Para me entender tire os sapatos, puxe um livro, acenda um cigarro, e diga alto “imagina se…”.
Respire fundo, dispa-se, relaxe, esqueça tudo que já sabe dessa vida, esqueça as intenções, esqueça a sua inteligência, padronizada, esqueça as suas experiências, a diferença de idade, as verdades. Para me entender seja. A tentativa de ser intensa, inteira, a tentativa de empatia, a vontade de não se perder, mesmo que a vida seja só perda, mesmo que te façam palhaça, mesmo com essa cara de boba.
Seja uma mulher. Que aprendeu a rir de si mesma, e a defender seu lado feio, que não tem vergonha do que nela é tão pequeno. Para me entender se esqueça. De me ver com os seus olhos, com as suas intenções, preocupações ou ideias. Se esqueça de resgatar os seus mundos para compreender os meus. Venha de alma nua. Porque tenho um lado primaveril tão forte quanto o iceberg. E é provável se enganar à primeira vista.
Sim, estou sempre no caminho do amor, mas esse mesmo caminho que é luz tem longas estiagens. Por isso não me julgue por uma fotografia, uma esquina, um lado, uma tarde de aniversário. Para entender uma mulher tenha a coragem de despi-la com os olhos dela.
Naquela noite de 1982, quando fui com uma amiga franco-brasileira assistir ao filme Fitzcarraldo, quase nada conhecia da vida desse barão da borracha peruano.
As referências a esse mestiço ambicioso vinham de um ensaio amazônico de Euclides da Cunha, que, em 1905, navegou até as cabeceiras do Purus. Euclides, que era obcecado pela ideia do progresso e da civilização, entendeu ou intuiu que a barbárie troca de lado sem fazer cerimônia.
Agora, ao ler um ensaio de Benjamin Abdala (Fluxos Comunitários: Jangadas, Margens e Travessias), conheci outras facetas de Carlos Fermín Fitzcarraldo. Filho de um marinheiro norte-americano com uma mestiça peruana, Fitzcarraldo morreu num naufrágio em 1897, quando tinha 35 anos. Mas essa vida breve não o impediu de construir um império econômico e descobrir um varadouro de nove quilômetros que liga o Rio Urubamba ao Madre de Dios. Esse istmo, que recebeu o nome de seu descobridor, foi importante para a circulação de pessoas e fluxo de mercadorias. O jovem magnata tentou transportar para sua propriedade em Madre de Dios um casarão com estrutura metálica construído por Eiffel. Mas como essa tentativa malogrou, a obra foi erguida em Iquitos.
Como tantos outros barões do “caucho” peruano que enriqueceram em pouco tempo, Fitzcarraldo foi um predador da floresta e um implacável caçador de índios. Euclides narra, de um modo tragicômico, o primeiro contato do jovem Fitzcarraldo com os “primitivos” machcos; depois afirma que dezenas desses índios foram dizimados por armas de fogo do “notável explorador” e seus capangas.
Lembro que naquela noite de inverno parisiense, eu e minha amiga Evelyne paramos de traduzir textos maçantes e fomos ver o filme de Werner Herzog. Os artigos na imprensa diziam que nesse filme havia cenas de Manaus e de seu maior símbolo arquitetônico: o teatro Amazonas, palco de tantas óperas e operetas durante o fausto da borracha. Mas nesse filme, Fitzcarraldo não é o ambicioso seringalista que executou, a sangue frio, centenas de índios da Amazônia. O sonho grandioso de Brian Sweeney Fitzgerald, vulgo Fitzcarraldo, é construir um teatro em Iquitos. O subtítulo do filme é “o preço de um sonho”. Uma tradução mais livre e não menos fiel seria: “o preço de uma loucura”.
Há várias cenas épicas, de deslumbrante efeito visual, como o barco içado montanha acima por centenas de índios; ou um concerto de ópera a bordo desse mesmo barco, que navega diante do porto de Iquitos, cuja população assiste a esse espetáculo inusitado. O filme fala da obsessão de Fitzcarraldo pelo canto lírico, que serve de mediação entre a cultura do “civilizado” e a dos “primitivos”. Mas não foram as sequências bombásticas e ousadas as que mais me emocionaram, muito menos a expressão amalucada de Klaus Kinski.
Logo no começo do filme, quando Fitzcarraldo chega a Manaus, vi uma das praças da minha infância e disse isso à minha amiga. São cenas externas ou foram filmadas num estúdio?, ela perguntou. Externas, eu disse. É Manaus mesmo.
Pouco minutos depois, quando a plateia ovacionava a filmagem da ópera Ernani, interpretada por Caruso e Sarah Bernhardt, uma cena de nove segundos me emocionou. No cinema do Boulevard Saint-Germain, reconheci meus pais no centro da tela. E como minha mãe olhava e ria para a tela, era como se estivesse olhando e rindo para mim.
Voltei várias vezes ao cinema para rever esse par de figurantes felizes, e em cada sessão a saudade que sentia deles só aumentava. Quando telefonei para Manaus, minha mãe perguntou se ela estava bem no filme. Disse que ela era a melhor atriz dentre os 600 figurantes.
