A arte que nasce do fogo

A arte que nasce do fogo

“A arte pura é a mais elevada contemplação espiritual por parte das criaturas. Ela significa a mais profunda exteriorização do ideal, a divina manifestação desse “mais além” que polariza a esperança da alma.
O artista verdadeiro é sempre o “médium” das belezas eternas e o seu trabalho, em todos os tempos, foi tanger as cordas mais vibráteis do sentimento humano, alçando-o da Terra para o Infinito e abrindo.” Emmanuel

Nos últimos 14 anos o artista plástico canadense Steven Spazuk  desenvolveu uma técnica de pintura original que permite a criação de obras de arte usando fuligem.

Conhecer o processo é quase tão belo quanto o trabalho final….

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9 melhores poemas de Fernando Pessoa: escolha uma imagem e saiba qual é o seu

9 melhores poemas de Fernando Pessoa: escolha uma imagem e saiba qual é o seu

Em cada paisagem da alma existe um poema a ser sentido e interpretado.

Abaixo, escolha a imagem que mais disser ao seu coração.

Fernando Pessoa tem um poema especial para este exato momento.

Boa leitura!

Ah, e depois aproveite e leia os outros! Afinal, é Fernando Pessoa!

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1 – Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de HOTEL,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado
[sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe — todos eles príncipes — na vida…

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

2 – O guardador de rebanhos

Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),

É só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.

3 – Tabacaria

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo.
que ninguém sabe quem é
( E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes
e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.

4 – Ode marítima

Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pró lado da barra, olho pró Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos detrás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos.
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.

Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente.

Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Trazem memórias de cais afastados e doutros momentos
Doutro modo da mesma humanidade noutros pontos.
Todo o atracar, todo o largar de navio,
É — sinto-o em mim como o meu sangue —
Inconscientemente simbólico, terrivelmente
Ameaçador de significações metafísicas
Que perturbam em mim quem eu fui…

Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!
E quando o navio larga do cais
E se repara de repente que se abriu um espaço
Entre o cais e o navio,
Vem-me, não sei porquê, uma angústia recente,
Uma névoa de sentimentos de tristeza
Que brilha ao sol das minhas angústias relvadas
Como a primeira janela onde a madrugada bate,
E me envolve com uma recordação duma outra pessoa
Que fosse misteriosamente minha.

5 – Aniversário

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui…
A que distância!…
(Nem o acho…)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes…
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio…

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos…
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim…
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!


6 – Presságio

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar pra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente…
Cala: parece esquecer…

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar…


7 – Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.


8 – Todas as cartas de amor…

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

9 – Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

It´s the journey!

It´s the journey!

Por Tatiana Nicz

Há alguns anos, quando estava assistindo um de meus seriados favoritos a protagonista se questionou algo parecido com: Como nós conseguiremos planejar um futuro se passarmos todos os dias “carpediando o diem”?* A pergunta dela me deixou com aquele sentimento de “é isso aí!”, igual acontece quando alguém consegue traduzir em palavras algo que para você faz muito sentido.

Um Stephen Hawking ateu disse: não é Deus que te proporciona o que você quer, é você mesmo. O universo é um imenso de um “free lunch”. Isso foi uma das suas grandes conclusões após uma vida dedicada a unificar conceitos da física, caçando buracos negros e buscando as respostas no Universo para os maiores questionamentos da humanidade. Em resumo, quer dizer que tudo é energia e essa energia está disponível para todos basta saber acessá-la. O que disse Hawking não é muito diferente do que diz também a Física Quântica. Existe uma lei simples no Universo chamada de “lei da atração”, em resumo significa que o que você pensa e quer você atrai para si (e isso serve também para coisas negativas). Como nos ensinam desde sempre que ter seus desejos realizados é algo realmente grandioso e é a fonte da felicidade, que é no fundo o que todo mundo busca, documentários e livros como “O Segredo” se tornaram rapidamente sucesso de vendas, pois eles ensinam como fazer uso dessa lei para conseguir tudo que você deseja: relacionamentos, bens, posses, sucesso, enfim, tudo.

Eu sei disso não só porque li livros (que hoje já não me servem) como Paulo Coelho ou “A Profecia Celestina” ou “O Segredo”, mas porque desde pequena, muito antes de ler qualquer desses livros, sempre consegui o que queria. Escolhi meu primeiro amor, depois escolhi o segundo também, talvez o terceiro. Claro, hoje tenho um conceito diferente de quando jovem sobre amor. Escolhi também diversos destinos e todas as etapas que construiriam meu currículo profissional, mesmo quando decidi mudar de profissão.

Escolhi, por exemplo, onde iria fazer meu mestrado e levava na agenda o anúncio do programa puído, já quase rasgando de tanto desdobrar e dobrar e que guardava em minha agenda. Por vezes eu o desdobrava, olhava e me imaginava estudando lá, falando assim parece que foi mesmo como um passe de mágicas que em poucos anos embarquei naquele avião com destino à Amsterdam, pago por uma bolsa de estudos que me foi premiada pelo governo holandês. Claro que para isso tive que me inscrever, conviver com a derrota de não passar até ser chamada novamente; aliás, vivi os altos e baixos de todo o processo em todas as minhas conquistas, então não dá para tirar meu esforço de nenhuma delas, mas é certo que antes de tudo eu sempre pedi.

Quem está lendo isso deve achar que isso é mesmo algo maravilhoso, mas o que eu quero dizer é justamente o contrário. O que mais me lembro dos anos que fiz meu mestrado foi que me sentia infeliz. Na verdade nenhuma das minhas conquistas me fez mais feliz, a distância que existia entre o querer e o ter sempre me deixava ansiosa, com medo de não conseguir e como acontece com quase todas as pessoas, quando conseguia realizar um desejo, imediatamente começava a pensar que não era exatamente aquilo que eu queria ou tinha imaginado e logo queria algo diferente. Sim, porque tem isso também, a realidade é sempre diferente da expectativa. No caso dos relacionamentos era pior ainda, eu não me sentia merecedora de um amor pelo qual havia pedido, aquilo não fazia sentido nenhum para mim. Além do mais, enquanto desejamos que o outro seja da maneira que queremos, não existe espaço para ele ser apenas o que é. Então o que existia mesmo era a imagem construída na minha mente do que eu queria que o outro fosse, mas não era. E com isso obviamente todo mundo sofria.

