Quanto vale um professor?

Quanto vale um professor?

Por Nara Rúbia Ribeiro

Na era do culto às celebridades, do elogio à desinteligência, da ânsia pelo fútil, do aplauso ao vazio, quanto vale um professor? Nada. Talvez menos que nada. Talvez seja um número negativo, uma subtração ao padrão de mundo que a maioria almeja.

Eu me considero uma eterna aluna da vida, uma estagiária da existência; e tive muitos mestres. Ainda os tenho. Daquilo que tenho aprendido, muito devo àqueles que, em sala de aula, transmitiram-me seus conhecimentos. Contudo, devo confessar que a postura dos meus verdadeiros mestres diante da vida foi o que sempre mais me ensinou.

Muitos dos meus professores ilustravam em seu currículo, de diversas formas, o ideário de suas vidas. Eles se viravam com seus baixos salários, lutando por melhor remuneração e melhores condições de trabalho. Eles tinham a audácia de se rebelar contra os ditames de nossos dias: contra a coisificação do homem e a tentativa capitalização das almas, negando-se a pactuar com a transformação dos outros em meros números, em objetos estatísticos que podem ou não nos auferir alguma vantagem patrimonial.

Sempre estudei em escola pública. Já tive aula em que o professor ditasse toda a matéria, pois o giz havia acabado. Já vi professor fazer vaquinha entre os colegas para comprar remédio de preço módico para o filho. Tive a oportunidade de ver a merenda negada ao professor, posto que o Ministério da Educação a distribuía, foi o que alegaram, apenas “para os alunos”.

Hoje, o professor, por mais que se desdobre, por mais que se dedique, por mais que tenha a sua carreira como prioritária, ganhará sempre pouco. Caso se valha apenas da docência, não terá patrimônio, não terá status, não será celebrado, não terá holofote dos veículos de comunicação. E, neste país, ainda prevalece a crença de que quem é celebridade é tudo. De que o bom profissional não é o honesto e probo: o bom é o rico.

Isso é, implicitamente, ensinado aos nossos filhos. Ser bem sucedido é ter espaço na MTv, é ser badalado por revistas de fofocas, é ser visto de “Camaro amarelo”. Bonito é ser fotografado entre as celebridades. Ser grande é ser famoso, conhecido, não importa se para isso a pessoa tenha que “ordenhar” alguém em reality transmitido nacionalmente. Que importa se o cantor só fala uma frase na música inteira e a frase é de baixo calão? Ele é rico e famoso, e é isso o que importa.

Muitos andam preocupados com a crise econômica, mas quem anda se ocupando da crise dos valores? Quem anda se dedicando ao conhecimento, à busca por novas leituras do mundo, à quebra, à ruptura do modelo desumano de sociedade que criamos? Quem se dedica a questionar padrões e a não cotejar o conformismo? Quem, além dos profissionais da Educação?

Por isso, quando vejo um professor sangrando ao legitimamente lutar por um direito seu, a minha alma sangra junto. Mas a ignorância que nos sangra não é capaz de drenar os nossos sonhos. Sabemos que o culto à celebridade, bem como o elogio à ignorância, não se sustenta se iluminado pela razão, uma vez acordada a sensibilidade de cada um.

Ser nada a uma geração onde o vazio é aplaudido de pé, remar contra o mar da mediocridade do mundo é uma glória sem preço. Em tempos como o nosso, ser menos é mais.

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“Em algum lugar do passado”: o reencontro entre a matéria e o sonho

“Em algum lugar do passado”: o reencontro entre a matéria e o sonho

Por Octavio Caruso

O espírita absorve o que ocorre no filme como uma metáfora sobre reencarnação, mas esse elemento, além de simplificar demais a sensibilidade do tema, não existe na obra original: “Bid Time Return” (1975), de Richard Matheson, diferente de outra obra do escritor, “Amor Além da Vida”, que é essencialmente espiritualista em sua noção de céu e inferno, mesmo que sendo utilizados metaforicamente, posto que o espiritismo, como doutrina, mesmo existindo de forma modesta em outros países, foi abraçado com maior respeito pelo Brasil. Matheson inspirou-se no livro “Man and Time”, de J.B. Priestley, que abordava uma viagem no tempo realizada por meio da auto-hipnose, para contar uma fantasia envolta em romance.

O escritor que já tinha um histórico de contos de terror e ficção científica intencionou desafiar-se com uma abordagem diferente, mais lúdica, da desgastada fórmula da viagem no tempo. Seu protagonista no livro descobre-se com um tumor inoperável no cérebro, o que o leva a impulsivamente hospedar-se em um refinado hotel, onde encontra o retrato de uma bela e jovem atriz. Disposto a voltar no tempo e encontrá-la, ele incorre à auto-hipnose, fazendo sua mente acreditar que sua matéria se transferiu para aquele ponto no espaço-tempo. Ao final, fica implícito que aquela aventura romântica foi apenas o delírio de um moribundo. Já ao escrever o roteiro para a adaptação cinematográfica, cinco anos depois, o escritor decidiu modificar bastante o percurso do protagonista, suavizando ainda mais o conceito romântico, pois não haveria mais o tumor no cérebro, mas, sim, uma morte causada pela intensa frustração amorosa, por não poder mais estar próximo da mulher que ama. Incluiu também a cena inicial, onde vemos uma senhora idosa se aproximar do jovem e clamar enigmaticamente que ele a reencontrasse, aspecto que torna compreensível o tom espiritualista que a obra então recebeu entre os cinéfilos brasileiros. Um filme que pode ser tido como objetivamente espírita é o fraco “A Reencarnação de Peter Proud” (1975), que, inclusive, é similar ao trabalho de Matheson, mesmo que não trate o tema como algo possível, mas, sim, como um bom material para que o diretor J. Lee Thompson exercitasse o suspense e terror, na fase em que vários produtores buscavam pegar carona no sucesso de “O Exorcista” (1973).

A atriz Jane Seymour admirava tanto seu colega Christopher Reeve, que colocou o nome dele em seu filho. Os dois continuaram amigos até o falecimento dele. O diretor Jeannot Szwarc não obteve nenhum outro sucesso em sua carreira, chegou a atrair a atenção popular novamente com o fracasso de “Supergirl”, em 1984. No belo “Em Algum Lugar do Passado” (Somewhere in Time – 1980), sua direção melíflua combina perfeitamente com o tom do roteiro, podendo soar sacarina demais para alguns, mas coerente com a proposta. A trilha sonora de John Barry é uma das mais belas compostas por ele, com inserções marcantes da décima oitava variação de “Rapsódia Sobre um Tema de Paganini”, de Rachmaninoff. Um detalhe interessante é que, na emocionante cena próxima ao final, onde Reeve passa seus últimos momentos no passado com Seymour, o ator havia acabado de saber que seria pai pela primeira vez, tornando muito difícil para que ele se concentrasse no personagem.

Retirando os elementos fantásticos, a razão do encantamento perene que provoca nos cinéfilos do mundo todo, a profunda identificação que todos nós sentimos com o conflito do protagonista. Quem não gostaria de poder rever um ente querido ou um amor que não existe mais? Passar alguns minutos na presença de alguém que vive apenas na memória, poder falar coisas que não foram ditas, reviver momentos felizes por alguns segundos. Não existe cena mais bela que aquela onde Reeve percebe estar fora de seu tempo, vivendo uma ilusão, sendo brutalmente transportado para sua realidade. A sua reação ao descobrir-se sozinho novamente, após tantos momentos agradáveis com a mulher que amava, sabendo que não a veria novamente, contorcendo-se de desespero em sua cama. Resignado em sua profunda dor, ele aguarda seu fim. Na presença da morte ele volta a sorrir, sua mente refaz o longo caminho até ela, que o aguarda como se nunca houvesse partido. No exato segundo em que ocorre o aguardado enlaçar de suas mãos com as da mulher que ama, simbolizando o reencontro entre a matéria e o sonho, o filme termina.

