O Crisântemo é a Flor Nacional do Japão e possui muitos significados culturais, além de ser o Brasão Oficial da Família Imperial. Esta flor singela é retratada em diversas obras de arte como gravuras, pinturas e literatura. A imagem acima, por exemplo, foi uma pintura de Ohno Bakufu, grande pintor japonês.
O Crisântemo tem seu significado tão firmemente enraizado na cultura oriental, que acabou se tornando personagem principal de vários poemas e histórias, entre elas uma fábula bastante popular no Japão: Dama Branca e Dama Amarela.
A Dama Branca e Amarela é um conto japonês, que embora simples, nos passa uma lição incrível. Acabou se popularizando no mundo todo devido ao livro “Myths & Legends of Japan” (Mitos e Lendas do Japão), do escritor F. Hadland Davis.
A Dama Branca e a Dama Amarela
Era uma vez dois crisântemos, um branco e outro amarelo que cresciam lado a lado em um campo. Um dia, um velho jardineiro as encontrou e se apaixonou pela dama amarela. Ele ofereceu-se para levá-la para sua casa e torná-la ainda mais bela do que era. A dama amarela, sem pensar duas vezes, despediu-se da irmã e foi levada pelas mãos suaves do jardineiro para ser plantada em seu jardim.
Depois que a dama amarela partiu, a dama branca chorou amargamente. Sua beleza singela havia sido desprezada e, pior que isso, viu-se forçada a permanecer sozinha no campo, sem mais a companhia da irmã, com quem passava horas a conversar. Enquanto isso, a dama amarela se tornava cada dia mais bela.
Nem parecia mais a simples flor amarela do campo. Apesar de estar vivendo uma vida de luxo, a dama amarela às vezes se lembrava da irmã branca que havia abandonado sozinha no campo, sem ninguém para conversar. Mas assim que o jardineiro vinha cuidar de sua beleza, ela logo esquecia de sua irmã solitária.
Um dia, um capitão da vila chegou dizendo que estava procurando uma flor perfeita para se tornar a crista do elmo do seu senhor. O jardineiro então mostrou a ele, sua mais linda flor, o crisântemo amarelo. Mas o capitão foi logo dizendo que não estava a procura de um crisântemo que tivesse muitas e longas pétalas.
Ele buscava um crisântemo que fosse da cor branca, simples e com apenas dezesseis pétalas. Como ele não havia gostado da dama amarela, agradeceu e partiu logo em seguida à procura da sua flor perfeita. A dama amarela ficou muito desapontada por ter sido desprezada pelo capitão da vila, mas procurou não ficar pensando nisto.
No caminho, o homem passou pelo campo e encontrou a dama branca chorando. Ela contou a ele sobre a dama amarela que a havia abandonado, deixando-a tão triste e solitária no campo. Ele então lhe contou que conheceu a dama amarela e que ela não era nem metade tão bela quanto à branca flor que tinha diante dos olhos.
Diante dos elogios do capitão, a dama branca parou de chorar e ficou muito animada e feliz, especialmente depois que ele perguntou-lhe se ela desejaria ser a crista do elmo do seu senhor. O homem ainda disse-lhe que caso aceitasse, ela seria muito bem cuidada e teria uma vida de rainha, com muitos luxos.
A dama branca concordou e logo foi plantada em uma janela no palácio do Daimyo. O senhor feudal e toda sua família concordaram que realmente a dama branca era mesmo a flor perfeita para a sua crista. Vários artesãos e artistas vieram de longe e de perto, para retratar o belo crisântemo em todos os pertences da família.
Além de estar retratada na armadura do Daimyo, a dama branca percebeu de que não precisava mais de um espelho para se mirar, pois sua bela face branca estava presente em todos os mais preciosos bens da família do Daimyo, como caixas de laca, roupões de banho, travesseiros, colchas, mantos e outros objetos da família.
Olhando para cima, podia ver o seu rosto entalhado em grandes painéis. Foi pintada de todas as maneiras possíveis e imagináveis, inclusive boiando sobre a correnteza. Todo mundo concordava de que o crisântemo branco, apesar de possuir apenas dezesseis pétalas, representava o mais belo elmo de todo o Japão.
Quanto ao crisântemo amarelo, sua vida de luxo e riqueza teve uma curta duração. Enquanto a face feliz da dama Branca era perpetuada nos bens do Daimyo, a face da dama Amarela só transpirava tristeza. Por um período curto de tempo, foi feliz, se tornou uma bela flor e havia ganho muitos elogios dos visitantes.
No entanto, um dia, ela sentiu uma rigidez nos membros e percebeu o fim da exuberância de sua existência. A antiga cabeça orgulhosa, que antes era repleta de belas e longas pétalas douradas, pendeu e quando o velho jardineiro a viu desfalecida, a arrancou do canteiro para jogá-la em meio a um monte de lixo.
Enquanto isso, a dama branca foi cuidadosamente conservada, sem contudo perder a sua beleza simples, afinal havia sido escolhida pelo Daimyo para ser o brasão da família, justamente por sua singela, simplicidade e humildade.
Enfim, a moral da história é: Por mais que demore, o sucesso e a felicidade pode chegar até nós. Basta ter paciência e aprender a superar eventuais circunstâncias ruins que podem acontecer em nossa vida. Para aqueles que tem como qualidade a simplicidade e a humildade, a vida sempre RESERVA coisas boas…
Você, assim como nós aqui da Conti outra, é um grande admirador da cultura japonesa?
Acompanhe também o site de origem dessa matéria: o “Japão em Foco“
Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.
Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.
Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto vôo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro vôo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o grito de conquista havia soado.
Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofegante num beiral de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por um momento. E então parecia tão livre.
Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra tão igual como se fora a mesma.
Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos. Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos. Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos:
— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! ela quer o nosso bem!
Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:
— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!
— Eu também! jurou a menina com ardor. A mãe, cansada, deu de ombros.
Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta do colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava: “E dizer que a obriguei a correr naquele estado!” A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.
Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem, resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.
Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente. Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.
Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.
Texto extraído do livro “Laços de Família”, Editora Rocco — Rio de Janeiro, 1998, pág. 30. Selecionado por Ítalo Moriconi, figura na publicação “Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século”
A mãe era desse jeito: só ia em missa das cinco, por causa de os gatos no escuro serem pardos. Cinema, só uma vez, quando passou os Milagres do padre Antônio em Urucânia. Desde aí, falava sempre, excitada nos olhos, apressada no cacoete dela de enrolar um cacho de cabelo: se eu fosse lá, quem sabe?
Sofria palpitação e tonteira, lembro dela caindo na beira do tanque, o vulto dobrado em arco, gente afobada em volta, cheiro de alcanfor.
Quando comecei a empinar as blusas com o estufadinho dos peitos, o pai chegou pra almoçar, estudando terreno, e anunciou com a voz que fazia nessas ocasiões, meio saliente: companheiro meu tá vendendo um relogim que é uma gracinha, pulseirinha de crom’, danado de bom pra do Carmo. Ela foi logo emendando: tristeza, relógio de pulso e vestido de bolér. Nem bolero ela falou direito de tanta antipatia. Foi água na fervura minha e do pai.
Vivia repetindo que era graça de Deus se a gente fosse tudo pra um convento e várias vezes por dia era isto: meu Jesus, misericórdia… A senhora tá triste, mãe? eu falava. Não, tou só pedindo a Deus pra ter dó de nós.
Tinha muito medo da morte repentina e pra se livrar dela, fazia as nove primeiras sextas-feiras, emendadas. De defunto não tinha medo, só de gente viva, conforme dizia. Agora, da perdição eterna, tinha horror, pra ela e pros outros.
Quando a Ricardina começou a morrer, no Beco atrás da nossa casa, ela me chamou com a voz alterada: vai lá, a Ricardina tá morrendo, coitada, que Deus perdoe ela, corre lá, quem sabe ainda dá tempo de chamar o padre, falava de arranco, querendo chorar, apavorada: que Deus perdoe ela, ficou falando sem coragem de aluir do lugar.
Mas a Ricardina era de impressionar mesmo, imagina que falou pra mãe, uma vez, que não podia ver nem cueca de homem que ela ficava doida. Foi mais por isso que ela ficou daquele jeito, rezando pra salvação da alma da Ricardina.
Era a mulher mais difícil a mãe. Difícil, assim, de ser agradada. Gostava que eu tirasse só dez e primeiro lugar. Pra essas coisas não poupava, era pasta de primeira, caixa com doze lápis e uniforme mandado plissar. Acho mesmo que meia razão ela teve no caso do relógio, luxo bobo, pra quem só tinha um vestido de sair.
Rodeava a gente estudar e um dia falou abrupto, por causa do esforço de vencer a vergonha: me dá seus lápis de cor. Foi falando e colorindo laranjado, uma rosa geométrica: cê põe muita força no lápis, se eu tivesse seu tempo, ninguém na escola me passava, inteligência não é estudar, por exemplo falar você em vez de cê, é tão mais bonito, é só acostumar. Quando o coração da gente dispara e a gente fala cortado, era desse jeito que tava a voz da mãe.