Esses dias eu li um belo texto que temos que ensinar nossas crianças o poder da espera. Sim a espera ativa é uma dádiva e nossas crianças não sabem mais esperar. Mas, como tudo na vida, antes de ensinarmos algo, precisamos aprender tal coisa, e o fato é que eu não sabia esperar, porque ninguém faz nada consciente quando está concentrado apenas no resultado final. E era um apego tão excessivo aos resultados que eu me esquecia de viver a jornada. Um dia uma amiga disse: você não sabe esperar o destino acontecer. E é bem provável que ela estivesse certa, acontece que eu não apenas não sabia como também não queria. Eu queria controlar tudo e estava tão concentrada nisso que perdi uma parte importante de minhas grandes jornadas: a jornada per se.

No primeiro dia de aula do tal mestrado, a professora e coordenadora, certamente uma das melhores que já tive em minha vida, finalizou as primeiras apresentações com muito entusiasmo e um belo sorriso dizendo: “It´s the journey!”. Os olhos delas brilhavam e a paixão com que as palavras saíam de sua boca era algo realmente inspirador, eu não sabia como ela fazia aquilo, mas precisava descobrir porque era isso que queria para mim, a palavra é essa mesmo: entusiasmo. A palavra entusiasmo vem do grego e originalmente significava inspiração pela presença de Deus, ou ainda, viver com a presença de Deus em si.

Hoje, passados sete anos, acho que finalmente entendi o seu grande segredo: viver o presente com entusiasmo, ou seja, com Deus presente em si. Entendi algumas coisas quando visitamos o tal lugar mágico do qual ela falava com a mesma paixão que proferia sobre paradigmas do turismo, o único bem que possuía: um chalé simples situado numa ilhota em pleno Mar Adriático, na costa de seu país Croácia. Talvez esse entusiasmo seja algo inerente aos croatas, porque quando estava lá soube de um programa do governo que ensina as crianças nas escolas sobre gentileza e a importância de sorrir. Hoje, ao lembrar de todo seu entusiasmo, realmente não acredito que em algum momento de sua vida ela tenha pedido por todo aquele reconhecimento, até porque tinha muita coisa trabalhando contra ela: é mulher proveniente de um país “periférico” e por isso teve que construir seu espaço em um universo dominado por homens nascidos nas maiores potências mundiais. O que ela sabia era aproveitar a jornada. Hoje também sou uma professora entusiasmada com meu ofício e em homenagem à ela (ou talvez para eu nunca esquecer) repito o mesmo para meus alunos: “it´s the journey!”

Em inglês o verbo ser se mistura ao estar: se sou, estou (e não se quero, sou ou se tenho, sou). Pensando em tudo isso, finalmente me senti preparada para me aprofundar na prática do budismo. O budismo sempre me pareceu algo muito bonito assim como inacessível. Parecia um simples muito complexo e era o oposto de tudo que eu era. Palavras como estar e presente, desapegar, meditação, paciência pareciam simplesmente intangíveis para mim. Mas apesar de eu não desejar mais o ter, eu ainda tinha o desejo de mudar, de ser. Entendi então que só existe uma maneira de saborearmos esse tal “free lunch”, é estando inteiramente presente em qualquer ação e assim fazendo uso de todos os sentidos. Sim, uma coisa por vez. Pois é, em mundo moderno e altamente conectado, isso é quase uma missão impossível. Nós não fazemos nenhuma ação isoladamente. Não comemos apenas, nem dirigimos apenas, nem nos exercitamos apenas. Sempre são ações combinadas que sem perceber não nos permitem usar todos os sentidos para desenvolvermos prazer em tal ação.

Mas a verdade é que, ao contrário do que nos ensinam, não somos multi-tasks (multi-tarefas), nós fomos programados sim para fazer uma coisa de cada vez, e hoje também desconfio que mais ainda para ter um círculo bem menor de amizades do que atualmente nutrimos.  É desafiador, mas não é impossível, precisa de treino, muito treino. A recompensa é que quanto mais eu comecei a me concentrar para fazer uma coisa de cada vez, menos ansiosa fiquei, menos desejos tive e também desenvolvi uma dificuldade maior em absorver muita informação ou fazer muitas coisas ao mesmo tempo o que naturalmente ajuda no processo de fazer uma coisa por vez.

Além do mais, nós nascemos com tudo que precisamos para viver bem, dons, talentos e o poder de sentir, de ter emoções, que é inerente à todo e qualquer ser. Através do desenvolvimento e aprimoramento de nossos dons e talentos podemos exercer um ofício que nos dê conforto para viver. Acredite! Isso é suficiente, o que você é/está pode te bastar. O mundo não vai acabar se você desligar seu telefone enquanto come, por exemplo.  Também não precisamos nos informar de tudo, ler tanto, nem saber muito a mais do que sabemos, nem ter mais do que temos. Então aprenda a se desconectar, acalme seu coração e confie. Quando não sabemos confiar ou esperar, não nos beneficiamos totalmente da beleza que reside no acaso, que aliás também podemos chamar de presente, um grande presente do Universo para nós. É novamente no inglês que encontrei uma palavra que define isso: serendipity**. O feliz acaso. Sim, a espontaneidade também é um bom ingrediente para a felicidade, aquilo que acontece de repente, sem pedido, plano ou controle.

E foi assim que, muitos anos depois, descobri a resposta para pergunta do início desse texto: como vou planejar um futuro enquanto estiver vivendo no presente? A resposta é que você tem tudo e não precisa planejar nada, muito menos passar metade de seus dias pensando em tudo aquilo que quer ter. Sim: “it´s the journey!””.

*How are we supposed to plan a life? A career? A family? If we are always “carpe”-ing the “diem”? da série Grey´s Anatomy.

** Palavra que minha grande amiga Drika me ensinou.

Uma dança diferente: saiba mais sobre a dançaterapia

Uma dança diferente: saiba mais sobre a dançaterapia

Por Adriana Túbero

Você sabe o que seu corpo pode? Provavelmente você deve estar imaginando o corpo em algum tipo de atividade. Entretanto, minha pergunta não se refere a fazer atividades físicas ou de dança como ballet, jazz, dança do ventre, zumba ou qualquer outro do tipo fitness – palavra de origem inglesa e significa “estar em boa forma física”. Tais atividades estão mais voltadas à técnica e a estética e, na maioria das vezes, estão em busca de um corpo “idealizado”. O corpo deve estar dentro de certos padrões de beleza ou “sarado”. Não se trata de uma crítica a tais modalidades de atividade, mesmo porque fui bailarina profissional de “carteirinha” do Ballet de Rio Preto. Escrevo apenas para elucidar e diferenciar o trabalho que atualmente realizo voltado para saúde, em que o corpo é o fio condutor de muitos questionamentos e respostas. Enfim, o que quero trazer para nossa reflexão é: Que sensações você já experimentou por meio do corpo?

