Só existe uma raça, e ela surgiu na África

Só existe uma raça, e ela surgiu na África

Nem branca, nem negra, amarela ou vermelha. Na face da Terra existe uma única raça: a humana. Todos nós fazemos parte dela.

Há alguns anos o racismo voltou a assombrar o mundo e a encontrar expressão política, justamente na Europa, onde não se imaginaria que poderia ressurgir. Na França, as idéias racistas professadas pela Frente Nacional de Jean-Marie Le Pen e sua filha, Marine Le Pen, atraíram parcela considerável do eleitorado. Em vários outros países europeus, partidos da direita, e até mesmo de movimentos neofascistas conquistaram numerosas cadeiras nos parlamentos. Na mesma medida em que aumenta o número de refugiados e de imigrantes vindos de nações do Terceiro Mundo, aumenta o sentimento de ancestral xenofobia de muitos europeus, que rapidamente encontra seus canais de expressão política.

É interessante se observar como, ao longo da história, as políticas racistas nunca deixaram de pedir à ciência que legitimasse sua hierarquização social, seus preconceitos e exclusões. Muitos foram os cientistas que prontamente se puseram a conceber teorias, instrumentos de medição, critérios e teses que supostamente definiam as características das diferentes “raças” humanas e formulavam a base de sustentação de uma série de eventos que marcaram a história do homem, da expansão colonial europeia ao apartheid sul-africano, do segregacionismo norte-americano ao nazismo.

Nos últimos anos, a palavra raça, aliás, desapareceu discretamente dos livros escolares e as antigas classificações foram desacreditadas. Isso aconteceu graças às descobertas da paleontologia, da genética, da etnologia. Mesmo assim, ainda existem alguns pesquisadores isolados que professam a existência de raças. Quando, em 1994, os psicólogos Charles Murray e Richard Herrnstein publicaram nos Estados Unidos The bell curve, com 800 páginas de gráficos e análises que “demonstravam” que o QI de negros era inferior ao dos brancos, a obsessão racista que inspirou o livro não deixou margem para dúvidas. Seu objetivo político foi claramente percebido: abolir os programas sociais, colocados em prática há 30 anos por Washington, em favor dos mais pobres.

O que se pergunta, nos dias de hoje, é se um cientista pode se interessar por “raças” humanas sem procurar demonstrar sua desigualdade. Na verdade, cada um de nós tem sua própria definição do termo, assim como os ideólogos do racismo sempre encontram defensores para proclamar que o “politicamente correto” é cientificamente incorreto.

A evolução

No século 18, o botânico sueco Carl von Linné criou o sistema de classificação dos seres vivos – ainda hoje utilizado – e estabeleceu o nome científico de Homo sapiens para a espécie humana. Mas, sem contrariar o pensamento dominante na época, dividiu a humanidade em subespécies de acordo com a cor da pele, o tipo físico e pretensos traços de caráter: os vermelhos americanos, “geniosos, despreocupados e livres”; os amarelos asiáticos, “severos e ambiciosos”; os negros africanos, “ardilosos e irrefletidos”; e os brancos europeus, “ativos, inteligentes e engenhosos”. Essa classificação da diversidade humana em “grandes raças” não só foi totalmente aceita como também serviu de base para classificações futuras, que alteravam a de Linné e oscilavam entre uma variedade que ia de três a 400 raças.

No século 19, as descobertas arqueológicas destruíram explicações simplistas para a origem do homem na Terra, a origem do planeta que habitamos. Em A origem das espécies, Charles Darwin formulou a teoria da mutação das espécies. Observou que, por meio da mutação, as espécies se adaptam ao meio natural, geram criaturas diferentes de si mesmas e dão origem a novas espécies. Concluiu, então, que algumas espécies se extinguiam dando lugar a outras: esse processo seria o da seleção natural. Mais tarde, Darwin estendeu essa teoria para o surgimento do homem, classificando-o como descendente dos antropóides. A comunidade científica e outros setores da sociedade opuseram-se a essa conclusão, pois não podiam admitir que o homem branco, “superior”, descendesse de macacos. Na verdade, sabe-se hoje que o homem é parente do macaco e não seu descendente. As descobertas de Darwin foram muito importantes, mas não definitivas, pois as pesquisas continuam, lançando sempre novas luzes sobre as origens do homem.

A mais antiga espécie de hominídeo foi o Australopithecus, que surgiu no sul da África há cerca de 3 milhões de anos. Este nosso provável ancestral tinha algumas características semelhantes ao homem moderno e criou o primeiro instrumento. Quando um dos nossos ancestrais passou a andar sobre os dois pés, ficou com as mãos livres para fazer e usar objetos. O trabalho com as mãos foi sofisticando a sua capacidade de manipular, estimulando o crescimento do seu cérebro e a sua capacidade intelectual e dotou-o de cultura, diferenciando-o dos animais.

A expansão

O homem começou a se diversificar muito cedo, lá pelos 2,5 milhões de anos, quando saiu de seu lugar de nascimento, a África oriental. Ele se propagou através de todo o mundo antigo, isto é, África, Europa e Ásia. Mas as glaciações produziram dois isolados pontos geográficos: a Europa, na qual o norte foi inteiramente recoberto por glaciares; e a Indonésia, que era unida ao continente asiático e dele foi separada no final das glaciações. Esses dois isolamentos levaram a um “derivado genético” e moldaram dois grupos: o Pitecantropona Indonésia e o homem de Neandertal na Europa, muito diferentes anatomicamente de nosso ancestral, o homem moderno que já vivia algures. Este, o Homo sapiens sapiens, há 500 mil anos expandiu suas fronteiras em todas as direções, a partir de uma segunda onda de povoamento na Europa, na Ásia, na Austrália e na América.

Segundo o paleontólogo Yves Coppens, diretor do Laboratório de Antropologia do Museu de História Natural de Paris, “o Neandertal e nosso ancestral, o Cro-Magnon, ao que se sabe constituíram na Europa duas raças distintas. Mas ainda não sabemos se essas populações se ‘inter-fecundaram’, isto é, se geraram descendência fecunda. Também não sabemos se o homem de Neandertal, desaparecido há uns 30 mil anos, como o pitecantropo indonésio, se fundiu com a população de Homo sapiens, ou se extinguiu.”

Para o paleontólogo, “talvez seja essa a única questão sobre raça que hoje interessa à ciência. Em um século de descobertas, vimos se delinearem outras fronteiras no seio da humanidade. Se retomarmos o sentido zoológico do termo – uma subespécie diferenciada mas que se ‘inter-fecunda’ com outras subespécies –, não existe na superfície da terra senão uma única ‘raça’ humana conhecida, a do Homo sapiens sapiens.”

A pesquisa paleontológica e seu prolongamento antropológico tentam estabelecer, dentre outras coisas, quais são as filiações, os laços de parentesco que unem esses humanos. Mas, para Pierre Darlu, geneticista no Laboratório de Epidemiologia Genética de Paris, “todas as classificações tentadas até hoje tiveram como ponto comum a ocultação do caráter evolutivo do homem”.

André Langanney, diretor do Laboratório de Antropologia biológica do Museu do Homem, Paris, acredita que “existem dois conceitos diferentes de ‘raça’ humana: um inclui as particularidades imediatamente perceptíveis entre os indivíduos (língua, cultura, aparência física), devido às diferenças de suas populações de origem; outro é o conceito ‘científico’, igualmente empírico, aquele que foi estabelecido por Linné no século 18, o das quatro raças. Essa formulação foi contestada, algumas décadas mais tarde, pelo filósofo alemão Johann Gottfried Herder, que afirmava não existirem ‘nem quatro nem cinco raças humanas’, ao contrário, havia a continuidade da variação nas populações”.