Achava estudo a coisa mais fina e inteligente era mesmo, demais até, pensava com a maior rapidez. Gostava de ler de noite, em voz alta, com tia Santa, os livros da Pia Biblioteca, e de um não esqueci, pois ela insistia com gosto no titulo dele, em latim: Máguina pecatrís. Falava era antusiasmo e nunca tive coragem de corrigir, porque toda vez que tava muito alegre, feito naquela hora, desenhando, feito no dia de noite, o pai fazendo serão, ela falou: coitado, até essa hora no serviço pesado.
Não estava gostando nem um pouquinho do desenho, mas nem que eu falava. Com tanta satisfação ela passava o lápis, que eu fiquei foi aflita, como sempre que uma coisa boa acontecia.
Bom também era ver ela passando creme Marsílea no rosto e Antissardina n° 3, se sacudindo de rir depois, com a cara toda empolada. Sua mãe é bonita, me falaram na escola. E era mesmo, o olho meio verde.
Tinha um vestido de seda branco e preto e um mantô cinzentado que ela gostava demais.
Dia ruim foi quando o pai entestou de dar um par de sapato pra ela. Foi três vezes na loja e ela botando defeito, achando o modelo jeca, a cor regalada, achando aquilo uma desgraça e que o pai tinha era umas bobagens. Foi até ele enfezar e arrebentar com o trem, de tanta raiva e mágoa.
Mas sapato é sapato, pior foi com o crucifixo. O pai, voltando de cumprir promessa em Congonhas do Campo, trouxe de presente pra ela um crucifixo torneadinho, o cordão de pendurar, com bambolim nas pontas, a maior gracinha. Ela desembrulhou e falou assim: bonito, mas eu preferia mais se fosse uma cruz simples, sem enfeite nenhum.
Morreu sem fazer trinta e cinco anos, da morte mais agoniada, encomendando com a maior coragem: a oração dos agonizantes, reza aí pra mim, gente.
Fiquei hipnotizada, olhando a mãe. Já no caixão, tinha a cara severa de quem sente dor forte, igualzinho no dia que o João Antônio nasceu. Entrei no quarto querendo festejar e falei sem graça: a cara da senhora, parece que tá com raiva, mãe.
O Senhor te abençoe e te guarde,
Volva a ti o Seu Rosto e se compadeça de ti,
O Senhor te dê a Paz.
Esta é a bênção de São Francisco, que foi abrandando o rosto dela, descansando, descansando, até como ficou, quase entusiasmado.
Era raiva não. Era marca de dor.
Texto publicado em “Prosa Reunida”, Editora Siciliano – São Paulo, 1999, foi incluído por Ítalo Moriconi no livro “Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século”, Editora Objetiva – Rio de Janeiro, 2000, pág. 349.
A israelense Yamit Silverman Fonseca, de 39 anos, tinha 21 quando saiu do serviço militar obrigatório em Israel e foi viajar pelo mundo.
Não parou durante oito anos. Conheceu a Austrália, a Índia, os Estados Unidos e a América Latina.
Até que um incidente de percurso a manteve presa em uma cachoeira na Chapada dos Veadeiros, em Goiás: conheceu o Bruno, um guia turístico que morava na região e por quem Yamit largaria tudo para viverem juntos.
“Um dia depois que eu cheguei aqui eu já conheci o Bruno na cachoeira. Meu marido. Me apaixonei por ele, por esse lugar, tomei banho nesta água e falei, eu não vou embora, não.”
Daquela vez, os dois passaram apenas de três a quatro dias juntos. Era uma paixão de viagem. Ela precisava seguir seu caminho e foi para Nova York. Chegando lá, não conseguiu esquecer Bruno.
“Eu ligava para ele todo dia. Naquela época não tinha celular e ele não tinha telefone em casa. Eu liguei no orelhão da esquina da Vila de São Jorge [onde Bruno morava]. Quem atendeu o telefone foi correndo na casa dele. Muito doido. Aí ele falou, ou ela é super rica para me ligar todo dia aqui ou ela está gostando muito de mim. Bom, rica eu não sou, não.”
Yamit trabalhou por dois meses em Nova York, juntou dinheiro e voltou à procura de Bruno. “Eu voltei, peguei ele e e nunca mais soltei (…). Cheguei aqui na sorte. Que nem a mesma língua a gente falava. A gente misturou quatro línguas juntos, tudo misturado.”
Bruno havia explicado a Yamit por telefone que não tinha casa, morava em uma cabana na beira do rio, sem banheiro ou chuveiro. Ela não quis nem saber. “Vim na sorte, se rolar, rolou.”E acabou rolando. Hoje os dois moram juntos no meio do mato, em uma casa no Vale da Lua, um ponto turístico da região onde as pedras têm uma formação que lembram a superfície lunar. Lá eles abriram uma lanchonete e vivem da venda de sucos e lanches aos turistas.
Antes de ficarem definitivamente juntos, Yamit contou que por cinco anos ela vinha ao Brasil com visto de turismo, ficava seis meses e precisava sair por outro meio ano. Até que se casaram de vez. “Aí que nunca mais eu saio daqui. É maravilhoso, maravilhoso.”
Disse que chegaram a viver sem energia elétrica na casa do vale. Depois chegou um gerador de energia solar. “Depois que muda para o mato não tem como voltar para trás”, revelou.
Yamit disse que nem tudo é tão calmo assim quanto parece ao morar na natureza. Em época de queimadas precisa proteger a casa do fogo. Quando chove, o rio enche e ninguém passa.
Há ainda a preocupação com a saúde. “Se alguém se machucar aqui é um problema. Por isso você tem que ficar muito forte. Fazer exercícios, comer bem e se virar com seus problemas. É melhor evitar.”
A israelense contou que sua família já foi até a Chapada dos Veadeiros conhecer Bruno e ele também já foi a Israel. “No começo meus pais reclamaram porque o Bruno não era judaico e na minha religião não se pode casar com uma pessoa de outra religião. Mas depois que eles conheceram o Bruno, se apaixonaram por ele, acabou esse problema e nunca ninguém mais tocou no assunto.”
Sentido da vida
E da mesma forma que Yamit foi certeira ao decidir viver um grande amor ela é sobre o sentido da vida: “eu tenho certeza que é a felicidade. É a unica coisa que importa. Porque sem ela nada vale e se você a tem pode passar por qualquer coisa.”
Revelou que busca essa felicidade a todo momento. “É isso o meu destino na vida, é melhorar minha felicidade.”
Para ser feliz, procura ter uma vida saudável e lê muito. “‘E tomo banho de rio, que ajuda bastante. Você pode estar triste, bravo e nada dar certo. Aí você enfia sua cara lá dentro d’água e sai feliz, é impressionante.”
O terapeuta Luiz Alberto Hanns, autor de “A Equação do Casamento”, conclui a série de artigos sobre traição explicando os passos que compõem o caminho da superação
Abordei em artigos anteriores o moralismo e os sentimentos de quem foi traído, agora discuto as sete fases que as pesquisas mostram ser cruciais para a superação de uma infidelidade (descritas no meu livro “A Equação do Casamento”). Elas podem seguir aproximadamente a sequência abaixo.
Para passar por elas com sucesso, é importante que o parceiro que traiu tenha sensibilidade e paciência e que o parceiro traído não se engesse na postura do ressentido a ser “reconquistado”.
1. Arrependimento
Em geral, cabe ao parceiro que foi infiel demonstrar com clareza que se arrepende. Não apenas da boca para fora, mas com uma profunda conexão emocional. Não justifique sua infidelidade acusando o parceiro (“Você me tratava com frieza”) ou falando das suas próprias necessidades (“Eu estava carente”). Soará como tentativa de minimizar o problema. Deixe para abordar suas reivindicações mais tarde, quando seu parceiro estiver pronto para repactuar o casamento. Ainda que você não se arrependa de ter tido um caso(já vimos que há circunstâncias que podem tê-lo levado a isto), lamente estar causando sofrimento ao parceiro. E não ter sabido enfrentar os problemas conjugais. Deixe o arrependimento claro em palavras, atitudes e respeite a dor do outro.
2. Desforra
Talvez o parceiro traído durante meses sinta fúria, ou fique amuado e puna-o com silêncios. Ele precisará de um tempo para descontar a mágoa. Ao punir você, ele não só se alivia, como pretende “reeducá-lo” e fazê-lo saber como doeu. Aguente e respeite estes sentimentos. Querer abreviar rápido demais o período de expiação (“viremos logo a página”) só piora as coisas. Em geral, ao longo dos meses a raiva tende a diminuir e se intercalar com momentos de prazer. Tenha paciência. Se esse período se alongar além do razoável, é preciso que o parceiro infiel dê um basta à quarentena de punições. Se vocês se gostam e querem permanecer juntos, encontrarão o balanceamento adequado.
