Na poesia e na psiquiatria, o homem voa.

Na poesia e na psiquiatria, o homem voa.

Por Josie Conti

Lembro-me que, durante a minha formação como psicóloga, houve um período em que realizava estágio em um Hospital-Dia. Certo dia, pedi aos frequentadores de um dos grupos que realizávamos ao longo do dia que fizessem um desenho com imagens de um local que representasse onde eles gostariam de estar naquele momento. Embora eu tivesse uma ideia inicial para uma reflexão posterior que poderíamos desenvolver tendo como base as imagens, sentimentos e significados das ilustrações que surgiriam, eu imaginava que aquela simples, mas, não despretensiosa figura indicaria traços de um sonho que cada um trazia consigo. Quem trabalha com saúde mental sabe do poder da arte como coadjuvante no tratamento de pessoas com diagnósticos psiquiátricos.

Quando os desenhos ficaram prontos, entretanto, os resultados pareciam muito mais simbólicos do que eu imaginava encontrar e, na maioria deles, as folhas traziam imagens de pássaros e outras referência ao voo. Os participantes do grupo, possíveis reféns de seus diagnósticos e sintomas, conheciam bem o sentimento da falta de liberdade, a sensação de impotência e, muitas vezes, até a paralisação frente à vida e, talvez por isso, e através de seus traços, buscavam o voo que lhes devolveria a liberdade. Suas falas também diziam da busca por um encontro com novas perspectivas, da volta a suas rotinas e família de antes do adoecimento. Alguns, menos lúcidos para uma fala tão organizada, não demonstravam objetivos tão definidos, mas também se encantaram com a ideia do voo. Outros ainda, cronicamente mais adoecidos, não disseram nada. Eu gosto de pensar que estavam em pleno voo, mas, disso nunca saberei.

Naquele dia, sem que planejássemos, formamos um bando de pássaros. Eles, ora presos em algum lugar do caminho, identidades partidas, em busca da sanidade. Ora, apresentavam-se com suas asas fortes em voos a lugares que muitos talvez nunca sonhem chegar. Eu, inexperiente, cercada de juvenil ignorância para lidar com tantas possibilidades. Naquele voo, certamente eu era o menor passarinho.

Quem admira poesia sabe que poeta também tem costume de ser pássaro. No infinito de possibilidades de um voo ou do nascer e bater das asas constroem-se os mais lindos textos e versos.

O voo, mesmo que simbólico, não abandona os sonhos e metáforas daquele que escreve. Ele quer ir além, quer virar borboleta, rompe as grades das gaiolas que o cerceiam, plana em horizontes distantes. O escritor é borboleta, beija-flor ou um pássaro que caiu do ninho. Possui asas que surgem das costas, asas machucadas, salta em precipícios. Do mais famoso nome da literatura ao mais ilustre desconhecido, estão todos lá: mais um bando de passarinhos!

Sonho, simbolismo e poesia. Na loucura, na infância, na sanidade ou na fantasia. Deve ser por isso que super herói que não voa é meio sem graça, tem poder pela metade.

Somos todos filhos de um sonho alado que sempre quer ir além, seres metamorfoseados por asas imaginárias. Fênix dos desejos que sempre voltam e nos mantém em movimento. Seguimos em busca de nós mesmos, em busca da cura, em busca do desconhecido.

Diferente dos pássaros que voam simplesmente, porque são pássaros e nada questionam sobre isso, o homem voa para ser homem.

Pai e Filho, um vídeo sobre o sacrifício e o amor verdadeiro

Pai e Filho, um vídeo sobre o sacrifício e o amor verdadeiro

Quando alguém realmente importante deixa de estar ao nosso lado fisicamente, quanto dessa pessoa ainda continua dentro de nós?

É disso que trata “Pai e filho”, um curta do diretor francês Fred Bouchal que foi traduzido para o português por Flávio Marianni, do canal Legendadus

Cumplicidade, emoção, perda, luto e a simpatia pelo caminho da superação são alguns dos prováveis sentimentos que serão despertados em quem permiter-se vivenciar essa triste, mas linda história de amor.