E o teu pai?
Sério como sempre, eu disse. E bem mais careca. Mas não olhava para a câmera, e sim para ti.
Ela riu com vontade. O riso, que partiu da margem esquerda do Rio Negro e chegou ao orelhão gelado na rive gauche do Sena, era o riso que não pude ouvir no filme.
Nunca mais vi Fitzcarraldo. Faz algum tempo meus pais saíram deste mundo, mas permaneceram na tela, anônimos para os espectadores. Mesmo assim, ainda posso imaginá-los no outro lado do espelho: essa sala eternamente escura e silenciosa, visitada pela memória dos vivos.
Originalmente publicado em O Estado de S. Paulo, Caderno 2, 27/05/2011
Eugen Berthold Friedrich Brecht nasceu em Augsburg, no dia 10 de fevereiro de 1898, tendo falecido em Berlim Leste, em agosto de 1956. Trata-se de um grande dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido.
Eis um de seus poemas em que, com a acidez que lhe é própria, analisa o papel social do analfabeto político para que não nos esqueçamos de que grande parte da miséria moral deste planeta está diretamente ligada ao mau uso do Poder Político graças, certamente, ao analfabetismo de tantos de nós.
O Analfabeto Político
O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.”
Nada é impossível de Mudar
“Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar.”
Privatizado
“Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade pertence.
Todo homem sábio é sereno.
A serenidade é conquista que se consegue com esforço pessoal e passo a passo.
Pequenos desafios que são superados; irritação que se faz controlada; desafios emocionais corrigidos; vontade bem direcionada; ambição freada, são experiências para a aquisição da serenidade.
Um Espírito sereno já se encontrou consigo próprio, sabendo exatamente o que deseja da vida.
A serenidade harmoniza, exteriorizando-se de forma agradável para os circunstantes. Inspira confiança, acalma e propõe afeição.
O homem sereno já venceu grande parte da luta.
Que nenhuma agressão exterior te perturbe, levando-te à irritação, ao desequilíbrio.
Mantém-te sereno em todas as realizações.
A tua paz é moeda arduamente conquistada, que não deves atirar fora por motivos irrelevantes.
Os tesouros reais, de alto valor, são aqueles de ordem íntima, que ninguém toma, jamais se perdem e sempre seguem com a pessoa.
Tua serenidade, tua gema preciosa.
Diante de quem te enganou, traindo a tua confiança, o teu ideal, ou envolvendo-te em malquerença, mantém-te sereno.
O enganador é quem deve estar inquieto, e não a sua vítima.
Nunca te permitas demonstrar que foste atingido pelo petardo da maldade alheia. No teu círculo familiar ou social sempre defrontarás com pessoas perturbadoras, confusas e agressivas.
Não te desgastes com elas, competindo nas faixas de desequilíbrio em que se fixam. Constituem teste à tua paciência e serenidade. Assim exercita-te com essas situações para, mais seguro, enfrentares os grandes testemunhos e provações do processo evolutivo, sempre, porém, com serenidade.
(Texto ditado a Divaldo Franco)
Extraído do livro “Dimensões da Verdade” – Editora LEAL
Dalai Lama
Vou agora ler e explicar brevemente um dos mais importantes textos sobre a transformação da mente, Lojong Tsigyema (Oito Versos que Transformam a Mente). Este texto foi composto por Geshe Langri Tangba, um bodisatva bastante incomum. Eu prpoprio o leio todos os dias, tendo recebido a transmissão do comentário de Kyabje Trijang Rinpoche.
1. Com a determinação de alcançar O bem supremo em benefício de todos os seres sencientes, Mais preciosos do que uma joia mágica que realiza desejos, Vou aprender a prezá-los e estimá-los no mais alto grau.
Aqui, estamos pedindo: “Possa eu ser capaz de enxergar os seres como uma joia preciosa, já que são instrumentos por meio dos quais poderei alcançar a onisciência; portanto, possa eu ser capaz de prezá-los e estimá-los.”
2. Sempre que estiver na companhia de outras pessoas, vou aprender A pensar em minha pessoa como a mais insignificante dentre elas, E, com todo respeito, considerá-las supremas, Do fundo do meu coração.
“Com todo respeito considerá-las supremas” significa não as ver como um objeto de pena, o qual olhamos de cima, mas, sim, as ver como um objeto elevado. Tomemos, por exemplo, os insetos: eles são inferiores a nãs porque desconhecem as coisas certas a serem adotadas ou descartadas, ao passo que não conhecemos essas coisas, já que percebemos a natureza destrutiva das emoções negativas. Embora seja essa a situação, podemos também enxergar os fatos de um outro ponto de vista. Apesar de termos consciência da natureza destrutiva das emoções negativas, deixamo-nos ficar sob a influência delas e, nesse sentido, somos inferiores aos insetos.
3. Em todos os meus atos, vou aprender a examinar a minha mente E, sempre que surgir uma emoção negativa, Pondo em risco a mim mesmo e aos outros, Vou, com firmeza, enfrentá-la e evitá-la.