3. Processo de explicações e esclarecimentos
A maioria das pessoas traídas quer saber tudo que de fato se passou. Essas explicações ajudam a situar o parceiro traído, que ficou sem referências e busca redescobrir quem é seu conjuge e o quanto foi exposto. Aprenda a aguentar esses interrogatórios e as reações intensas de mágoa a cada nova informação que você for “soltando”. Se você mentir para preservar a relação, poderá ser desmascarado e parecer um mentiroso incorrigível. Se o caso terminou e quer resgatar a relação, aguente com paciência. Mas se estes interrogatórios se tornarem repetitivos e só deixarem ambos atolados na mágoa, dê um basta com ternura, mas firmeza: “Já lhe disse tudo de importante. Não vou entrar em detalhes que não acrescentam nada e apenas nos farão mal”. Se você for a parte traída e não puder parar, busque ajuda, não destrua o que restou expondo demais a si e ao parceiro.
4. . Indenização
Se você traiu e quiser restaurar a relação, é preciso “indenizar” o parceiro: corrigir antigas negligências de sua parte e atender a partir de agora com mais cuidado às necessidades dele. Essa fase é talvez a mais importante para o futuro da relação. Tanto você como ele poderão utilizar esse período de resgate da relação para incorporar novas práticas de um cuidar do outro. Não se trata de uma “limpada de barra provisória”: não volte, mais adiante, aos antigos padrões de negligência. E se você for a parte traída, cuidado para não exagerar nas exigências e pedidos de mimo.
5. Perdão
Se você é a parte infiel, não tenha pressa para que seu parceiro oficialize um perdão. Se você foi traído, reveja o que os vincula, qual o valor que a relação tem para você. Não seja moralista e não se afunde na autocomiseração. Você não será o primeiro nem o último a ser traído. Se quer ficar casado, em algum momento terá de superar e perdoar. Se precisar de ajuda psicoterápica, não hesite em procurar, pois pode ser difícil lidar com as vulnerabilidades ativadas em você. Perdoar é empatizar com o parceiro, compreender os contextos e se dispor a repactuar a relação. Não é fácil, mas com autoestima e confiança na vida, é possível recuperar o equilíbrio e refazer uma aposta no parceiro.
6. Reasseguramento
Se você tiver sido infiel, terá de tranquilizar o parceiro por meses ou anos. Ele gostaria de ter acesso a seus e-mails, celulares, de poder achá-lo a qualquer momento, de ter sua agenda diária, de acompanhá-lo em viagens, de ser incluído em programas que antes eram exclusivamente seus? Dar a ele acesso a seu cotidiano é o custo de tranquilizar um conjuge traumatizado. A prioridade na fase de resgate de confiança não é o seu conforto, mas o do parceiro.
7. O sétimo passo: repactuação
Depois do choque inicial, muitos casais acabam por revisar a relação. Mesmo que você tenha sido traído esteja aberto a rever quais comportamentos seus podem ter contribuído para que o casamento desandasse e, se quiser resgatar a relação, cabe também a você fazer sua parte. Se foi você quem traiu, chegou a hora de, além de escutar as necessidades do parceiro, colocar também as suas. Se tiverem afinidade, atração sexual e complementaridade psicológica, terão tudo para seguir adiante, conectar-se às necessidades do outro e evitar repetir erros — e cultivar melhor a relação.
* Luiz Alberto Hanns é terapeuta com mais de 20 anos de prática clínica e autor de “A Equação do Casamento — O que pode (ou não) ser mudado na sua relação”
Segundo Dalai Lama, a felicidade é um “sentido maior de satisfação”, o que não se confunde, especificamente, com “experiências prazerosas”. Afirma o líder espiritual que a felicidade “advém da paz mental que surge do calor humano”.
No vídeo, o Nobel da Paz fala de um mecanismo de auto-aprisionamento: somos prisioneiros dos rótulos, fala da solidão, da depressão e de outras problemáticas atuais.
Vale conferir, na íntegra, o pensamento de Dalai Lama.
Estamos vivendo uma inversão de valores. O brasileiro, por hábito de gerações, sempre coloca a culpa de tudo no governo. A situação política da nação está vergonhosa, não há dúvida, mas, gradativamente, o povo está se acostumando a projetar seu desinteresse nos engravatados de Brasília. “Não temos acesso à educação”, um mantra que é repetido diariamente. Mas será que o brasileiro deseja verdadeiramente se instruir?
Ninguém impede a entrada gratuita de uma pessoa, independente de credo, raça e classe social, em uma biblioteca ou em um sebo. Quem decide a forma como essa pessoa irá se divertir, em suma, como ela irá utilizar o seu tempo de lazer, não é o governo. É o mesmo equívoco daqueles pais que colocam a culpa da grosseria dos filhos na escola. Elegância e bom gosto se aprendem em casa, inicialmente, pelo exemplo dos pais, e aprimorados pelas decisões individuais do jovem. A contribuição financeira que os pais oferecem, do mais pobre ao mais rico, pode servir para diversas formas de satisfação, do “ser” e do “ter”. É uma decisão exclusiva do indivíduo. Aquele pouco de salário que resta no final do mês, após o pagamento das contas, pode ser investido em álcool, cigarro, prestação do carro e roupas de grife, mas também pode ser investido em teatro, cinema e livros. Ser medíocre é um direito inalienável de todos, porém, não sejamos ingênuos, é uma opção plenamente consciente. Colocar a culpa no governo, na pobreza, na falta de sorte, é, pura e simplesmente, uma tremenda hipocrisia.
Então eu volto à questão inicial: será que o brasileiro deseja verdadeiramente se instruir? Caso utilizemos como parâmetro o microcosmo representado pelas redes sociais, com uma multidão compartilhando notícias falsas sem buscar a fonte, curtindo postagens de textos em que leram apenas a chamada, incitando discursos de ódio sem nenhum embasamento, seguindo a manada em qualquer modismo tolo, ou, um clássico, postando indiretas enigmáticas que interessam apenas ao umbigo da própria pessoa, podemos ter a nítida constatação de que reina o caos. Há bastante tempo livre, o problema parece estar na lista de prioridades do cidadão. O brasileiro que passa o ano todo reclamando que vivemos numa nação que não valoriza cultura, é exatamente o mesmo que, em seu tempo ocioso na internet, valoriza apenas o raso, compartilhando vídeos bobinhos de crianças escorregando na casca de banana e músicas de qualidade questionável. É tudo muito engraçado para o brasileiro, ainda que viva diariamente uma realidade de altíssimos impostos, sem segurança, moradia, transporte, saúde e educação de mínima qualidade.
Talvez essa mentalidade emocionalmente imatura e constante de bobo alegre, de incentivador do feriadão enforcado, explique o interesse quase doentio pela vergonha alheia, pelo bizarro, em detrimento do que é elegante.[/quote_box_right]
Talvez essa mentalidade emocionalmente imatura e constante de bobo alegre, de incentivador do feriadão enforcado, explique o interesse quase doentio pela vergonha alheia, pelo bizarro, em detrimento do que é elegante. A autocrítica é essencial nesse processo, visando o necessário autoaprimoramento, uma maturidade intelectual e emocional. Nós precisamos, mais do que nunca, de brasileiros que valorizem a água benta da testa, que não postem nas redes sociais, no início da semana, o desejo pela aproximação rápida da Sexta-Feira.
O Brasil precisa de pessoas que compreendam, acima de tudo, que devem procurar trabalhar naquilo que verdadeiramente amam, pois, dessa forma, o estudo constante será sempre uma atitude natural, não uma obrigação profissional. Os pais devem ensinar aos filhos que, na equação da vida, a prioridade deve ser a satisfação profissional com a busca dedicada pela realização do sonho, não a corrida para somar nas filas de concursos públicos, a busca por uma subjetiva estabilidade, que, na realidade, entrega para o mercado funcionários frustrados, sem sangue nos olhos.
Uma possível solução
A criança aprende pelo exemplo, ela começa imitando aqueles que a cercam, ela precisa escutar os pais folheando as páginas dos livros, após um dia longo de trabalho, ou numa manhã de um final de semana tranquilo. Ela precisa ser surpreendida com o desligar da televisão e do computador, após o jantar na casa humilde ou na mansão, sendo estimulada a acompanhar os pais, sentada no sofá ao lado, compartilhando o sábio silêncio de mentes trabalhando. Enxergar perifericamente os olhos do pai se aproximando do final de uma página, fascinada por aquele universo que o encanta, tentando igualar aquela velocidade, vencer a figura terna de autoridade. E, inteligente, o pai carinhoso, consciente dessa linda batalha lúdica, deixa o filho acreditar que é mais rápido.
Com esperta teatralidade, a mãe desliga as luzes e acende velas, captando a criatividade da criança com o bruxulear mágico, formando sombras nas linhas que os pequenos olhos perseguem com o dobro de atenção. As aventuras elaboradas pelos autores se amalgamam à emoção despertada pelo ambiente, uma sensação que nenhum jogo eletrônico poderia emular. Ao invés de despejarem um smartphone ou um tablet nas mãos das crianças, os pais responsáveis presenteiam seus filhos com livros.