“Minha vida”, um filme sobre o perdão e o desapego

“Minha vida”, um filme sobre o perdão e o desapego

Por Octavio Caruso

Michael Keaton sempre foi um grande ator, algo que muitos passaram a perceber apenas com o sucesso de “Birdman”. Ele é popularmente reconhecido por filmes onde explorou extremos de interpretação, como o histriônico “Beetlejuice”, porém, com “Minha Vida”, que ainda considero seu melhor desempenho, ele teve a chance de utilizar os elementos de seu início como comediante stand-up, inserido em uma trama cruelmente realista, vivendo um workaholic que descobre, num curto espaço de tempo, que irá ser pai e que está morrendo de câncer nos rins. A abordagem do diretor/roteirista Bruce Joel Rubin, que escreveu “Ghost – Do Outro Lado da Vida”, encanta pela forma felliniana com que ele constrói o leitmotiv da necessidade de aprender a perdoar.

O protagonista é mostrado no início como uma criança altamente criativa, contagiando seus colegas de escola, que, aceitando um convite do menino, aparecem na frente da casa dele, esperando a apresentação de um grupo circense. A fantasia do garoto seria a materialização de um pedido feito a uma estrela, na noite anterior. Os pais dele, exatas réplicas do tipo de pessoa que ele viria a se tornar profissionalmente, recebem com frieza aquele evento, envergonhados pela atitude do filho, acabam optando pela punição, o castigo que irá bloquear o lúdico da criança.

Já adulto, ele adota uma postura cínica e debochada, projetando suas frustrações existenciais em uma ambição exagerada pela realização profissional. Ele nunca perdoou os pais, simplesmente se afastou, numa tentativa de reestruturar sua psique, com o auxílio da terna esposa, vivida pela bela Nicole Kidman. É interessante a forma como o roteiro evidencia a importância da jovem, quando, em uma reunião familiar, os pais dele demonstram mais alegria ao vê-la. Aquela que sempre foi o maior elo entre as famílias, que, por trás dos panos, sempre tentou resgatar a pureza do menino de outrora, mantendo os pais dele informados sobre tudo. A resistência doce, no difícil convívio com um homem que havia se tornado a antítese de tudo que desejava ser. O câncer acaba sendo o instrumento que ressuscita o caráter original, o adulto que o menino sonhava ser.

“Não ouse tirar minha esperança, ela é tudo o que eu tenho”.

O filme trabalha a lógica do desapego material, com o pai decidido a registrar em vídeo o máximo possível de informações, ensinamentos, para o filho que, pelas estatísticas médicas, ele não chegaria a conhecer. De coisas simples, como a maneira certa de se barbear e seguramente apertar a mão de desconhecidos, até relatos emocionantes das razões que fizeram ele se apaixonar pela mulher, uma linda corrida contra o tempo, visando o legado. E, quando paramos pra pensar, a única coisa que verdadeiramente importa na vida é o legado. O quarto que decoramos com tanto carinho, selecionando a cor da parede e dos móveis, esse receptáculo de emoções tão intensas e diversas, onde o amor é expresso em sua forma mais primitiva, irá, um dia, testemunhar a vida de outras pessoas, indiferentes à existência dos moradores anteriores. A morte não precisa ser o esgotamento do valor inspiracional de quem deixa de existir, o ser humano se perpetua em suas ações, que podem reverberar por séculos. O pai continuará presente, na tela da televisão, com sua aparência intacta, saudável, protegendo o amado filho de todos os obstáculos que irá enfrentar.

São várias as cenas bonitas que eu poderia ressaltar, porém, não quero estragar a experiência de quem ainda não conhece a obra. É manipulativa em excesso, mas, sem dúvida, eficiente. Tenho certeza que você não irá esquecer o momento em que o homem, já em estágio terminal, perdoa o pai, enquanto ele carinhosamente faz a barba do filho pela última vez, fechando o ciclo da vida.

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MY LIFE, Nicole Kidman, Michael Keaton, Michael Constantine, Queen Latifah, 1993, (c) Columbia

OCTAVIO CARUSO

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Carioca, apaixonado pela Sétima Arte. Ator, autor do livro “Devo Tudo ao Cinema”, roteirista, já dirigiu uma peça, curtas e está na pré-produção de seu primeiro longa. Crítico de cinema, tendo escrito para alguns veículos, como o extinto “cinema.com”, “Omelete” e, atualmente, “criticos.com.br” e no portal do jornalista Sidney Rezende. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro, sendo, consequentemente, parte da Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica.

