão expostos nas prateleiras. Aprenda a escolher, escolhendo.

6. Mantenha os livros ao alcance

Mesmo no caso das crianças muito pequenas. Não tenha medo que eles se danifiquem. Livro bom é livro lido.

7. Ajude seu filho a formar uma biblioteca pessoal.

Ela poderá ajudá-lo a contar a sua história de leitor. Invista uma parte do seu orçamento para compra de livros.

contioutra.com - 7 dicas para formar filhos leitores
Wandy Lampson

 

Denise Guilherme

contioutra.com - 7 dicas para formar filhos leitoresMestre em Educação, formadora de professores e consultora na área de projetos de leitura. Desde cedo, apaixonada por palavras ditas e escritas. Descobriu nos livros um caminho para entender a si mesma e aos outros. E ficou tão encantada com o que viu que decidiu compartilhar com o mundo.

Saiba mais em: www.ataba.com.br

Carta para KANDINSKY

Carta para KANDINSKY

Caro, Wassily Kandinsky,

Você não sabe quem eu sou e provavelmente nunca vamos nos conhecer. Mas, como a arte faz a gente pensar coisas inimagináveis, resolvi escrever esta carta. Hoje eu fui à uma exposição sua que está rolando no CCBB do Rio de Janeiro. A abertura foi ontem, dia 28, e vai durar até 30 de março. Essa exposição já passou por Brasília, depois vai para Belo Horizonte e São Paulo. É a primeira vez que suas obras saem da Europa e vêm para o Brasil. As peças que estão na exposição são do acervo de vários museus e coleções particulares. Eu vi quadros seus, objetos, fotos e algumas coisas que você escreveu. Você, além de pintar, tinha o dom da palavra. Escreveu livros e descrevia a arte da forma que eu vejo, como algo mágico. Além das suas obras, vi quadros de outros artistas, como da sua ex-mulher, Gabriele Münter. Achei ela incrível! Confesso que não conhecia o trabalho dela, mas me surpreendi quando descobri que ela era sua aluna e de repente vocês se viram tomados pelo amor. Também vi obras de Alexej Von Jawlensky , Mikhail Larionov, Pavel Filonov, Nikolai Kulbin e Aristarkh Lentulov. Alguns deles eram seus colegas de arte, não é? Resolveram juntar todo mundo na exposição para mostrar um pouco sobre a arte moderna e contemporânea.

Eu sempre soube quem você era, porque, claro, você é o pai do abstracionismo e eu sempre gostei muito de arte abstrata. Quando eu era pequena, achava que não sabia desenhar direito. Meus desenhos eram sempre mais feios do que dos meus amigos. Então, eu resolvi pintar rabiscos, misturar cores que não faziam sentido para ninguém, mas para mim, faziam todo o sentido do mundo. Depois eu nunca mais pintei. Comecei a achar que deveria criar algo que as pessoas entendessem melhor, por isso comecei a escrever.

Hoje, quando eu te encontrei através de cores e rabiscos, resgatei aquela menininha que colocava todo seu sentimento na tela. As cores, depois de um tempo, criam vida, que nem as palavras fazem em um texto. “Eu vi todas as minhas cores em espírito, diante dos meus olhos. Selvagens, linhas quase loucas foram esboçados na minha frente”, você disse. E eu acredito que seja verdade. As cores têm sons e texturas que nós não conseguimos perceber. Talvez você seja uma espécie de mago. Você tinha essa relação com arte e espiritualidade, né? São Jorge era um santo que te provocava uma reação diferente, tanto que você fez um quadro abstrato dele. Depois que eu descobri que aquele era São Jorge, o quadro saiu do abstracionismo para mim. Isso que é o mais interessante na arte abstrata. De tanto olhar, uma hora você para de observar o quadro para fazer parte dele.

Você nasceu na Rússia, em Moscou, estudou direito, porque era o sonho do seu pai, mas depois que viu um quadro do Claude Monet e assistiu à ópera Lohengrin, no Teatro Bolshoi, decidiu que deveria investir na carreira de artista. Em 1869, você se mudou para Alemanha para começar um curso de pintura. Logo no começo, seu professor disse que as cores que você usava eram muito chamativas e diferentes, por isso você deveria pintar apenas em preto e branco. Isso lhe rendeu algumas xilogravuras que eu também encontrei na exposição. Mas para você isso foi uma afronta, já que as cores eram aquilo que mais lhe chamavam atenção.

Você trabalhou por muito tempo como artista independente e em suas obras fica claro sua ligação com a arte popular, o folclore russo, a cultura popular da Sibéria e rituais xamânicos. A parte fantástica e surreal dos contos de fadas que você ouvia desde pequeno te ajudou a se desprender um pouco do naturalismo, que era fortemente reconhecido na época. Além da música, as histórias surreais influenciaram muito o seu estilo. Você tinha um forte apego com aquilo que não se explica.