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OCTAVIO CARUSO

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Carioca, apaixonado pela Sétima Arte. Ator, autor do livro “Devo Tudo ao Cinema”, roteirista, já dirigiu uma peça, curtas e está na pré-produção de seu primeiro longa. Crítico de cinema, tendo escrito para alguns veículos, como o extinto “cinema.com”, “Omelete” e, atualmente, “criticos.com.br” e no portal do jornalista Sidney Rezende. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro, sendo, consequentemente, parte da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica.

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Ciência comprova: As relações que duram mais dependem de 2 coisas básicas

Ciência comprova: As relações que duram mais dependem de 2 coisas básicas

Por Karin Cristina Guedes de Oliveira

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Milhares de casais se unem em matrimônio anualmente. No Brasil, o mês das noivas é maio, nos Estados Unidos, o mês mais popular para casamento é o mês de junho, onde em média 13.000 casais dizem “sim”.

Desses casais que decidem passar a vida juntos, muitos não conseguem levar o relacionamento por muito tempo. Se você parar agora e analisar quantos casais você conhece que se casaram e se divorciaram, certamente terá que anotar, ou perderá a conta. Pensando nisso, que o psicólogo, John Gottman, juntamente com sua esposa também psicóloga, Julie Gottman, realizaram um estudo com casais para entender melhor o motivo do fracasso e do sucesso de seus relacionamentos.

A conclusão a que chegaram pode parecer óbvia demais, porém ao analisarmos os detalhes de nossos próprios relacionamentos, certamente identificaremos pontos que precisam de mais atenção.

Segundo o estudo dos Gottmans, as duas coisas básicas que movem um relacionamento até o fim da vida são generosidade e bondade.

John e Julie criaram o “The Lab Love” (O Laboratório do Amor), levaram 130 casais para seu laboratório do amor, onde passaram o dia realizando tarefas corriqueiras como comer, cozinhar, limpar, enquanto os cientistas sociais os analisavam. Ao fim das análises, os estudiosos classificaram os casais em dois grupos: mestres e desastres. Passaram-se seis anos e os casais foram chamados novamente. Os mestres permaneciam juntos e felizes. Os casais que pertenciam ao grupo “desastres” ou não estavam mais casados ou permaneciam juntos, porém infelizes. Esse resultado levou os cientistas a conclusão de que a generosidade é fundamental para o relacionamento entre o casal. Atos simples como responder a perguntas rotineiras com agressividade ou com generosidade afeta o futuro e a qualidade do seu relacionamento. Perguntas como: “Você viu aquele pássaro?” podem ser a deixa para a esposa demonstrar mais interesse pelos gostos do marido, agindo com generosidade e bondade, criando uma conexão entre os dois. Respostas ríspidas, desinteressadas ou ignorar o apontamento do seu companheiro por indiferença, significam bem mais do que apenas cansaço, ocupação, falta de tempo. Mas sim, podem representar que tudo é mais importante do que as coisas bobas que ele ou ela apreciam.

O estudo apontou que temos duas respostas a escolher quando se trata das questões de nossos companheiros, podemos optar por respostas generosas que nos aproximam como casal ou respostas ríspidas que nos afastam um do outro. Os “mestres” escolhiam respostas generosas, criavam uma conexão com o companheiro, demonstrando-lhe interesse em suas necessidades emocionais. Pessoas que agem com bondade e generosidade, como os casais que pertenciam ao grupo de “mestres” preocupam-se em criar um ambiente de apreciação e gratidão pelo o que o companheiro faz, em contrapartida, casais “desastres” constroem um ambiente baseado na insatisfação, sempre apontando para os erros do outro, para o que ele deixou de fazer, esquecendo-se dos pontos positivos.

A pesquisa mostrou que em situações como, o atraso da esposa ao se preparar para um jantar pode ser encarado pelo marido de duas maneiras diferentes: com bondade e generosidade ou com agressividade, concentrando-se apenas no fato de que ela sempre se atrasa, nunca se apronta na hora combinada, desconsiderando que o atraso pode ter sido motivado pelo tempo que ela gastou preparando uma surpresa para ele.

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Generosidade e bondade

Generosidade e bondade podem salvar seu relacionamento. Não estou dizendo que no dia de aniversário de casamento, uma vez ao ano, você fará aquela surpresa linda, e pronto. O que a pesquisa revelou implica na aplicação diária de doses de generosidade e bondade, seja relevando uma coisa aqui, sendo gentil em outra situação ali, evitando cobranças desnecessárias e sempre, sempre e sempre concentrar-se no que a outra pessoa fez e faz de positivo, não de negativo. Sua esposa foi ao supermercado e comprou só alimentos, esquecendo-se do creme dental? Você escolhe: seja agressivo e reclame do creme que ela esqueceu ou agradeça pela comida que comprou. Sua escolha dirá que tipo de relacionamento você está vivendo.

John e Julie Gottman, após estudarem os casais com eletrodos enquanto conversavam, concluíram que casais do grupo “desastres” ficavam fisicamente afetados ao dialogarem com seus companheiros, fisiologicamente eram como se estivessem em guerra ou enfrentando um leopardo. Os “mestres” apresentavam passividade, relaxamento e tranquildade ao conversarem. E você? A qual grupo pertence?

‘Ela’, o retrato fiel de nossa sociedade

‘Ela’, o retrato fiel de nossa sociedade

Por Octavio Caruso

O protagonista vivido por Joaquin Phoenix no excelente “Ela”, de Spike Jonze, trabalha inserindo emoções no subconsciente de estranhos, criando cartas escritas à mão para seus clientes. O futuro se mostra através de aparatos tecnológicos requintados, mas a realidade dos homens é exatamente a que vivemos hoje: pessoas que se cruzam nas ruas e não se encaram; corpos carentes de calor humano mesmo quando próximos. A terrível solidão que se experimenta em grupo.

Samantha (Scarlett Johansson), a voz feminina do sistema operacional, uma ideia que gradualmente se revela através da percepção de Theodore (Phoenix), personificando o elemento que carecia na vida dele: algo/alguém que se importa. Só que ela não é real, mas apenas o resultado de uma dedicada pesquisa no banco de dados dele. Ela suspira, não por necessitar de oxigênio, mas por calculisticamente perceber o efeito no processo identificatório (Freud considerava “a mais remota expressão de um laço emocional com outra pessoa”) que esse simples som causa no ser humano. E, tão interessante quanto, temos a personagem vivida por Amy Adams, única mulher com quem ele se relaciona sem demonstrar insegurança. Ela defende uma das melhores frases, o leitmotiv da obra: “Apaixonar-se é uma loucura. É como uma forma de insanidade socialmente aceitável”.

Num toque de gênio, o roteiro encaminha o protagonista a uma situação crucial, onde tendo a opção de, com a permissão de sua “parceira”, experimentar o sexo fisicamente com uma substituta, ele a considera algo menos real, incapaz de emular com ela os sentimentos que compartilha diariamente com Samantha. Ciúme, insegurança, medo. Autênticas emoções que nascem do convívio, nos longos momentos de cumplicidade serena após a usual satisfação sexual dos primeiros meses de uma relação. Ao lembrar-se de sua esposa, vivida por Rooney Mara (ele se recusa a formalizar o divórcio, mesmo sabendo que não há mais possibilidade de retorno), ele percebe que está apenas ativando uma versão dela em sua memória afetiva, algo facilmente manipulável. A nostalgia embeleza tudo o que toca. O que é, afinal, real? Como quando sentimos pena na poética “morte” de HAL 9000 no clássico de Stanley Kubrick, acabamos nos surpreendendo com o nível de afeto que desenvolvemos ao longo da trama pelo casal.