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Capulana, um lindo poema da escritora moçambicana Énia Lipanga

Capulana, um lindo poema da escritora moçambicana Énia Lipanga

Capulana

A semelhança dos teus traços de mamana
Que coberta de uma humilde capulana
Menina de cores d`Africa
Onde os paços que perfumam becos
Esbanjam beleza
Mucume disfarçado em natureza

Capulana,
Enrolando a moldura de curvas moçambicanas
Cobrindo as fofocas das mamanas
Que semeiam simpatia da nossa terra

Valorizando a postura
E criando sedução aos olhos da cintura
Capulanizando gostos
És de forma delicada enrolada em cérebros
Que moldam rostos

Viva, pois esta vivacontioutra.com - Capulana, um lindo poema da escritora moçambicana Énia Lipanga
De cor aos amantes
Mais vida, aos amores
Deixa e tape as colantes
E seduza nossos senhores

Assim como a cultura quando cose
Africanize as europeias de Moz
De como espelho as cocuanas
Que são fieis a marrabenta
E ignoram, o semba
Que valorizam suas tradições e
criam de volta da fogueira suas canções

Por baixo do que cobras
Há fogo,
Fogo que arde
Mulheres lindas, moçambicanas obras de arte
Que acolhem vida, vinda de qualquer parte

Capulana, capulana,
Siga todas a fulanas que te ti se abstêm
Capulana, capulana
Ame todas as fulanas
Que de ti são reféns

Énia Stela Lipanga

Foto de capa da matéria © Werner Puntigam

 

Ensaios sobre a calma

Ensaios sobre a calma

Por Tatiana Nicz

Eu não fui uma criança tranquila, da minha infância tenho algumas recordações bem marcantes de como eu era curiosa. Lembro-me bem de como enchia meu pai de perguntas e como ele se incomodava. Para mim não bastava saber “Por quê?” eu também queria saber “Como?”.

Meu pai às vezes perdia a paciência, minha irmã se irritava “pare de ser tão curiosa!”, um conselho praticamente impossível de se seguir, ainda mais quando se é criança. Eu queria saber e entender de tudo! Com o tempo aprendi a buscar as respostas sozinha. Nessa ânsia para encontrá-las, desmontava e remontava brinquedos, virava horas montando quebra-cabeças, devorava livros e, com os olhos grandes e redondos que herdei de minha mãe, observava tudo com muita atenção.

Minha curiosidade cresceu junto com uma grande inquietação, o que sempre me movia a buscar mais e mais. Eu não acho que ser curiosa é algo ruim, pelo contrário, mas minha curiosidade rapidamente aliou-se à muita ansiedade. No intuito de saciar toda aquela energia, meus pais me matriculavam em tudo e me mantinham sempre ocupada. Eu nadava e competia desde cedo, fazia jazz, sapateado e inglês. Acho que tudo isso contribuiu para transformar minha curiosidade e energia em ansiedade e pressa.

Eu sempre tive pressa. Ironicamente, meu relacionamento com meu pai no seu último ano de vida foi conturbado, ele se incomodava com a minha personalidade enérgica, falante e rápida. Eu lembro que entrava na casa dele falando e gesticulando sem parar e ele me pedia calma. Da mesma maneira com que ele sempre (em vão) me pedia para comer mais devagar. Eu comia da mesma maneira com que devorava os livros, com a esperança de que a comida me fosse saciar a fome que sentia. Mas essa fome nunca foi fisiológica, ela vinha de dentro, era uma fome de alma.

Foi desassossegadamente que caminhei pela vida durante anos e de certa maneira sou grata à isso, pois a pressa me fez continuar sempre, me trouxe muito conhecimento, me fez alcançar objetivos diversos e buscar sempre o novo: uma nova maneira de olhar o mundo, de me relacionar, de encarar a vida. Mas com essa pressa toda era impossível parar para absorver e digerir tudo que eu vivia.