A criança precisa assistir os pais admirando por vários minutos aquela estante repleta de capas coloridas, tendo sua curiosidade instigada na direção de descobrir quais maravilhas se escondem naqueles tomos. O pai inteligente pode até se dar ao luxo de inicialmente reprimir a aproximação da criança, afirmando teatralmente que ela precisa ter muito cuidado com aqueles objetos extremamente importantes, já que o proibido é um elemento que atrai com maior intensidade.
O filho pequeno entenderá que, ao tocar aqueles livros especiais, está se empoderando e agindo como um homenzinho, adentrando um mundo novo de incríveis possibilidades. Então, o pai, com o sorriso de quem sabe que está criando um ser humano potencialmente valoroso, promete ajudar o filho a desbravar aquela magnífica aventura literária. Os pais precisam ser os heróis da criança, liderando sempre pelo exemplo, conquistando o respeito por merecimento.
Caso todos os brasileiros tivessem essa consciência, nossa nação não estaria atravessando esse miserável momento cultural. Colocar um filho no mundo precisa ser uma atitude consciente. A parentalidade irresponsável é a gênese de grande parte dos nossos maiores problemas.
O senhor, um provável morador de rua, lendo um livro de literatura da estante- Rio de Janeiro.
Carioca, apaixonado pela Sétima Arte. Ator, autor do livro “Devo Tudo ao Cinema”, roteirista, já dirigiu uma peça, curtas e está na pré-produção de seu primeiro longa. Crítico de cinema, tendo escrito para alguns veículos, como o extinto “cinema.com”, “Omelete” e, atualmente, “criticos.com.br” e no portal do jornalista Sidney Rezende. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro, sendo, consequentemente, parte da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica.
A princípio realmente parece não fazer sentido que uma mulher que acabou de dar à luz a um bebê saudável sinta-se triste e deprimida. Mas, isto é muito mais comum do que se possa imaginar.
Um grande número de mulheres passa pelo puerpério, período que se inicia logo após o parto e tem uma duração de aproximadamente três meses, com essa sensação de tristeza profunda, ansiedade, medo e instabilidade emocional.
É uma fase de profundas alterações físicas, psicológicas e sociais na mulher, na qual aumentam os riscos para o aparecimento de transtornos psiquiátricos. Há necessidade de reorganização social e adaptação a um novo papel. A mulher tem um súbito aumento de responsabilidade por se tornar referência de um novo ser indefeso, sofre de privação de sono e isolamento social. Além disso, é preciso a reestruturação da sexualidade, da imagem corporal e da identidade feminina. É um momento desencadeador de uma série de mudanças intra e interpessoais.
São três tipos de distúrbios psiquiátricos puerperais: Tristeza Pós Parto, Depressão Puerperal e Psicose Puerperal. O que os distinguem é a gravidade do quadro e o que ele tem de incapacitante, afetando a funcionalidade da mãe e pondo em risco seu bem estar e o do bebê.
A Tristeza Puerperal é um distúrbio leve e transitório com poucos dias de duração. Acomete 50% a 85% das mulheres. Os sintomas são: choro, flutuação de humor, irritabilidade, fadiga, tristeza, insônia, dificuldade de concentração e ansiedade relacionada ao bebê. Pode durar de uma semana a 10 dias.
A Depressão Puerperal (DPP) é um transtorno psíquico de grau moderado a severo e atinge 10% a 20% das mulheres. Os principais sintomas são: tristeza, choro fácil, desalento, abatimento, labilidade, falta de apetite, náuseas, sensação de incapacidade de cuidar do bebê e desinteresse por ele, desinteresse pelas atividades do dia a dia, distúrbios do sono, insônia inicial e pesadelo, ideias suicidas, perda do interesse sexual e culpa. Desenvolve-se lentamente em semanas ou meses (Silva, E.T.; Botti, N.C.L., 2005).
A Psicose Puerperal é um distúrbio de humor psicótico que apresenta perturbações mentais mais graves. Ocorre em 0,1% a 0,2% das mulheres, seu início é abrupto nas duas ou três primeiras semanas após o parto. Tem como sintomas: confusão mental, perda do senso de realidade, agitação psicomotora, angústia, insônia, evolução para formas maníacas, melancólicas ou até mesmo catatônicas (Klaus e col., 2000). Segundo Vera Laconelli (2005), para a mulher em surto o bebê não existe como tal. Ele passa a ser um espaço vazio preenchido por elementos do psiquismo da mãe, cindidos do real.
The Man is at Sea is a recreation by Van Gogh
Analisando a gravidez e o pós-parto sob um ponto de vista simbólico, entende-se que, o materno é um aspecto feminino que precisa ser elaborado no desenvolvimento da personalidade da mulher mesmo que não ocorra uma gravidez física. Gallbach afirma, baseada na teoria de C.G. Jung, que esse aspecto materno, uma vez constelado, deve ser confrontado pela mulher e ela deve deixar-se ser regida por ele. Assim ela passará pela transformação psíquica de “menina-moça para mulher-mãe. Num sentido mais amplo, de gerada para geradora, de criatura para criadora” (Gallbach, 1995).
Apesar de todo sofrimento envolvido, é possível correlacionar a depressão pós-parto como um momento positivo, de amadurecimento da mulher, contribuindo no processo de individuação e encontro de si mesma. As mudanças que ocorrem tanto físicas quanto psíquicas propiciam à ela um encontro com a sua essência. Desde o desejo de ser mãe, até o fato concreto de ter a criança nos braços, a transformação acontece independente de sua vontade consciente.O corpo vai lentamente se transformando e ao longo de nove meses um novo ser vem sendo gestado e a princípio se confunde e vive em simbiose com a mãe.
A mulher que, neste período, conseguir refletir e se entregar de corpo e alma ao processo pelo qual está passando, terá a chance de um entendimento maior, de uma elaboração do materno e do feminino como aspectos que pertencem a si e a uma esfera maior ao mesmo tempo. Essa passagem física de filha para mãe pode propiciar a compreensão psíquica de que o nascimento concreto de uma criança também pode ser vivido como renascimento de si mesma agora, transformada em mãe. A gravidez e a maternidade ainda podem ser refletidas como um processo de iniciação feminina que promove o contato com conteúdos inconscientes, a integração destes à consciência e consequentemente a ampliação e transformação dos mesmos.
A forma que vivemos hoje, associada à cobrança dos papéis sociais que devemos desempenhar impede, de alguma forma, esse olhar para dentro de si nesse período tão importante na vida da mulher. Esse pode, hipoteticamente, ser uma das causas dos transtornos psíquicos no puerpério.
A psicoterapia associada á técnicas de trabalhos corporais pode auxiliar nesse período por serem facilitadores no processo de autoconhecimento e busca de si mesmo. Além de diminuírem o estresse por proporcionar um relaxamento, essas técnicas promovem um rebaixamento no nível de consciência facilitando o acesso aos conteúdos inconscientes que, uma vez acessados, podem ser identificados, clarificados e integrados à consciência propiciando uma ampliação da mesma.
Fontes:
KLAUS, M. H., KENNEL, J. H. & KLAUS, P. (2000). VÌnculo: construindo as bases para um apego seguro e para a independência. Porto Alegre: Artes Médicas.
GALLBACH, M.R. – Sonhos e Gravidez – Iniciação à Criatividade Feminina. Paulus, 1995.
IACONELLI, V. – Depressão Pós-parto, Psicose Pós-parto e Tristeza Materna – Artigo da Revista Pediatria Moderna, v.41 n.4, 2005.
LILIAN MARIN ZUCCHELLI – Depressão Pós-parto Como Um Momento Positivo no Processo de Individuação da Mulher: Uma Visão Simbólica – Monografia apresentada como Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Psicoterapia Analítica e Abordagem Corporal, 2011.
SILVA, E.T.; BOTTI N.C.L. – Depressão Puerperal – Uma Revisão de Literatura – Revista Eletrônica de Enfermagem v.07, n.2, p.231-238, 2005. Disponível em http://www.fen.ufg.br
Lilian Marin Zuchelli – Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Junguiana pela PUC-SP. Especialista em Psicoterapia de Abordagem Junguiana associada à Técnicas de Trabalho Corporal pelo Institiuto Sedes Sapientiae. CRP: 06/23768
Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.
Manuel António Pina, in “Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma é Apenas um Pouco Tarde”
“O bater de asas de uma simples borboleta poderia influenciar o curso natural das coisas e, assim, talvez provocar um tufão do outro lado do mundo.”
Tendo como base a ideia central do “Efeito borboleta” apresento um vídeo romântico e que, num primeiro momento poderia até parecer bobinho….mas nem tanto!