Uma só espécie

Dizer, hoje em dia, que existem raças humanas, implica em demonstrar a existência de grupos distintos, possuidores de traços “comuns” entre si e de particularidades que não se encontraram em nenhum outro grupo. É claro que entre um senegalês, um cambojano e um italiano existem, evidentemente, diferenças físicas visíveis: cor da pele e dos olhos, tamanho, textura dos cabelos etc. Mas hoje em dia já sabemos que o patrimônio genético dos três é extremamente próximo. A descoberta dos grupos sanguíneos, da variação das enzimas, das sequências de DNA, dos anticorpos e tantas outras, puseram em evidencia o parentesco dos homens entre si, assim como sua extraordinária diversidade. Uma combinação de genes, frequente numa população e rara em outra, é, assim mesmo, potencialmente presente em toda parte.

A comprovação se deu em 2002, quando uma equipe de sete pesquisadores dos Estados Unidos, França e Rússia comparou 377 partes do DNA de 1056 pessoas originárias de 52 populações de todos os continentes. O resultado mostrou que entre 93% e 95% da diferença genética entre os humanos é encontrada nos indivíduos de um mesmo grupo e a diversidade entre as populações é responsável por 3% a 5%. Ou seja, dependendo do caso, o genoma de um africano pode ter mais semelhanças com o de um norueguês do que com alguém de sua própria cidade na África! O estudo também mostrou que não existem genes exclusivos de uma população, nem grupos em que todos os membros tenham a mesma variação genética.

Muitas diferenças

Na sua longa evolução até atingir a sua forma humana final, nosso ancestral foi se adaptando fisicamente às condições ambientais. Perdeu os pelos do corpo, provavelmente há pouco menos de 2 milhões anos, por que começou a fazer longas caminhadas e precisava esfriar o corpo. Sem pelo, ficou com o corpo exposto e as células que produziam melanina se espalharam por toda a pele. A mudança na coloração da pele foi descoberta em 1991pela antropóloga Nina Joblonski, da Academia de Ciências da Califórnia, Estados Unidos, ao encontrar estudos que mostravam que pessoas de pele clara expostas à forte luz solar tinham níveis muito baixos de folato. Como a deficiência dessa substância em mulheres grávidas pode levar a graves problemas de coluna em seus filhos, e como o folato é essencial em atividades que envolvam a proliferação rápida de células, tais como a produção de espermatozóides, a antropóloga concluiu que nos ambientes próximos à linha do Equador, a pele negra era uma boa forma de manter o nível de folato no corpo, garantindo assim a descendência sadia. Para provar suas teorias a respeito de cor da pele, Nina Joblonski usou um satélite da NASA e criou um mapa de padrões de radiação ultravioleta em nosso planeta, mostrando que o homem evoluiu com diferentes cores de pele para se adaptar aos diferentes meio-ambientes.

Assim, o homem saiu da África e chegou à Ásia, e de lá foi para a Oceania, a Europa e por fim para a América. Nas regiões menos ensolaradas, a pele negra começou a bloquear demais os raios ultravioleta, sabidamente nocivo mas essencial para a formação da vitamina D, necessária para manter o sistema imunológico e desenvolver os ossos. Por isso, as populações que migraram para regiões menos ensolaradas desenvolveram uma pele mais clara para aumentar a absorção de raios ultravioleta. Portanto, a diferença de coloração da pele, da mais clara até a mais escura, indicaria simplesmente que a evolução do homem procurou encontrar uma forma de regular nutrientes.

Claude Blanckaert, historiador da ciência no Museu Nacional de História Natural, Paris, acredita que “a teoria das raças demonstra que a ciência jamais é neutra. A tese da grande corrente tornou-se, com o tempo, uma escala rígida de raças, dominada pelos europeus.”.

A partir de 1860, as ciências naturais e pré-históricas concordam que o homem tem uma história bem mais antiga do que se supunha até então. Mas as teorias se adaptam às idéias darwinistas: ao se admitir que as raças são diferentes quase desde a origem da humanidade, sugere-se que certos povos foram submetidos a uma “interrupção de desenvolvimento”.

No século 20, as mitologias nacionalistas foram dominadas pelos clichês, tudo para justificar as políticas colonialistas. O auge desse pensamento foi a ideologia da raça “ariana”, uma tremenda enganação científica, que justificava a eliminação da “anti-raça”, o judeu.

O século 21 fez sua estréia sob a sombra da divisão entre o bem, simbolizado por povos ocidentais (americanos e europeus) e o mal, personificado pelos povos do oriente. Que as idéias racistas não criem mais nenhuma explicação “científica” para provar mais nada!

Fonte indicada: Brasil 247

20 coisas para se lembrar se você ama uma pessoa com depressão

20 coisas para se lembrar se você ama uma pessoa com depressão

Por  CHRISTIAN MACIEL

Segundo a Organização Mundial da Saúde, existem mais de 350 milhões de pessoas no mundo com depressão.

Tendo como base essa estatística impressionante, é altamente provável que todos nós, em algum momento de nossas vidas, tenhamos um contato próximo com alguém que sofre de depressão, sejam nossos amigos, família, colegas de trabalho, sejam até mesmo chefes – alguém muito próximo de nós precisará de nossa compreensão.

Em minha experiência como psicoterapeuta, os anos de trabalho me mostraram que um dos aspectos mais devastadores para quem lida com a depressão é ter que conviver com o estigma e com as críticas negativas que vêm das pessoas próximas. Essas pessoas, na maioria das vezes, nem mesmo percebem o quanto seus comportamentos e comentários são negativos e prejudiciais, e fazem com que o doente de depressão se sinta ainda pior.

Com isso em mente, apresento 20 coisas simples para nos lembrarmos quando formos interagir com aqueles que lutam contra a depressão. Qualquer um destes pontos não só pode ajudar, diminuindo o estigma em torno da depressão, mas, também pode ajudar o indivíduo a lidar com a doença em seu dia a dia.

1. A depressão pode agir como fortalecedora de caráter

Em uma recente conversa TEDx, o psiquiatra e filósofo, Dr. Neel Burton explicou que a depressão pode representar um mergulho mais profundo no significado e importância da vida. Uma pessoa que experimenta a depressão pode ser entendida como quem está trabalhando para dar sentido e aprimorar a vida. Além disso, a depressão pode ser uma maneira de preparar um futuro melhor e ainda mais saudável tanto para nós quanto para aqueles que nos rodeiam. Dr. Burton continua a mencionar que algumas das pessoas mais influentes e inspiradoras da história lidaram com a depressão ao longo de suas vidas, tais como, Abraham Lincoln e Winston Churchill. Sua busca pela paz e felicidade guiava seus corações e mentes para o poço da depressão, mas essa inquietação os auxiliou na mudança do curso da história.

É preciso imensa vontade e transparência para reconhecer e lidar com a presença da depressão, mas também, é possível que ela seja um grande impulsionador para que as pessoas criem respostas nos momentos mais sombrios de suas vidas. Em conclusão, a depressão pode levar as pessoas para os bosques profundos de suas alma, mas, também pode ajudá-las a limpar as ervas daninhas desnecessárias e os arbustos em que podem estar se escondendo a beleza da vida.

2. Pessoas com depressão precisam de mais companhia e gostam quando são procuradas por amigos e outras pessoas queridas.

Uma teoria que cresce sobre a raiz da depressão em nossa sociedade é a falta de relações sociais em nossas comunidades, e até mesmo em nossas famílias como desencadeantes ou mesmo potencializadoras da doença. Há uma dose constante de vazio e desconexão em nossas interações cotidianas, devido ao excesso de trabalho, televisão e tecnologia. As pessoas que desenvolvem depressão precisam de mais contato, mais amigos, mais pessoas chegando até elas, não o contrário.

Mesmo que haja um forte desejo por parte da pessoa doente pela solidão, é necessário quebrar esse ciclo. Amigos, vizinhos e pessoas próximas devem se aproximar para ver como estão as coisas, estimular e fazer um pouco de companhia.