O filme aborda uma realidade que enxergamos hoje. Um espetáculo acontecendo no palco, grande parte da plateia olha a tela de seus smartphones, posicionados para captarem o melhor ângulo. O registro está se tornando mais importante que a experiência real. A emoção está em aguardar os comentários elogiosos dos amigos nas postagens das fotos do evento nas redes sociais. Estão equivocados aqueles que pensam que o ato de manter um diário saiu de moda, ele apenas se tornou público.

Você assiste um filme em casa, sendo interrompido a cada minuto pelo barulhinho irritante do alarme de mensagem nova no WhatsApp daqueles que estiverem acompanhando você na sessão. O mesmo barulho irritante que interrompe praticamente tudo hoje em dia. A pessoa larga o que estiver fazendo e checa a telinha. E, para piorar, nunca é por uma boa causa. São sempre tolices, fotos engraçadinhas, questionamentos estapafúrdios, fofocas, em suma, uma longa variação da velha conversa desajeitada no elevador, sobre questões climáticas e a necessidade de se tomar uma cerveja. Quando mais jovem, costumava adorar visitar a casa do meu avô na região serrana, afastado de tudo, minha fortaleza de solidão, onde o silêncio zumbia os ouvidos. Passava semanas em um ambiente onde a imaginação era incentivada a despertar, uma época onde precisávamos apenas tirar o fone do gancho para conseguirmos paz. Sinto-me sortudo por ter vivido aquela época, triste com a realidade da garotada de hoje, incapaz de olhar nos olhos de alguém por trinta segundos.

Eu sou visto como chato por entrar pouco no Facebook, não ter smartphone e me recusar a usar WhatsApp. Tenho o hábito diário de assistir, ao menos, um filme e, ao longo do dia, avançar a leitura dos livros, algo em torno de cinco, ao mesmo tempo, já que não tenho o mesmo tempo livre de quando era adolescente. Ainda precisa sobrar tempo para a escrita, fundamental em meu trabalho. É uma questão de prioridades. Afirmo que não há a mais remota possibilidade de eu interromper uma sessão de um filme, uma boa conversa ou a leitura de um livro. São experiências de completa imersão, prazeres que saboreio com toda intensidade. Quando estou em um show, vivo aquele momento único. Quer me deixar irritado? Interrompa um bate-papo alegre numa festa, fazendo todos olharem pra uma câmera. O papo nunca volta exatamente para onde estava, pois o clima se perdeu, o assunto muda. Quer registrar o momento? Tome distância e tire a foto de todos conversando, registre a beleza de amigos que aproveitam melhor que você aquela linda oportunidade de interação. E, perdoe a sinceridade, caso você seja aquele pobre coitado que tira duzentas selfies em uma festa, saiba que você simplesmente só se importa com a ilusória imagem que precisa passar para outrem. O registro mental/emocional é muito mais importante que o físico.

Sei que é um desejo utópico, a tendência é essa realidade triste piorar, mas, caso meu conselho sirva a alguém: desligue o smartphone e preste atenção ao mundo real que te rodeia.

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OCTAVIO CARUSO

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Carioca, apaixonado pela Sétima Arte. Ator, autor do livro “Devo Tudo ao Cinema”, roteirista, já dirigiu uma peça, curtas e está na pré-produção de seu primeiro longa. Crítico de cinema, tendo escrito para alguns veículos, como o extinto “cinema.com”, “Omelete” e, atualmente, “criticos.com.br” e no portal do jornalista Sidney Rezende. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro, sendo, consequentemente, parte da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica.

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10 motivos que me fazem me dar muito bem comigo mesma

10 motivos que me fazem me dar muito bem comigo mesma

Por Clara Baccarin

Hoje é segunda-feira, o meu dia da semana favorito! Não, nem sempre foi assim, quantos anos eu passei odiando as segundas, tomando toneladas de café sem açúcar para ver se o dia ficava mais doce. Mas hoje eu bendigo esse dia! Há algumas razões para isso, uma delas é que eu odeio domingo, para mim, domingo tem cara de TPM com sinusite aguda e enxaqueca. Eu choro horrores em quase todos eles. Tudo o que escrevo no domingo são textos pré-suicidas (exagerando só um pouquinho). Por isso segunda-feira é a calmaria pós tsunami. E para a sua sorte e também para a minha, hoje é segunda e esse é um texto sorridente! Outro motivo de hoje em dia eu amar as segundas-feiras é que eu sei que vai começar mais uma semana de muitos escritos, é que eu faço o que amo, apesar de não ser isso que paga minhas contas. Segunda é dia de me autocortejar! Por isso resolvi escrever esse texto hoje, quero compartilhar 10 motivos que me fazem me dar muito bem comigo mesma!

Só um recadinho antes de começar! Pra quem não sabe, regularmente eu escrevo textos ‘listas’ como esse! Veja esse aqui também! 😉

E pode ficar tranquilo que apesar do tom autoajuda, eu tento não ser clichê, sou no mínimo poética e engraçada.

Segue a lista do amor próprio, autoconfiante, de quem aprendeu a fazer fusquinha para aquela segunda-feira chata e intragável!

1. Já pensou em cortar laços?

Quero começar com um item que julgo essencial para que eu possa aproveitar minha própria companhia: o desapego. Esse é um conceito extremamente amplo e eu poderia escrever um livro só sobre isso (aliás já fiz isso, é meu livro Castelos Tropicais). Mas, quero aqui apenas falar sobre algumas facetas de viver de uma forma mais desapegada e independente. Já pensou em cortar laços? Já pensou em tentar se desprender de suas raízes para ver como são seus passos fora da zona de conforto? Já pensou o que você pode ser e aonde pode chegar se você se libertar disso que te prende num solo e te dá estrutura, mas também te limita a visão? Já pensou descobrir que você pode voar se abandonar os tripés, as muletas, se se desapegar dos eternos corrimãos em forma de segurança? Você vai inclusive aprender a se desfazer de fantasias que são tão velhas que parecem terem sido costuradas em sua pele. Vai aprender a se despir dessa camuflagem que te iguala à paisagens tantas vezes cinzas. Desapegar não significa necessariamente dizer adeus, muitas vezes significa apenas dizer ‘não’, ‘minha visão é outra’, ‘eu quero mais’, ‘eu sou diferente’… Ao se despir, ao se diferenciar, pode ser que você se encontre. E reencontros são sempre motivos de comemoração.

2. Atrás dessas paredes existe um quintal

Esse número dois tem a ver também com desconstruir. Parece que desde criança aprendemos que importante mesmo é construir uma bolha forte e segura para que possamos morar dentro. A velha moral da história dos três porquinhos. Com muito trabalho, construímos nossas casinhas de tijolos, de preferência uma casinha cheia de paredes e com poucas portas e janelas para que lobo mau nenhum se atreva a entrar. Temos que nos proteger! Mas você já parou para imaginar o que há atrás de tantas paredes? Essas paredes que eu chamo de verdades, construídas com tijolos antigos, com uma receita ultrapassada, que sim, te protege, mas também te resguarda da vida, da imaginação, de um universo com diversas possibilidades. Atrás dessas paredes existe um quintal, uma floresta, um oceano. Existem também lobos maus, abismos e labirintos, mas até eles podem ser bem divertidos. Demolir paredes leva tempo, desmoronar as próprias verdades exige que você use como ferramenta o auto diálogo, a coragem e a vontade de ver lados seus que quase viraram a última bonequinha russa, quieta e fechadinha dentro de tantas outras. Mas, se há vontade, você consegue quebrar as cascas e renascer. Talvez abrir apenas grandes portas e janelas nas suas pareces já é o suficiente.