Depois de entrar em contato com os Zyrianos, um povo ugro-fínico da nação Kómi que tinha conexão com o xamanismo, você chegou à conclusão de que através da arte o homem e o divino podem criar uma relação direta. Essa ideia é muito antiga e vem desde os nossos primórdios, quando a arte era usada como forma de poder para atrair ou espantar maus espíritos. Descobri que você, a partir de então, procurou em cada objeto uma manifestação espontânea ou expressão de seus sons e cores interiores.

O artista tem o papel de juntar os dois mundos. Por isso você escreveu que “pintar é detonar um choque de mundos diferentes”. Eu acredito que você esteja falando do nosso mundo tátil e do mundo “divino”, o qual não temos acesso e não sabemos nada. Eu chamo esse mundo de mundo das ideias. E você é o grande responsável por trazer tantas ideias em forma de cor. Você é a ponte entre o nosso mundo e o das ideias.

Sua arte chama atenção porque existe um pouco da sua história em cada traço. É completamente autêntico. Cada caminho que você percorreu pela vida, cada história que ouviu, cada cultura que conheceu, cada arte que você se encantou, fazem parte das suas obras. Eu tinha uma vaga impressão sobre você, mas agora sinto que te conheço muito bem. A arte é uma porta de entrada para a alma de alguém. Depois de olhar de perto algumas das suas pinturas, senti como se eu te olhasse de perto e percebi que temos mais coisas em comum do que eu imaginava. Por isso, me senti tão à vontade de te escrever essa carta. Você mudou minha percepção sobre arte abstrata, porque descobri que o abstrato é um espelho do artista e um espelho do espectador. A identificação é instantânea.

Obrigada.

Com carinho,

Marcela.

contioutra.com - Carta para KANDINSKY
Kandinsky

Inteligência brilhante, por Rubem Alves

Inteligência brilhante, por Rubem Alves

Tive um primo de inteligência fulgurante. Éramos da mesma idade. Aos oito anos brincávamos de soldadinhos de chumbo. Mas seu prazer era um dicionário comparativo de português, francês, inglês e alemão que estava fazendo.

Eu olhava para aquele livro enorme de capa preta, daqueles que os contadores usavam para registrar a contabilidade de firmas, cada página dividida em quatro colunas, uma para cada língua.

Na escola, quando tirava 98 numa prova ele batia com a palma da mão na testa em desespero e dizia: “Fracassei”. Dele jamais se poderia dizer que foi mau aluno. Seu brilho prometia uma vida de vitórias. Adulto, pela manhã, ao levantar, o seu primeiro gesto era ligar a fita da língua que estava aprendendo.

Veio a conhecer doze línguas. Não sei direito para quê. Que utilidade poderia lhe ter a língua húngara? Os benefícios de falar húngaro eram desproporcionais ao esforço de aprendizagem. Como psicanalista, eu pergunto: Será que ele estava em busca da língua desconhecida que lhe permitiria entender a Babel da sua alma?

Muitos brilhos são chamas de um coração infeliz. Lançou-se do sétimo andar de um prédio. Não suportou o sentimento de fracasso que lhe deu um discurso – pelos seus critérios, o tal discurso não era merecedor da nota 10.

Matou-se por não suportar a vergonha de um pequeno fracasso. Esse é o perigo de querer ser perfeito. Não conheço nenhum estudo que explore as relações entre genialidade e loucura. Mas deve haver.

Conheci um homem que se vangloriava por ter um QI acima de 200. E trazia sempre consigo a carteira de Membro dos Gênios de QI acima de 200. Acho que para certificar-se de que era inteligente. Quando os outros não concordavam com ele julgava-os burros e ele, um incompreendido. Autoritário.

Quem se julga possuidor de QI 200 e se gaba disso tem de ser autoritário. Não saltou do 7o. andar apesar de ser um chato presunçoso. Não sei onde andará. Suspeito que tenha se mudado para o país dos homens com QI acima de 200.

Rubem Alves,
No livro ” Ostra feliz não faz pérola”

Dica da Conti outra: Conheça o Instituto Rubem Alves e acompanhe seus projetos.

Dica de livro: Sete Vezes Rubem (Fruto do trabalho de uma década, esta obra reúne sete livros de Rubem Alves publicados pela Papirus entre 1996 e 2005.)

3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós

3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós

Por Lara Vascouto

Ao invés de almejar uma posição no topo da pirâmide social, melhor seria se a pirâmide nem existisse. Aqui estão alguns motivos.