Na próxima vez que você se lembrar de alguém que está passando por um estado depressivo, pense em um ato agradável, atraente e amigável que pode fazer, em vez de escolher ficar longe.

Considere seus entes queridos e amigos que estão passando pela depressão como pessoas que estão precisando de você e de sua presença mais do que nunca. Família e comunidade são remédios naturais para a depressão. Vamos começar a usá-los com mais frequência, e como um excelente complemento no tratamento.

Madre Teresa faz uma colocação muito pertinente e que pode ser lembrada nesse contexto: “A mais terrível pobreza é a solidão e o sentimento de não ser amado.”

3. A pessoa doente não tem intenção de sobrecarregar ninguém

Uma característica comum de pessoas que estão lidando com a depressão é que elas estão conscientes de si mesmos, de seus pensamentos, seus sentimentos e do comportamento dos outros em relação a elas. O peso que a depressão pode trazer sobre uma pessoa é suficiente para enterrá-la por um dia – e o julgamento de pessoas ao seu redor não está na lista de afazeres.

Apenas um indivíduo deprimido entende o quão difícil pode ser esconder seus sentimentos e pensamentos de outras pessoas para evitar julgamentos e outras situações constrangedoras.

Infelizmente, as pessoas que lutam contra a depressão podem optar pela solidão, porque elas não querem afetar ninguém negativamente. Embora isso possa não ser sempre o caso, entes queridos deprimidos desejam gerenciar sua depressão, e para isso podem tentar não afetar as pessoas próximas. Essa pode ser uma situação paradoxal, porque estar sozinho pode realmente agravar os sintomas de depressão.

A depressão pode fazer com que a pessoa se sinta como se ela fosse um fardo para o mundo, especialmente para aqueles que a rodeiam. Elas não estão em busca de atenção. É um entendimento valioso reconhecer que administrar a depressão é o objetivo mais importante de um indivíduo deprimido, não causando quaisquer ônus ou dor aos próximos. Se acontecer de eles te machucarem ou ofenderem, lembre-se de que eles não são o inimigo – a depressão é o verdadeiro inimigo. Diga à pessoa deprimida que você a aceita, incondicionalmente, e a lembre de  todas as características positivas que você ama nela.

4. Uma pessoa com depressão não está “quebrada” ou com defeito

O corpo humano é uma máquina complexa. Ainda mais complexo é o cérebro humano, suas estruturas e funções. Embora a causa de algumas formas de depressão não sejam totalmente conhecidas ou compreendidas, muitos de nós fazemos a suposição de que um indivíduo deprimido está com defeito ou falha em seu funcionamento. O valor de uma pessoa não está correlacionado com o diagnóstico de depressão. A depressão pode acontecer na vida de uma pessoa, por muitas razões e a ciência está longe de respostas definitivas.

A coisa mais útil que você pode fazer para ajudar é continuar a valorizar o indivíduo deprimido e olhá-lo como um todo, como uma pessoa valiosa.

5. Eles são filósofos naturais

Indivíduos que vivem uma depressão têm muitas perguntas e opiniões sobre a vida, sobre a felicidade e sobre a sua importância no mundo. A depressão tem um jeito engraçado de tornar a perspectiva da pessoa mais ampla e inclusiva.

Os indivíduos deprimidos gostariam de fazer do mundo um lugar melhor e mais justo. Eles gostariam de ter respostas para todos os desafios da vida e, em seguida, gostariam de compartilhar o conhecimento com tantas pessoas quanto possível. Às vezes, essa curiosidade pode ser uma inimiga, uma vez que irá criar mais perguntas do que há respostas.

Nunca se esqueça de reconhecer que os indivíduos deprimidos são inteligentes, curiosos e criativos. Esse é um ponto positivo, não negativo.

6. Eles estão lutando arduamente contra a depressão e precisam de apoio

Na maior luta de suas vidas, os indivíduos deprimidos precisam de líderes de torcida, não de intimidadores. É nos momentos mais sombrios que os amigos podem se tornar os anjos e os anjos se tornarem salva-vidas – literalmente. Você terá uma escolha em algum momento de sua vida para ser um salva-vidas ou um ceifador de esperanças. Seja um salva-vidas. Dê o presente da aceitação, ajuda, incentivo e presença.

7. Eles gostam de ter oportunidades de diversão e risos

O que é o oposto da depressão? É um fenômeno científico provado que o riso é bom para a alma e para a mente. Os indivíduos deprimidos funcionam da mesma maneira.

8. Eles são sensíveis aos sentimentos e ações de outras pessoas

Os indivíduos deprimidos cuidam – e eles se preocupam muito. Eles se preocupam sobre como você se sente, sobre como você os vê, sobre como você se vê e sobre o que os outros precisam. Pode ser que eles se preocupem até demais! Algumas das pessoas mais carinhosas que eu já conheci são pessoas que sofrem de algum tipo de depressão. Deixe-os saber o que você precisa e o que você não precisa.

Estabeleça limites claros e seja carinhoso e atencioso. Não há nada melhor do que um relacionamento sólido com base em uma comunicação saudável e com  limites.

9. Eles devem ser tratados com respeito

Há um estigma negativo vindo da sociedade e ligado a lidar com a depressão. O respeito é muito mais um valor do que um ato. Respeito envolve ver além do indivíduo deprimido e enxergar a pessoa inteira.

A depressão tem a capacidade de mascarar muitas qualidades positivas e verdadeiramente notáveis de uma pessoa. Não deixe que a depressão te engane ou engane a quem você ama. Comemore o que você não vê inicialmente, buscando a bondade das pessoas que sofrem com essa doença difícil.

10. Eles devem ser tratados como qualquer outra pessoa

Às vezes, apenas viver uma rotina com o máximo de normalidade possível pode trazer um tal impulso no tratamento que pode servir como um grande coadjuvante no tratamento para a depressão.

11. Eles têm talentos e interesses

Todos nós temos talentos e habilidades. Seus entes queridos que estão deprimidos adorariam fazer algo. E adivinha? Eles provavelmente podem fazê-lo muito, muito bem! Se você não sabe o que é, então, você acabou de encontrar a sua próxima missão. Vá descobrir. Ajude-os a encontrar a sua verdadeira paixão. Procure maneiras de alimentar e aprimorar essa paixão e, finalmente, apagar essa identidade negativa que vem com a luta contra a depressão.

12. Eles são totalmente capazes de dar e receber amor

Todo ser humano na Terra é capaz de dar e receber amor. E, você adivinhou! Seus entes queridos deprimidos não são diferentes. Dê e você receberá. Trate os outros como você gostaria de ser tratado. Não importa que alguém está lutando contra a depressão. A capacidade de amar ainda existe. Ela ainda está lá! Estenda a mão para ela. Você vai encontrar muito mais amor do que você imaginou que pudesse haver por lá.

Lembre-se de que, nas janelas de alívio dos sintomas da depressão, pode haver episódios maravilhosos de notável alegria, risos e comunhão. Você deve contar com elas e esperar que elas apareçam estando pronto para agir.

13. Eles adoram aprender sobre como funciona a vida

Em busca de maneiras de aliviar sua depressão, os indivíduos podem se tornar solucionadores de problemas naturais. Não se surpreenda se eles se tornarem leitores ou aprendizes vorazes. Não se surpreenda se eles fizerem perguntas que não podem ser respondidas rapidamente. Muitos dos líderes e pioneiros do mundo foram levados por uma análise profunda, pensamentos profundos e crenças e valores profundos, mas, fortemente enraizados. Às vezes, simplesmente devemos permitir que as nossas perguntas venham à tona.