3. No meu teatro só tem coadjuvante

Nesse caminho de descosturar fantasias antigas da própria pele e libertar bonequinhas russas, pode acontecer que você decida enfim mudar os protagonistas de sua vida. Já pensou em colocar na frente do palco aqueles atores coadjuvantes, aquele cara que sempre fazia papel de árvore, aquela mulher estabanada que ficava sempre atrás da princesa emplastada de maquiagem? Já pensou em recuperar aquela pessoa que existia na infância quando você era mais você mesmo? Colocar esses seres desprezados como atuantes nos seus dias. Agora eles têm voz e vez e histórias novinhas e mais coerentes para serem desvendadas.

4. Olhos de reconhecer diamantes

Daí então seu olhar muda. Daí então você começa a querer estar perto do que combina com esses novos protagonistas. Daí então você começa a querer o que te faz rir, começa a prestar atenção em coisas que normalmente seriam ignoradas. Seus olhos ficam afiados, agora você consegue distinguir melhor entre um diamante falso e um verdadeiro. Nem sempre dá certo, é verdade. Mas mesmo quando acontece o engano, você já está tão livre que consegue fugir rapidinho do que não interessa.

5. Minha personalidade é múltipla

Ao quebrar verdades o que sobra? Nada e tudo. Você tem um mundo aberto para ser e criar. Acho que vivemos apegados à definições, à nomenclaturas, à receitas. Tenho que ter um nome, uma forma, senão quem serei eu? E se você perceber que não existe manual do autoconhecimento, que não existe uma loja que venda personalidades prontas, redondinhas e bem definidas? Estereótipos são muletas falsas. Se dar bem consigo mesmo tem a ver também com aceitar seu lado bipolar, sua esquizofrenia, sua múltipla personalidade, sua inconstância, as diferentes vozes falando dentro de você. Tudo na vida é movimento, porque sua personalidade não seria? Deixe-se ter estações, dias de sol, dias de dilúvio. As verdades são efêmeras, então não crie uma bíblia de si mesmo.

6. Meus sonhos são festas vip

Sem querer querendo, ao começar a me divertir mais comigo mesma, meus sonhos mudaram. Parece que meus sonhos são uma festa vip, para entrar tem que saber a senha, e ela geralmente começa com olhos nos olhos. Claro que muitos penetras curiosos ainda continuam a invadir meus sonhos, esses que chegam de mãos abanando e vêm apenas para comer o bolo, beber a cerveja e deixar minha alma bagunçada. Um penetra de vez em quando até anima a festa. Mas gosto de continuar dizendo que meus sonhos são festas vip, assim posso comemorar em paz, com convidados que trazem presentes e se embebedam junto comigo.

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7. Os excessos da alma são obras de arte

Daí quando surge um penetra, ou quando a festa vip está muito boa que até nos dias de labuta ela fica existindo no pensamento, também quando a festa acaba e deixa aquela vontade imensa de quero mais ou então uma mega ressaca. Ainda é possível se divertir sozinho. Qualquer sobra, qualquer bagunça, qualquer lembrança pode ser reciclada, pode virar música, pintura ou poema. Os excessos e sobras da alma são obras de arte.

8. Tampe os ouvidos e cante alto

Depois de ter feito muita arte, muitos poemas, escrito textos como esse e ainda perceber os velhos rabugentos insistindo em palestrar por dentro. Essas falas velhas e ranzinzas em forma de mágoa, em forma de desgosto podem ser ofuscadas com música. Lembra quando éramos crianças e quando não queríamos ouvir aquele amigo chato, tampávamos os ouvidos e cantávamos alto ‘Lá lá lá lá’? É praticamente a mesma coisa, mas hoje em dia geralmente eu tomo um banho e canto alto um Chico Buarque (talvez não seja a melhor escolha, por causa de alguma mulheres sofridas, mas mesmo assim comigo dá certo).

9. A intuição conhece mais a minha felicidade

Voltando a falar de mudança no foco de atenção e também sobre mudança de protagonistas, penso que existem aquelas mini nuvenzinhas falando coisas em meus ouvidos. Mas hoje quem faz o papel do anjinho é a intuição, e o diabinho são os conselhos. Claro, pode ser que nem todos os conselhos sejam ruins ou mal intencionados, mas quem vai decidir se um conselho é válido ou não é o meu anjinho. Escuto um conselho, depois escuto a minha intuição e filtro. A intuição conhece mais a minha felicidade. Estou aprendendo a ouvi-la mais e mais.

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10. Quero parar de furar as boias

Vou terminar com uma coisa que ando tentando ter a humildade de aprender. Essa coisa de muitas vezes me sentir afundando nesse mar de lama que muitas vezes a vida parece ser, e eu me debato e grito e quero sair, quero ser resgatada, brado aos sete ventos ‘Socorro! Ajuda! Me tirem daqui!’ E acontece que vez ou outra passam barcos me jogando boias salva vidas, e eu geralmente furo todas. Deve ser só para continuar me debatendo e chamando a atenção. Quero ter a humidade de aceitar ajudas e conseguir sair desse mar que ao mesmo tempo que me engole me seduz. Acho que aprender a boiar também me fará curtir mais as paisagens dessa trajetória.

Por enquanto é isso! Que sua semana tenha muitas festas vip! 😉

Arriverderci!

Alice Ruiz: ‘Talvez a velhice começa exatamente no momento em que você descobre que muita coisa não faz sentido’

Alice Ruiz: ‘Talvez a velhice começa exatamente no momento em que você descobre que muita coisa não faz sentido’

Por Gabriela Gasparin

Fã que sou de Paulo Leminski, estava eu a caminhar pela exposição sobre o poeta na Caixa Cultural, em São Paulo, quando o segurança entra na sala em que eu estava e adverte:

– Moça, vamos fechar a exposição em cinco minutos. Estou avisando só para você se preparar, sabe como é, né?

– Ah, tudo bem, sem problemas – respondo. Afinal, eu já tinha fotografado quase todos os poemas destacados na exposição, entrado em transe com um ensaio de Leminski sobre o sentido da vida (leia ao final do texto) e em poucos minutos assistiria ao show da banda Leminskanções, de Estrela Leminski, filha do poeta, com letras escritas por ele.

Eu não esperava absolutamente mais nada daquela terça-feira de feriado (que já tinha contado com uma caminhada no parque pela manhã e uma visita à exposição de Marina Abramovic à tarde, seguida de um suflê de chocolate com cupuaçu — sim, tem dias que a vida parece realmente fazer muito sentido mesmo!).

Sorridente e satisfeita, agradeci ao gentil segurança e já me preparava para sair quando ele resolveu dar uma última informação:

– E sem contar que a esposa dele resolveu chegar agora, então não queremos tumultuar.

Era isso mesmo. Alice Ruiz, poetisa e companheira de Leminski por anos, caminhava pelo corredor ao lado explicando a algumas mulheres cada detalhe das fotos ali expostas. Uma das fotografias havia me chamado a atenção um pouco antes de ela chegar. Era uma imagem em preto e branco do casal abraçadinho, que remetia a um momento de ternura e amor dos dois. Que nada. Alice revelou que ela nem queria ter tirado aquele retrato no dia. “Estávamos muito tristes”, ressaltou.