Recentemente, eu e meu marido largamos nossos empregos em São Paulo e viemos morar em uma cidade pequena, no litoral. A motivação por trás dessa mudança foi a percepção de que vivíamos uma vida que drenava toda a nossa vitalidade e energia por coisas que não eram importantes para nós: status, prestígio, dinheiro. Reconheço que dinheiro é importante, mas muito dinheiro só é importante se você quer manter um determinado estilo de vida. Felizmente, esse não era o nosso caso e, com esse pensamento, trocamos salários exuberantes por salários que pagam o suficiente apenas para quitar as contas no fim do mês, mas que em contrapartida hoje nos permite olhar o mar todos os dias, chegar em casa cedo e ter energia e disposição para o que consideramos realmente importante.

contioutra.com - 3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós
Depois que a gente terminar Winterfell, já podemos começar a construir Harrenhal, querido!

Há alguns dias, meu marido me mostrou um artigo que continha a clássica pirâmide de distribuição de renda no Brasil. Rindo, ele apontou que ao deixar os nossos empregos em São Paulo nós rolamos triunfalmente pirâmide abaixo, deixando para trás o grupo dos 4% mais ricos para aterrissar com graça e estilo entre os 66% mais pobres do nosso país.

Nós levamos na esportiva, porque nossa convicção no estilo de vida que escolhemos permanece intacta e inalterada. Mas o gráfico me fez pensar na enorme desigualdade que enfrentamos no Brasil e em como grande parte das pessoas define o próprio valor com base nessa pirâmide. E isso, por sua vez, me levou ao questionamento: será que as pessoas trabalhariam tanto e se sacrificariam tanto se o nosso mundo não fosse tão desigual? Será que as pessoas não seriam mais felizes, saudáveis, solidárias, generosas em um mundo sem desigualdade onde elas não fossem encaixadas o tempo todo dentro de uma pirâmide que descaradamente determina quem venceu e quem ganhou? Uma infinidade de estudos dizem que sim e nos mostram que os efeitos da desigualdade são tão corrosivos que alteram a índole das pessoas chegando a moldar sociedades inteiras. Entenda:

Nós ficamos doentes por status. Literalmente.

Todo mundo riu do “rei do camarote”, mas no fundo, a busca por status é mais importante para nós que vivemos em um país extremamente desigual do que gostaríamos de admitir. Um dos principais efeitos da desigualdade é a intensificação de questões relacionadas a sentimentos de superioridade e inferioridade. Esses sentimentos acabam gerando um fenômeno conhecido como ansiedade por status, isto é, ansiedade relacionada à imagem que esperamos que os outros tenham de nós. Ao contrário do que você possa pensar,

Estudos revelam que os índices de doenças psiquiátricas em países com altos níveis de desigualdade são três vezes maiores do que aqueles em países com pouca desigualdade.

Esse tipo de ansiedade não se restringe aos grupos da base da pirâmide, mas permeia toda ela, independente da sua posição. Isso significa que mesmo o mais rico indivíduo no nosso país pode sofrer de estresse se achar que não está levando um estilo de vida apropriado à sua posição social.

contioutra.com - 3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós
É só entrar no Facebook para achar um monte de gente que sofre de ansiedade por status.

O resultado disso é uma sociedade doente, literalmente. A ansiedade por status leva a problemas sérios de saúde, como depressão, ataques de pânico, hipertensão, e muitos outros. Estudos revelam que os índices de doenças psiquiátricas em países com altos níveis de desigualdade são três vezes maiores do que aqueles em países com pouca desigualdade. Além disso, a desigualdade aumenta a competição entre as pessoas e faz com que elas trabalhem muito mais para chegar à posição social que desejam. Muitas vezes, isso significa maiores níveis de stress, menor imunidade, pior qualidade de sono, alimentação e até riscos relacionados à segurança no trabalho.

O pior é que, apesar de a sua posição social depender amplamente de fatores fora do seu controle (como a família em que você nasceu e a escola em que estudou), nós acreditamos realmente que quem está no topo fez por merecer, assim como quem está na base. Isso faz com que a ansiedade se torne muito maior, porque teoricamente você tem tudo o que precisa para vencer na vida. Só depende de você, certo? Então, se você está aí chafurdando na lama, a culpa é toda sua. Esse pensamento traduz muito bem outro efeito extremamente nocivo da desigualdade. Basicamente, em sociedade com altos índices de desigualdade.

É cada um por si

Devido ao fato de a desigualdade criar um alto nível de competição por status, as pessoas sentem que têm que cuidar de si mesmas e passam a desconfiar de tudo e de todos. Basicamente, em sociedades desiguais, as distâncias entre as classes sociais são tão grandes que você passa a acreditar que as pessoas que não estão na mesma posição que você são diferentes. Isso faz com que os níveis de confiança entre os cidadãos sejam muito menores e o senso de comunidade quase inexistente. Traduzindo: em sociedades desiguais, as pessoas se ajudam menos, participam menos politicamente e cooperam menos para o bem estar coletivo.

contioutra.com - 3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós
E, se você tem alguma dúvida, experimenta pegar metrô em São Paulo às seis da tarde.