Observe que mesmo parado nosso corpo tem música e se move! Está dançando sempre. Mas como Adriana?, você diria. Esta sinfonia não é audível porque nós estamos mergulhados nela desde que nascemos! Veja bem: o coração tem ritmo, bate aproximadamente 100 mil vezes por dia, as veias tem pulsação, nossos olhos piscam 25mil vezes por dia e nossos órgãos trabalham o tempo todo. Muitos de nós partimos daqui sem saber do que somos capazes, sem sequer nos surpreendermos e sem arriscarmos nada.

O corpo é tudo que temos!

Quando temos um ambiente e um clima favorável, companhias receptivas, movimento e música, o corpo é motivado e desperta, aumentando a nossa potência. O corpo que EXPERIMENTA essa potência encontra possibilidades infinitas e de cada experiência vivida surge uma nova porta que se abre. A DANÇATERAPIA, trabalho que realizo há 12 anos, a meu ver, contribui sobremaneira a responder esta questão importante: O que pode o nosso corpo? pois ela é uma ferramenta terapêutica que pode curar o “modo de vida” pela experiência do corpo.

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O que você faz para superar dos revezes da vida? Foge? Ressente-se? Fica com raiva de tudo e de todos? Amargura-se? Isola-se? Deprime? Imagine se você tivesse que passar novamente e eternamente por todas as coisas que já viveu. Perdas, enfermidades, lutas, paixões, separações… tudo de novo do mesmo jeito! Isso seria bom? Amor fati!!!! – que, segundo Nietzsche, significa aceitação integral da vida e do destino humano mesmo em seus aspectos mais cruéis e dolorosos – aceitação que só um espírito superior é capaz. Para o filósofo, temos a chave para nos tornar escultores da nossa própria vida dançando a música da vida pelo prazer do ritmo e da melodia. Nesse sentido, a Dançaterapia oferece este espaço de criação para seus próprios valores, reconhecendo e valorizando o INSTANTE que a vida nos oferece, com tudo o que ela tem. Que todos nós possamos permitir que o corpo nos dê as chaves da nossa potência e que nós aproveitemos para experimentar, nos conhecer melhor, nos relacionar com o outro e com o nosso ambiente.

Convido você para esse passo de dança!

Nota da Conti outra: o texto acima foi publicado com a autorização da autora.

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contioutra.com - Uma dança diferente: saiba mais sobre a dançaterapiaAdriana Túbero

Psicóloga, Psicodramatista e Dançaterapeuta – dirige o Espaço Vívere – Corpo, Mente & Harmonia em Araraquara SP e coordena o Centro Brasileiro de Dançaterapia.

Contato: [email protected]

No Youtube: Curso de Capacitação em Dançaterapia 2015 – Espaço Vívere

A terceira margem do rio, um conto de Guimarães Rosa

A terceira margem do rio, um conto de Guimarães Rosa

Por Guimarães Rosa

Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente — minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa.

Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a ideia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta.

Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez a alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — “Cê vai, ocê fique, você nunca volte!” Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — “Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?” Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo — a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa.

Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para. estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram juntamente conselho.

Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s’embora, para jamais, o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa.

No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida furtada: a ideia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava.

Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o ‘dever de desistir da tristonha teima. De outra, por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a palmos, a escuridão, daquele.

A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele aguentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e paus-de-árvore descendo — de espanto de esbarro. E nunca falou mais palavra, com pessoa alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos.

 

Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se comia uma comida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça para ir esvaziando a canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pelos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia.

Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — “Foi pai que um dia me ensinou a fazer assim…”; o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não-encontrável? Só ele soubesse. Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos aí choramos, abraçados.

Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão de seu feito. Seja que, quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-que-disseram: que constava que nosso pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, agora, esse homem já tinha morrido, ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada mais. Só as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos.

Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranqüilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando ideia.

Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar a voz: — “Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto… Agora, o senhor vem, não carece mais… O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!…” E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n’água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia… Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.

Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.

Texto extraído do livro “Primeiras Estórias”, Editora Nova Fronteira – Rio de Janeiro, 1988, p. 32.

contioutra.com - A terceira margem do rio, um conto de Guimarães Rosa

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Uma vida simples não é uma vida simplória, Mário Sérgio Cortella

Uma vida simples não é uma vida simplória, Mário Sérgio Cortella

Como os bens influenciam em nossas vidas?

Uma vida simples é o mesmo que uma vida simplória?

Segundo  Mário Sérgio Cortella, há bens que influenciam no que é fundamental e outros no que é essencial em nossas vidas.

Assista esse pequeno vídeo e ouça outras considerações do professor sobre esses assuntos.

Sobre as consequências da mágoa na vida das pessoas: reflexões de Krishnamurti

Sobre as consequências da mágoa na vida das pessoas: reflexões de Krishnamurti

No vídeo abaixo, um extrato da palestra de Krishnamurti realizada em Ojai, Califórnia em 1982.

A pergunta que desencadeia a reflexão exposta é: “É possível nunca ser magoado?”

Em sua linguagem calma e pausada, Krishnamurti nos transite reflexões bastante interessantes sobre o papel da mágoa em nossas vidas tanto nos sentidos positivos quanto negativos. Vale conferir.

Jiddu Krishnamurti foi um filósofo, escritor, e educador indiano. Proferiu discursos que envolveram temas como revolução psicológica, meditação, conhecimento, liberdade, relações humanas, a natureza da mente, a origem do pensamento e a realização de mudanças positivas na sociedade global. Constantemente ressaltou a necessidade de uma revolução na psique de cada ser humano e enfatizou que tal revolução não poderia ser levada a cabo por nenhuma entidade externa seja religiosa, política ou social. Uma revolução que só poderia ocorrer através do autoconhecimento; bem como da prática correta da meditação ao homem liberto de toda e qualquer forma de autoridade psicológica.