14. Eles não planejam perder a luta contra a depressão

A luta contra a depressão pode acontecer ao longo de toda uma vida ou pode acontecer em um episódio isolado. Independentemente disso, uma luta é aquela que sempre precisa ser vencida. A pergunta sempre é: quando vou conseguir sair dessa depressão e como posso acelerar isso um pouco? O plano é ganhar contra a depressão. O objetivo é não se afundar em autopiedade. De extrema importância é lembrar que a depressão é tratável e há muitos, muitos recursos para ajudar. Um dos primeiros passos na luta contra a depressão é reconhecer a sua presença. Ao reconhecer a sua presença, você pode começar a tratá-la. Muitas vezes, uma pessoa em negação vai gastar inúmeras quantidades de energia escondendo sua depressão, ou tentando lidar com isso através de sua própria vontade.

15. Eles podem se sentir tristes, sem razão aparente, apenas esteja com eles

O humor pode ser volátil e instável, e ele não é algo que é facilmente controlado como um interruptor ou uma alavanca. Seus entes queridos estão tentando muito, mas, é muito difícil ser feliz, agradável e envolvente quando o humor varia pelo lado oposto.

Eles precisam de você por perto. Literalmente. Basta sentar-se com eles e ler um livro juntos, assistir a uma comédia, ou fazer um pequeno passeio até a loja de café local para uma pequena distração. Nenhum psicólogo é necessário nesse ponto, a relação acontece entre vocês, apenas a sua presença e aceitação são grande diferenciais.

16. Eles podem não ter tanta energia quanto eles gostariam de ter

Um dos sintomas da depressão é a fadiga ou a falta de energia. Um dos antidepressivos mais eficazes que tem sido reconhecido pelas pesquisas é o exercício. Eu imagino que você talvez já tenha ouvido falar dessa recomendação antes, mas deixe-me ser um pouco mais específico. O tipo e a duração do exercício pode variar, mas, o mínimo necessário para se sentir um efeito antidepressivo é fazendo uma caminhada rápida pelo menos três vezes por semana durante 30 minutos de cada vez.

17. Podem parecer irritáveis às vezes – mas, você não deve levar nada disso para o lado pessoal.

Irritabilidade é outro sintoma de depressão, embora não haja nenhuma desculpa para tratar as pessoas de maneira desrespeitosa. Por isso, é importante que exista uma expectativa quanto a um padrão mínimo que você espera de alguém. Um limite pode ser pensado como uma expectativa do que é ajustado, a fim de manter uma relação harmoniosa.

Se um indivíduo deprimido ferir seus sentimentos, de alguma forma, não há problema em dizer-lhes isso. Basta deixar que a pessoa amada saiba como você está se sentindo. Além disso, se o seu ente querido deprimido não está disposto a ouvir, tente novamente mais tarde quando as emoções estiverem mais equilibradas. Deixe-os saber que você os ama, mas que você também ama a si mesmo.

18. Eles não querem ouvir verbos como “deveria”.

Como em “Você deveria sair mais com seus amigos”. Se houver uma kriptonita para indivíduos deprimidos, é essa – o “deveria”. Os indivíduos deprimidos já têm um profundo e arraigado sentimento de “dever”. No caso de você não saber o que é um “dever”, é uma declaração de que tem um “sentimento de obrigação” inserido dentro de si. Por exemplo, você “deve” sair e se exercitar mais.  Se eu fosse você, eu faria x, y e z.

Uma postura como essa pressupõe que o indivíduo deprimido não tem uma mente e vontade própria e a pessoa que faz essas declarações assume uma atitude paternalista. E, entes queridos deprimidos não precisam de um pai dizendo o que eles “deveriam” fazer. Em vez disso, opte por fazer perguntas abertas e que deem à pessoa a oportunidade de refletir e tomar suas próprias decisões.

19. Eles precisam de muito apoio familiar e incentivo

Há um grande poder na utilização de um relacionamento como uma ferramenta para ajudar os indivíduos deprimidos a aprenderem sobre si mesmos.

Uma das melhores maneiras de fazer a diferença na vida de uma pessoa deprimida é deixar que ela saiba que você está lá com ela. Isso é algo que tem de ser comunicado diretamente, cara a cara. Algo que deve ser considerado também é a maneira com que você mostra o seu apoio e encorajamento. Aqui está uma pequena lista de recomendações:

– Dê um pequeno elogio sincero;

– Observe os pontos fortes e positivos da pessoa querida que está doente;

– Inclua essa pessoa em seus eventos ou planos;

– Remova as palavras “deveria” da relação;

– Respeite seus sentimentos e pensamentos, mas, use perguntas abertas, tanto quanto possível.

20. Eles precisam de reforço positivo mais do que críticas

Em qualquer relacionamento, destaque sempre os ganhos positivos e os comemore. Isso ajuda a aumentar a chance de repetição do comportamento desejado.

Por outro lado, ser o destinatário de reforço positivo gera um sentimento maravilhoso. Mesmo no local de trabalho, quando recebemos elogios e reconhecimento pelo nosso trabalho e esforços, aumentamos a nossa produtividade e nossa dedicação ao que fazemos.

A pessoa querida sempre receberá um reforço em sua autoestima quando você decidir usar um reforço positivo.

Experimente.

Do original:  20 Things to Remember If You Love A Person With Depression

Traduzido e adaptado por Josie Conti exclusivamente para o site Conti outra.

Dica de livro: O Demônio do Meio-Dia: Uma Anatomia da Depressão, Andrew Solomão

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente), poema de Tiago de Melo

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente), poema de Tiago de Melo

Dedicado a Carlos Heitor Cony, Tiago de Melo escreve, em 1964, “Os Estatutos do Homem”. Assim, meio à turbulência de um país marcado pela mácula dos Atos Institucionais que cerceavam a liberdade, suprimindo Direitos, eis que a poesia nos empresta as sua asas, na mais ampla libertação.

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)

Artigo 1
Fica decretado que agora vale a verdade, agora vale a vida e de mãos dadas marcharemos todos pela vida verdadeira;

Artigo 2
Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas, tem direito a converter-se em manhãs de domingo;

Artigo 3
Fica decretado que a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra e que as janelas devem permanecer o dia inteiro abertas para o verde onde cresce a esperança;

Artigo 4
Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem, que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu; parágrafo único, o homem confiará no homem como um menino confia em outro menino;

Artigo 5
Fica decretado que os homens estão livres do julgo da mentira, nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem armadura de palavras, o homem se sentará a mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa;

Artigo 6
Fica estabelecida durante dez séculos a pratica sonhada por Isaías que o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora;

Artigo 7
Decreta e revogada, fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraudada da alma do povo;

Artigo 8
Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá a planta o milagre da flor;

Artigo 9
Fica permitido que o pão de cada dia que é do homem o sinal de seu suor, mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura;

Artigo 10
Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida o uso do traje branco;

Artigo 11
Fica decretado por definição que o homem é o animal que ama, e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã;

Artigo 12
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com imensa begonia na lapéla; parágrafo único, só uma coisa fica proibida, amar sem amor;

Artigo 13
Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar um sol das manhãs de todas, expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de tentar e a festa do dia que chegou;

Artigo Final
Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso da dor, a partir deste instante, a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

Tiago de Melo

Santiago do Chile, abril de 1964

contioutra.com - Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente), poema de Tiago de Melo

Sobre amar o outro como ele é- Padre Fábio de Melo

Sobre amar o outro como ele é- Padre Fábio de Melo

Se você não consegue lidar com os limites dos outros, é porque você não consegue lidar com os seus limites. A rejeição é um processo de ver-se.

Toda vez que eu quero buscar no outro o que me falta, eu o torno um objeto. Eu posso até admirar no outro o que eu não tenho em mim, mas eu não tenho o direito de fazer do outro uma representação daquilo que me falta. Isso não é amor, isso é coisa de criança.

O anonimato é um perigo para nós. É sempre bom que estejamos com pessoas que saibam quem somos nós e que decisões nós tomamos na vida. É sempre bom estarmos em um lugar que nos proteja.