Quando nos propomos uma prática desse tipo, a única coisa que constitui obstáculo são as negatividades presentes no nosso fluxo mental; já espíritos e outros que tais não representam obstáculo algum. Assim, não devemos ter uma atitude de preguiça e passividade diante do inimigo interno; antes, devemos ser alertas e ativos, contrapondo-nos às negatividades de imediato.
4. Vou prezar os seres que têm natureza perversa E aqueles sobre os quais pesam fortes negatividades e sofrimentos, Como se eu tivesse encontrado um tesouro precioso, Muito difícil de achar.
Essas linhas enfatizam a transformação dos nossos pensamentos em relação aos seres sencientes que carregam fortes negatividades. De modo geral, é mais difícil termos compaixão por pessoas afligidas pelo sofrimento e coisas assim, quando sua natureza e personalidade são muito perversas. Na verdade, essas pessoas deveriam ser vistas como objeto supremo da nossa compaixão. Nossa atitude, quando nos deparamos com gente assim, deveria ser a de quem encontrou um tesouro.
5. Quando os outros, por inveja, maltratarem a minha pessoa, Ou a insultarem e caluniarem, Vou aprender a aceitar a derrota, E a eles oferecer a vitória.
Falando de modo geral, sempre que os outros, injustificadamente, fazem algo de errado em relação à nossa pessoa, é lícito retaliar, dentro de uma ótica mundana. Porém, o praticante das técnicas da transformação da mente devem sempre oferecer a vitória aos outros.
6. Quando alguém a quem ajudei com grande esperança Magoar ou ferir a minha pessoa, mesmo sem motivo, Vou aprender a ver essa outra pessoa Como um excelente guia espiritual.
Normalmente, esperamos que os seres sencientes a quem muito auxiliamos retribuam a nossa bondade; é essa a nossa expectativa. Ao contrário, porém, deveríamos pensar: “Se essa pessoa me fere em vez de retribuir a minha bondade, possa eu não retaliar mas, sim, refletir sobre a bondade dela e ser capaz de vê-la como um guia especial.”
7. Em suma, vou aprender a oferecer a todos, sem exceção, Toda a ajuda e felicidade, por meios diretos e indiretos, E a tomar sobre mim, em sigilo, Todos os males e sofrimentos daqueles que foram minhas mães.
O verso diz: “Em suma, possa eu ser capaz de oferecer todas as qualidades boas que possuo a todos os seres sencientes,” essa é a prática da generosidade e ainda: “Possa eu ser capaz, em sigilo, de tomar sobre mim todos os males e sofrimentos deles, nesta vida e em vidas futuras.” Essas palavras estão ligadas ao processo da inspiração e expiração.
Até aqui, os versos trataram da prática no nível da bodhicitta convencional. As técnicas para cultivo da bodhicitta convencional não devem ser influenciadas por atitudes como: “Se eu fizer a prática do dar e receber, terei melhor saúde, e coisas assim”, pois elas denotam a influência de considerações mundanas. Nossa atitude não deve ser: “Se eu fizer uma prática assim, as pessoas vão me respeitar e me considerar um bom praticante.” Em suma, nossa prática destas técnicas não deve ser influenciada por nenhuma motivação mundana.
8. Vou aprender a manter estas práticas Isentas das máculas das oito preocupações mundanas, E, ao compreender todos os fenômenos como ilusórios, Serei libertado da escravidão do apego.
Essas linhas falam da prática da bodhicitta última. Quando falamos dos antídotos contra as oito atitudes mundanas, existem muitos níveis. O verdadeiro antídoto capaz de suplantar a influência das atitudes mundanas é a compreensão de que os fenômenos são desprovidos de natureza intrínseca. Os fenômenos, todos eles, não possuem existência própria e eles são como ilusões. Embora apareçam aos nossos olhos como dotados de existência verdadeira, não possuem nenhuma realidade. “Ao compreender sua natureza relativa, possa eu ficar livre das cadeias do apego.”
(Extraído de The Union Of Bliss And Emptiness.)
Fonte: Dalai Lama
Alguma vez na sua vida, você passou por uma situação tão triste, grave ou dramática que perdeu totalmente o foco ou ficou tão mal que entrou em depressão ou, teve uma crise de ansiedade?
Ao estudar um dos artigos escritos pela pesquisadora de Harvard, Diana Coutu, o que me chamou atenção foi o aspecto de que as pessoas resilientes são realistas, porém, não conformista.
Fico me questionando… Se existisse algo simples, pequeno; no entanto, mágico. Algo possível de ser feito, uma pequena ação… Uma atitude que ao ser tomada potencializa a realidade, leva-a a algo mais rico, prospero, intenso e feliz… O que seria?