A doença do meu pai me trouxe profundas reflexões sobre a calma. Tinha dias que eu o observava, sentado, lendo, emagrecido, sem sair de casa e com um semblante tranquilo, parecia que era com a mesma calma que a vida lhe escorria pelos dedos. Eu tentava entender como era viver nesse tempo dele, que estava tão descompassado do meu. Quando eu perguntava para ele sobre o tempo, ele me dizia sobre a importância de ser paciente e de como as horas passavam de maneira diferente para os atarefados e para quem tinha tempo de sobra. E o que eu queria mesmo era parar o tempo.

E de tudo que ele dizia, ele me pedia calma. Muitas das nossas discussões eram em torno disso. “Calma, minha filha, você é muito rápida, calma, coma devagar”. O que ele não entendia é que eu não tinha calma porque a doença dele me deixava com muita pressa. Era difícil de vencer os dias pensando em tudo que eu tinha para dizer e queria dizer para ele e pensando se seria suficiente, será que não surgiriam novos assuntos? Com pressa, eu tentava falar mais rápido para caber tudo naquele curto espaço de tempo que nos restava e antecipar todos os assuntos e dúvidas que viessem um dia a surgir. Tinha tanta coisa que eu queria falar e ouvir. Tantas perguntas que sei que ficariam sem respostas. Então, com pressa, eu tentava prever todos os assuntos do futuro e queria acelerar o passo para que pudesse viver mais coisas e compartilhar com ele o máximo possível da minha vida. Não tem como ter calma quando seus dias com a pessoa mais importante da sua vida estão contados.

Em dezembro do ano passado senti que essa pressa toda me pesava na alma, me dei conta de que vinha carregando em minha bagagem muito peso extra e então resolvi olhar com calma para esse sentimento de cansaço que se apresentava. Da mesma raiz da fome que eu sentia, senti um cansaço de alma. Assim, antes de terminar o ano, sentei-me à beira do mar e sob a luz do sol poente fiz uma lista com os assuntos de ordem prática que estavam me pesando e me deixando mais apressada e como faria para resolvê-los. Finalmente era hora de aprender sobre a calma.

E os meses seguintes me trouxeram esse aprendizado. Meu pai ficou quase 2 meses internado e todos os dias eu ia para o hospital e me sentava ao seu lado, lá passava horas calada e imóvel. Era inútil falar sobre qualquer assunto, era inútil ter pressa. Pois nada, nenhum assunto tem importância diante da morte. Então é preciso parar, é preciso ter calma.

O tempo no hospital, como meu pai mesmo havia me dito, passava diferente de como eu estava acostumada. O tempo da despedida é um tempo descompassado, onde o futuro se desvanece, onde o passado fica borrado em meio às lágrimas e onde cada batida traz a dura certeza de que somos pequenos e insignificantes diante da infinitude do Universo e da finitude da vida; a certeza de que nem toda a curiosidade do mundo, nem toda a pressa, nem todos os brinquedos que desmontei, nem os quebra-cabeças que montei ou os livros que li, nem os lugares por onde andei, nada disso me serviu quando tive que sentar ao lado de meu pai, segurar-lhe a mão já fria e pacientemente contemplar a vida que, agora com pressa, lhe esvaia junto às batidas rápidas dos ponteiros do relógio, mas meu coração estava tranquilo.

Durante o tempo que meu pai esteve internado, aprendi que a pressa não me servia, a vida é para ser pacientemente degustada. Aprendi também que muitas perguntas ficam mesmo sem respostas, não dá para questionar a morte. A morte não responde à nenhum “Por quê?” ou “Como?”.

Na despedida final, permaneci calma ao seu lado, nossos corações finalmente pareciam ter acertado o compasso era como se o tempo tivesse parado e lá no fundo eu ainda podia ouvir a voz de meu pai que me pedia: “- tenha calma, minha filha!”

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Cego mesmo é quem só confia no que vê

Cego mesmo é quem só confia no que vê

Por André Luís Neto da Silva Menezes

É um absurdo existirem pessoas que negam o invisível só porque seus olhos não enxergam.

A própria configuração de expansão que o universo assumiu apresenta vestígios da intervenção gravitacional da matéria escura.

É possível acreditar na existência de coisas invisíveis? Certamente, como é o fato astronômico da matéria escura. Essa substância estranha, que permeia 95% do universo é constituída de partículas nunca detectadas em laboratório, com massa superior à de átomos do universo observável.