Enquanto somos crianças, com sorte, costumamos escutar de nossos pais lições valorosas sobre a necessidade do altruísmo, os malefícios do egoísmo exacerbado e a importância de deixarmos como legado um mundo melhor do que aquele que nos recebeu. Crescemos e esquecemos estes ensinamentos, preocupados apenas em acumular o vil metal, fazendo dele um instrumento para conquistarmos poder, status social, fama. Poucos são os que utilizam seus recursos, financeiros ou intelectuais, para o bem maior. Ínfimos são os que reconhecem os esforços desses poucos. A questão que atinge a consciência com a força de um instrumento de silício: Vale a pena ser altruísta, sacrificar-se pelo bem maior, sabendo que existe uma grande possibilidade de, neste mundo moderno onde a elegância é alvo de deboche, você ser recompensado com o anonimato?
Selecionei, dentre meus favoritos, dez filmes sobre indivíduos que, com suas atitudes nobres e altruístas, modificaram positivamente o ambiente em que viviam. A lista não está em ordem de preferência.
Em Cada Coração, Uma Saudade (All Mine to Give – 1957)
A trama se passa por volta de 1850 e conta o drama de um garoto de doze anos que acaba de perder seus pais, necessitando cumprir a promessa que fez à mãe em seu leito de morte: distribuir seus cinco irmãos pequenos para boas famílias da região. Ele precisa amadurecer mais rápido e tomar uma decisão cruel, sacrificando seu amor pelos irmãos, objetivando o bem estar dos mesmos. É difícil manter-se insensível nos vinte minutos finais. Os pais, vividos por Glynis Johns e Cameron Mitchell, eram imigrantes humildes, analfabetos, constantemente hostilizados pelos habitantes da região. O garoto, no dia do Natal, acaba se tornando o disseminador de uma nova geração, que, levando em consideração a boa criação dos pais, constituirão uma cidade melhor no futuro. Essa é a mensagem que a bela obra busca transmitir.
Viver (Ikiru – 1952)
Na obra de Akira Kurosawa, Takashi Shimura vive um homem no crepúsculo de sua existência. Vítima de um câncer, ele descobre ter desperdiçado sua vida sendo um funcionário modelo, sem faltas e reclamações, sem momentos de lazer, plenamente dedicado a uma função burocrática, que qualquer um poderia fazer e que só satisfazia seu empregador. Balançando-se em um parque de diversões, emociona-se tentando voltar no tempo e corrigir seus erros. Sobrando-lhe pouco tempo de vida, ele então decide deixar um legado eterno, útil como algo tangível, na forma de um parque onde as crianças pudessem brincar, e filosoficamente eficiente, incentivando seus colegas a seguirem seu exemplo. Já que a prefeitura sempre prometia, mas nunca construía aquela área de lazer, ele se redimiria com seu esforço, construindo algo que sobreviveria por décadas após sua passagem. Somente quando estava prestes a morrer, o nobre senhor decidiu viver.
Uma Voz nas Sombras (Lilies of The Field – 1963)
A simples história de um homem desempregado, vivido por Sidney Poitier, em papel que lhe rendeu um Oscar, que, numa parada para consertar seu carro em uma fazenda, acaba conhecendo uma pequena comunidade de freiras. Elas o veem como um enviado de Deus para ajudá-las a construir uma capela no meio daquele fim de mundo. Inicialmente ele se recusa, chega a desistir na metade, mas acaba retornando para finalizar aquela missão. Não existe motivo algum para que ele ajude aquelas senhoras, tampouco seu trabalho será reconhecido, mas ele parece encontrar um significado para sua existência naquele exaustivo trabalho braçal.
Zorba – O Grego (Alexis Zorbas – 1964)
Cada personagem na adaptação da obra de Nikos Kazantzakis pode ser visto como uma representação de elementos da psicologia humana. O poeta/escritor britânico ao interagir com a força livre da natureza, o personagem “Zorba”, estabelece eficiente metáfora a todas as tentativas de se reconectar com suas potencialidades criativas. O personagem vivido por Alan Bates chega à Grécia com a finalidade de tomar posse da herança deixada por seu pai. Ele representa o elemento da comodidade, conduzido por motivações lógicas e cheio de regras autoimpostas. Afastou-se tanto de sua própria natureza/instinto, que drenou sua energia criativa. Sequer uma linha consegue escrever no papel de sua vida. Esquecido de si mesmo, ele encontra sua antítese na forma do falastrão Zorba, vivido brilhantemente por Anthony Quinn, que esbanja descontrole emocional e racional, apaixonado pela vida. Do encontro entre o racional e o impulsivo, nasce uma grande amizade, que enriquecerá a experiência de vida de ambos. A cena mais famosa, um dos mais belos momentos da Sétima Arte, simboliza a comunhão harmônica entre estes dois extremos pela dança. Aquele jovem que observava passivo o mundo ao seu redor, agora desejava tomar parte nesta enorme celebração chamada vida. O ato da celebração é mais importante que o objeto que se celebra. O poeta aprende que confrontar um problema com uma sonora gargalhada, pode ser muito eficiente.
Peixe Grande (Big Fish – 2003)
A melhor maneira de se compreender as atitudes de alguém, suas motivações e sonhos, é estabelecendo um muro que divida o que a pessoa acredita ser e sua real personalidade. Suas fantasias e desejos correspondem a uma imagem criada, por traumas, vitórias e derrotas. Uma infância de miséria e fome encaminhará a uma vida adulta em que o desejo por uma mesa farta seja prioridade. As fantasias de uma pessoa não mentem, expõem cruelmente detalhes que aos olhos treinados tornam-se páginas reveladoras em um livro aberto. O filho do protagonista de “Peixe Grande”, não se importava em decifrar os segredos contidos no livro aberto que era seu pai. Jovem ambicioso, preocupado demais com sua vida profissional, sem paciência alguma com aquele nobre senhor e suas histórias repetidas. A perspectiva da morte faz com que o jovem busque conhecer aquela incógnita falastrona, que sempre o deixava envergonhado em suas festas, com seus arroubos criativos. Angustiado com a recusa do pai em se mediocrizar, tornar-se comum, seu filho então decide conduzir uma pequena investigação, que acaba levando-o a constatar que somente a fantasia, o lírico, realmente satisfaz de forma plena. Como explicitado no diálogo entre o jovem e o médico da família, que pacientemente lhe conta sobre o dia de seu nascimento. Havia sido uma manhã como qualquer outra, bastante diferente da forma fantástica como seu pai havia lhe contado sua vida inteira. Uma das perguntas que o filme nos faz é: existe algo de errado em viver uma fantasia? Somos escravos da regularidade da natureza. O sol impreterivelmente nasce e some no horizonte, a chuva eventualmente molha nossas cabeças e as flores se guiam em direção à luz solar. Dormimos e despertamos tentando diariamente encontrar razões para que nossa existência continue a nos surpreender. Edward Bloom (Albert Finney e Ewan McGregor) decidiu bem cedo na vida, não se deixar moldar nas fôrmas dos outros. Por acreditar ser mais do que era, tornou-se maior, confiante e decidido a livrar aqueles que se relacionavam com ele, desta prisão torturante chamada vida real. O peixe se molda ao tamanho do aquário em que é colocado, portanto ele procuraria reservatórios mais ambiciosos. O simples ato natural de crescer, para ele seria visto como uma constatação de sua nova condição exploratória. Sua pequena cidade não lhe atrapalhava, porém também não lhe incitava a evoluir. Como peixe, nadava em um pacífico lago de água parada, ansiando uma correnteza. Todos aqueles que cruzam o caminho de Bloom, tem suas vidas modificadas de alguma forma positiva. “Não existe um rosto triste, todos estão muito felizes”, como é dito por seu filho em um dos momentos mais emocionantes. Essa é a essência do filme, sua grande mensagem: sejam maiores que a vida e busquem sempre o fantástico e o impossível, deixando seus sapatos em Spectre. O verdadeiro alienado é aquele que realmente acredita que ser humano é somente discutir política, “esquerda” e “direita”, enquanto nos deparamos com impossíveis possibilidades minuto a minuto. Sabem aquele conselho que lhes dita para serem pés no chão? Sigam-no, porém imaginem-se no incerto solo lunar e sem equipamentos. Quem sabe, enquanto passeiam por lá, não encontram algum gentil gigante ou uma marciana, que irão habitar nos futuros sonhos de seus filhos e netos, moldando-lhes o caráter?