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‘Sentido é uma coisa que você acredita que vai encontrar enquanto você é jovem’, diz Alice Ruiz

E foi assim que tive a honra de ver os últimos cinco minutos da exposição com a narração de uma real integrante da história ali exposta. Soma-se a isso, obviamente, a oportunidade que tive de perguntar a ela o sentido da vida.

– Posso devolver com uma pergunta?, indagou Alice (que deixou para responder ao final do show da filha, do qual até fez uma ponta).

– Mas é claro!

– “O que importa o sentido se tudo vibra?…” – e completou: “Eu já escrevi isso faz tempo e publiquei faz tempo, mas aí eu pensei, não tem! Não tem… [sentido]”.

Ela me disse que o sentido da vida é uma de suas questões e a maior prova é que já escreveu sobre o assunto. “É que sentido é uma coisa que você acredita que vai encontrar enquanto você é jovem, talvez a velhice começa exatamente no momento em que você descobre que muita coisa não faz sentido”, observou Alice, esclarecendo que está com 69 anos. E fez questão de ressaltar: “Olha que idade sexy. Estou fazendo 69, meu último 69!”

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Buscando o sentido

O sentido, acho, é a entidade mais misteriosa do universo.
Relação, não coisa, entre a consciência, a vivência e as coisas e os eventos.
O sentido dos gestos. O sentido dos produtos. O sentido do ato de existir.
Me recuso a viver num mundo sem sentido.
Estes ANSEIOS/ENSAIOS são incursões conceituais em busca do sentido. Pois isso é próprio da natureza do sentido: ele não existe nas coisas, tem que ser buscado, numa busca que é sua própria fundação.
Só buscar o sentido faz, realmente, sentido.
Tirando isso, não tem sentido.

Paulo Leminski, Curitiba, agosto de 1986

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Sentido

(Gláucio Giordanni e Carlos Moreira)
Poema: Alice Ruiz (*)
Poema: Makely Ka (**)

Que fique muito mal explicado
Não faço força pra ser entendido
Quem faz sentido é soldado
Para todos os efeitos meus defeitos não são meus

Que importa o sentido se tudo vibra?*

Não importa o sentido
O bramido do meu canto mudo
Comporta bemóis e sustenidos
Convoca ouvidos surdos
Ao silêncio suave
Da melodia sem conteúdo

Está escrito
Quem não quiser ceder
ao canto das páginas
feche os olhos
ou tape com cera os ouvidos**

Poema e voz *: Alice Ruiz
Poema e voz**: Makely Ka

Vidaria é um projeto parceiro CONTI outra.

O verbo Abujamrar – Homenagem a Antônio Abujamra , que faleceu na data de hoje

O verbo Abujamrar – Homenagem a Antônio Abujamra , que faleceu na data de hoje

Por Alan Lima

Se os heróis de Cazuza morreram de overdose de drogas, os meus andam indo embora com overdose de vida. Neste vinte e oito de abril de dois mil e quinze, quem resolveu pegar o bonde natural foi Abujamra. Listaria suas inúmeras facetas como ator e comunicador, porém o termo que melhor lhe abraçou foi provocador.

Ele era uma tempestade de questionamentos. Sacudiu mesmo os mais firmes. Seu programa Provocações, da TV cultura, marcou minha vida. As entrevistas iam além de conhecer opiniões do entrevistado, Abujamra deslocava as perguntas para o grau de socos nas ideias, e o que era certeza, virava uma nuvem… ao ponto de quem respondia, mesmo os célebres como Rubem Alves, Viviane Mosé, responderem… “eu não sei.”

Um apresentador que mexeu seus convidados naquilo que desconheciam.

Deixou em mim,  telespectador,  o desejo de ir além do trivial, de viver as incertezas e incoerências com coragem, sem escondê-las ou mascará-las.

Pelo amor do sagrado, surjam novos velhinhos assim. Brotem do chão, nasçam das esquinas de nossos bairros, irritem a morte ao máximo.

O mundo anda exato demais, a busca por fórmulas rasas de como ser feliz, rico e bonito, são fabricadas sem escalas nos jornais e nas rodas de conversas. Por isso, eu estou aqui apelando,  abujamrem mais!

É isto. Antônio Abujamra  ultrapassou o limite do tempo, chegou no das ideias e se transformou num verbo.

O verbo Abujamrar vem da poesia e significa desmontar os significados da rotina.

Façam bem a si mesmos! Abujamrem-se!

contioutra.com - O verbo Abujamrar - Homenagem a Antônio Abujamra , que faleceu na data de hoje
Antônio Abumjara

Precisamos de afinidades: é mais fácil a combinação do que a diferença

Precisamos de afinidades: é mais fácil a combinação do que a diferença

Por  Ronaldo Magella

Não digo que jamais iria namorar ou casar, me apaixonar ou amar, alguém que escutasse forró, sertanejo ou axé, ritmos que não tenho o menor apreço, não gosto, escuto ou tenho predileção, então, confesso que seria difícil estar ao lado de alguém que tivesse esse gosto musical e fosse participante ativo de eventos com esse tipo de musica por natureza.

Escrevo sobre isto, pois recentemente uma amiga, que pra mim, por suas fotos nas redes sociais, parecia apaixonada, gostando e querendo bem, como dizem meus amigos, terminou o seu relacionamento, e me confessou que, o motivo foram as diferenças de personalidade, gostos e atitudes.

Ela me disse, ele é muito expansivo, sou muito retraída, ele adora aparecer, sou mais na minha, discreta, ele gosta de barulho, prefiro o silêncio, ele é muito alegre, sou um pouco triste e sombria, foi a confissão que ela me confidenciou, sem olhar nos meus olhos, típico do seu jeito tímido e pouco.

Até bem sei, é verdade, realmente precisamos de afinidades e gostos, semelhanças e cumplicidades, como disse no início, não digo que jamais não aconteceria, mas acho pouco provável, e mais, em verdade até já tentei, mas foi decepção pra mim e pra ela, não dá certo, aquilo que não combina e fica meio torto e precisará de muito esforço para ser suportado, a convivência não é fácil.

Sim, é verdade, existem casais que são diferentes, água e óleo, não se misturam, mas em alguma coisa eles devem parecer, pelo menos do amor, no sentimento, no gostar um pelo outro, na vontade e no desejo de ficarem juntos, ao menos e pelo menos nisso. Claro que não estou dizendo para ficarmos loucos e sairmos por aí procura apenas de quem se encaixa na nossa bola de cristal, a pessoa perfeito e redonda, mas temos que admitir que é fácil a combinação do que a diferença.

Se combinando já nos distraímos e perdemos o controle, brigamos e nos magoamos, ficamos com raiva e discutimos, imagine quando nada de parecido encontramos na outra pessoa? Buscamos sempre o nosso espelho, ou, muitas vezes aquilo que nos falta, queremos alguém parecido, que admiramos ou que venha a nos preencher, nos torne melhores e felizes, ninguém, nenhum de nós quer um desejo de amar ou ficar com alguém que sabe que não terá paz.

É fácil enfrentar o mundo ao lado de alguém que amamos, gostamos e sentimos prazer, na conversa, no jeito, na companhia, e quando temos isso, o mundo é pouco e pequenos, a opinião dos outros pouco nos importa ou afeta, a felicidade em nós, nos torna imunes ao que vem de fora, quando a relação é sólida e consistente, nada e nem ninguém derruba, fere ou mata, mas pra isso, talvez, precisamos de semelhanças e afinidades.​
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Ronaldo Magella – professor, poeta, escritor, blogueiro, radialista, jornalista, tomador de café, romântico, sentimental, romântico, feio, e mais nada.
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A flauta de Valentina

A flauta de Valentina

Por Juliana Pereira Santos

Fazia mais ou menos um mês que escutava o som de uma flauta tocando incessante em algum canto da vizinhança. Num primeiro momento, sem a atenção do coração,  aquilo me pareceu apenas barulho, incomodou! Mas comecei a prestar atenção na melodia, e o som caiu doce na alma, era belo!