O universo se resume ao que podemos ver? Definitivamente não. Canais de frequência ultravioleta, infravermelho, ondas de rádio, raios X radiação cósmica de fundo, magnetismo e diversas outras configurações energéticas já provam conclusivamente que o que os olhos podem ver não representa nem 0,0000001% do que existe e os melhores equipamentos e técnicas de captação de vibrações energéticas em frequências não visíveis aos olhos humanos estão ampliando nossa visão de uma realidade que os olhos humanos não podem ver, mas que é real e é incontestável: não pode ser negada nem discutida.

Desde os anos 30, o astrônomo suíço, Fritz Zwicky (1898-1974), provou que o universo não se resume ao que vemos, comparando as velocidades observadas de galáxias individuais do aglomerado de Coma com as velocidades calculadas a partir da massa total do aglomerado. Esses dados foram conseguidos pela relação entre massa e luminosidade, comparando os resultados obtidos com outros resultados de outras populações estelares já documentadas na época.

O resultado foi contundente: para explicar as velocidades significativas das galáxias do aglomerado essa estrutura deveria ser muito massiva, maior que sugeria sua luminosidade. Uma parte do aglomerado não brilhava mais e, portanto, segundo Zwicky, deveria ser formada por “Dunkel Materie” (matéria sombria).

Essa “matéria sombria” era composta de que? Inicialmente duas hipóteses permearam o ambiente científico dos anos 30: trata-se de uma nova forma de matéria, que nomeamos “matéria escura”, pela sua óbvia invisibilidade, ou matéria convencional emitindo luz muito fraca. De fato existe muita matéria no espaço que simplesmente não faz parte de uma estrela e por isso não brilha, é o caso da poeira estelar, não visível por não brilhar, mas detectável pelos efeitos gravitacionais que produz nos corpos celestes ao seu redor.

Mas essa matéria convencional, como o gás ionizado e a poeira cósmica, por exemplo, sem luz própria sempre é atingida por fótons das estrelas ao seu redor, absorvendo e refletindo o eletromagnetismo que recebem e assim podem ser captadas pelos aparelhos de leitura de frequência de onda de raios-x ou infravermelho.

As estrelas e a matéria detectável pelos instrumentos conhecidos são apenas uma pequena parte de toda a matéria contida no universo.

A física nuclear nos fornece mecanismos para que possamos pesar o universo.

A nucleossíntese primordial iniciada no primeiro segundo depois do Big Bang, gerou tanto calor que os prótons e nêutrons recém-formados não conseguiam se combinar para formar núcleos atômicos. Esse processo só começou no fim desse primeiro segundo, quando a temperatura caiu a menos de 1 bilhão de graus.

Nessa época o universo já era extremamente rarefeito: a densidade média da matéria não chegava a alguns gramas por metro cúbico, ou seja muito menos denso do que o ar atmosférico. O período em que o Universo não era nem muito quente, nem muito frio para permitir que prótons e nêutrons se combinassem formando hélio foi relativamente curto (alguns minutos apenas). Além disso, para a combinação ocorrer, é preciso que prótons e nêutrons se encontrem, o que é muito mais provável quando o número de partículas por unidade de volume é mais elevado. Portanto, se conhecermos observacionalmente a quantidade de hélio produzida durante o Big Bang é possível inferir a densidade de matéria à época. E a partir daí deduzir informações sobre a densidade atual, desde que o fator de rarefação devido à expansão cósmica seja conhecido.

Observações de galáxias distantes, como estrelas que mal tiveram tempo de produzir grandes quantidades de hélio, indicam que aproximadamente 24% da matéria convencional é formada por hélio, o que indica, segundo as leis da física nuclear, que a densidade média da matéria atualmente é de aproximadamente 0,2 prótons /m³. Isso representa mais do que podemos obter por observação direta ,mas está longe do suficiente para explicar as velocidades das estrelas em galáxias, e de galáxias em aglomerados galáticos.

Podemos determinar a composição do universo em termos de matéria convencional de forma talvez ainda mais indireta, estudando a primeira luz emitida – a radiação cósmica de fundo. Essa radiação foi emitida quando o universo tinha cerca de 370 mil anos e representa praticamente uma fotografia dos confins do cosmos observável àquela época.