A Morada da Sexta Felicidade (The Inn of the Sixth Happiness – 1958)
Existem dois pontos que considero muito relevantes nesse épico injustamente pouco lembrado do diretor Mark Robson, dois momentos que compensam o equívoco do interesse romântico forçado e sem química entre a missionária Gladys Aylward, interpretada por Ingrid Bergman, e o soldado chinês vivido pelo alemão Curd Jürgens. A jovem inglesa que consegue fazer o impossível, resgatando e zelando pela segurança das crianças chinesas no período opressivo da guerra, conduzindo-as numa exaustiva e perigosa caminhada através das montanhas para um local seguro, havia sido inicialmente impedida de realizar seu sonho por não ter as qualificações necessárias para o trabalho. Ela precisou lutar para conseguir o dinheiro para a viagem, além de ter que se contentar com o trabalho de doméstica em uma hospedaria numa aldeia remota. Situação que conduz diretamente para o segundo momento, que ocorre no terceiro ato, um discurso belíssimo de Robert Donat, que estava muito doente e morreria pouco tempo depois, interpretando o Mandarim que, profundamente comovido com a força do espírito inquebrantável daquela jovem, declara a ela sua conversão para o cristianismo, fazendo questão de que aquela informação constasse nos escritos de seu povo. O roteiro e a atuação evidenciam que aquele gesto simbólico não feria ou desrespeitava suas crenças pessoais, apenas sublimava o conceito de religião como um elemento que, pela sua etimologia, existe como um laço de piedade com o propósito único de religar os seres humanos ao conceito subjetivo do divino, algo maior do que os dogmas de qualquer ideologia religiosa. E é bonito que essa cena, exatamente a última gravada pelo ator, seja uma despedida. Entrevistado para a biografia do ator, o diretor afirmou que todos na equipe sabiam que ele estava utilizando suas últimas energias naquele trabalho. É possível notar essa aura de transcendência na cena. A emoção de Bergman é real, enquanto escuta seu esforçado colega afirmar que eles não se veriam novamente. Donat, sempre lembrado por “Os 39 Degraus” de Hitchcock, estava sem trabalhar por longos cinco anos, mas mostrava-se orgulhoso de poder morrer fazendo aquilo que mais amava, em um projeto tão bonito.
Nenhum a Menos (Yi Ge Dou Bu Neng Shao- 1999)
A saga de uma professora obstinada e uma criança que não seria uma estatística. Esforço impressionante do sensível diretor Zhang Yimou em retratar o lado mais belo da natureza humana. Com um elenco de amadores que utilizam seus próprios nomes, e ocupam funções parecidas com a de seus personagens, “Nenhum a Menos” fala sobre uma jovem de treze anos (Wei Minzhi) que vive em um pobre vilarejo chinês, afastado da civilização. Quando o professor da humilde escola primária local precisa ausentar-se por um mês, o prefeito convoca a menina para ser a professora substituta. O modesto pagamento lhe será dado caso ela consiga evitar a desistência das crianças. As famílias são paupérrimas e não existe esperança nos olhos dos alunos, que externam a angústia com atos de rebeldia. Yimou inicia a obra nos fazendo crer que a obstinação da menina é guiada apenas em função do pagamento, porém ao longo da trama ele nos emociona ao mostrar a devoção do antigo professor, que com um número limitado de gizes e sem dinheiro para repô-los, utiliza até mesmo o pó que resta em seus dedos, para concluir seus ensinamentos na lousa. Esse amor que só é explicado pela vocação genuína, acaba contaminando a jovem, que empreende uma árdua jornada, externa e interna, de amadurecimento, para resgatar o aluno mais peralta da classe, que havia fugido para a cidade grande, para encontrar trabalho. A discussão que a obra fomenta, entre a falta de perspectiva desmotivadora e o progressivo estímulo da menina em lutar por aquele único aluno, estabelece uma parábola inspiradora e realista. No percurso de sua jornada, que se inicia ainda na escola, quando junto com as crianças carrega tijolos, intencionando pagar a viagem de ônibus, ela acaba gastando muito mais dinheiro do que viria a receber ao final de sua missão. Por outro lado somos apresentados à figura de uma secretária da cidade, que se mostra incapaz de demonstrar compaixão, ao negar ajuda à menina. Yimou nos apresenta uma mulher adulta, que nega um simples gesto, que lhe tomaria alguns minutos apenas, enquanto a jovem exala maturidade ao manter-se aguerrida ao seu objetivo, chegando a dormir na rua. O naturalismo documental da filmagem agrega valor à mesma, fazendo com que nos identifiquemos com as situações e torçamos para que a protagonista consiga encontrar o garoto e levá-lo de volta à escola. Como qualquer criança de treze anos, não tão diferente daquelas a quem deve ensinar, na mesma situação, ela inicia focada apenas em não deixar nenhum deles fugir. Antes mesmo de corajosamente se aventurar na cidade, suas ações já demonstram que algo mudou nela, amadureceu, e, mais importante, nos alunos. Sua obstinada devoção provou às carentes crianças, que elas não são números em uma estatística. O emocionante final deixa claro que, onde antes dominava a desesperança e o caos, agora se faz brilhar a luz da autoestima. A mudança interna foi muito maior que a externa, advinda da jornada da jovem.
O Vento Será Tua Herança (Inherit The Wind – 1960)
A trama, baseada em um caso real ocorrido em 1925, é um exemplo de como Stanley Kramer conseguia esquivar-se do panfletarismo ideológico, buscando compreender os dois lados, retratando-os com o mesmo carinho. Não existem estereótipos, vilões detestáveis e mocinhos amados, apenas homens psicologicamente tridimensionais que realmente acreditam deter a razão, sendo colocados em natural conflito de ideias. É o que ocorre com os protagonistas vividos por Spencer Tracy e Fredric March, homens com um histórico de amizade e admiração mútua, mas que se encontram ideologicamente em lados opostos. Criacionismo e Evolução, conceitos que ainda hoje, surpreendentemente, podem incitar uma briga, sendo abordados em 1960. Admirável! O projeto fracassou nas bilheterias e dificilmente você verá sendo exibido na televisão. Na época, fanáticos religiosos berravam que o diretor era o “Anticristo”, exercendo a ignorância típica concernente ao fanatismo em qualquer área. Já na primeira sequência, o roteiro (de Nedrick Young, na lista negra e utilizando pseudônimo, e Harold Jacob Smith) explicita a essência da proposta. Um banner preso em árvores, ocupando toda a tela, com um nome: “BRADY”, esclarece a função do personagem de March na sociedade antes mesmo de sua primeira aparição. Ele é mais que um político, mais que um homem, ele é um símbolo de salvação, aquele que irá manter o demônio afastado da pequena cidade. E a evolução de Darwin era um diabinho inconveniente, que não podia ter voz. Como todo sacerdote de qualquer religião sabe, mentiras são necessárias para manter o povo sob seu jugo, sendo controlados pelo medo e pela possibilidade de redenção. E também sabem que a verdade é muito melhor amparada em argumentos, já que não se guia por um limitante livro de condutas, então a melhor solução é sempre impedir que os argumentos apareçam. Por essa razão, nas páginas da História, todos aqueles que buscavam alertar o povo para a verdade eram silenciados rapidamente. A discussão é uma ameaça, pois incita as pessoas a exercitarem o pensamento lógico, o raciocínio. O professor vivido por Dick York é afastado de sua sala de aula exatamente por estimular seus alunos ao livre pensar, ensinando-os sobre a evolução das espécies. A população da cidade é mostrada desde o início como zumbis, entoando hinos religiosos como máquinas. Kramer também evidencia a impossibilidade da coexistência entre ideologia religiosa e política, algo muito atual em nossa realidade, culminando no discurso final do personagem de March, um homem que possuía uma grandeza de valores em sua juventude, mas que se perdeu ao extravasar frustrações e complexos em sua crença. O mais triste é perceber que os zumbis agressivos mostrados no filme ainda existem em nossa sociedade. Vemos o povo demonizando cientistas e suas pesquisas, políticos querendo determinar leis de acordo com suas crenças religiosas, pastores acumulando fortunas, intolerância racial e homofobia. Podemos constatar pesarosos que o pensamento lógico e sensato ainda é um exercício facilmente substituível pela aceitação cômoda do cabresto. Stanley Kramer, falecido em 2001, continua sendo o homem mais corajoso na indústria.
Serpico (1973)
O protagonista está sentado descansando em seu jardim, escutando a ária “E Lucevan le Stelle”, momento marcante da ópera Tosca, onde o revolucionário Cavaradossi aguarda seus últimos minutos de vida em uma prisão. Um detalhe que pode passar despercebido, mas que demonstra a sensibilidade criativa do diretor Sidney Lumet, que adaptou a história real imortalizada no livro de Peter Maas. O trágico pintor de Puccini e o policial íntegro interpretado brilhantemente por Al Pacino possuem muito em comum, especialmente a qualidade de manterem-se fiéis aos seus valores, mesmo quando confrontados pela total desesperança. Frank Serpico só queria fazer seu trabalho, não defendia nenhuma causa nobre, mas cometeu o crime de ignorar que o sistema alimentava a corrupção que, em teoria, deveria combater. O roteiro de Waldo Salt e Norman Wexler mostra a gradual frustração de um jovem que tinha uma visão idealizada de como ser um oficial da lei. O desconforto inicial ao perceber os primeiros deslizes de seus colegas, o choque ao constatar que seus superiores temiam sua resistência a receber propina, pois acabaria se tornando como o rei sábio do conto que escuta de sua namorada, um louco aos olhos daqueles que beberam da fonte envenenada pela ganância. Ele não estava disposto a sorver sequer uma gota daquela água pestilenta. Com real interesse, ele atravessa uma fase em que tenta genuinamente compreender as possíveis razões por trás dos atos ilegais de seus colegas, o baixo salário ou problemas familiares, mas logo descobre que não há dificuldade extrema que não seja subjugada pela dignidade daquele cujo caráter não se dobra. Esse trabalho de construção de personagem de um impecável Al Pacino é auxiliado pela decisão do diretor de fotografia Arthur J. Ornitz, que, em diversas cenas, utiliza lentes que achatam a imagem, criando a ilusão de que o cenário se impõe sobre o protagonista, oprimindo-o cada vez mais em sua jornada inescapável rumo à descrença total na honestidade em sua função.