Recentemente, um estudo da Universidade da California, em Berkeley, causou polêmica ao concluir que pessoas ricas têm maior propensão a quebrar as regras, trapacear para conseguir o que querem e desrespeitar os outros em geral. Isso se dá em grande parte porque pessoas ricas se sentem superiores e merecedoras do seu sucesso – como se tivessem chegado no topo da pirâmide sem a ajuda de ninguém. Claro que muito raramente esse é o caso. Mas em sociedades desiguais esse sentimento é aceito por todos. E é por isso que nós admiramos a imagem do brasileiro batalhador, que abre mão de tudo – saúde, tempo com a família, lazer – para conseguir subir um pouquinho a pirâmide. Deveríamos sentir vergonha do fato de a maioria das pessoas ter de abrir mão de tanta coisa para ter o mínimo. Como podemos não sentir um incômodo ao observar o indivíduo que, entre os dois empregos e o estudo, tem só 4 horas por dia para dormir? Nós aplaudimos esses casos sem parar para pensar no absurdo que isso representa. Ainda mais porque, apesar de todos esses esforços, é muito provável que esse cara não consiga chegar muito longe na pirâmide. Isso porque, em sociedades desiguais…

A mobilidade social é quase nula

Estudos mostram que quanto maior a desigualdade em um país, menor o índice de mobilidade social. E não é muito difícil entender o porquê. Obviamente, se você nasceu no sertão nordestino em uma família que depende de algumas cabeças de gado para sobreviver, provavelmente não vai conseguir estudar o mesmo tanto, nem vai encontrar as mesmas oportunidades que o cara que nasceu em uma família abastada no Rio de Janeiro. Aliás, é muito provável que você siga os passos dos seus pais e se torne um adulto que depende de algumas cabeças de gado para sobreviver. Estudos indicam que, em países desiguais, a família em que você nasceu determina até 50% do seu salário quando adulto. Já em países com menores índices de desigualdade, esse número cai para 20%.

Além da família, muitos outros fatores impedem que uma pessoa da base da pirâmide consiga subir. Educação primária insuficiente; o ambiente onde você cresceu; a sua aparência; o bebê que você vai ter ainda adolescente; os contatos que você não tem; as dívidas que você vai fazer para manter a imagem necessária para conseguir um bom emprego; as doenças que você vai desenvolver por tentar manter 2 empregos e uma faculdade à noite – tudo isso influencia o seu sucesso e contribui para que a escalada da pirâmide se torne quase que paralisante. É como dar um passo para frente e dois para trás. Consequentemente, a falta de mobilidade social mantém e reforça a desigualdade.

Com tudo isso em mente, fica claro que a desigualdade é provavelmente um dos problemas mais urgentes da nossa sociedade. O caminho para uma sociedade menos desigual pode variar. O Japão, por exemplo, alcançou um baixíssimo índice de desigualdade fazendo com que o nível de renda entre as diversas funções dentro das empresas não fosse tão discrepante. Já os países nórdicos preferem igualar o nível de renda da população através de pesados impostos. Claro que nada disso adianta se as necessidades básicas da população não forem atendidas – e por necessidades básicas quero dizer comida, saúde, habitação, saneamento básico, energia elétrica, educação, coisas assim. Infelizmente, não parece que chegaremos lá tão cedo. Será que a desigualdade já conseguiu nos transformar permanentemente em monstrinhos egoístas e individualistas que só pensam no próprio umbigo?

Nota da CONTIoutra:  Nó de Oito é uma página parceira e o texto acima foi publicado com a autorização da autora.

contioutra.com - 3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nós

________________________________________________________________________

Lara Vascouto

contioutra.com - 3 efeitos nocivos da desigualdade que passam praticamente despercebidos por nósInternacionalista, ex-Googler e fanática por ler e escrever textos bem-humorados. Optou por ser pobre e feliz na praia ao invés de rica e triste em São Paulo.

Para mais artigos da autora acesse seu blog Nó de Oito

Curta Nó de Oito também no Facebook

8 dicas para conquistar sua liberdade através da música

8 dicas para conquistar sua liberdade através da música

Por Juliana Bertoncel

“A música oferece à alma uma verdadeira cultura íntima e deve fazer parte da educação do povo.”
François Guizot

A música é uma ferramenta poderosa para sua liberdade emocional, física e psíquica. E o melhor, está à sua disposição, quando, onde e na hora que você quiser.