Para entender melhor, este meu ‘devaneio, compartilho com você outra pesquisa… Em 2001, a psicóloga Barbara Fredrickson, da Universidade da Carolina do Norte, realizou uma pesquisa para detectar a resiliência de um grupo de estudantes. Pouco depois, ocorreram os atentados de 11 de Setembro. A psicóloga, então, retomou sua pesquisa para avaliar os efeitos da tragédia no grupo que ela estava estudando. E fez a seguinte descoberta: os estudantes classificados como mais resilientes no teste anterior experimentaram as mesmas sensações de angústia e tristeza que os menos resilientes experimentaram após os atentados. No entanto, ela notou uma considerável diferença…
A diferença é que os mais resilientes demonstraram maior capacidade de recuperação e registraram menor incidência de problemas como estresse pós-traumático, depressão e ansiedade. Você consegue imaginar o por quê?!
De acordo com os resultados da Dra. Fredrickson, o principal motivo é a atitude positiva.
Responda: Quais são as atitudes que você tem ultimamente diante dos revezes da vida? Atitudes positivas ou negativas? Há algo que você possa fazer para ter mais atitudes positivas?
Se você tem entre 45 e 65 anos, preste bastante atenção no que se segue. Se você for mais novo, preste também, porque um dia vai chegar lá. E, se já passou, confira.
Sempre me disseram que a vida do homem se dividia em quatro partes: infância, adolescência, maturidade e velhice. Quase correto. Esqueceram de nos dizer que entre a maturidade e a velhice (entre os 45 e os 65), existe a ENVELHESCÊNCIA.
A envelhescência nada mais é que uma preparação para entrar na velhice, assim com a adolescência é uma preparação para a maturidade. Engana-se quem acha que o homem maduro fica velho de repente, assim da noite para o dia. Não. Antes, a envelhescência. E, se você está em plena envelhescência, já notou como ela é parecida com a adolescência? Coloque os óculos e veja como este nosso estágio é maravilhoso:
— Já notou que andam nascendo algumas espinhas em você? Notadamente na bunda?
— Assim como os adolescentes, os envelhescentes também gostam de meninas de vinte anos.
— Os adolescentes mudam a voz. Nós, envelhescentes, também. Mudamos o nosso ritmo de falar, o nosso timbre. Os adolescentes querem falar mais rápido; os envelhescentes querem falar mais lentamente.
— Os adolescentes vivem a sonhar com o futuro; os envelhescentes vivem a falar do passado. Bons tempos…
— Os adolescentes não têm idéia do que vai acontecer com eles daqui a 20 anos. Os envelhescentes até evitam pensar nisso.
— Ninguém entende os adolescentes… Ninguém entende os envelhescentes… Ambos são irritadiços, se enervam com pouco. Acham que já sabem de tudo e não querem palpites nas suas vidas.
— Às vezes, um adolescente tem um filho: é uma coisa precoce. Às vezes, um envelhescente tem um filho: é uma coisa pós-coce.
— Os adolescentes não entendem os adultos e acham que ninguém os entende. Nós, envelhescentes, também não entendemos eles. “Ninguém me entende” é uma frase típica de envelhescente.
— Quase todos os adolescentes acabam sentados na poltrona do dentista e no divã do analista. Os envelhescentes, também a contragosto, idem.
— O adolescente adora usar uns tênis e uns cabelos. O envelhescente também. Sem falar nos brincos.
— Ambos adoram deitar e acordar tarde.
— O adolescente ama assistir a um show de um artista envelhescentes (Caetano, Chico, Mick Jagger). O envelhescente ama assistir a um show de um artista adolescente (Rita Lee).
— O adolescente faz de tudo para aprender a fumar. O envelhescente pagaria qualquer preço para deixar o vício.
— Ambos bebem escondido.
— Os adolescentes fumam maconha escondido dos pais. Os envelhescentes fumam maconha escondido dos filhos.
— O adolescente esnoba que dá três por dia. O envelhescente quando dá uma a cada três dia, está mentindo.
— A adolescência vai dos 10 aos 20 anos: a envelhescência vai dos 45 aos 60. Depois sim, virá a velhice, que nada mais é que a maturidade do envelhescente.
— Daqui a alguns anos, quando insistirmos em não sair da envelhescência para entrar na velhice, vão dizer:
— É um eterno envelhescente!
Que bom.
O texto acima foi extraído do livro “100 Crônicas”, Cartaz Editorial/Jornal O Estado de São Paulo, São Paulo, 1997, pág. 13.
Conheça a vida e a obra de Mario Prata visitando “Biografias”.
Imagine ser você uma caçamba e ter que transportar uma quantidade de areia infinita. Seriam necessárias incontáveis viagens. Nunca acabaria essa tarefa. Disto vem aquele dizer: “é areia demais para o meu caminhãozinho.”
Quem nunca se encantou com uma pessoa, calculou as probabilidades de conquistá-la e chegou ao resultado zero?
“Eu não tenho chance.”
Sem jogar, você nunca vencerá. Na desistência precoce, jamais saberá se os cálculos estão corretos. Porém, existem situações em que, de fato, é melhor tirar o time de campo, antes de levar um cartão vermelho coletivo.
Há um terceiro cenário, o mais doloroso.