Os dias seguiram e minha mãe comentou que uma vizinha havia abrigado um sobrinho jovem, de apenas 30 anos, com duas filhas pequenas, uma de seis e outra de nove anos. Em três meses o rapaz perdera a mãe e a esposa de 31 anos com um câncer violento que tirou-lhe a vida em pouco tempo. Chateada, a mulher disse-lhe que algumas vezes encontrava a menina mais velha chorando de saudade.

A história soo-me um tanto indigesta! Compadeci-me dele e de suas filhas, fiz uma prece silenciosa pedindo a Deus que a saudade não lhes tirasse a esperança e por dias, ao sair e ao chegar em casa, tentei encontrar-me com o viúvo, ou com suas filhas, para oferecer-lhes ao menos um caloroso bom dia! Eu havia também ganho vários ovos de Páscoa e pensei que se desse um ovo para as crianças, elas ficariam felizes.

Naquela semana, saindo de casa para o trabalho, escutei uma voz viva, atrás de mim dizendo: “Bom dia”! Era o viúvo! Sua face era serena, e eu, surpresa, respondi com um sorriso sincero e segui meu caminho pensando naquela trágica história. Era sábado! Quando voltei… o som da flauta ressoava novamente, insistente! A música era: Aleluia! Aquela versão bonita que ouvimos no filme Shrek. A música perdurou por todo o dia, só parou com o entardecer! E eu não sabia quem a tocava!

O aleluia para o cristão é uma expressão de alegria plena! Na Páscoa, quando Jesus Ressuscita, ele é dito muitas e muitas vezes como uma forma de afirmação da fé! Só é possível experimentar a força do Aleluia, quem aprende a enxergar a vida na morte! Tarefa difícil! Sofrida! Só os nobres e humildes corações podem alcançar esta graça!

Na segunda feira, encontrei-me com minha vizinha e disse-lhe que apesar de não conhecer as suas sobrinhas, eu havia guardado um ovo de Páscoa para elas e queria entregá-lo. Ela chamou as meninas, que vieram correndo, apresentou-me e lhes disse que eu tinha um presente. Entreguei o ovo e as pequenas,   com os olhos brilhantes e um sorriso iluminado, me deram um abraço apertado, grato! A tia disse à mais velha: “Filha, para agradecer o ovo, toque uma música para ela!” A menina correu, pegou a flauta e tocou o Aleluia! O meu corpo ficou todo arrepiado! Eu havia descoberto quem tocava a flauta mágica! Era a Valentina!

Nas histórias e nos mitos, a flauta é um instrumento de poder mágico! O deus Pã usava a flauta para seduzir as ninfas. No oriente, ela é utilizada para encantar as serpentes! Pensei então que, naquele momento, a flauta poderia ser para a menina, a varinha mágica que curava-lhe o coração!

As crianças são mais sábias que nós! Menos corrompidas, elas estão mais perto da sabedoria de Deus! Apesar de não conhecerem muito as nossas explicações racionais para os dramas da vida, sabem internamente que a morte é inerente à vida humana, sabem que a perda dói e sabem também que a cura para as dores da alma está dentro de nós mesmos!

A menina dos olhos brilhantes e de abraço apertado não é minha paciente! Mas se posso ousar lançar o meu olhar clínico sobre a sua expressão sagrada, ouso dizer que Valentina  usa a flauta para aproximar-se do espírito da mãe, vivo dentro dela! O aleluia, incansavelmente repetido, é um ritual de autocura! Poderia ser talvez a forma que a menina encontra para dizer ao próprio coração que a mãe estará para sempre ali, eternizada, ainda que a saudade lhe corte a alma!

Ontem ouvi novamente o tocar de sua flauta! Fechei meus olhos e por alguns minutos uni-me a ela em seu ritual e mentalizei com força o seu Aleluia! Valentina  é a expressão da criança sagrada e prova concreta de que a sabedoria é confidenciada aos corações livres! Ela vai crescer e certamente lhe roubarão a inocência! Mas rezo, para que o seu coração guerreiro esteja sempre vigilante para guardar em sua memória o poder da flauta mágica!

Imensos doces prazeres

Imensos doces prazeres
Imagem do filme "Diário de Anne Frank"

Por Patrícia Dantas

Num pouso de segundos, senti vontade de vasculhar tudo – tudo o que até então eu havia guardado dos tantos imensos e doces prazeres de um tempo que eu prefiro não calcular em números, mas desejo simplesmente senti-lo – como eram aquelas pessoas, minhas amigas e amigos, as primeiras festas, os jogos, a turminha (como costumávamos chamar), a sala de aula, as brincadeiras, as reuniões secretas, nossas histórias, primeiras fantasias e interesses confusos e arrebatadores pelo outro.

Revirei uma pasta enorme – já se abrindo pelo volume de tantas coisas que eu ainda guardava -, talvez fosse o momento de jogar tudo fora, não lembrar, mas jamais esquecer.

Era tudo tão bom que chega a ser dolorido. As cartinhas, já um pouco encardidas pelo tempo (de uns quinzes, dez, oito anos) me transportaram para um tempo não muito distante se olharmos para nossa cronologia oficial e histórica. Mas, sobretudo, um tempo que adquiriu outro sentido. Já não se escrevem mais cartinhas como aquelas, não se perde mais tempo, porque hoje temos a internet que dá conta de tudo.

Amigos e amigas que viajaram, foram morar distante, não deram mais notícias; amigos e amigas que se casaram e construíram suas famílias; amigos e amigas que preferiram se aventurar pelo mundo; amigos e amigas que encontro e nos comunicamos nas redes sociais com a mesma sensação de uma amizade eterna; amigos e amigas que já se foram, e às vezes nem sabemos para onde; amigos e amigas que não se falam mais, sem motivo algum, ou já se esqueceram da amizade daquele tempo; amigos e amigas que continuam lutando pelo que mais acreditávamos: nossos sonhos; amigos e amigas que um dia poderão se encontrar nos rumos incertos da vida que muitas vezes faz de tudo o caminho mais certo para seguir; amigos e amigas, sem mais.

Fiquei imaginando como eu escrevia, minha forma de ver o mundo, minha forte relação com as palavras. Será que eles aceitavam tudo o que eu dizia? Tudo que pousava com desejo nas minhas mãos e ganhava o papel ainda em branco? Não sei, adoraria saber! Também não sei dizer se eu os entendia, mas eu os respondia sempre, jamais deixava uma conversa, uma inquietação, uma dúvida de um amigo sem resposta, nem que fosse só para dar uma palavra amiga, às vezes com pequenas doses de realidade, pois tinha medo e sabia que a realidade poderia maltratá-los da forma mais cruel possível – sempre tive este senso terrível da realidade -, é como se eu pudesse tocá-la e senti-la antes de dá-la a alguém. Assim, podia escrevê-los de vez em quando.

Ao passo que recebia muitas cartinhas também as enviava cuidadosamente, em envelopes decorados, papeis coloridos e desenhados. Eu até poderia não conhecer grandes obras de arte, mas sabia que a vida necessita de boas doses de arte, todos os dias, para sairmos da tentação de provar sempre das coisas triviais, superficiais, reais.