Para acompanhar as dicas, imagens das obras de  Boris Indrikov.

1. A música serve de consolo, nos acolhe como um abraço quando estamos tristes e sozinhos.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

2. Ela comunica e expressa nossos sentimentos, dando voz às nossas dores e nos ajudando a reorganizar nosso estado emocional.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

3. Em momentos desafiadores experimente usar a música como âncora, como um impulso motivador e encorajador, escutando músicas que lhe transmitam boas sensações.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

4. Música com ritmo forte e regular é construtiva e disciplinadora. Contribui para a concentração, foco e melhor desempenho em atividades físicas.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

5. Música também é imagem, criação, criatividade, imaginação. Ela nos conduz à um mundo de sonhos e desejos, à nossa verdade mais íntima. Permita-se viajar através dos sons.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

6. Parece até mágica, mas a música também tem a missão de lhe lembrar o pra que você veio ao mundo. Quantas vezes a música certa tocou na hora certa, como uma mensagem do universo para você?

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

7. A música une, congrega e fortalece vínculos. Todos os bons momentos sociais normalmente são acompanhados de uma excelente trilha sonora. Tem coisa melhor que uma roda de violão, sair para dançar e ir ao seu show favorito, e compartilhar tudo isso com as pessoas que você mais ama?

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

8. A música age sobre nosso corpo inteiro. Estimula a produção e liberação da endorfina (conhecida como hormônio do prazer), relaxa a mente, equilibra nossa respiração e batimentos cardíacos além de diminuir ansiedade, depressão e estresse.

contioutra.com - 8 dicas para conquistar sua liberdade através da música
Boris Indrikov

“Sem a música, a vida seria um erro.”

Friedrich Nietzsche

___________________________________________

Juliana Bertoncel é musicoterapeuta e tem como missão de vida ser um instrumento de escuta e fala amorosa, com o propósito de dar voz aos sonhos, potencialidades, e realizações internas de cada pessoa com a qual ela se conectar. Saiba mais em www.terapiaemusica.com.br

Nota da Conti outra: o texto acima foi publicado com a autorização da autora.

Editorial Conti outra.

“Loucos e santos”, declamado por Antônio Abujamra

“Loucos e santos”, declamado por Antônio Abujamra

Loucos e Santos

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.

Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.

Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.

Deles não quero resposta, quero meu avesso.

Que me tragam dúvidas e angústias e aguentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco.

Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.

Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.

Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.

Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.

Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.

Não quero amigos adultos nem chatos.

Quero-os metade infância e outra metade velhice!

Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.

Tenho amigos para saber quem eu sou

Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que “normalidade” é uma ilusão imbecil e estéril.

Nota da CONTI outra sobre a autoria: Existe uma falsa atribuição de autoria desse texto à Oscar Wilde, entretanto, a verdadeira autoria seria de Marcos Lara Resende.

“Loucos e santos” , declamalo por Antônio Abujamra

A arte do desapego

A arte do desapego

Por Nara Rúbia Ribeiro

Muitos vivenciam o amor como um rasgo a que a alma se submete intencionalmente para exigir que a mão do amado a costure. O problema é que a mão do outro nem sempre está disponível para esse trabalho: a alma sangra, dói, e os rasgos se expandem… A dor, quando bem resolvida, pode ser um prenúncio de beleza. Mas, para que o belo de fato advenha, é preciso viver a dor, senti-la, tocá-la, integrar-se a ela, e transmutá-la, sabedores de que o vivenciar a dor também é parte do exercício de amor.

Já tive muitos castelos desmoronados na poeira dos dias. Quem não os teve? E a dor, nesse caso, é inevitável. Em nossa alma aprendiz, amar é desejar estar ao lado do outro, dentro do outro. É querer ser o outro sem sair de si mesmo. É construir uma redoma de sonho e ali inserir o amado, sob a eterna e vigilante proteção dos nossos olhos. E queremos que o outro caiba exatamente no nosso sonho e viva o nosso projeto de existência. Que ele esteja no cenário que construímos e encene o papel que lhe escrevemos.

E, num repente, algum novo vento nos sopra e mostra que o outro não é exatamente o aquele a quem julgamos amar. Percebemos que ele tem segredos e mistérios maiores que pensávamos e ficamos perplexos ao perceber que ele tem caminhos traçados e que quer percorrê-los, muitas vezes, sem nós. Perdemos a voz ao saber que a alma do outro é hóspede e hospedeira de outras almas. E as nossas pernas tremem ao constatar que a redoma era ilusão. Que todo o castelo de amor era ilusório. E a dor chega e castiga e fustiga a alma com cem mil acusações.