Você já saiu de sua zona de conforto. A outra pessoa abriu espaço, acenou para uma possível vitória e o jogo começou. Surgiram “sins” nas respostas. O começo corria bem e uma derrota parecia distante. O placar seguia sem gols, mas a torcida já comemorava nas arquibancadas, erguiam-se as faixas: é tetra!
Então, no auge da confiança, você ouve um não.
A expectativa da conquista tornou-se num sentimento de fracasso. O coro de “é campeão” entalou e calou no estádio. Sem fazer ideia de como tudo deu errado, você então se questiona: por quê? O melhor chute bateu na trave.
Respire e pense.
Não somos carregadores de areia. Somos histórias. Cada pessoa é um roteiro desenrolando. Seremos, para o outro, vilões, coadjuvantes, atores principais. Nunca, porém, seremos diretores. Jamais iremos dirigir e isso torna todo o enredo imprevisível.
Ninguém o deixou porque é menos bonito, inteligente. Apenas aquele filme não era o do momento, por fatores misteriosos. O ser humano é complexo: detestarão e amarão pelas mesmas características.
Cuida das suas lindezas, pois, mais que um caminhão, é um Universo.
Que teus personagens sejam boas estrelas a te enfeitar.
Dentro da rotina agitada e repleta de tarefas e exigências do dia a dia, tem muita gente que está reservando um tempinho para pintar e se expressar através dos livros para colorir, que alías, tem virado uma verdadeira febre entre os adultos.
São jardins, florestas, mandalas e tantos outros desenhos que permitem o relaxamento e a criatividade. Os mesmos desenhos ganham tonalidades, combinações e versões diferentes para cada olhar e mão que rege o lápis de cor.
Assim, as pessoas se percebem desatando os nós da ansiedade, da preocupação, do estresse e se deslocam para um novo mundo, o próprio universo interior. Um verdadeiro resgate da nossa criança interna, que numa versão adulta e suportada na coletividade pode novamente adentrar no mundo do lúdico, do mágico e da imaginação.
E como faz a criança em idade escolar, nós adultos podemos voltar a treinar nossas mais diversas habilidades e capacidades pessoais.
A cada expressão artística precisamos definir as cores que farão a combinação desejada e, assim, exercitamos nossa capacidade de julgamento, de escolha e nossa visão ampliada do objetivo proposto, que, por sua vez, nos permite a previsão de onde queremos chegar.
Precisamos pensar no traçado e na força do lápis que iremos empregar e, com isso, treinamos a leveza e a delicadeza ou a força e a firmeza diante de si e do mundo.
Tomamos o cuidado para respeitar as margens, para não deixar que uma parte transborde sobre a outra e, deste modo, testamos nossos limites internos e externos. Fazemos o exercício do que está dentro e fora de nós. Aprendemos a ser cuidadosos e a fazer algo com esmero e precisão.
Escolhemos gravuras mais detalhada ou mais expansivas e, com isso, podemos identificar como anda nosso próprio humor. Se estamos mais abertos ou fechados, mas calmos ou irritados, mais serenos ou agitados.
Trabalhamos com afinco e energia até que alcançamos o resultado final. Desta forma, treinamos nosso foco e determinação. A sermos persistentes e não deixarmos para trás questões inacabadas ou assuntos mal resolvidos.
A cada trabalho terminado é possível testar algo novo, se abrir para novas combinações e materiais e, por essa via, criamos também novos caminhos mentais em nosso cérebro e espaço para condutas mais criativas no cotidiano.
Nada mais gratificante do que ver a gravura terminada e, com isso, elevarmos nossa alma com autoestima e com a sensação de que somos capazes de criar verdadeiras obras-primas a partir de nós mesmos.
Fica claro que os livros para colorir chegaram como um poderoso recurso terapêutico para nós adultos. Eles não substituem um tratamento psicoterápico, médico ou de terapia ocupacional quando indicado, mas abrem o rol de possibilidades que podemos ter as mãos para exercitarmos nossa criatividade, relaxar e apaziguar a alma em momentos de estresse e agitação.
E neste caminho de autodescoberta, há os que tem se arriscado a desenhar suas próprias florestas e mandalas, dando vazão às formas que preenchem seu Ser. Indo além das cores e dos traços e mergulhando nos verdadeiros jardins secretos da alma!
O texto de Daniel Munduruku, graduado emfilosofia, história e psicologia, doutor em educação e escritor premiado da etnia Munduruku, nos faz lembrar de quem fomos um dia e nos deixa óbvia a esperança de que nem tudo esta perdido. Nossa cultura milenar tem muito a nos ensinar.
Adriana Vitória
A milenar arte de educar dos povos indígenas
Por Daniel Munduruku · Lorena (SP) · 15/5/2009 Educar é dar sentido. É dar sentido ao nosso estar no mundo. Nossos corpos precisam desse sentido para se realizar plenamente. Mas também nossos corpos são vazios de imagens e elas precisam fazer parte da nossa mente para possamos dar respostas ao que se nos apresenta diuturnamente como desafios da existência. É por isso que não basta dar alimento apenas ao corpo, é preciso também alimentar a alma, o espírito. Sem comida o corpo enfraquece e sem sentido é a alma que se entrega ao vazio da existência.