A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no Kamikakushi – 2001)
Impossível não compararmos a clássica história de Lewis Carrol com esta jóia de Hayao Miyazaki. Tanto “Alice” quanto “Chihiro” vivem em um mundo em que o real e o fantástico andam de mãos dadas, limitados apenas pela imaginação da protagonista. A meu ver, o roteiro do mestre japonês consegue, em sua simplicidade, superar “Alice no País das Maravilhas”, “Alice no País dos Espelhos” e qualquer outra obra similar a esses conceitos. A jovem japonesa se sente entediada no banco de trás do carro de seus pais, no que lhe parece uma interminável viagem. O mundo que ela vislumbra pela janela é desinteressante, assim como o falatório de seus pais, que lhe parece vazio. Sua mãe afirma que se mudar para outra cidade é uma aventura divertida, porém os olhos tristes da menina residem ainda em sua velha escola, seus amigos, laços que se desfazem à velocidade do vento que atravessa a janela do carro e perturba seu cabelo. O momento em que a fantasia se funde à realidade ocorre de maneira semelhante no conto de Carrol, quando Alice segue o coelho e adentra em sua toca. Chihiro e seus pais descobrem o que acreditam ser um parque de diversões abandonado, quando procuravam um atalho na estrada. As duas personagens encontram de forma inusitada um gatilho que desperta nelas a melhor fuga para seus problemas: um mundo paralelo, que reflete em lindas metáforas todos os estágios da vida, onde as jovens evoluem enfrentando obstáculos aparentemente impossíveis. Chihiro inicia o filme como uma garota ingênua, medrosa e mimada, tornando-se ao final uma mulher madura e valorosa. Miyazaki ainda encontra tempo em sua obra para incutir críticas ao capitalismo, uma sociedade que parece visar apenas o “ter”, não o “ser”. Com tantas animações que parecem subestimar a inteligência e sensibilidade das crianças, mostrar a seus filhos obras como as de Miyazaki, incentivar neles o ato de pescar, ao invés de lhes entregar o peixe já mastigado de animações similares, pode ser um presente inestimável e de efeito vitalício.
Carioca, apaixonado pela Sétima Arte. Ator, autor do livro “Devo Tudo ao Cinema”, roteirista, já dirigiu uma peça, curtas e está na pré-produção de seu primeiro longa. Crítico de cinema, tendo escrito para alguns veículos, como o extinto “cinema.com”, “Omelete” e, atualmente, “criticos.com.br” e no portal do jornalista Sidney Rezende. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro, sendo, consequentemente, parte da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica.
Autonomia (Grego antigo: αὐτονομία autonomia de αὐτόνομος autonomos de αὐτο- auto- “de sí mesmo” + νόμος nomos, “lei”, que quando combinados são entendidos como “aquele que estabelece suas próprias leis”.
Eu tenho observado muito na maneira como somos “programados” para aprender com o que vem de fora e nos esquecemos de validar os nossos aprendizados. É como se inconscientemente todos os dias, mandássemos uma mensagem para nós mesmos de que não somos bons o suficiente, que não sabemos o suficiente, que não somos capazes. Nessa ânsia por sermos capazes estudamos, fazemos cursos, lemos livros, sempre no papel de aprendizes e dando autonomia para o outro ser o mestre. Acho que até uma certa idade isso é bem válido, as crianças precisam de orientação, os adolescentes também, alguns ofícios ou até idiomas podem ser aprendidos, mas o problema é que continuamos replicando essa fórmula em tudo que realizamos.
Certo dia fui fazer o Zazen – meditação sentada Zen Budista – eu não sabia absolutamente nada sobre o Zen Budismo e muito menos sobre o tal zazen. Perguntei ao monge com a esperança que ele me ensinasse algo e me desse orientações “como é esse zazen?” e o monge respondeu: “então, você senta e medita”. Eu ainda esperei para ver se ele complementaria com algo, mas não. Foi então que ele me contou como os orientais têm a cultura de fazer e aprender e não o contrário como fazemos por aqui. Essa lição ficou muito forte em mim, inclusive para desistir de fazer zazens e acreditar que sou o que preciso ser, sem meditação, Yoga, curso de nada.
Acho importante a gente se encher de conhecimento, aprender, crescer. Mas é mais importante ainda que, em algum momento no meio disso tudo, a gente se permita parar um pouco para contemplar e validar o que ja temos e aprendemos e acreditar, de alguma maneira, que isso é suficiente. Além do mais tem coisa que aprendemos com a vida e que não está em livro algum. Quer aprender a desenhar? Desenhe. Quer aprender a fotografar? Fotografe. Com o equipamento mais simples que puder. Tente gastar menos dinheiro com equipamentos e cursos e um pouco mais de energia simplesmente fazendo, acreditando que você dá conta. E não apenas é importante fazer isso por nós mesmos, mas também pelos outros.
Sinto que nós aprendemos sobre muita coisa, mas não sabemos nada sobre autonomia. Pudera, somos a cultura da “pena”, não somos programados para dizer que o outra dá conta e sim para sentir pena. Dessa maneira não nos damos conta que sentir pena automaticamente invalida e tira a total autonomia do outro de lidar com suas dores e dificuldades e de aprender. A pena é o pior que você pode dar para o outro, independente da situação que ele esteja. A pena é um sentimento arrogante e egoísta, que só parece ser bom para quem sente, mas no fundo nem isso é.
Não culpo ninguém que sente pena, eu mesma me policio todos os dias para não sentir pena de ninguém, nossa sociedade é paternalista, nós aprendemos a passar a mão na cabeça do outro e chorar por/com ele, afinal, coitadinho! Mas não aprendemos a olhar e dizer: “você dá conta, eu tenho certeza que dá!”. Mas, apesar de ser raro, quando alguém faz isso por nós, é libertador.
Há alguns anos, passei por um período bem conturbado, joguei anos de carreira (e cursos e diplomas) no lixo e não sabia o que seria de mim profissionalmente, no meio disso era responsável pelo bem-estar da minha mãe que tem Alzheimer e meu pai fora diagnosticado com câncer, raro, agressivo, grave. Eu estava perdida. Olhando para trás às vezes acho bom que vivemos em uma cultura onde a estética é tão importante porque por fora eu parecia bonita, magra, cabelos longos e hoje acho bom que muitas vezes nosso exterior “engana”, porque por dentro eu estava em ruínas.
Um dia, em conversa entre amigas, uma delas me disse: “estou super tranquila, vejo uma luz no fim do túnel para você, você vai ser uma ótima professora e vai amar dar aula e os alunos vão te adorar!”. Ela andava batendo nessa tecla há algum tempo.
Eu não sei se já agradeci à ela, mas o que ela fez por mim foi grandioso. Claro que existe meu trabalho de correr atrás, estudar, me dar essa autonomia e descobrir que eu sabia muito mais do que imaginava e também tentar. Mas, a maneira como ela falou, com tanta certeza, me salvou. Eu lembro de ter ficado incomodada, “pô como ela não está vendo como eu sou coitadinha?”. Mas algo dentro de mim se agarrou naquela certeza que ela tinha, porque ela mesma é professora, então se ela que conhecia o trabalho, estava vendo algo em mim que eu mesma não conseguia enxergar, talvez ela estivesse certa. E estava.
Em pouco tempo descobri outro ofício e através dele aprendi que é possível amar o que fazemos e reencontrei propósito na vida. E ter descoberto isso, foi o que me deu forças para enfrentar um período da minha vida “pauleira” que foi esse em que, aos poucos, perdi meu pai. E para proclamar minha independência e autonomia também dos padrões de beleza cortei os cabelos bem curtos. Foi uma libertação e ao mesmo tempo muito assustador. Mas, descobri que, ao contrário de Sansão e do que eu mesma acreditava, minha força não está nos meus cabelos e sim em acreditar que posso mesmo quando as circustâncias me fazem duvidar.
E hoje penso muito sobre esse processo de me dar autonomia e dar autonomia aos outros. Porque aquele velho clichê é pura verdade, somos sim muito mais fortes do que pensamos e podemos ir mais longe. Basta nos darmos autonomia para tanto.