Como a gravidade é uma força que atrai para regiões densas, a matéria começou a se distribuir de forma cada vez mais irregular no universo. Por isso, o universo jovem era muito homogêneo, o que se traduz na radiação cósmica de fundo por uma grande uniformidade de temperatura na direção de observação.

Podemos então determinar facilmente qual seria o grau de heterogeneidade do universo para que ele fosse composto unicamente de matéria convencional e, em seguida, comparar esse resultado com o mapa da radiação cósmica de fundo.

A diferença aparece no tamanho e é nítida. Se o universo jovem fosse formado apenas por matéria convencional, deveria ser 100 vezes mais heterogêneo que o observado e assim seria impossível ter acomodado a matéria escura.

As leis da gravitação são universais, o que significa que a matéria convencional e a matéria escura sofrem os mesmos efeitos do campo gravitacional. Mas elas não se distribuem da mesma maneira no universo, pois a matéria convencional interage com a luz: um átomo que absorve um fóton emite um elétron; um íon que captura um elétron emite um ou vários fótons. Esses processos fazem a matéria convencional perder energia por radiação. Já com a matéria escura ocorre exatamente o contrário. Como ela não reage com outras partículas conhecidas, não emite quantidades significativas de luz. Como consequência, a matéria convencional capturada no interior de uma concentração de matéria escura dirige-se para o centro dessa formação, dissipando energia como um satélite que perde velocidade devido ao atrito com as camadas mais altas da atmosfera.

O telescópio do projeto SDSS (o mais ambicioso levantamento astronômico da história, que pretende mapear 25% do universo observável), situado no Apache Point Observatory, no Novo México, Estados Unidos, com uma poderosíssima lente de 2,5 metros de diâmetro, determinou a posição e distância de quase 1 milhão de galáxias. Sua distribuição espacial mostra a mesma alternância característica de filamentos e regiões vazias, explicadas com a suposição da presença da matéria escura com abundância igual à que deduzimos mediante a leitura dos dados obtidos pela sonda Planck.

Todas as evidências apontam para uma matéria que interage com o campo gravitacional, pode se aglomerar e interferir na expansão das galáxias e aglomerados, mas não interage diretamente com as partículas conhecidas pela física nuclear, dando respaldo ao que os cientistas físicos da mecânica quântica chamam de anti-matéria.

Definitivamente quem crê só no que vê precisa aprender muito sobre a realidade.

(André Luís Neto da Silva Menezes, pseudônimo: Tiranossaurus Rex – publicitário, inventor, filósofo, músico, integrante da Royal Society Group e vice-presidente da Associação Canedense de Imprensa – [email protected])

Fonte: Diário da Manhã

E por que não felizes para sempre?

E por que não felizes para sempre?

Por Adriane Sabroza

Tudo bem que a vida não é um conto de fadas, que nós não somos princesas e que os príncipes, na maioria das vezes, acabam se transformando em sapos.

Tá bom, eu também acho que para sempre é muito tempo, mas que mal tem os relacionamentos acabarem bem ou, melhor dizendo, não acabarem nunca, assim como nos contos de fadas?

Por que o para sempre hoje em dia tem uma conotação negativa e acaba sendo sinônimo de tédio, falta de opção, medo da mudança ou acomodação?

Por que não acreditamos na magia do renascimento, na possibilidade de descobrir o novo em meio ao que é tão familiar e não nos arriscamos a acreditar que é possível, sim, reencontrar na pessoa que está ao nosso lado há tempos alguns dos motivos que nos fizeram, simplesmente, querer ficar?

Ainda que os sonhos não sejam os do passado ou que alguns projetos tenham fracassado, é possível olhar para o lado e reconhecer alguém por quem, um dia, tudo valeu a pena.

Claro que nem tudo vai durar para sempre e todos temos o direito, pensando melhor, o dever de procurarmos a felicidade onde quer que ela esteja. Mas penso que no mundo atual, em plena onda do fast food (a comparação aqui é proposital) tudo se tornou rápido demais, curto e passageiro.