Me alugo para sonhar, um conto de Gabriel García Márquez

Me alugo para sonhar, um conto de Gabriel García Márquez

Às nove, enquanto tomávamos o café da manhã no terraço do Habana Riviera, um tremendo golpe de mar em pleno sol levantou vários automóveis que passavam pela avenida à beira-mar, ou que estavam estacionados na calçada, e um deles ficou incrustado num flanco do hotel. Foi como uma explosão de dinamite que semeou pânico nos vinte andares do edifício e fez virar pó a vidraça do vestíbulo. Os numerosos turistas que se encontravam na sala de espera foram lançados pelos ares junto com os móveis, e alguns ficaram feridos pelo granizo de vidro. Deve ter sido uma vassourada colossal do mar, pois entre a muralha da avenida à beira-mar e o hotel há uma ampla avenida de ida e volta, de maneira que a onda saltou por cima dela e ainda teve força suficiente para esmigalhar a vidraça.

Os alegres voluntários cubanos, com a ajuda dos bombeiros, recolheram os destroços em menos de seis horas, trancaram a porta que dava para o mar e habilitaram outra, e tudo tornou a ficar em ordem. Pela manhã, ninguém ainda havia cuidado do automóvel pregado no muro, pois pensava-se que era um dos estacionados na calçada. Mas quando o reboque tirou-o da parede descobriram o cadáver de uma mulher preso no assento do motorista pelo cinto de segurança. O golpe foi tão brutal que não sobrou nenhum osso inteiro. Tinha o rosto desfigurado, os sapatos descosturados e a roupa em farrapos, e um anel de ouro em forma de serpente com olhos de esmeraldas. A polícia afirmou que era a governanta dos novos embaixadores de Portugal. Assim era: tinha chegado com eles a Havana quinze dias antes, e havia saído naquela manhã para fazer compras dirigindo um automóvel novo. Seu nome não me disse nada quando li a notícia nos jornais, mas fiquei intrigado por causa do anel em forma de serpente e com olhos de esmeraldas. Não consegui saber, porém, em que dedo o usava.

Era um detalhe decisivo, porque temi que fosse uma mulher inesquecível cujo verdadeiro nome não soube jamais, que usava um anel igual no indicador direito, o que era mais insólito ainda naquele tempo. Eu a havia conhecido 34 anos antes em Viena, comendo salsichas com batatas cozidas e bebendo cerveja de barril numa taberna de estudantes latinos. Eu havia chegado de Roma naquela manhã, e ainda recordo minha impressão imediata por seu imenso peito de soprano, suas lânguidas caudas de raposa na gola do casaco e aquele anel egípcio em forma de serpente. Achei que era a única austríaca ao longo daquela mesona de madeira, pelo castelhano primário que falava sem respirar com sotaque de bazar de quinquilharia. Mas não, havia nascido na Colômbia e tinha ido para a Áustria entre as duas guerras, quase menina, estudar música e canto. Naquele momento andava pelos trinta anos mal vividos, pois nunca deve ter sido bela e havia começado a envelhecer antes do tempo. Em compensação, era um ser humano encantador. E também um dos mais temíveis.

Viena ainda era uma antiga cidade imperial, cuja posição geográfica entre os dois mundos irreconciliáveis deixados pela Segunda Guerra Mundial havia terminado de convertê-la num paraíso do mercado negro e da espionagem mundial. Eu não teria conseguido imaginar um ambiente mais adequado para aquela compatriota fugitiva que continuava comendo na taberna de estudantes da esquina por pura fidelidade às suas origens, pois tinha recursos de sobra para comprá-la à vista, com clientela e tudo. Nunca disse o seu verdadeiro nome, pois sempre a conhecemos com o trava-língua germânico que os estudantes latinos de Viena inventaram para ela: Frau Frida. Eu tinha acabado de ser apresentado a ela quando cometi a impertinência feliz de perguntar como havia feito para implantar-se de tal modo naquele mundo tão distante e diferente de seus penhascos de ventos do Quindío, e ela me respondeu de chofre:

— Eu me alugo para sonhar.

Na realidade, era seu único ofício. Havia sido a terceira dos onze filhos de um próspero comerciante da antiga Caldas, e desde que aprendeu a falar instalou na casa o bom costume de contar os sonhos em jejum, que é a hora em que se conservam mais puras suas virtudes premonitórias. Aos sete anos sonhou que um de seus irmãos era arrastado por uma correnteza. A mãe, por pura superstição religiosa, proibiu o menino de fazer aquilo que ele mais gostava, tomar banho no riacho. Mas Frau Frida já tinha um sistema próprio de vaticínios.

— O que esse sonho significa — disse — não é que ele vai se afogar, mas que não deve comer doces.

A interpretação parecia uma infâmia, quando era relacionada a um menino de cinco anos que não podia viver sem suas guloseimas dominicais. A mãe, já convencida das virtudes adivinhatórias da filha, fez a advertência ser respeitada com mão de ferro. Mas ao seu primeiro descuido o menino engasgou com uma bolinha de caramelo que comia escondido, e não foi possível salvá-lo.

Frau Frida não havia pensado que aquela faculdade pudesse ser um ofício, até que a vida agarrou-a pelo pescoço nos cruéis invernos de Viena. Então, bateu para pedir emprego na primeira casa onde achou que viveria com prazer, e quando lhe perguntaram o que sabia fazer, ela disse apenas a verdade: “Sonho”. Só precisou de uma breve explicação à dona da casa para ser aceita, com um salário que dava para as despesas miúdas, mas com um bom quarto e três refeições por dia. Principalmente o café da manhã, que era o momento em que a família sentava-se para conhecer o destino imediato de cada um de seus membros: o pai, que era um financista refinado; a mãe, uma mulher alegre e apaixonada por música romântica de câmara9 e duas crianças de onze e nove anos. Todos eram religiosos, e portanto propensos às superstições arcaicas, e receberam maravilhados Frau Frida com o compromisso único de decifrar o destino diário da família através dos sonhos.

 

Fez isso bem e por muito tempo, principalmente nos anos da guerra, quando a realidade foi mais sinistra que os pesadelos. Só ela podia decidir na hora do café da manhã o que cada um deveria fazer naquele dia, e como deveria fazê-lo, até que seus prognósticos acabaram sendo a única autoridade na casa. Seu domínio sobre a família foi absoluto: até mesmo o suspiro mais tênue dependia da sua ordem. Naqueles dias em que estive em Viena o dono da casa havia acabado de morrer, e tivera a elegância de legar a ela uma parte de suas rendas, com a única condição de que continuasse sonhando para a família até o fim de seus sonhos.