Amar alguém é viver o exercício constante, de não querer fazer do outro o que a gente gostaria que ele fosse. A experiência de amar e ser amado é acima de tudo a experiência do respeito.

Como está a nossa capacidade de amar? Uma coisa é amar por necessidade e outra é amar por valor. Amar por necessidade é querer sempre que o outro seja o que você quer. Amar por valor é amar o outro como ele é, quando ele não tem mais nada a oferecer, quando ele é um inútil e por isso você o ama tanto. Na hora em que forem embora as suas utilidades, você saberá o quanto é amado!

Tudo vai ser perdido, só espero que você não se perca. Enquanto você não se perder de si mesmo você será amado, pois o que você é significa muito mais do que você faz!

O convite da vida cristã é esse: que você possa ser mais do que você faz!

Saibamos o que os poetas falam das mães

Saibamos o que os poetas falam das mães

Quando a mãe é a musa, assim nasce o poema:
Para Sempre

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
– mistério profundo –
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade

O menino que carregava água na peneira

Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.

A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e
sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.

A mãe disse que era o mesmo
que catar espinhos na água.
O mesmo que criar peixes no bolso.

O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces
de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio, do que do cheio.
Falava que vazios são maiores e até infinitos.

Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito,
porque gostava de carregar água na peneira.

Com o tempo descobriu que
escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira.

No escrever o menino viu
que era capaz de ser noviça,
monge ou mendigo ao mesmo tempo.

O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor.

A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
Você vai carregar água na peneira a vida toda.

Você vai encher os vazios
com as suas peraltagens,
e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos!
Manoel de Barros

Mãezinha
Andam em mim fantasmas, sombras, ais…
Coisas que eu sinto em mim, que eu sinto agora;
Névoas de dantes, dum longínquo outrora;
Castelos d’oiro em mundos irreais…

Gotas d’água tombando… Roseirais
A desfolhar-se em mim como quem chora…
— E um ano vale um dia ou uma hora,
Se tu me vais fugindo mais e mais!…

Ó meu Amor, meu seio é como um berço
Ondula brandamente… Brandamente…
Num ritmo escultural d’onda ou de verso!

No mundo quem te vê?! Ele é enorme!…
Amor, sou tua mãe! Vá… docemente
Poisa a cabeça… fecha os olhos… dorme…

Florbela Espanca

Canção para a minha mãe

E sem um gesto, sem um não, partias!
Assim a luz eterna se extinguia!
Sem um adeus, sequer, te despedias,
Atraiçoando a fé que nos unia!

Terra lavrada e quente,
Regaço de um poeta criador,
Ias-te embora antes do sol poente,
Triste como semente sem calor!

Ias, resignada, apodrecer
À sombra das roseiras outonais!
Cor da alegria, cântico a nascer,
Trocavas por ciprestes pinheirais!

Miguel Torga


Gaiota

Como não tinha
um pintor expressionista
naquele instante
a atravessar a avenida?

Como não tinha
um fotógrafo que fosse?
Um repórter de tevê
com a câmera a postos?

Só cruzou por ali
um poeta novato
e registrou a cena
em versos telegráficos:

O anjo nu dormita
sobre sacos de lixo
na gaiota. A mãe
é tração animal.

Paulo Becker

Mãe

Você chegou de mansinho, mãe
Como quem pisasse em películas de candura.
E disse coisas amenas e claras,
Numa combinação rara
De borbulhas de sonho
E aurora de sol:
– “Dorme, filhinha!”
E colocou-me no colo
E pediu que se apagassem as luzes da terra
Para que eu pudesse dormir
Recostada em seu peito.
Contou-me histórias de estrelas antigas
E de miragens bucólicas
Enluaradas de azul e poesia.
Beijou-me a face
E velou o meu sono,
Sempre a observar
A intensidade do meu estado febril.
A febre passou, mamãe,
E a minha infância também.
Os encantamentos do seu carinho, não.
Estes jamais passarão.

Nara Rúbia Ribeiro

contioutra.com - Saibamos o que os poetas falam das mães

É no ínfimo que vejo a exuberância

É no ínfimo que vejo a exuberância

“É no ínfimo que vejo a exuberância.” Manoel de Barros

A véspera da viagem sonhada; o café da manhã da criança, em primeiro dia de aula; à espera de um sábado cinzento, com a agenda repleta de nadas; uma bendita noite, digna de revelar um antigo segredo; a obviedade de um amor, por anos enclausurado em cólera; para despertar os orvalhos; dias de verão, sem nuvens para apaziguar o colorir das peles; consumar o trabalho idealizado; o almoço viciado em ópios; quando a vida é traduzida em outras línguas; será que será eterno?

Quando me foi emprestado o olhar para que a arte se manifestasse em minha íris; dia de faxina para a festa; dia de faxina depois da festa, à procura de sussurros ou embriaguezes primeiras; em busca de um olhar que sorria com a mesma intensidade de quem respira; acender uma vela em oração.

Lagartixa em comunhão com a varanda; aspirar os pensamentos da miragem; sentir-me encharcada por milagres, ainda imaculados; café com cigarro; entregar uma flor de bicicleta; ler o cartão de quem destina uma flor; pela dissonância que torna alguém artista; uma melodia subscrita na carne.

Negação do amanhecer; pela lua que se vai em sincronia com um beijo; o sol primogênito da concretude de um sonho; pela morte de um corpo já sem passado, já sem futuro; rompimento da bolsa; sublimação da dor que há séculos habitava o músculo, fatigado de excessos.

Pela imagem poética ilusória; pelo presságio que dê nome à jornada; por amigos que clamam compartilhar suas quimeras; rompimento dos ovos, em coração de árvore.

Não anoitecer a solidão; transcrever, apenas, minha renúncia à existência mesquinha; carregar o fardo dos vagalumes.

Com ansiedade de amanhecer, recebo, em ternura, a missão de desobsediar epifanias.

Ps: dedico este texto à minha irmã, Renata. Que ela tenha muitas ansiedades de amanhecer na nova vida!

Mariana Portela 

Confissões, Declarações e Crônicas…

Antropologia: a ciência da Alteridade

Antropologia: a ciência da Alteridade

Por Letícia Maia

Alguns definem a Antropologia como sendo a ciência que estuda o homem.
Alguns dividem a Antropologia em diversas classes e vertentes.
Alguns nem ao menos sabem o que é Antropologia.
A Antropologia realmente é uma ciência que estuda o homem. Porém, muitas outras ciências também o estudam. O que a difere das demais ciências é o estudo do ser humano em todas suas dimensões. O homem e todas suas relações, tradições, singularidades e semelhanças. Existem, de fato, diversas “antropologias”, algumas muito conhecidas – como a Cultural e a Arqueológica, outras nem tanto – como a Visual e a Linguística.
Mas além de todos estes conceitos e definições, vejo na Antropologia a ciência do ESTRANHAMENTO e, consequentemente, da ALTERIDADE.
“Estranhar” o Outro. Reconhecer em outro indivíduo (ou em um conjunto deles) suas peculiaridades e diferenças. Não somente, mas também suas equivalências. É na prática do ESTRANHAMENTO que eu me identifico, que eu me vejo como ser único e que eu me afirmo como sendo, da mesma maneira, o Outro.

E é neste contexto que nasce a ALTERIDADE. O momento de contato com o Outro. Identificando-o, considerando-o, valorizando-o e, acima de tudo, respeitando-o. Tentar compreender, sem julgamentos ou sobreposições. Afinal, vivemos o paradoxo de sermos diferentemente iguais e igualmente diferentes. “Multicoloridos homens”.
Talvez seja essa essência que falte em muitas outras ciências e em muitos outros indivíduos e seus conjuntos…
Alguns definem a Antropologia como sendo a ciência que estuda o Homem.
Eu defino a Antropologia como sendo a ciência da Alteridade.

contioutra.com - Antropologia: a ciência da Alteridade

Nota da CONTi outra: agradecemos à Letícia Maia por nos enviar esse lindo texto e autorizar a publicação nesse local.
Letícia Maia estuda Ciências Sociais com bacharelado em Antropologia pela Universidade de Brasília.