Ah, só agora lembrei da suprema e sutil realidade! Ainda estou impregnada da leveza daquelas palavras dos meus amigos e amigas que me deixaram estas singelas e poderosas obras-primas, tão instigantes, devoradoras, insistentes, um misto de saudade e esperança.

Arrumei outra pasta nova para guarda-las melhor (as cartinhas que não voltam mais!), e só depois de abrir e ler tudo com atenção, brilho e lágrimas nos olhos, fui organizando cada uma numa espécie de arquivo pessoal, empilhadas de acordo com datas ou formatos (cartas, cartões, papeis soltos), todas numa composição perfeita para bisbilhotar outra vez daqui a uns quinzes anos – não sei se resistirei a minha ansiedade e tamanha tentação em abri-las até lá – não que eu goste de revirar o passado, mas gosto de imaginar cenas, casos, a vida de cada um, como a construção de uma novela, com todas as fases, até o clímax e o desfecho dos personagens.

Agora, todas já estão guardadas, limpas, quase intocáveis. À espera do tempo!

***

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Imagem do filme “Diário de Anne Frank”

10 doenças espiritualmente transmissíveis, por Mariana Caplan

10 doenças espiritualmente transmissíveis, por Mariana Caplan

Kuthumi nos diz que a Espiritualidade é uma armadilha! Algumas delas abaixo….

É uma selva lá fora, e não deixa de ser uma verdade a respeito da vida espiritual como qualquer outro aspecto da vida. Será que realmente pensamos que só porque alguém tem meditado por cinco anos, ou feito 10 anos de prática de ioga, que será menos neurótico que outra pessoa? Na melhor das hipóteses, talvez eles serão um pouco mais conscientes disso. Um pouco.

É por esta razão que eu passei os últimos 15 anos de minha vida pesquisando e escrevendo livros sobre cultivo de discernimento sobre o caminho espiritual em todas as áreas pedregosas – poder, sexo, iluminação, gurus, os escândalos, a psicologia, a neurose – mesmo que a sério, mas simplesmente confusas e inconscientes, as motivações no caminho.

Meu sócio (autor e professor Marc Gafni) e eu estamos desenvolvendo uma nova série de livros, cursos e práticas para trazer mais esclarecimentos para essas questões.

Vários anos atrás eu passei um verão vivendo e trabalhando na África do Sul. Após a minha chegada, fui imediatamente confrontada com a realidade visceral que eu estava no país com a maior taxa de homicídios do mundo, onde o estupro é comum e mais de metade da população era HIV-positivo – homens e mulheres, gays e heteros iguais .

Como eu vim a conhecer centenas de mestres espirituais e milhares de praticantes espirituais através do meu trabalho e viagens, fiquei impressionada pela maneira em que as visões espirituais, perspectivas e experiências tornam-se da mesma forma “infectadas” por “conceitos contaminantes” – compondo um relacionamento confuso e imaturo para princípios espirituais complexos que podem parecer bem invisíveis e insidiosos como uma doença sexualmente transmissível.

As seguintes 10 categorizações não se destinam a ser definitivas, mas são oferecidos como uma ferramenta para se tornar consciente de algumas das doenças mais comuns transmitidas espiritualmente.

1. A Espiritualidade Fast-Food: Misture a espiritualidade com uma cultura que celebra a velocidade, a multitarefa e gratificação instantânea e o resultado é provável que seja a espiritualidade fast-food. A espiritualidade fast-food é um produto da fantasia comum e compreensível que o alívio do sofrimento da nossa condição humana pode ser rápida e fácil. Uma coisa é certa, porém: a transformação espiritual não pode ser obtida em uma solução rápida.

2. Falsa Espiritualidade: a espiritualidade do falso é a tendência de falar, vestir e agir como se imagina que uma pessoa espiritual seja. É uma espécie de imitação da espiritualidade que imita a realização espiritual da maneira que o tecido estampado de pele de onça imita a pele genuína de uma onça.

3. Motivações Confusas: Embora o nosso desejo de crescer seja genuíno e puro, muitas vezes ele se confunde com motivações menores, incluindo o desejo de ser amado, o desejo de pertencer, a necessidade de preencher nosso vazio interno, a crença de que o caminho espiritual removerá o nosso sofrimento e ambição espiritual, o desejo de ser especial, de ser melhor do que, para ser “o único”.

4. Identificando-se com Experiências Espirituais: Nesta doença, o ego se identifica com a nossa experiência espiritual e a toma como sua própria, e nós começamos a acreditar que estamos incorporando insights e idéias que surgiram dentro de nós em determinados momentos. Na maioria dos casos, isso não dura indefinidamente, embora tenda a perdurar por longos períodos de tempo para aqueles que se julgam iluminados e / ou que trabalham como professores espirituais.

5. O Ego Espiritualizado: Essa doença ocorre quando a própria estrutura da personalidade egóica se torna profundamente integrada com conceitos espirituais e idéias. O resultado é uma estrutura egóica, que é “à prova de bala.” Quando o ego se torna espiritualizado, somos invulneráveis a ajudar, uma nova entrada, ou comentários construtivos. Nos tornamos seres humanos e impenetráveis e estamos tolhidos em nosso crescimento espiritual, tudo em nome da espiritualidade.

6. Produção em Massa de Professores Espirituais: Há uma série de atuais tradições espirituais da moda , que produzem pessoas que acreditam estar em um nível de iluminação espiritual, ou mestria, que está muito além de seu nível real. Esta doença funciona como uma correia transportadora espiritual: coloca este brilho, leva àquele insight, e – bam! – Você está iluminado e pronto para iluminar os outros de maneira similar. O problema não é aquilo que tais professores ensinam, mas que representam a si próprios como tendo realizado a mestria espiritual .

7. Orgulho Espiritual: O orgulho espiritual surge quando o profissional, através de anos de esforço trabalhado efetivamente alcançou um certo nível de sabedoria e que usa esse conhecimento para se desligar a novas experiências. Um sentimento de “superioridade espiritual” é outro sintoma desta doença transmitida espiritualmente. Ela se manifesta como uma sensação sutil de que “Eu sou melhor, mais sábio e acima dos outros porque sou espiritual”.

 

8. Mente de Grupo: Também conhecido como o pensamento grupal, mentalidade de culto ou doença ashram. A mente de grupo é um vírus insidioso que contém muitos elementos tradicionais da co-dependência. Um grupo espiritual faz acordos sutis e inconscientes sobre as formas corretas de pensar, falar, vestir e agir. Indivíduos e grupos infectados com o “espírito de grupo” rejeitam indivíduos, atitudes e circunstâncias que não estão em conformidade com as regras, muitas vezes não escritas do grupo.

9. O Complexo de Povo Escolhido: O complexo de pessoas escolhidas não se limita aos judeus. É a crença de que “O nosso grupo é mais poderoso, iluminado e evoluído espiritualmente, e simplesmente colocado, melhor do que qualquer outro grupo.” Há uma distinção importante entre o reconhecimento de que alguém encontrou o caminho certo, o professor, ou comunidade para si, e tendo encontrado aquele, O Único.

10. O Vírus Mortal: “Eu Cheguei”: Esta doença é tão potente que tem a capacidade de ser terminal e mortal para a nossa evolução espiritual. Esta é a crença de que “Eu cheguei” na meta final do caminho espiritual. Nosso progresso espiritual termina no ponto em que essa crença se cristalizou em nossa psique, no momento em que começamos a acreditar que chegamos ao fim do caminho, um maior crescimento cessa.

“A essência do amor é a percepção”, de acordo com os ensinamentos de Marc Gafni, “Portanto, a essência do amor próprio é a auto percepção. Você só pode se apaixonar por alguém que você pode ver claramente – incluindo a si mesmo. Amar é ter olhos para ver. É só quando você se vê claramente que você pode começar a se amar “.