Fiquei em Viena mais de um mês, compartilhando os apertos dos estudantes, enquanto esperava um dinheiro que não chegou nunca. As visitas imprevistas e generosas de Frau Frida na taberna eram então como festas em nosso regime de penúrias. Numa daquelas noites, na euforia da cerveja, sussurrou ao meu ouvido com uma convicção que não permitia nenhuma perda de tempo.

— Vim só para te dizer que ontem à noite sonhei com você — disse ela. — Você tem que ir embora já e não voltar a Viena nos próximos cinco anos.

Sua convicção era tão real que naquela mesma noite ela me embarcou no último trem para Roma. Eu fiquei tão sugestionado que desde então me considerei sobrevivente de um desastre que nunca conheci. Ainda não voltei a Viena.

Antes do desastre de Havana havia visto Frau Frida em Barcelona, de maneira tão inesperada e casual que me pareceu misteriosa. Foi no dia em que Pablo Neruda pisou terra espanhola pela primeira vez desde a Guerra Civil, na escala de uma lenta viagem pelo mar até Valparaíso. Passou conosco uma manhã de caça nas livrarias de livros usados, e na Porter comprou um livro antigo, desencadernado e murcho, pelo qual pagou o que seria seu salário de dois meses no consulado de Rangum. Movia-se através das pessoas como um elefante inválido, com um interesse infantil pelo mecanismo interno de cada coisa, pois o mundo parecia, para ele, um imenso brinquedo de corda com o qual se inventava a vida.

Não conheci ninguém mais parecido à idéia que a gente tem de um papa renascentista: glutão e refinado. Mesmo contra a sua vontade, sempre presidia a mesa. Matilde, sua esposa, punha nele um babador que mais parecia de barbearia que de restaurante, mas era a única maneira de impedir que se banhasse nos molhos. Aquele dia, no Carvalleiras foi exemplar. Comeu três lagostas inteiras, esquartejando-as com mestria de cirurgião, e ao mesmo tempo devorava com os olhos os pratos de todos, e ia provando um pouco de cada um, com um deleite que contagiava o desejo de comer: as amêijoas da Galícia, os perceves do Cantábrico, os lagostins de Alicante, as espardenyas da Costa Brava. Enquanto isso, como os franceses, só falava de outras delícias da cozinha, e em especial dos mariscos pré-históricos do Chile que levava no coração. De repente parou de comer, afinou suas antenas de siri, e me disse em voz muito baixa:

— Tem alguém atrás de mim que não pára de me olhar.

Espiei por cima de seu ombro, e era verdade. Às suas costas, três mesas atrás, uma mulher impávida com um antiquado chapéu de feltro e um cachecol roxo, mastigava devagar com os olhos fixos nele. Eu a reconheci no ato. Estava envelhecida e gorda, mas era ela, com o anel de serpente no dedo indicador.

Viajava de Nápoles no mesmo barco que o casal Neruda, mas não tinham se visto a bordo. Convidamos para mulher a tomar café em nossa mesa, e a induzi a falar de seus sonhos para surpreender o poeta. Ele não deu confiança, pois insistiu desde o princípio que não acreditava em adivinhações de sonhos.

— Só a poesia é clarividente — disse.

Depois do almoço, no inevitável passeio pelas Ramblas, fiquei para trás de propósito, com Frau Frida, para poder refrescar nossas lembranças sem ouvidos alheios. Ela me contou que havia vendido suas propriedades na Áustria, e vivia aposentada no Porto, Portugal, numa casa que descreveu como sendo um castelo falso sobre uma colina de onde se via todo o oceano até as Américas. Mesmo sem que ela tenha dito, em sua conversa ficava claro que de sonho em sonho havia terminado por se apoderar da fortuna de seus inefáveis patrões de Viena. Não me impressionou, porém, pois sempre havia pensado que seus sonhos não eram nada além de uma artimanha para viver. E disse isso a ela.

Frau Frida soltou uma gargalhada irresistível. “Você continua o atrevido de sempre”, disse. E não falou mais, porque o resto do grupo havia parado para esperar que Neruda acabasse de conversar em gíria chilena com os papagaios da Rambla dos Pássaros. Quando retomamos a conversa, Frau Frida havia mudado de assunto.

— Aliás — disse ela —, você já pode voltar para Viena.

Só então percebi que treze anos haviam transcorrido desde que nos conhecemos.

— Mesmo que seus sonhos sejam falsos, jamais voltarei — disse a ela. — Por via das dúvidas.

Às três, nos separamos dela para acompanhar Neruda à sua sesta sagrada. Foi feita em nossa casa, depois de uns preparativos solenes que de certa forma recordavam a cerimônia do chá no Japão. Era preciso abrir umas janelas e fechar outras para que houvesse o grau de calor exato e uma certa classe de luz em certa direção, e um silêncio absoluto. Neruda dormiu no ato, e despertou dez minutos depois, como as crianças, quando menos esperávamos. Apareceu na sala restaurado e com o monograma do travesseiro impresso na face.

— Sonhei com essa mulher que sonha — disse.

Matilde quis que ele contasse o sonho.

— Sonhei que ela estava sonhando comigo disse ele.

— Isso é coisa de Borges — comentei.

Ele me olhou desencantado.

— Está escrito?

— Se não estiver, ele vai escrever algum dia — respondi. — Será um de seus labirintos.

Assim que subiu a bordo, às seis da tarde, Neruda despediu-se de nós, sentou-se em uma mesa afastada, e começou a escrever versos fluidos com a caneta de tinta verde com que desenhava flores e peixes e pássaros nas dedicatórias de seus livros. À primeira advertência do navio buscamos Frau Frida, e enfim a encontramos no convés de turistas quando já íamos embora sem nos despedir. Também ela acabava de despertar da sesta.

— Sonhei com o poeta — nos disse.

Assombrado, pedi que me contasse o sonho.

— Sonhei que ele estava sonhando comigo disse, e minha cara de assombro a espantou.

— O que você quer? Às vezes, entre tantos sonhos, infiltra-se algum que não tem nada a ver com a vida real.