Tratado do saber viver – um verbo em consequência do outro

Tratado do saber viver – um verbo em consequência do outro

Por Joana Nascimento

Olhar e realmente enxergar.

Ouvir e realmente escutar.

Falar e realmente dizer.

Ler e realmente entender.

Estudar e realmente saber.

Visitar e realmente conhecer.

Dançar e realmente extravasar.

Lutar para realmente conseguir.

Agir para realmente impressionar.

Avistar para realmente alcançar.

Provar e realmente experienciar.

Sentir para realmente significar.

Ficar para realmente permanecer.

Sorrir e realmente felicitar.

Ser para substancialmente existir.

Sucumbir à essência e complexidade da vida; para realmente viver.

Joana Nascimento 

contioutra.com - Tratado do saber viver – um verbo em consequência do outroSou jornalista e aspirante a produtora e crítica cultural, e, bem incipiente, roteirista de cinema.
Acredito piamente no conhecimento do maior número de textos teóricos, narrativos e imagens como forma de evolução mental e espiritual.
Embora tenha vontade, sei que uma pessoa não muda o mundo, mas creio que cada cabeça individual é um universo diferente, e este, nós podemos melhorar sempre. O impacto positivo no todo externo será sempre progressivo e crescente.
Gosto de escrever sobre existencialismo e condutas de vida, sempre fazendo analogias com filmes, livros, música e teatro. Conheça mais em www.joananasc.blogspot.com.br.

Machista? Eu???

Machista? Eu???

Por Elika Takimoto

Ser machista no Brasil é como ser racista, ou seja, ninguém assume que é. No entanto, se perguntarmos para os negros se eles se sentem discriminados, eles dirão, em sua grande maioria, que sim. Se perguntarmos para as mulheres… o assunto fica por demais controverso. Poderia levantar a discussão sobre as mulheres que adoram andar ao lado de um ‘cavalheiro’, tomado aqui no sentido de querer dizer que elas se sentem bem ao caminhar não com um homem gentil e sim com um homem que a proteja e que a perceba como um ser frágil e inferior. Segue daí uma grande discussão, a começar pela dificuldade de diferenciar ‘machista’ de ‘cavalheiro’. Mas não é essa polêmica que quero aguçar. É uma outra. Esse texto é sobre uma determinada bandeira que levanto desde que soube que meu nome era Elika Takimoto. E vou teimar em hasteá-la porque insisto em querer construir uma sociedade mais igualitária, onde não precise ler quase todos os dias nos jornais casos de estupros, meninas com medo dos próprios colegas de escola, mulheres reféns dessa violência que por vezes acontece de forma silenciosa e burocrática.

Após ouvir vários homens casados que se dizem zero-machistas, perguntei-lhes: como é o sobrenome de sua esposa? Cem por cento dos casos, o marido diz naturalmente o sobrenome da cônjuge que é, vejam que interessante, o mesmo deste que se diz em posição igual a das mulheres.

Para começar, alguns detalhes da nossa história: o primeiro Código Civil Brasileiro (Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916), em sua redação original, pontuava, no artigo 240: “A mulher assume, pelo casamento, com os apelidos do marido, a condição de sua companheira, consorte e auxiliar nos encargos de família”. Por “apelidos” entenda-se o sobrenome do marido, que poderia ser simples ou composto, ou seja, sua adoção era uma ‘obrigação’ da mulher. Tal obrigatoriedade significava uma afirmação do poder marital, da supremacia do varão, cuja origem vem do direito romano, em que a mulher ingressava na família do esposo. Esta adoção de nome era um costume a que a lei deu guarida, e devia ser compreendida como uma expressão da comunhão de vida entre os dois cônjuges. Que lindo.

Hoje, as coisas mudaram. Já não é mais obrigatório as mulheres adotarem o sobrenome dos maridos, embora muitos nem sequer saibam disso. Vale observar, trocar de identidade tem um significado forte subliminar: a mulher, literalmente, aceita perder a sua ‘identidade’ em prol de se fortalecer na nova família liderada pelo marido. Há meninas que irão dizer que é uma prova de amor, uma homenagem tal e qual uma tatuagem. Justamente, queridinha, o sobrenome do marido, que a esposa passa a usar, funciona como um carimbo a mostrar que ela tem um dono e senhor, tipo gado quando é comprado e marcado na pele as iniciais do fazendeiro ao qual passa a pertencer.

Ah, já estou ouvindo daqui você dizer que não fez isso pensando assim, que vocês se amavam, que no furor da paixão isso passou despercebido e que no frigir dos ovos você não tem culpa de nada, apenas fez o que manda o figurino e que, sim, não pode ser acusado de machista por isso. Mas saibam, vocês (homens e mulheres) que aceitam isso sem questionar, são sim machistas e têm tudo a ver com o que as mulheres sofrem hoje. Vocês também são responsáveis por esses tristes números que vemos nos jornais indicando a violência com pessoas do sexo feminino. Ignorar isto é fingir que o mundo é um conto de fadas e que os casamentos são todos como os que vemos na sessão da tarde. A relação homem-mulher é tensa, o conflito existe e ameaça e mata e estupra. Você que diz que nada tem a ver com isso está se esquivando de sua responsabilidade social adotando a posição cômoda zecapagodiana de deixar a vida lhe levar. Com exceção do Zeca, sabemos bem onde vai dar isso.

Acredito que este seja um caso em que nem a própria mulher reconhece sua condição de submissão. E entender essa situação, esse processo histórico, é uma característica, acredito eu, significativa para a superação da desigualdade. Não aceitar o sobrenome do marido é um caminho para se fortalecer como indivíduo independente, é manter a sua identidade, a sua completude. E saiba que esse caminho se faz não somente nessa atitude, no passado, digo, no ato do casamento civil, mas que ele precisa ser trilhado no dia-a-dia, constantemente, também no aqui e no agora. Diversas vezes, a título de exemplo e esclarecer o que estou querendo dizer, quando viajamos, eu e meu marido, preenchendo documentos de hotéis, perguntaram-nos: Mas vocês não são casados? Ou, então, já saíam tirando suas próprias conclusões: Pensei que vocês fossem casados! Na nossa Lua de Mel, vejam bem, o meu nome foi incluído em todas as fichas nos passeios como Elika Borges e eu tinha que pedir, exigir, implorar para que elas fossem refeitas. Ainda assim, chamavam-nos de casal Borges.

Embora insista que a identidade seja o ponto de referência a partir do qual surge o conceito e a imagem de si, sei muito bem que ela não é algo único e sim um sistema identificatório em processo dinâmico. Mas vamos ser sinceros com nós mesmos, de uma forma muito geral e bastante concreta, o nosso nome e sobrenome são mais que meras palavras escritas ou faladas. Eles estão direcionados a representar todo o nosso universo pessoal. Desde que os humanos passaram a denominar os objetos e situações, ainda na sociedade neandhertal, o nome passou a ser utilizado como uma identificação, uma forma de distinguir e individualizar uns dos outros. Assim, passou a ser considerado um determinante da personalidade, e, por isto, não é possível que alguém exista sem esta designação pessoal. Sem seu nome e seu sobrenome.

Mas sim, você pode querer não enxergar nada disso e achar que é só mais uma polêmica. Afinal, não foi você quem fez a lei. Entretanto, meu bem, se a seguiu, ainda que pudesse ter feito diferente, você tem sua parcela de contribuição com a violência que testemunhamos diariamente neste nosso país porque um tipo de preconceito muito danoso é este que não grita, age de forma silenciosa, sonsa e como se fosse natural. Diluído no dia a dia e em nossa cultura aparece como uma forma de manter a ordem das coisas e de lembrar quem manda. E quem obedece.