O que nos sangra, num momento como esse, é a obrigação de desamar. Mas será que isso existe? Os poetas, há muito, já apregoaram que o amor é sempre “para sempre”. Questionaremos as verdades poéticas? Banalizaremos o amor? Faremos dele um bibelô barato e quebrável destinado a adornar, por breves dias, as estantes da nossa alma?

Ocorre que somos ainda aprendizes da arte do eterno. O amor não reside senão no desejo da plenitude do outro. Ele não se esmera a não ser no respeito ao outro. Ele não pulsa a não ser para o querer o bem e sonha que o outro, pássaro livre em perfeição de voo, possa vislumbrar, dos cumes de si mesmo, os mais belos sentimentos e paisagens da terra.

E assim, quando o outro não mais deseja estar ao nosso lado, isso nos fere e sangra, mas o que nos massacra não é o outro. É desejo egoístico de aprisionar um espírito que também, assim como nós, tem sede de infinitos.

Tenho comigo que o que mais dói é a obrigatoriedade que nos impomos, quando o castelo desmorona, de desamar o outro. E embora talvez não o tenhamos amado de fato, fizemos um esboço de amor e é desorientador apagá-lo. Desamar é doloroso demais, porque o desfazimento do amor é contrário à nossa natureza etérea, espiritual, eterna.

Devemos, sim, exercitar o desapego; não o desamor. Desejar a liberdade, a integralidade, a plenitude do outro. Compreender que o que dói não é o amor não correspondido, mas a quebra das correntes (talvez até de ouro) com que tentávamos prender alguém. Apenas quando soubermos apreciar com encantamento a liberdade, seja ela nossa ou de um ser amado, teremos conhecido a face invisível e invencível de um amor verdadeiro.

E a alma, outrora rasgada, fará das cicatrizes uma arte emoldurada e rebordada de vida, na certeza de que toda a dor, bem lá no fundo, labora a nosso favor.

Goiânia, 01 de fevereiro e 2015.

Olhar como da primeira vez

Olhar como da primeira vez

Os lugares que frequentamos e as pessoas que estão à nossa volta vão ficando invisíveis com o passar do tempo. Aos poucos, nossa atenção encontra novos alvos e a paisagem some, como somem os rostos e a realidade particular de cada um, até que não reste quase nada. E, no entanto, estão todos vivos a nosso lado, e o sol se põe de um modo que um dia nos pareceu tão bonito, e aquela mulher canta de um jeito que antes nos fascinava tanto. Esse mundo querido ficou invisível para nós porque nos acostumamos com ele – e acostumar-se quer dizer não mais notar, não ouvir e talvez amar um pouco menos. Mas toda a beleza perdida aparece outra vez quando abrimos os olhos e vemos tudo de novo – como da primeira vez.

(Luiz Carlos Lisboa, “O som do silêncio”, Editora Verus, página 79)

contioutra.com - Olhar como da primeira vez

A gratidão e as pequenas gentilezas

A gratidão e as pequenas gentilezas

Por Lourival Antonio Cristofoletti

Dói constatar que há muito pouco espaço para a gratidão manifesta, não importa sobre que tipo de justificativa: somos pródigos em arrumar desculpas, mesmo a respeito de pequenas omissões. Geralmente não nos detemos o suficiente para analisar a importância que tiveram e têm em nossas vidas os conselhos e as atitudes de pessoas que cruzaram o nosso caminho nas mais variadas circunstâncias (muitas vezes nem as conhecíamos, o que não as impediram de ter desempenhado um papel importantíssimo no rumo de nossas vidas).

Estão perdidas em algum canto obscuro da nossa memória aquelas pessoas que:

– despertaram em nós uma vocação, ou até mesmo nos ensinaram a arte de um hobby, de um esporte, de uma profissão: foram para nós, num determinado momento, um ícone, uma referência; lógico que depois, fizemos por merecer o que somos e construímos hoje, mas, seguramente, sem aquele “empurrão”, tudo teria sido muito mais difícil (ou, quem sabe, até impossível);

– num momento difícil de nossas vidas, em que o dinheiro era muito escasso, alimentaram nossos estômagos vazios, com lanches simples e maravilhosos, e/ou nos abrigaram por uns tempos, cedendo um espaço para ficarmos, tudo isso sem nada nos cobrar;

– nos disseram que haveria um concurso interessante, e, que muitas vezes, até nos emprestaram o dinheiro para a inscrição (através delas prestamos o concurso, fomos aprovados e estamos trabalhando lá até hoje);

– nos apresentaram ao mundo das artes e da cultura em geral, emprestando-nos discos e livros, nos permitindo o acesso à leitura de jornais, revistas (pode ser que nem nos emprestaram nada, mas, como vizinhos, nos brindaram com o som de cantores e músicas inesquecíveis), muitos deles determinantes nos rumos da nossa vida.