Não tornei a vê-la nem a me perguntar por ela até que soube do anel em forma de cobra da mulher que morreu no naufrágio do Hotel Riviera. Portanto não resisti à tentação de fazer algumas perguntas ao embaixador português quando coincidimos, meses depois, em uma recepção diplomática. O embaixador me falou dela com um grande entusiasmo e uma enorme admiração. “O senhor não imagina como ela era extraordinária”, me disse. “O senhor não resistiria à tentação de escrever um conto sobre ela”. E prosseguiu no mesmo tom, com detalhes surpreendentes, mas sem uma pista que me permitisse uma conclusão final.

— Em termos concretos — perguntei no fim —, o que ela fazia?

— Nada — respondeu ele, com certo desencanto. — Sonhava.

Março de 1980

Via Pessoa

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5 dicas para lidar com a TV na educação do seu filho

5 dicas para lidar com a TV na educação do seu filho

Por Cristina Cançado

Qual é a influência da televisão no desenvolvimento do seu filho?

O que de fato ele tem assistido nesses programas infantis? O que é bom e o que é ruim? Você costuma assistir a esses programas com seu filho? O que ele assiste está de acordo com os valores da sua família?

CUIDADO!

Saiba que deixar a criança na frente da televisão tem aspectos positivos e negativos. Por isso, é bom ficar atenta para decidir com segurança sobre o que e por quanto tempo seu filho vai ficar na frente da telinha.

Aspectos positivos no uso da TV

Assistir televisão possibilita à criança:

  • Compreender as histórias.

  • Construir narrativas.

  • Desenvolver a imaginação.

  • Ter referências únicas, mesmo que pertencendo a ambientes diferentes.

  • Aumentar o repertório de brincadeiras, canções e histórias.

  • Aos 4 e 5 anos, ter uma noção do início e término dos programas (noção de tempo).

  • Conhecer culturas diferentes.

A televisão é a principal companhia de muitas crianças e vários canais têm sua programação totalmente dedicada exclusivamente à elas. Desenhos, novelas e filmes são apenas alguns dos programas produzidos para atrair a atenção dos pequenos e mantê-los em frente ao aparelho por horas. Cabe a você, mãe, ficar de olho e não permitir que a telinha invada a vida do seu filho de tal maneira que, como diz Branca Maria de Paula no livro Truques Coloridos, “As crianças acham que ele é o maior mágico do mundo. As crianças e milhares de pessoas que vivem por aí. Vivem caladinhas, prestando atenção, sem fazer nada, só vendo, sem fazer nada, só respirando… televisão.”

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Aspectos negativos no uso da TV

Assistir televisão pode levar a criança a desenvolver:

  • Tendência à imitação

  • Submissão

  • Isolamento ou apatia

  • Agressividade

  • Atividade sexual precoce

  • Diminuição da comunicação familiar

  • Insônia

  • Obesidade

  • Consumismo

  • A criança até 2 anos que fica muito tempo diante da TV pode ter o desenvolvimento da visão periférica comprometida.

Diante disso, fique alerta para os programas que seu filho assiste. Veja 5 dicas que irão te ajudar a fazer da TV uma aliada na criação do seu filho!

Dicas para você começar hoje

1) Limite o uso da TV a uma hora ou no máximo a duas horas por dia e lembre-se de escolher um programa de boa qualidade. Para isso, procure conhecer os programas que seu filho gosta de assistir. Você pode fazer isso nos finais de semana ou gravá-los para assistir depois.

2) Selecione os programas que você assiste quando as crianças estiverem por perto. Lembre-se: educamos pelo exemplo.

3) Não faça da TV o ponto central da sua casa. Apenas um aparelho em casa é o suficiente. Essa dica é importante! Na minha casa, por exemplo, só temos um aparelho.

4) Procure assistir alguns dos programas com seu filho e o ensine a ter opiniões críticas sobre o que assiste.

5) Não perca a oportunidade de estar com seu filho. Mas se for para escolher entre a TV ou uma brincadeira, prefira brincar com ele. Vai ser mais divertido!

Você deve estar se perguntando como poderá acompanhar os programas que seu filho assiste com essa falta de tempo e correria. Mas, é fundamental que você saiba o que seu filho anda assistindo. Não perca tempo! Pesquise, leia, converse com outra pessoas, procure dentro da sua rotina uma forma de conhecer que tipo de informação a TV está transmitindo para seu filho. Afinal, você não quer permitir que a TV molde os valores, as crenças e o comportamento do seu filho!

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Cristina Cançado

contioutra.com - 5 dicas para lidar com a TV na educação do seu filhoPedagoga e autora do livro Como Educar os Filhos e Colocar Limites, Cristina Cançado orienta mães de todo Brasil a melhorar o relacionamento com seus pequenos.

www.maesqueeducam.com.br

As águas do Tempo

As águas do Tempo

Por Hirondina Joshua

Chegamos cedo ao Parque Nacional de Gorongosa. Queríamos anteceder o Sol que naquele dia se fazia primeiro.
─ …Eu definiria a água deste lugar, como a água que já tivesse percorrido o Universo, mas sem que ela própria o tivesse feito. O olhar me leva à posição de uma tal capacidade metafísica de ver e compreender a maravilhosa paisagem do conhecimento absoluto: entender a linguagem da água, o corpo e o verbo da sua molécula.
Sentei no horizonte como se Ser do horizonte fosse, estendendo distâncias à Vida.
A água me significou tudo. Era o planeta todo em estado de transcendência, mundos em estado de (di) fusão.
Aconteci. Todo o instante que ali me fiz, inventou-se em mim a Terra : e crescia dentro e fundo e imaculado na razão mística da existência. Olhava o azul em todos os seus tons alguns até que se confundiam com o verde, os sons eram música sem pauta. Rítmicas e de uma tal perfeição que movia os ouvidos da emoção.
Enquanto pensava alto, ouvia o som da água, relaxando a carne interior.

─ Vamos para outra direcção…há mais coisas fascinantes do outro lado. O meu colega já vinha a incomodar com aquele ar grave e irritado.

Eu não podia crer no que via, nem muito menos deixar de o fazer. As águas azuis transcendiam o verde que prezo, os montes, e todo o resto…Era a água a falar, eram os sons a dialogar, eu não via mais nada diante de mim senão o Ser azulado em que transformava.

─ Vou mesmo embora. Estás a ouvir-me?