A educação tradicional entre os povos indígenas se preocupa com esta tríplice necessidade: do corpo, da mente e do espírito. É uma preocupação que entende o corpo como algo prenhe de necessidades para poder se manter vivo.
Esta visão de educação é sustentada pela idéia de que cada ser humano precisa viver intensamente seu momento. A criança indígena é, então, provocada para ser radicalmente criança. Não se pergunta nunca a ela o que pretende ser quando crescer. Ela sabe que nada será se não viver plenamente seu ser infantil. Nada será por que já é. Não precisará esperar crescer para ser alguém. Para ela é apresentado o desafio de viver plenamente seu ser infantil para que depois, quando estiver vivendo outra fase da vida, não se sinta vazia de infância. A ela são oferecidas atividades educativas para que aprenda enquanto brinca e brinque enquanto aprende num processo contínuo que irá fazê-la perceber que tudo faz parte de uma grande teia que se une ao infinito.
Num mesmo movimento ela vai sendo introduzida no universo espiritual. Embalada pelas histórias contadas pelos velhos da aldeia, a criança e o jovem passam a perceber que em seu corpo moram os sentidos da existência. Este sentido é oferecido pela memória ancestral concentrada nos velhos contadores de histórias. São eles que atualizam o passado e o fazem se encontrar com o presente mostrando à comunidade a presença do saber imemorial capaz de dar sentido ao estar no mundo.
Este processo todo é alimentado por rituais que lembram o passado para significar o presente. São movimentos corpóreos embalados por cantos e danças repetidos muitas vezes com o objetivo de “manter o céu suspenso”. A dança lembra a necessidade de sermos gratos aos espíritos criadores; contam que precisamos de sentidos para viver dignamente; ordena a existência. Cada grupo de idade ritualiza a seu modo. Cada um se sente responsável pelo todo, pela unidade, pela continuidade social.
Educar é, portanto, envolver. É revelar. É significar. É mostrar os sentidos da existência. É dar presente. E não acaba quando a pessoa se “forma”. Não existe formatura. Quem vive o presente está sempre em processo. É por isso que a criança será sempre criança. Plenamente criança. Essa é a garantia de que o jovem será jovem no seu momento. O homem adulto viverá sua fase de vida sem saudades da infância, pois ele a viveu plenamente. O mesmo diga-se dos velhos. O que cada um traz dentro de si é a alegria e as dores que viveram em cada momento. Isso não se apaga de dentro deles, mas é o que os mantém ligados ao agora.
Resumo da ópera: A educação tradicional indígena tem dado certo. As pessoas se sentem completas quando percebem que a completude só é possível num contexto social, coletivo. Cada fase porque passa um indígena – desde a mais tenra idade – alimenta um olhar para o todo, pois o conhecimento que aprendem e vivem é um saber holístico que não se desdobra em mil especialidades, mas compreende o humano como uma unidade integrada a um Todo maior e Único.
Olhar os povos indígenas brasileiros a partir de uma visão rasa de produção, de consumo, de riqueza e pobreza é, no mínimo, esvaziar os sentidos que buscam para si.
Oração
Ah! entrelinhas
Cheias de mistérios
A poesia está com você
Bendita sois vós entre as palavras
E bendito é o verso da vossa estrofe
Além
Entrelinhas mãe de enganos
Mostrai pra nós versadores
Agora e na hora de nossa criação
O que escondes
Silvana Conterno
Vamos falar sobre o ‘efêmero’. Palavra não tão usada quanto deveria, já que é um dos poucos adjetivos que podem qualificar tudo, exatamente tudo. Tudo o que você nota agora ao seu redor e em você é efêmero: computador, objetos, pensamentos, ideias e sentimentos. Nada, absolutamente nada é imutável, tudo está em constante transformação e movimento. Acredito que verdades são efêmeras, acredito que o amor é efêmero e isso apenas quer dizer que o amor, assim como tudo no mundo, se transfigura, muda, é onda, é movimento. E estou falando tudo isso pois quero discutir hoje sobre um dos nossos valores, nossos parâmetros para medir sentimentos. Medimos a importância e a legitimidade de um sentimento através do valor ‘tempo’.
Quando foi que o acúmulo de marcações em um instrumento artificial que deveria ser um facilitador das rotinas, vulgo relógio, se tornou o principal instrumento, diga-se de passagem um tanto ditador, de medida e dos valores dos sentimentos?
Sim, porque nunca vi celebrarmos bodas que foram calculadas na intensidade dos beijos, dos carinhos, na genuinidade do contato dos olhos, na originalidade do primeiro encontro, no brilho das pupilas dilatadas de dois seres se reconhecendo, na química inexplicável e inquantificável por qualquer ponteiro. Nunca vi comemorarmos bodas de ouro que foram medidas no diâmetro do arrepio dos pelos, no choque de peles desconhecidas que se encontram como polos opostos de um imã virgem. Nunca vi comemorarmos e festejarmos o amor genuíno que durou uma noite, um mês, uma temporada, mas que marcou uma vida. Que criou na memória um álbum de retratos mais antigo e mais denso do que as fotos tantas vezes posadas e corroídas a traças dos álbuns de família. Um amor que guardou mais cenas, que criou mais lágrimas, sorrisos e gozos do que as datas comemorativas contabilizadas nos calendários de papel.