Merecem igualmente um espaço nobre na galeria da gratidão todas as pessoas que trabalharam para nós, ou nos prestaram serviços (em escolas, creches), cuidando de nossos filhos, principalmente quando eles eram mais indefesos: você pode até argumentar que sempre lhes pagou muito bem por esse serviço (o que não se discute), mas não se esqueça que, mesmo assim, seus filhos poderiam ter sido maltratados, agredidos, ter adquirido péssimos hábitos.

As pessoas, quando são atendidas em suas pequenas ou grandes solicitações, raramente se dignam a agradecer a gentileza a quem as valorizou e se mobilizou, sabe lá a que preço (em termos de dificuldade, de ordenação de agenda, disponibilidade de tempo), para atendê-las.

Agem como se fosse obrigação sua, como se fossem naturais os pedidos delas, como se fosse uma honra atendê-las, mesmo que você nunca as tenha visto ou ouvido falar delas antes. É bom se ressaltar que, quanto maior a amizade, maior a necessidade da valorização do gesto.

É restrito, também, o espaço das pequenas gentilezas, principalmente no trânsito. Quando você quer sair de uma vaga diagonal, e o trânsito está intenso, é normal você ter que esperar muito tempo: geralmente alguém só pára o carro e lhe dá passagem se ele estiver interessado em ocupar a sua vaga.

Se você quase sobe na calçada com o carro, ou espera pacientemente, para lhe dar passagem, o motorista passa por você na maior imponência e desprezo, sem olhar de lado e sem dar o menor aceno de reconhecimento pela gentileza com que foi distinguido, como se fosse um imenso prazer para você ter cedido espaço para tão importante personalidade.

Vestidas as carapuças, o mais importante de qualquer reflexão não é provocar lágrimas, arrependimentos, autocensuras: o que mais interessa é, com base no estímulo ao nosso campo de memória, o que podemos fazer de diferente agora, a partir do resgate da consciência de significativos momentos de nossa existência.

É possível reparar alguma coisa com aquelas pessoas que tanto representaram para nós? Se a resposta for negativa (“já morreram”, “não tenho a menor idéia como reencontrá-las”, etc.), cabe outra reflexão, como forma grata de “pagamento” pelo que, de maravilhoso, recebi um dia: “O que está ao meu alcance fazer, para participar da vida de outras pessoas, que, no momento presente, tal como eu, precisam de algum tipo de estímulo?”.

E por que tudo isso? E por que dar atenção a esses convites? Se não movido por impulsos afetivos, éticos e de reconhecimento, pelo menos em atenção a um princípio interessante na vida, que nos convida a continuamente renovarmos o ciclo “receber, agradecer, desfrutar, compartilhar, devolver”.

LOURIVAL  ANTONIO CRISTOFOLETTI

contioutra.com - A gratidão e as pequenas gentilezasPaulista de Rio Claro e residente em Vitória/ES. É mestre em Administração pela UnB – Universidade de Brasília, Analista Organizacional e Consultor em Recursos Humanos. Atualmente atua como professor na Graduação e MBA na FAESA – Faculdades Integradas Espírito-Santenses; Instrutor na UFES – Universidade Federal do ES e na ESESP– Escola de Governo do ES.

Livro publicado: COMPORTAMENTO: INQUIETAÇÕES & PONDERAÇÕES
Livraria Logos (vendas pelo site)

E-mail de contato: : [email protected]
No Facebook: Lourival Antonio Cristofoletti No Instagram: lourivalcristofoletti

Que o mundo nunca se esqueça de Mandela, o pai da liberdade!

Que o mundo nunca se esqueça de Mandela, o pai da liberdade!

“Penso que a essência, a luz de um grande espírito se expande no tempo e nos inunda os espaços. Uma grande alma nunca finda.

Sempre digo que o que diferencia um ser iluminado dos demais humanos é basicamente isso: a grandeza, o sucesso de um indivíduo de alma opaca pode produzir em nós até alguma admiração, mas faz com que dimensionemos a nossa pequenez.

A alma iluminada, como a de Mandela, não. Mandela não nos faz lembrar do quão pequenos somos, ele nos faz enxergar o que seremos, ele amplia nosso horizonte interior de modo que passamos a acreditar em nós mesmos.” 

Nara Rúbia Ribeiro

Nota da CONTI outra: A homenagem que aparece no vídeo foi realizada pelo coro musical Soweto Gospel Choir, da África do Sul em  07 de dezembro de 2013, alguns dias após o seu falecimento. O tributo, realizado em forma de flasmob, trouxe os músicos vestidos como funcionários de um supermercado em Soweto. A canção “Asimbonanga” do músico sul-africano Johnny Claggna foi escrita na década de 70 quando Mandela ainda estava preso. A letra diz: “Não vimos ele/ Não vimos Mandela/ No lugar onde ele está/ No lugar onde ele é mantido”. (Fonte: Pragmatismo político)

Nara Rúbia Ribeiro: colunista CONTI outra

contioutra.com - Que o mundo nunca se esqueça de Mandela, o pai da liberdade!