Aquela voz irritante voava no azul das águas, fazia-se paz em toda a extensão da palavra.

De olhos fitos no azul, retornei-me mar, rio, lago…esculpindo a beleza interior por via exterior.

─ A água é certamente a coisa mais bela que Deus criou. Pensei com medo e receio mas eu gosto de sentir esta verdade que traço. Ainda que de forma escorregadia.
─Phiu phiu phiu phiu…ouvi um animal ao alto, parecia uma garça eu não sei diferenciar o canto das aves… distraída vi-me sozinha naquele espaço.

Já o meu colega tinha ido embora, certamente à procura de uma outra maravilha naquele gigantesco Parque. Sacudi as calças; percorri o tempo com a mesma velocidade com que se percorre a luz.
E pela primeira vez na vida; corri…

contioutra.com - As águas do Tempo
Gorongosa, Moçambique

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Hirondina Joshua

contioutra.com - As águas do TempoNasceu em Maputo, Moçambique, a 31 de Maio de 1987.
Está integrada em várias antologias, revistas, jornais, sites, blogues nacionais e internacionais. Teve Menção Extraordinária no Premio Mundiale di Poesia Nósside 2014.

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Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer

Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer

Por Josie Conti

Se Manoel de Barros descreve a essência, a pureza e as próprias insignificâncias da vida, nas obras abaixo, o artista plástico lituano Laimonas Smergelis as pinta.

A CONTI outra os convida para um passeio pela estética sublime das temáticas mais singelas.

Façam um bom passeio.

contioutra.com - Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer
Laimonas Smergelis

“E vi as borboletas. E meditei sobre as borboletas. Vi que elas dominam o mais leve sem precisar de ter motor nenhum no corpo. (Essa engenharia de Deus!) E vi que elas podem pousar nas flores e nas pedras sem magoar as próprias asas. E vi que o homem não tem soberania nem pra ser um bem-te-vi.”

Manoel de Barros

contioutra.com - Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer
Laimonas Smergelis

“Não tenho pensa.
Tenho só árvores ventos
passarinhos – issos.”

Manoel de Barros

contioutra.com - Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer
Laimonas Smergelis

“A ciência pode classificar e nomear todos os órgãos de um sabiá
mas não pode medir seus encantos.”

Manoel de Barros

contioutra.com - Para saborear Manoel de Barros: um passeio estético que vocês merecem fazer
Laimonas Smergelis

“Por viver muitos anos
dentro do mato
Moda ave
O menino pegou
um olhar de pássaro –
contraiu visão fontana.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Está rengo de mim o amanhecer.
Ouço o tamanho oblíquo de uma folha.
Atrás do ocaso fervem os insetos.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Retiro semelhanças de árvores comigo.
Não tenho habilidade pra clarezas.
Preciso de obter sabedoria vegetal.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Uma espécie de gosto por tais miudezas me paralisa.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Pra mim, poderoso é aquele que descobre as insignificâncias [do mundo e as nossas].”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“A sensatez me absurda.
Os delírios verbais me terapeutam.
Posso dar alegria ao esgoto ( palavra aceita tudo).”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Só as coisas rasteiras me celestam.
Eu tenho cacoete pra vadio.
As violetas me imensam.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se
inclui a sedução.
É quando a pássara está namorada que ela gorjeia.”

Manoel de Barros

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Laimonas Smergelis

“Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância
de ser feliz por isso.”

Manoel de Barros

Dica da Conti outra: Saiba mais sobre a obra do poeta e conheça os projetos sociais da Fundação Manoel de Barros.

As guerreiras africanas do Daomé estão nas ruas do Senegal

As guerreiras africanas do Daomé estão nas ruas do Senegal

Por Sandra Quiroz

Do original contioutra.com - As guerreiras africanas do Daomé estão nas ruas do Senegal

[dropcap type=”1″]A[/dropcap] África não é só famosa por sua rainhas, mas também para suas guerreiras. Desde o Egito antigo, passando pela Núbia, Nigéria, Congo, Gana, Guiné Bissau, África do Sul e Benin. O continente tem uma história de luta das mulheres que eram combatentes assim como os homens.

As guerreiras do Daomé, também conhecidas como as guerreiras Mino, são um exemplo disso.  Foram soldados valentes e disciplinadas. A crueldade em sua forma de lutar as colocava a frente no campo de batalha contra os colonos brancos europeus. Este exército de mulheres foi criado no início do século XVII, e por quase 200 anos dominou e prevaleceu invicto. As Amazonas do Daomé são um dos poucos exércitos de mulheres documentado da história moderna.

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Foto de Edmond Fortier

O único propósito destas guerreiras era a guerra. Elas eram educadas e treinadas para a luta. Não podiam ter filhos ou se casar e suas habilidades físicas vieram para superar os guerreiros homens . Rifles Winchesterque obtidos da venda de escravos, facas, lanças, arcos e flechas eram as suas armas. Após as batalhas, bebiam o sangue de seus inimigos e , em seguida, expunham suas cabeças como um troféu de guerra .

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Foto de © YZ

Algumas fontes indicam que o número de guerreiras Mino chegou a quatro mil e outros dizem que elas chegaram a casa de seis mil mulheres guerreiras . Durante dois séculos, essas tropas foram poderosas na África Ocidental até que desapareceu em 15 de janeiro de 1894. O reino do Daomé perdeu a batalha contra a França e tornou-se uma colônia, agora Benin.

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Foto de © YZ

E  foi justamente a história dessas mulheres fortes e respeitadas do reino do Daomé, que inspirou a artista francesa YZ Yseult . “Amazon” é o nome do seu trabalho que consiste em uma série de imagens em preto e branco do passado anti colonial e revolucionário.

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Foto de © YZ

Do outro lado da arte de rua, que sempre foi uma ferramenta de expressão poderosa , YZ apresenta o mundo das mulheres que marcaram a história africana e desafiaram todos os tipos de estereótipos. Histórias dessas grandes Amazonas, em ruas senegalesas . Histórias de mulheres anônimas que hoje devem ser lembradas.