A literatura é uma arte adorável, porque ela ajuda você a viver. Histórias não são passatempos banais, que lhe servem de distração e nada mais. As histórias revelam o que há de mais profundo e verdadeiro no espírito humano.
E isso não é conversa fiada para superestimar o valor da literatura. É uma constatação do significado que as histórias exercem no imaginário da humanidade.
Tudo começou com a oralidade. As conversas em volta da fogueira. A necessidade de contar e inventar. E criar e levar as mentes para fora da realidade. Ou pelo menos para uma realidade diferente.
Como defende Crhistopher Vogler, em A Jornada do Escritor, uma grande história tem imagens profundas arquetípicas, compartilhadas e entendidas por todos nós, numa dimensão atemporal. O que significa que enfrentamos os mesmos dramas dos heróis e heroínas dos livros que lemos. E dessa forma, nos identificamos com eles. Experimentamos com eles novas buscas e desafios. Literalmente, voamos para outros mundos fora da nossa própria realidade. Depois disso, voltamos para casa acrescidos, ampliados em experiências e recursos para vivermos nossas próprias vidas.
É fácil observarmos isso. Se lemos um drama, que ressalta questões confusas da existência adulta e se estamos nessa mesma fase, observamos o que acontece com o personagem, torcemos por ele, nos envolvemos porque se trata também da nossa vida. E dali, tiramos novas formas para lidar com velhas questões.
Se mergulhamos em um envolvente romance, nos entusiasmamos porque queremos paixão na nossa vida, queremos viver uma história excitante como aquela. Também desejamos amar e experimentar toda essa aventura. E podemos sair em busca.
Temas como lealdade, supremacia, força, justiça povoam grandes épicos de fantasia. Não acreditamos naqueles super-heróis, mas admiramos o senso de justiça e a lealdade que exalam e queremos isso para nossa vida também.
A literatura nos transforma e nos oferece uma possibilidade encantadora de experimentar muitos sentimentos, muitas sensações… e então, transpormos tudo isso para o mundo real, pois é aqui que vivemos.
Ernani Ssó, talentoso escritor gaúcho, ressalta que uma boa história é misteriosa e que isso atinge em cheio o leitor. (A vida é um mistério!). Afirma também que a leitura
não é só uma operação da razão. Também é uma operação dos instintos e dos sentidos. Uma história boa nos arrebata por isso, confundimos nossos próprios sentimentos com os do personagem.
Em um personagem encontramos nosso medo da morte. Em outro, nossa confusão em escolher um rumo para a vida. Nos identificamos. Nos trabalhamos, mesmo sem perceber.
Nossos aspectos sombrios também são espelhados nas histórias. E com isso temos a chance de iluminá-los ou fazer um acordo com eles. Todos temos eles conosco. Que bom podermos vivenciá-los sob a pele de um personagem de algum livro.
O autor não precisa se preocupar com mensagens ou recursos pedagógicos. Isso é uma grande bobagem. História é imaginação e criatividade. É isso o que envolve o leitor. A chance de viver algo que fala diretamente com seu espírito, com suas necessidades humanas.
Clarissa Pinkola Estés, a consagrada escritora de “Mulheres que correm com os lobos”, aponta o poder curativo das histórias. Nesse sentido, ela é um bálsamo para nossas vidas. Nos misturamos a elas e dali tiramos o remédio que precisávamos para melhorarmos a nossa vida. E isso é uma coisa estupenda!
A leitura é uma prática excepcional. Além de nos ajudar com nossa própria vida, nos fazer viajar em mundos criativos, nos emocionarmos com os mais variados desfechos; ela trabalha nossa linguagem e nosso conhecimento. Precisamos de mais argumentos para fazer disso uma prática cotidiana?
Bem, eu não. Porque ler já me salvou em muitos momentos. Já me tirou de dias tediosos. Já me fez mudar cursos de algum projeto. Já me divertiu. Já me deu a chance de sentir uma porção infinita de sensações… Já me fez tomar atitudes diferentes. Já me fez pensar sob outro prisma. Já me fez sonhar e ver que é possível.
A literatura é uma ação poderosa na nossa vida. Portanto, não tenho mais nada a dizer a não ser: LEIAM, LEIAM E LEIAM PARA SEMPRE!!
Cena do filme Hugo Cabret
Nota da página: Reprodução realizada com a autorização da autora.
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De certa forma, tenho vivido como um ser nômade. Não apenas porque tenho me deslocado e viajado com certa frequência e habitado diferentes lugares por um certo intervalo de tempo, mas, acima de tudo, tenho sido um ser de alma nômade. A alma nômade é aquela que possui uma certa dose de desapego, que explora sentimentos dentro de si até o esgotamento e sabe reconhecer a hora de partir quando sentimentos já não dão mais bons frutos. A alma nômade é ampla, pouco comodista, errante, aventureira de si mesma, se arrisca a explorar os próprios sentimentos que muitas vezes são territórios estrangeiros. O espaço externo às vezes não importa, porque o interno já guarda diversos mundos.
E hoje quero contar aqui 10 coisas que aprendi com minha alma nômade.
1- O gosto por ser estrangeira
Uma alma nômade é essencialmente estrangeira. Por ter percorrido diversos universos de sentidos, e ter compreendido diferentes formas de enxergar o mundo, a alma já não consegue pertencer a um grupo e carrega em si um pouquinho de cada sentimento que atravessou. E mesmo que volte para os campos sensíveis mais familiares ou primordiais, já não se sente em casa, já não se sente chegando ao ponto de que partiu. Ser estrangeira é não pertencer a um grupo por saber que grupos impõem regras, oferecem vantagens e acolhimentos, mas também enquadram as possibilidades de sentir.
2- Tenho lar, não tenho casa
Como diz uma frase que li por ai, o lar é feito de bons sentimentos e a casa é o espaço físico. A expressão ‘sentir-se em casa’ significa sentir-se tão livre a ponto de ser você mesmo. Minha alma nômade me ensinou que eu posso me sentir em casa em qualquer lugar, porque o meu lar sou eu e o carrego aonde for. Eu sou meu lar, meu quintal é o mundo e meu porto seguro é meu coração transbordando de amor.
3- Paixão pelo caminhar
Por não ter casa ou um destino, a alma nômade segue devagar, aproveitando o caminhar, pois a felicidade está em cada passo, em cada olhar, em cada aprendizado e não nas grandes conquistas que podem estar me esperando no fim do caminho, no fim do dia ou no fim da vida. A vida é a viagem em si, e eu sou apaixonada pela jornada, pelo hoje, pelo agora.
4- O futuro não existe
Aprendi com minha alma nômade uma sabedoria cigana: o futuro não existe. Justamente por ele não existir é que os ciganos podem ler (e inventar) destinos na palma de uma mão. O único adjetivo que qualifica o amanhã é: indeterminado. Minha alma nômade tem poucos planos, nenhum plano a longo prazo. Hoje ela está contemplando, aprendendo e construindo. O resultado de tudo, não sei. Mas agora eu estou inteira
5- Vivo por causas não por consequências
Eu escrevo porque minha causa é inspirar. Eu amo porque minha vontade é transbordar. Eu ando porque minha vida é experimentar. Eu sigo motivações, paixões e não recompensas. Eu foco nos meios, já não me importa os fins.
6- Solidão
Solidão é apenas a decisão de caminhar sozinha por uma causa intrínseca e escutar mais as vozes internas do que as do mundo. E seguir surda, às vezes sem suporte ou companhia, seguir o que brilha por dentro. A solidão é a tentativa de preservar uma genuinidade de alma. Se ela for isso, é fácil se dar bem com ela.
7- Coragem
Há uma frase que diz assim: ‘coragem é a resistência ao medo, o domínio do medo – não a ausência do medo’ (Mark Twain). Tenho tantos medos! Mas eu vou mesmo assim nos caminhos do desconhecido. Eu e meus medos desenvolvemos uma forma cordial de relacionamento: eles seguram minhas mãos, e eu não deixo de ir aonde devo mesmo com as mãos geladas e as pernas bambas.
8- Empatia
Ao explorar minha alma até o esgotamento, a capacidade de compreensão aflora. Ser alma nômade é não pertencer a nenhum grupo, mas compreender e se identificar um pouco com todos. Ser empático é ter ouvidos de compreender almas e olhos de ver singelezas.
9- Renascimento
Ser nômade é abandonar terras que se tornaram improdutivas, mas é também (re)encontrar solos cheios de vida. Ser nômade é participar dos ciclos, aceitar mortes e contemplar a vida, é renascer e celebrar isso. E saber a hora de esparramar abundâncias e festejar os encontros com primaveras.
10- Aprender a ir além
Além das verdades, além dos julgamentos, além dos entendimentos rasos, além das diferenças, além de tudo que me limita.
Ter a alma nômade é aprender a cortar raízes para poder desenvolver asas e assim, começar a perceber que a vida é uma tela eternamente recolorível.