Quando foi que amor verdadeiro começou a ser medido e definido pelo tempo? Quando foi que o valor do amor foi julgado pela quantidade de minutos que um aguenta perto do outro? Quando foi que por esse modo de marcação ditar o que é o amor, o amor, muitas vezes, acabou virando tantas outras coisas, menos amor de fato? Quando foi que nos tornamos maratonistas da paciência e aprendemos a conviver com materiais em decomposição só para finalmente provarmos ao mundo que tivemos, vivemos e aturamos um amor de verdade?
Vamos falar sobre o efêmero. O efêmero que é qualidade do que passa, às vezes demora uma vida para passar, às vezes demora uma noite. Às vezes a pessoa morre ou o sentimento dela morre antes dela e do seu sentimento morrer. O efêmero não é justo ou cuidadoso, ele só é fato, ele é apenas a única lei deste mundo.
O efêmero é o nosso único destino certo. E quanto tempo temos até que algo definhe? Não sabemos. E por que então teimamos em medir tudo nesse mundo e celebrar e comemorar as vitórias atribuídas pelo tempo, se o tempo, muitas vezes, será nosso primeiro traidor?
Vamos marcar nossas bodas, nossos sentimentos, nosso amor pela qualidade, pelo transbordamento, pela genuinidade, pela intensidade ao invés do simples, inconfiável, inconstante e mecânico atributo do tempo!
Hoje faço muitas bodas! Hoje celebro as bodas dos amores intensos!
E assim, compreendendo o ‘infinito’ como palavra que qualifica ‘intensidade’ e não ‘duração’, não posso deixar de citar o sábio mestre poeta Vinícius de Moraes (Soneto da Fidelidade):
Há muito tempo quando frequentava os jogos do Atlético Paranaense, ainda na Baixadinha, lembro que sempre no começo do jogo ou quando o jogo não ia bem, a torcida gritava para os jogadores “RAÇA”. Eu que sempre enxerguei a vida com poesia achava aquilo muito emocionante. Era o momento que mais gostava no jogo. E o grito alto e compassado da torcida até hoje ecoa dentro de mim: RAÇA.
Às vezes me pego olhando para pessoas em momentos de dificuldade ou quando estão indecisas ou quando querem desistir e tenho vontade de gritar como gritava nos jogos: RAÇA! Às vezes me olho no espelho e penso: RAÇA. O mundo anda meio mal e o que sinto é que a vida nos pede raça. Porque não tem quem passe ileso por ela sem dificuldades, problemas, problemas de gente grande, daqueles que fazem você duvidar da sua capacidade e achar que não vai dar conta. Muitas vezes eu acho que não darei conta. E o que aprendi é que para dar conta é preciso saber que não estamos sozinhos, e é preciso agir, por nós e pelos outros, precisamos “arregaçar as mangas” e fazer.
E aprendi também que para ter raça é preciso ter certezas. Certeza de que você arregaçou as mangas e fez o que podia, certeza das tuas escolhas, certeza que você estava presente no momento por inteiro e que deu o seu melhor. Mesmo que “seu melhor” às vezes pareça muito pouco.
A indecisão surge quando não estamos presentes por inteiro em nossas escolhas, quando elas são tomadas por outros ou pela vida, quando somos reativos. Quem é indeciso vive sempre pela metade, dividido entre o que foi e o que poderia ter sido. Ter raça é fazer escolhas e estar disposto a assumir as consequências. Porque a felicidade não espera pelos indecisos, ela só chega para quem tem raça. E para ser feliz é preciso coragem. Ter raça nos exige completude. Para sermos inteiros precisamos olhar para a dor do outro com mais cuidado, porque nós não somos completos sem o outro.
Por isso que quando penso em ter raça, penso também em empatia. A empatia é saber que somos compreendidos, que não estamos sós. Empatia é alguém gritando para nós: raça. Empatia é mais que amor, é validar a dor do outro e estar ali presente por inteiro para ele e entender que nem sempre a vida tem a ver com os nossos dramas.
Minha melhor amiga, assim como todos nós, já passou por altos e baixos. E quando ela estava em um dos seus baixos, eu me afastei. Me afastei porque era difícil vê-la sofrendo; porque eu não sabia o que fazer para ajudá-la e porque me sentia inútil diante de sua dor. Então como não sabia o que fazer, me afastei. A verdade é que nós não sabemos lidar com a dor do outro, mas se queremos aprender sobre empatia, precisamos aprender sobre o outro e sobre suas dores.