É no espírito dos ensinamentos de Marc que eu acredito que uma parte crítica do discernimento da aprendizagem no caminho espiritual é a descoberta da doença generalizada do ego e auto-engano que está em todos nós. Ou seja, é quando precisamos de um senso de humor e do apoio de amigos espirituais reais.

À medida que enfrentamos nossos obstáculos para o crescimento espiritual, há momentos em que é fácil cair em um sentimento de desespero e auto diminuição e perder nossa confiança no caminho.

Precisamos manter a fé em nós mesmos e nos outros, a fim de realmente fazer a diferença neste mundo.

Por Mariana Caplan, Ph.D.
Adaptado de Eyes Wide Open (Olhos Bem Abertos):
Cultivando o Discernimento no Caminho Espiritual (True Sounds)

Fonte: Mariana Caplan

Nota da Conti outra: A indicação deste texto foi uma gentileza ByNina

Qual a maior e mais dolorosa solidão? Veja a opinião de Vinícius de Moraes

Qual a maior e mais dolorosa solidão? Veja a opinião de Vinícius de Moraes

A maior solidão

A maior solidão é a do ser que não ama.
A maior solidão é a dor do ser que se ausenta, que se defende,
que se fecha, que se recusa a participar da vida humana.

A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo,
no absoluto de si mesmo, o que não dá a quem pede o que
ele pode dar de amor, de amizade, de socorro.

O maior solitário é o que tem medo de amar,
o que tem medo de ferir e ferir-se, o ser casto da mulher,
do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste,
cujo reflexo entristece também tudo em torno.

Ele é a angústia do mundo que o reflete.
Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes de emoção,
as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio,
semeia pedras do alto de sua fria e desolada torre.

Vinícius de Moraes

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Que tal fazer da sua princesa uma engenheira?

Que tal fazer da sua princesa uma engenheira?

Feche os olhos. Imagine a figura de um engenheiro trabalhando. Agora seja criativo e imagine sua filha no lugar do engenheiro. Imaginou? Já sei a resposta, seu cérebro não faz essa conexão. Mas se por um instante fizer, você vai imaginar a sua menina praticamente um menino, e depois conseguirá formar a imagem. Concordo com você, fica difícil ser feminina nesse contexto.

A engenheira Debbie Sterling nos ensina de um jeito descomplicado e totalmente espontâneo como podemos mudar esse paradigma. Ela é fundadora da empresa Goldie Blox, que produz brinquedos construtivos para meninas. Sua inovadora ideia surgiu da sua própria trajetória.

Era uma vez uma menina. Ela brincava de bonecas e tudo deveria ser rosa, caso contrário ela não se encaixaria. Debbie brincou muito e quando chegou à fase adulta escolheu engenharia. Teve aulas de desenho em Stanford e sua vida mais parecia um Lego sem conexões. Os meninos não a entendiam e ela precisou correr atrás para acreditar no seu potencial. No meio dessa luta interna e nadando contra a correnteza caiu uma ficha que encaixou tudo: “Nós meninas, em nossa infância, somos levadas a acreditar que seremos princesas!”. Veja o vídeo:

Debbie tem razão. Passamos horas e horas vestindo roupas de princesas, enquanto os meninos, em vantagem absoluta, brincam de Lego e todos aqueles brinquedos construtivos. Nada contra o rosa. Muito pelo contrário, mas será que podemos pensar além da cor? Nesse momento, ficou claro que a dificuldade ou apenas o não interesse precoce por matérias como matemática e ciências são comuns no gênero feminino. Mas essa tendência não é biológica e sim totalmente cultural.

Quando os tons de rosa começaram a clarear, nossa engenheira queria encontrar um jeito de desenvolver habilidades espaciais nas meninas e acabar definitivamente com o padrão estabelecido. Criou, testou, e enfim encaixou. Depois de algumas tentativas notou que as pequenas tinham mais interesse por livros e assim resolveu unir o útil ao agradável. Criou uma história lúdica, contada através de uma personagem que resolve seus problemas construindo máquinas. Com recurso próprio produziu alguns itens e foi sucesso imediato. Certamente o mundo estava esperando por isso.

Esse pequeno conto de fadas nos mostra que a empresa Goldie Blox proporciona o desenvolvimento intelectual não somente em matérias como matemática e ciências, mas principalmente em áreas como criatividade e arte. O casulo se abriu, nossas crianças são sementinhas ávidas por inovação. A voracidade da energia infantil nos impulsiona, nos move e cada vez mais, fará com que muitas Debbies venham compartilhar suas histórias.

Agora feche os olhos novamente. Respire fundo e imagine aquela figura do engenheiro. Conseguiu? Tudo bem, pode ficar tranquilo, eu também imaginei ele vestido de cor de rosa. O cérebro é plástico, mas precisa de uns minutos para absorver e compreender algumas novidades. Então retomando: desconstruir padrões, construir sonhos e ser feliz. E lembre-se sempre: sua filha será sempre mais que uma princesa!

Texto de Adriana Tucci Rothfuchs

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Título original: Transforme sua princesa numa engenheira
Originalmente publicado em Rescola – Reaprendendo a ensinar

Gratuidade das Aves e dos Lírios, por Manoel de Barros

Gratuidade das Aves e dos Lírios, por Manoel de Barros

 

Sempre que a gratuidade ousa em minhas palavras,
elas são abençoadas por pássaros e por lírios.

Os pássaros conduzem o homem para o azul,
para as águas, para as árvores e para o amor.

Ser escolhido por um pássaro para ser a árvore dele:
eis o orgulho de uma árvore.

Ser ferido de silêncio pelo vôo dos pássaros:
eis o esplendor do silêncio.

Ser escolhido pelas garças para ser o rio delas:
eis a vaidade dos rios.

Por outro lado, o orgulho dos brejos é o de serem escolhidos
por lírios que lhes entregarão a inocência.

(Sei entrementes que a ciência faz cópia de ovelhas, que a ciência produz seres em vidros -louvo a ciência por seus benefícios à humanidade, mas não concordo que a ciência não se aplique em produzir encantamentos.)

Por quê não medir, por exemplo, a extensão do exílio das cigarras?

Por quê não medir a relação de amor que os pássaros tem com as brisas da manhã?

Por quê não medir a amorosa penetração das chuvas no dentro da terra?

Eu queria aprofundar o que não sei, como fazem os cientistas, mas só na área dos encantamentos.

Queria que um ferrolho fechasse o meu silêncio,
para eu sentir melhor as coisas incriadas.

Queria poder ouvir as conchas quando elas se desprendem da existência.

Queria descobrir por quê os pássaros escolhem a amplidão para viver
enquanto os homens escolhem ficar encerrados em suas paredes.

Sou leso em tratar com máquina; mas inventei, para meu gasto,
um Aferidor de Encantamentos.

Queria medir os encantos que existem nas coisas sem importância.

Eu descobri que o sol, o mar, as árvores e os arrebóis são mais enriquecidos pelos pássaros do que pelos homens.

Eu descobri, com o meu Aferidor de Encantamentos, que as violetas e as rosas e as acácias são mais filiadas dos pássaros do que os cientistas.

Porque eu entendo, desde a minha pobre percepção, que o vencedor, no fim das contas, é aquele que atinge o inútil dos pássaros e dos lírios do campo.

Ah, que estas palavras gratuitas possam agora servir de abrigo para todos os pássaros do mundo.

contioutra.com - Gratuidade das Aves e dos Lírios, por Manoel de Barros

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