Não, senhores e senhoras, não estou querendo que vocês refaçam as suas identidades e as suas certidões de casamento. Mas pega mal dizer que vocês não são machistas se se recusam a enxergar que isso reflete toda uma história de discriminação com a mulher. Teimar em não se ver como machistas, à luz de tudo o que foi dito, é ser conivente com o estuprador que só enxerga, quando olha uma mulher, um objeto feito para lhe servir, submisso, descartável assim como um documento que não vale mais.

Sou Elika Takimoto. Sou livre dentro de um casamento. Aqui não encontrei nenhuma metade porque eu estou inteira. Sou e sempre fui, antes de tudo, fiel a mim mesma e aos meus ideais de justiça e igualdade.

Para me entender tire os sapatos

Para me entender tire os sapatos

Para me entender tire os sapatos, puxe um livro, acenda um cigarro, e diga alto “imagina se…”.

Respire fundo, dispa-se, relaxe, esqueça tudo que já sabe dessa vida, esqueça as intenções, esqueça a sua inteligência, padronizada, esqueça as suas experiências, a diferença de idade, as verdades. Para me entender seja. A tentativa de ser intensa, inteira, a tentativa de empatia, a vontade de não se perder, mesmo que a vida seja só perda, mesmo que te façam palhaça, mesmo com essa cara de boba.

Seja uma mulher. Que aprendeu a rir de si mesma, e a defender seu lado feio, que não tem vergonha do que nela é tão pequeno. Para me entender se esqueça. De me ver com os seus olhos, com as suas intenções, preocupações ou ideias. Se esqueça de resgatar os seus mundos para compreender os meus. Venha de alma nua. Porque tenho um lado primaveril tão forte quanto o iceberg. E é provável se enganar à primeira vista.

Sim, estou sempre no caminho do amor, mas esse mesmo caminho que é luz tem longas estiagens. Por isso não me julgue por uma fotografia, uma esquina, um lado, uma tarde de aniversário. Para entender uma mulher tenha a coragem de despi-la com os olhos dela.

Nove segundos, crônica de Milton Hatoum

Nove segundos, crônica de Milton Hatoum
Palácio Rio Negro - Manaus

Naquela noite de 1982, quando fui com uma amiga franco-brasileira assistir ao filme Fitzcarraldo, quase nada conhecia da vida desse barão da borracha peruano.

As referências a esse mestiço ambicioso vinham de um ensaio amazônico de Euclides da Cunha, que, em 1905, navegou até as cabeceiras do Purus. Euclides, que era obcecado pela ideia do progresso e da civilização, entendeu ou intuiu que a barbárie troca de lado sem fazer cerimônia.

Agora, ao ler um ensaio de Benjamin Abdala (Fluxos Comunitários: Jangadas, Margens e Travessias), conheci outras facetas de Carlos Fermín Fitzcarraldo. Filho de um marinheiro norte-americano com uma mestiça peruana, Fitzcarraldo morreu num naufrágio em 1897, quando tinha 35 anos. Mas essa vida breve não o impediu de construir um império econômico e descobrir um varadouro de nove quilômetros que liga o Rio Urubamba ao Madre de Dios. Esse istmo, que recebeu o nome de seu descobridor, foi importante para a circulação de pessoas e fluxo de mercadorias. O jovem magnata tentou transportar para sua propriedade em Madre de Dios um casarão com estrutura metálica construído por Eiffel. Mas como essa tentativa malogrou, a obra foi erguida em Iquitos.

Como tantos outros barões do “caucho” peruano que enriqueceram em pouco tempo, Fitzcarraldo foi um predador da floresta e um implacável caçador de índios. Euclides narra, de um modo tragicômico, o primeiro contato do jovem Fitzcarraldo com os “primitivos” machcos; depois afirma que dezenas desses índios foram dizimados por armas de fogo do “notável explorador” e seus capangas.

Lembro que naquela noite de inverno parisiense, eu e minha amiga Evelyne paramos de traduzir textos maçantes e fomos ver o filme de Werner Herzog. Os artigos na imprensa diziam que nesse filme havia cenas de Manaus e de seu maior símbolo arquitetônico: o teatro Amazonas, palco de tantas óperas e operetas durante o fausto da borracha. Mas nesse filme, Fitzcarraldo não é o ambicioso seringalista que executou, a sangue frio, centenas de índios da Amazônia. O sonho grandioso de Brian Sweeney Fitzgerald, vulgo Fitzcarraldo, é construir um teatro em Iquitos. O subtítulo do filme é “o preço de um sonho”. Uma tradução mais livre e não menos fiel seria: “o preço de uma loucura”.

Há várias cenas épicas, de deslumbrante efeito visual, como o barco içado montanha acima por centenas de índios; ou um concerto de ópera a bordo desse mesmo barco, que navega diante do porto de Iquitos, cuja população assiste a esse espetáculo inusitado. O filme fala da obsessão de Fitzcarraldo pelo canto lírico, que serve de mediação entre a cultura do “civilizado” e a dos “primitivos”. Mas não foram as sequências bombásticas e ousadas as que mais me emocionaram, muito menos a expressão amalucada de Klaus Kinski.

Logo no começo do filme, quando Fitzcarraldo chega a Manaus, vi uma das praças da minha infância e disse isso à minha amiga. São cenas externas ou foram filmadas num estúdio?, ela perguntou. Externas, eu disse. É Manaus mesmo.

Pouco minutos depois, quando a plateia ovacionava a filmagem da ópera Ernani, interpretada por Caruso e Sarah Bernhardt, uma cena de nove segundos me emocionou. No cinema do Boulevard Saint-Germain, reconheci meus pais no centro da tela. E como minha mãe olhava e ria para a tela, era como se estivesse olhando e rindo para mim.

Voltei várias vezes ao cinema para rever esse par de figurantes felizes, e em cada sessão a saudade que sentia deles só aumentava. Quando telefonei para Manaus, minha mãe perguntou se ela estava bem no filme. Disse que ela era a melhor atriz dentre os 600 figurantes.

E o teu pai?

Sério como sempre, eu disse. E bem mais careca. Mas não olhava para a câmera, e sim para ti.

Ela riu com vontade. O riso, que partiu da margem esquerda do Rio Negro e chegou ao orelhão gelado na rive gauche do Sena, era o riso que não pude ouvir no filme.

Nunca mais vi Fitzcarraldo. Faz algum tempo meus pais saíram deste mundo, mas permaneceram na tela, anônimos para os espectadores. Mesmo assim, ainda posso imaginá-los no outro lado do espelho: essa sala eternamente escura e silenciosa, visitada pela memória dos vivos.

Originalmente publicado em O Estado de S. Paulo, Caderno 2, 27/05/2011

Site Oficial de Milton Hatoum

 

“Analfabeto político”, você conhece algum?

“Analfabeto político”, você conhece algum?

Eugen Berthold Friedrich Brecht nasceu em Augsburg, no dia 10 de fevereiro de 1898, tendo falecido em Berlim Leste, em agosto de 1956. Trata-se de um grande dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido.

Eis um de seus poemas em que, com a acidez que lhe é própria, analisa o papel social do analfabeto político para que não nos esqueçamos de que grande parte da miséria moral deste planeta está diretamente ligada ao mau uso do Poder Político graças, certamente, ao analfabetismo de tantos de nós.

O Analfabeto Político

O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.”
Nada é impossível de Mudar
“Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar.”
Privatizado
“Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade pertence.