A descontinuidade recorrente das relações não me parece uma falta de compromisso com o outro ou apenas um querer aproveitar as oportunidades. É mais uma falta de compromisso consigo mesmo, o não conseguir apostar todas as fichas pra valer, o não se dar a chance de se conhecer e se reconhecer num mesmo relacionamento durante as diversas fases que ele apresenta.

Não é ficar muito tempo com o outro que a gente não aguenta. O que não suportamos é conviver com aquilo que nos tornamos com o passar do tempo, sem a maquiagem da paixão e o disfarce da novidade. É ter que se esforçar para manter o interesse onde a rotina impera e fazer valer o que se tem de bom, lado a lado com o que não é lá tão bom assim, e que, por culpa da convivência, não há mais como esconder.

O que estou querendo dizer é que, pra aqueles que se dispõe a se aventurar ao felizes para sempre, também não há garantias e há muito trabalho a ser feito, mas que para que o final seja mesmo feliz, é fundamental se olhar de verdade e buscar o melhor possível. Não para agradar ao outro, como muitos pensam, equivocadamente, mas para si mesmo. Para que possamos viver o lado bom do “felizes para sempre”, através do reconhecimento de que estamos juntos, apesar de tudo; de que o tempo passou, mas continuamos aqui, com a nítida percepção de que valeu a pena. E de que pode, sim, ser para sempre.

Sempre, mas de um jeito novo, que se refaz e se transforma com o passar do tempo. Sempre, mas fazendo todos os necessários pit stops para reabastecer o amor e calibrar o relacionamento. Sempre, mas sabendo que príncipes e sapos são dois lados da mesma moeda e que, cá pra nós, as princesas também são meio bruxas. Sempre, lembrando que vai haver momentos em tudo o que você vai querer é estar só, mas que isso não é, de modo algum, incompatível com o estar junto. Aliás, um só é possível quando há a possibilidade do outro. Sempre, do jeito que você sonhou ou como foi possível, mas sim ( por que não?), para sempre. Afinal, como já disse alguém por aí, para sempre não é todo dia.

Adriane Sabroza

contioutra.com - E por que não felizes para sempre?Psicoterapeuta por paixão e opção, mãe de três meninas lindas, minha maior realização e, nas horas vagas, aprendiz de escritora, sem nenhuma pretensão.

Do insulto e do elogio, por Jorge Forbes

Do insulto e do elogio, por Jorge Forbes

Pobres daqueles que acreditam em insultos e desconfiam de elogios…

Existe, eu diria, um fascínio, uma sedução, uma hipnose no insulto. As pessoas ficam hipnotizadas ao serem insultadas. Ao contrário do elogio, que é sempre questionável, o insulto não deixa dúvida sobre seu alvo. Há uma tendência a dar peso de verdade ao insulto e a desconfiar do elogio.

Fomos ensinados a não tomar para nós os elogios, a justificá-los como conseqüência dos atos de outras pessoas, que nos ajudaram, ou à sorte, ao acaso. A boa educação manda dizer: “Não é bem assim”, “Não é tanto”, “É porque sou seu filho”, “Caiu nas minhas mãos”. Se por um lado desconfia-se do elogio, por outro ninguém põe o insulto sob suspeita. Ele é certeiro.

Por estar prestando uma “homenagem”, aquele que elogia se põe a serviço do elogiado: ele se faz “homem a serviço de”. Quem elogia frequentemente é criticado pelo que disse. Corre um risco porque, ao elogiar, fala mais de si que do outro: “Não seja bajulador” “Bonita, ela? Ora, você está cego!”, “Mas como você foi falar uma coisa dessas?!” , Você vai votar nesse cara?”.

Já quem insulta não fala de si. Em geral, o insultante é visto como tendo razão, ele é honesto, é verdadeiro. Por quê? Porque quem insulta toca o ser do outro. O prazer de receber um nome pode ser maior que o desprazer provocado pelo qualificativo desse nome. Quando alguém diz “filho da mãe”, o insultado pode não sentir o destrato o suficiente e dizer que ser filho da mãe não é tão grave. Mas se o outro insiste e completa a frase usando a expressão “de uma prostituta”, ele pode reagir e dizer que o insultante exagerou. Da mesma maneira que entre a vítima e seu carrasco, há certa cumplicidade entre o insultado e o insultante. A cumplicidade deriva do fato de o insultado ter recebido um nome. É melhor ser “filho da mãe” do que não ser nada, base do dito “Falem mal, mas falem de mim”.