Escritora, advogada e professora universitária.
Administradora da página oficial do escritor moçambicano Mia Couto.
No Facebook: Escritos de Nara Rúbia Ribeiro
Mia Couto oficial

A Casa de Pequenos Cubinhos, um curta sobre a solidão

A Casa de Pequenos Cubinhos, um curta sobre a solidão

A animação conta a história de um velhinho que vive solitário em uma cidade inundada. À medida que a água sobe, o senhor eleva sua casa com pequenos tijolos em forma de cubos para se manter fora do nível do lago sobre o qual vive. Então, um dia, seu cachimbo favorito cai e vai parar em um andar mais baixo de onde sua real moradia encontrava-se naquele momento. Muito apegado ao cachimbo, ele decide comprar uma roupa de mergulho e ir atrás dele. Ao mergulhar, passa a reviver toda a história dele, de sua família e, claro, a da casa, cujos vários andares (cerca de 10), agora estão todos submersos, exceto o último.

A CASA DE PEQUENOS CUBINHOS

Título original:Tsumiki no ie.
Direção: Kunio Katô.
País: Japão.
Ano: 2008.
Digital. 12 min.

Os dez mais extraordinários poemas de Manoel Bandeira

Os dez mais extraordinários poemas de Manoel Bandeira

Editorial CONTi outra

Manuel Bandeira nasceu em 1886 e figura entre os grandes nomes da poesia brasileira. Lecionou Literatura, foi crítico literário e crítico de arte. Inclinado à música e à arquitetura, foi na dor que se descobriu poeta, enquanto em tratamento de uma tuberculose.

Situado entre os modernistas, sua temática permeia sua paixão pela vida, seu grande erotismo, o amor, a morte e a solidão. Sua requintada ironia diante da dor e do medo são marcos seus. Não raro invoca, com sensibilidade e maestria, suas  memórias da infância.

Separamos aqui dez de seus mais extraordinários poemas, segundo a nossa leitura do autor. Esteja à vontade para fazer mais sugestões aqui mesmo, nos comentários.

1 – DESENCANTO

Eu faço versos como quem chora
De desalento. . . de desencanto. . .
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente. . .
Tristeza esparsa… remorso vão…
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

– Eu faço versos como quem morre.

2 – POEMETO IRÔNICO

O que tu chamas tua paixão,
É tão somente curiosidade.
E os teus desejos ferventes vão
Batendo as asas na irrealidade…

Curiosidade sentimental
Do seu aroma, da sua pele.
Sonhas um ventre de alvura tal,
Que escuro o linho fique ao pé dele.

Dentre os perfumes sutis que vêm
Das suas charpas, dos seus vestidos,
Isolar tentas o odor que tem
A trama rara dos seus tecidos.

Encanto a encanto, toda a prevês.
Afagos longos, carinhos sábios,
Carícias lentas, de uma maciez
Que se diriam feitas por lábios…

Tu te perguntas, curioso, quais
Serão seus gestos, balbuciamento,
Quando descerdes nas espirais
Deslumbradoras do esquecimento…

E acima disso, buscas saber
Os seus instintos, suas tendências…
Espiar-lhe na alma por conhecer
O que há sincero nas aparências.

E os teus desejos ferventes vão
Batendo as asas na irrealidade…
O que tu chamas tua paixão
É tão-somente curiosidade.

3 – POÉTICA

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

4 – PORQUINHO-DA-ÍNDIA

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele prá sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas…

– O meu porquinho-da-índia foi minha primeira namorada.

contioutra.com - Os dez mais extraordinários poemas de Manoel Bandeira
Espaço Pasárgada, localizado em Recife

5 – VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica

Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

6 – TERESA

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

7 – MAÇÃ

Por um lado te vejo como um seio murcho
Pelo outro como um ventre de cujo umbigo pende ainda o cordão placentário
És vermelha como o amor divino.

Dentro de ti em pequenas pevides
Palpita a vida prodigiosa
Infinitamente

E quedas tão simples
Ao lado de um talher
Num quarto pobre de hotel.

8 – O IMPOSSÍVEL CARINHO

Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura
Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
-Eu soubesse repor_
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância!

9 – PNEUMOTORAX

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
– Diga trinta e três.
– Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
– Respire.

– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

10 – O ÚLTIMO POEMA

Assim eu quereria meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

Vou-me embora pra Pasárgada, declamado por Antônio Abujamra

Você achou esse conteúdo relevante? Compartilhe!

INDICADOS