Bertolt Brecht

Serenidade sempre

Serenidade sempre

Por Joanna de Ângelis

Todo homem sábio é sereno.
A serenidade é conquista que se consegue com esforço pessoal e passo a passo.
Pequenos desafios que são superados; irritação que se faz controlada; desafios emocionais corrigidos; vontade bem direcionada; ambição freada, são experiências para a aquisição da serenidade.
Um Espírito sereno já se encontrou consigo próprio, sabendo exatamente o que deseja da vida.
A serenidade harmoniza, exteriorizando-se de forma agradável para os circunstantes. Inspira confiança, acalma e propõe afeição.
O homem sereno já venceu grande parte da luta.
Que nenhuma agressão exterior te perturbe, levando-te à irritação, ao desequilíbrio.
Mantém-te sereno em todas as realizações.
A tua paz é moeda arduamente conquistada, que não deves atirar fora por motivos irrelevantes.
Os tesouros reais, de alto valor, são aqueles de ordem íntima, que ninguém toma, jamais se perdem e sempre seguem com a pessoa.
Tua serenidade, tua gema preciosa.
Diante de quem te enganou, traindo a tua confiança, o teu ideal, ou envolvendo-te em malquerença, mantém-te sereno.
O enganador é quem deve estar inquieto, e não a sua vítima.
Nunca te permitas demonstrar que foste atingido pelo petardo da maldade alheia. No teu círculo familiar ou social sempre defrontarás com pessoas perturbadoras, confusas e agressivas.
Não te desgastes com elas, competindo nas faixas de desequilíbrio em que se fixam. Constituem teste à tua paciência e serenidade. Assim exercita-te com essas situações para, mais seguro, enfrentares os grandes testemunhos e provações do processo evolutivo, sempre, porém, com serenidade.

(Texto ditado a Divaldo Franco)

Extraído do livro “Dimensões da Verdade” – Editora LEAL

Oito versos que podem transformar sua mente

Oito versos que podem transformar sua mente
Fotografia de Cuong Phungmanh

Dalai Lama
Vou agora ler e explicar brevemente um dos mais importantes textos sobre a transformação da mente, Lojong Tsigyema (Oito Versos que Transformam a Mente). Este texto foi composto por Geshe Langri Tangba, um bodisatva bastante incomum. Eu prpoprio o leio todos os dias, tendo recebido a transmissão do comentário de Kyabje Trijang Rinpoche.

1. Com a determinação de alcançar
O bem supremo em benefício de todos os seres sencientes,
Mais preciosos do que uma joia mágica que realiza desejos,
Vou aprender a prezá-los e estimá-los no mais alto grau.
Aqui, estamos pedindo: “Possa eu ser capaz de enxergar os seres como uma joia preciosa, já que são instrumentos por meio dos quais poderei alcançar a onisciência; portanto, possa eu ser capaz de prezá-los e estimá-los.”

2. Sempre que estiver na companhia de outras pessoas, vou aprender
A pensar em minha pessoa como a mais insignificante dentre elas,
E, com todo respeito, considerá-las supremas,
Do fundo do meu coração.
“Com todo respeito considerá-las supremas” significa não as ver como um objeto de pena, o qual olhamos de cima, mas, sim, as ver como um objeto elevado. Tomemos, por exemplo, os insetos: eles são inferiores a nãs porque desconhecem as coisas certas a serem adotadas ou descartadas, ao passo que não conhecemos essas coisas, já que percebemos a natureza destrutiva das emoções negativas. Embora seja essa a situação, podemos também enxergar os fatos de um outro ponto de vista. Apesar de termos consciência da natureza destrutiva das emoções negativas, deixamo-nos ficar sob a influência delas e, nesse sentido, somos inferiores aos insetos.

3. Em todos os meus atos, vou aprender a examinar a minha mente
E, sempre que surgir uma emoção negativa,
Pondo em risco a mim mesmo e aos outros,
Vou, com firmeza, enfrentá-la e evitá-la.
Quando nos propomos uma prática desse tipo, a única coisa que constitui obstáculo são as negatividades presentes no nosso fluxo mental; já espíritos e outros que tais não representam obstáculo algum. Assim, não devemos ter uma atitude de preguiça e passividade diante do inimigo interno; antes, devemos ser alertas e ativos, contrapondo-nos às negatividades de imediato.

4. Vou prezar os seres que têm natureza perversa
E aqueles sobre os quais pesam fortes negatividades e sofrimentos,
Como se eu tivesse encontrado um tesouro precioso,
Muito difícil de achar.
Essas linhas enfatizam a transformação dos nossos pensamentos em relação aos seres sencientes que carregam fortes negatividades. De modo geral, é mais difícil termos compaixão por pessoas afligidas pelo sofrimento e coisas assim, quando sua natureza e personalidade são muito perversas. Na verdade, essas pessoas deveriam ser vistas como objeto supremo da nossa compaixão. Nossa atitude, quando nos deparamos com gente assim, deveria ser a de quem encontrou um tesouro.

5. Quando os outros, por inveja, maltratarem a minha pessoa,
Ou a insultarem e caluniarem,
Vou aprender a aceitar a derrota,
E a eles oferecer a vitória.
Falando de modo geral, sempre que os outros, injustificadamente, fazem algo de errado em relação à nossa pessoa, é lícito retaliar, dentro de uma ótica mundana. Porém, o praticante das técnicas da transformação da mente devem sempre oferecer a vitória aos outros.

6. Quando alguém a quem ajudei com grande esperança
Magoar ou ferir a minha pessoa, mesmo sem motivo,
Vou aprender a ver essa outra pessoa
Como um excelente guia espiritual.
Normalmente, esperamos que os seres sencientes a quem muito auxiliamos retribuam a nossa bondade; é essa a nossa expectativa. Ao contrário, porém, deveríamos pensar: “Se essa pessoa me fere em vez de retribuir a minha bondade, possa eu não retaliar mas, sim, refletir sobre a bondade dela e ser capaz de vê-la como um guia especial.”

7. Em suma, vou aprender a oferecer a todos, sem exceção,
Toda a ajuda e felicidade, por meios diretos e indiretos,
E a tomar sobre mim, em sigilo,
Todos os males e sofrimentos daqueles que foram minhas mães.
O verso diz: “Em suma, possa eu ser capaz de oferecer todas as qualidades boas que possuo a todos os seres sencientes,” essa é a prática da generosidade e ainda: “Possa eu ser capaz, em sigilo, de tomar sobre mim todos os males e sofrimentos deles, nesta vida e em vidas futuras.” Essas palavras estão ligadas ao processo da inspiração e expiração.

Até aqui, os versos trataram da prática no nível da bodhicitta convencional. As técnicas para cultivo da bodhicitta convencional não devem ser influenciadas por atitudes como: “Se eu fizer a prática do dar e receber, terei melhor saúde, e coisas assim”, pois elas denotam a influência de considerações mundanas. Nossa atitude não deve ser: “Se eu fizer uma prática assim, as pessoas vão me respeitar e me considerar um bom praticante.” Em suma, nossa prática destas técnicas não deve ser influenciada por nenhuma motivação mundana.

8. Vou aprender a manter estas práticas
Isentas das máculas das oito preocupações mundanas,
E, ao compreender todos os fenômenos como ilusórios,
Serei libertado da escravidão do apego.
Essas linhas falam da prática da bodhicitta última. Quando falamos dos antídotos contra as oito atitudes mundanas, existem muitos níveis. O verdadeiro antídoto capaz de suplantar a influência das atitudes mundanas é a compreensão de que os fenômenos são desprovidos de natureza intrínseca. Os fenômenos, todos eles, não possuem existência própria e eles são como ilusões. Embora apareçam aos nossos olhos como dotados de existência verdadeira, não possuem nenhuma realidade. “Ao compreender sua natureza relativa, possa eu ficar livre das cadeias do apego.”

(Extraído de The Union Of Bliss And Emptiness.)
Fonte: Dalai Lama

contioutra.com - Oito versos que podem transformar sua mente
Fotografia de Cuong Phungmanh

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