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Foto de © YZ
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Foto de © YZ
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Foto de © YZ
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Foto de © YZ
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Foto de © YZ

11 possibilidades de melhorar a convivência

11 possibilidades de melhorar a convivência

Por Lourival Antonio Cristofoletti

Tendemos a entender e a crer que sabemos fazer escolhas. Nem sempre nossas vontades são o que há de melhor para nós mesmos. Embora possa ser interessante a opção de quem resolve ficar em seu próprio mundo, talvez valha a pena ser reservar um espaço para reflexão sobre como nos comportamos no círculo de amizades e o que poderíamos fazer de diferente para entendermos melhor o outro e sermos mais bem compreendidos.

Assim, para quem desejar dedicar algum tempo para esse propósito, talvez seja o caso de dar uma pausa para analisar a viabilidade de promover alguns ajustes em seu jeito de ser e de se comunicar, podendo, quem sabe, ser possível:

  • Compartilhar mais vezes seus conhecimentos, experiências, dons e habilidades, abrindo espaço para reflexões, incentivando o despertar de vocações, talentos, lideranças, tendo humildade para analisar os questionamentos e críticas, além de certa flexibilidade para se reposicionar.
  • Sair da zona da neutralidade e fazer o que tiver ao seu alcance para esclarecer os mal-entendidos e trazer clareza à situação, quando se mostra desejável um posicionamento seu, pela sensibilidade que tem e pelo conhecimento do assunto e pelos seus vínculos com os envolvidos.
  • Dosar o limite de insistência, em termos de tentativa de persuadir alguém, respeitando o estágio de evolução e as conveniências dele: “Você pode levar um cavalo às margens do rio, mas não consegue obrigá-lo a beber água”. Isto, porém, não o livra de procurar, com tato, esgotar as alternativas ao alcance.
  • Assimilar que não lhe cabe tripudiar, nem tirar proveito de quem está em desvantagem. Deixar uma saída honrosa para o vencido, permitindo que cada um se manifeste como sabe e quer: ajuda muito aceitar que o choro é livre e a reação alheia, dependendo da situação, merece ser vista apenas um problema alheio.
  • Se entender que deve exercer controles, que o sejam de suas suscetibilidades e imposições: é uma bela maneira de ser melhor para si mesmo e de exercitar a humildade. Nem tudo o que dirigem à sua pessoa está revestido de ofensa, má intenção, inveja, entendendo que a comunicação é complexa demais para ser vista ao pé da letra.
  • Não fazer agressões fortuitas, com rancor, ódio para, minutos depois, se arrepender do que disse ou fez. Controlar-se nos desentendimentos e manifestações radicais: de preferência, nas relações, nunca corte o que puder desatar.
  • Ter mais vezes a inocência de crer com mais frequência nas boas intenções dos outros, principalmente os que estão mais próximos, que desfrutam da sua intimidade e gozam da sua confiança.
  • Elogiar sempre que surgir uma boa oportunidade: quem sabe fazer isso e reconhecer o mérito do outro desenvolve controle de vaidades,reconhecendo o mérito do outro. Será enxergado com mais afeto e sua conduta poderá servir de inspiração. Terá suas críticas aceitas com mais naturalidade: quem sabe elogiar tem mais direito de criticar.
  • Estender seu olhar para breves frases que parecem irrelevantes bordões e que podem encerrar oportunidades de interessantes repensares: “ser humilde, sem ser servil”; “ser simples, sem ser simplório”; “ser reflexivo, sem ser lacônico” ; “ser conciso, sem ser incompleto”.
  • Cuidar para desenvolver mecanismos para aceitar com a possível naturalidade as discordâncias às suas opiniões e posturas. Cabe-lhe ponderar que até as suas sólidas convicções podem gerar questionamentos: ao permitir livremente essas manifestações terá oportunidades interessantes de reflexão e de aprimoramento.

E, finalmente, mas não menos importante:

  • Voltar suas atenções para a gentileza e a generosidade quando fizer críticas, escolhendo as palavras adequadas e o melhor momento para fazê-las: é uma oportunidade para evitar comentários furtivos, maledicências, prejulgamentos que são preconceituosos. Nas coisas em que tem agido de maneira diferente e não tem gostado do resultado, há uma oportunidade de mudanças: poderá, quem sabe, sentir-se mais leve e um pouco mais bem resolvido: todos agradecerão.

LOURIVAL  ANTONIO CRISTOFOLETTI

contioutra.com - 11 possibilidades de melhorar a convivênciaPaulista de Rio Claro e residente em Vitória/ES. É mestre em Administração pela UnB – Universidade de Brasília, Analista Organizacional e Consultor em Recursos Humanos. Atualmente atua como professor na Graduação e MBA na FAESA – Faculdades Integradas Espírito-Santenses; Instrutor na UFES – Universidade Federal do ES e na ESESP– Escola de Governo do ES.

Livro publicado: COMPORTAMENTO: INQUIETAÇÕES & PONDERAÇÕES
Livraria Logos (vendas pelo site)

E-mail de contato: : [email protected]
No Facebook: Lourival Antonio Cristofoletti No Instagram: lourivalcristofoletti

O Olhar, por Rubem Alves

O Olhar, por Rubem Alves

“Georgia O’Keeffe foi uma pintora norte-americana. Seus quadros são assombrosos! Porque seus olhos são assombrosos! “Ninguém vê uma flor realmente”, ela observou certa vez. “A flor é tão pequena… Não temos tempo e o ato de ver exige tempo, da mesma forma como ter um amigo exige tempo. “O ver, como fenômeno físico, acontece instantaneamente. Basta abrir os olhos … A luz toca a retina e a imagem se forma nalgum lugar do cérebro. Igual ao que acontece com a máquina fotográfica. Mas há um outro ver que não é coisa dos olhos. Como quando se contempla uma criança adormecida. A visão de uma criança adormecida nos acalma. Faz-nos meditar. O olhar se detém. Acaricia vagarosamente. O olhar se torna, então, uma experiência poética de felicidade. Sentimos que a criança que vemos dormindo no berço dorme também na nossa alma. E a alma fica tranquila, como a criança. É por isso que, mesmo depois de apagada a luz, ida a imagem física, vai conosco a imagem poética como uma experiência de ternura.” Rubem Alves

Dica da Conti outra: Conheça o Instituto Rubem Alves e acompanhe seus projetos.

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Imagem do filme “Vida e Arte de Georgia O’Keeffe”, (2010)

 

 Dica de livro: Sete Vezes Rubem (Fruto do trabalho de uma década, esta obra reúne sete livros de Rubem Alves publicados pela Papirus entre 1996 e 2005.)

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