Um dia em uma discussão em que falei sobre essa minha dificuldade para ela, ela me disse: “mas eu não esperava que você fosse curar minha dor, aliás eu não te pedi isso. Também não queria que você fizesse nada, só queria que você ficasse ao meu lado.” Empatia é isso, aprender a dar autonomia e ter fé que o outro pode dar conta do que vier, mas entender que ele não precisa estar sozinho para isso.
E é fundamental validar a dor do outro para sentir empatia. O mundo hoje pede ação e a ação só vem quando entendemos que fazemos parte de algo maior e somos empáticos perante as injustiças e dores que nos saltam aos olhos. O mundo pede empatia e ao mesmo tempo raça. Raça gera ação. E precisamos agir, precisamos nos envolver. “Se envolver” é algo que tem pouco a ver com palavras e virtualidades e muito a ver com presença e ação.
Ontem voltando do interior vi um acidente na estrada, o carro bateu atrás do caminhão, eu passei e foram poucos segundos em que pensei “não vou parar, alguém vai ajudar” e dai lembrei que quem sabe naquele momento esse “alguém” poderia ser eu. Desci do carro e vi duas crianças sentadas na beira do acostamento chorando desesperadas, o pai deitado ao lado sangrando; a mãe desacordada presa nas ferragens no banco do passageiro e a irmã mais velha gritando atrás, presa no carro.
Enquanto os poucos que estavam lá estavam indecisos do que fazer, orientei um dos rapazes para que não tirassem a menina do carro, não a deixassem sozinha e tentassem mantê-la acordada, liguei para polícia e pedi socorro. Depois me sentei com as crianças ao lado do pai para esperar ajuda. O que aconteceu nas horas seguintes em que estive lá presente e por inteira foi muito forte. E por um breve momento me lembrei da torcida do meu time que é lindamente chamado de Furacão.
Hoje, depois de ver meu pai lutando contra uma doença que lhe custou a vida, depois de assisti-lo dar seu último suspiro, ao ver a agonia de minha mãe perdendo sua consciência, ao olhar para os olhos cheios d´água daquelas duas crianças que haviam acabado de perder a mãe, entendo porque me afastei da minha amiga quando ela precisou de mim e entendo porque não nos envolvemos. A dor do mundo nos paralisa. É realmente muito difícil sentar e ficar ao lado do outro e saber que às vezes isso é a única coisa que podemos fazer, porque para mim apenas estar ao lado parecia ser tão pouco, mas hoje entendo que essa doação de estar ao lado naquele momento por inteiro para o outro, na verdade é algo muito grandioso.
Em momentos difíceis como esse é que me lembro da torcida gritando: raça. Quando as dores do mundo forem tão grandiosas que nos fazem sentir impotentes: raça. Quando a dor do outro lhe sangrar o coração: raça. Quando você sentir que não dará conta: raça. Para os indecisos: raça. Quando passa o furacão: raça. Para que todo o mal e toda dor não nos paralisem: raça. Para o jogo da vida: RAÇA.
Enquanto conversava com o garoto, perguntei do que ele mais gostava, ele me disse: futebol. Então contei para ele sobre os gritos da torcida pedindo “raça” e como aquela era a parte do jogo que eu mais gostava. E pedi para ele ter raça, raça maior que a dos jogadores em uma final de campeonato, muita raça. E depois que eles se foram, segui viagem pensando muito na vida. Que a vida é mesmo um jogo e assim como o futebol é um jogo jogado em equipe; um jogo que nos pede muita raça e o bom de ter raça é que ela não é solitária, a raça vem da certeza; e vem principalmente da plena certeza de que juntos sempre iremos mais longe.
Adendo:
Aprendi muito sobre empatia e comecei a olhar com mais atenção para esse sentimento quando assisti ao vídeo abaixo.
Tudo que a gente precisa, vez ou outra, é que a vida nos surpreenda.
É que, quando tudo está parado, quando dias se repetem por meses em uma sequência prevista de fatos, alguma peça se mexa, desorganizando todas as outras.
O novo assusta, desassossega, aperta o estômago e acelera o ritmo cardíaco, e ,como de tudo que nos parece ameaçador, nossa tendência é fugir, poupar nossas energias optando pelo seguro, pelo previsível, pelo que não nos tira o sono.
No entanto, se algo te instiga, te preocupa tanto a ponto de te privar de noites de sono, é porque, de alguma forma, você está vivendo.
Se você está cheio de feridas, significa que foi corajoso o suficiente para se expor a elas ou para continuar vivendo buscando uma forma de sará-las ou de conviver com elas.
Aquele que muito se protege dificilmente será ferido, mas, certamente, pouco terá vivido.
Lembro de uma passagem que me marcou bastante de um filme ao qual assisti há um tempo atrás que dizia: “Só é coragem se você tiver medo”.
Não é covardia desistir quando as coisas estão difíceis, estão sugando sua energia e lhe fazendo infeliz. Isso é inteligência.
Covarde, penso eu, é aquele que não se deixa surpreender, não se abre para o novo pelo medo do desconhecido. É quando o medo de sofrer é maior que a coragem de ser feliz.
Meu maior medo, acredite, ainda é o de não sentir medo algum.