O fragmento acima é excerto do TEXTO COMPLETO localizado no site do autor.

Jaulito, animação de 2 minutos traz profunda reflexão sobre a liberdade

Jaulito, animação de 2 minutos traz profunda reflexão sobre a liberdade

Sinopse

Jaulito é uma animação espanhola lançada em 2008. Foi selecionada entre as finalistas do concurso de melhor curta-metragem de animação da Espanha no Artfutura de 2009. É dirigido por Javier de la Torre. Jaulito nasceu trancado em uma gaiola. Um dia ele consegue escapar com ajuda de um corvo, mas jamais imaginou que a gaiola que tirava sua liberdade, era a mesma que lhe ajudava a viver.

Pensando sobre…

Aqueles que nos aprisionam o corpo são algozes menores. Carrascos de verdade não nos cortam as asas, não nos quebram as pernas, não nos cercam com grandes concretas ou com alambrados invisíveis. O verdadeiro algoz nos aprisiona alma. Faz com que o coração, embora se saiba alado, se sinta preso a emoções fixas e estanques, a medos dantescos do mundo no qual hermeticamente nos fechamos. Assim, de que vale ter asas e ver aberta a gaiola se o coração não quer a si próprio libertar? (Nara Rúbia Ribeiro)

Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.
Clarice Lispector

O jardineiro e a Fräulein, história de amor verídica narrada por Rubem Alves

O jardineiro e a Fräulein, história de amor verídica narrada por Rubem Alves

Menino, ele de longe olhava os pescadores nos seus barcos levados pelo vento. Pensava que o mar não tem fim. Pensava que os pescadores eram felizes porque não precisavam plantar peixes para colher depois. O mar era generoso: ele mesmo plantava os peixes que os pescadores só faziam colher com as suas redes. Tinha inveja dos pescadores. Ele era filho de agricultores. Tinha de plantar para colher. Diferente do mar, a terra tinha fim. Todos os pedaços de terra, os menores, os mais insignificantes, todos já estavam sendo cultivados. Os pescadores, se quisessem mais, bastava-lhes navegar mar a dentro. Mas os agricultores não podiam querer mais. A terra chegara ao fim. Quem quisesse mais terra para cultivar teria que sair da terra conhecida e ir em busca de outras terras, além do mar sem fim.

E foi porque a terra chegou ao fim que ele, adolescente, seus irmãos e seus pais, entraram num navio que os levaria a uma nova terra, Buragiro… Era assim que eles, japoneses, conseguiam falar o nome Brasil…

No Brasil, Hiroshi Okumura – esse era o seu nome – conseguiu trabalho na casa de uma família de alemães. Família rica, casa de muitos criados e criadas. Ele não falava português nem alemão. Mas não importava. Seu trabalho era cuidar da horta e do jardim. E a língua da terra e das plantas ele conhecia muito bem. E foi assim que, na sua fiel e silenciosa competência de jardineiro e hortelão, ele passou a ser amado pelos seus patrões.

Mas os jardineiros têm também sonhos de amor. Jardins sem amor são belos e tristes. Mas quando o amor floresce o jardim fica perfumado e alegre. Pois esse era o segredo que morava na alma do jardineiro japonês: ele amava uma mulher, uma alemãzinha, serviçal também, todos a tratavam por “Fräulein”. Cabelos cor de cobre como ele nunca vira no seu país, pele branca salpicada de pintas, olhos azuis, e um discreto sorriso na sua boca carnuda que se transformava em risada, quando longe dos patrões. Era ela que lhe trazia o prato de comida, sempre com aquele sorriso…

E ele sonhava. Sonhava que suas mãos acariciavam seus cabelos. Sonhava que seus braços a abraçavam e os braços dela o abraçavam. Sonhava que sua boca e sua língua bebiam amor naquela boca carnuda… E a sua imaginação fazia aquilo que faz a imaginação dos apaixonados: se imaginava num ritual de amor, delicado como a cerimônia do chá, tirando a roupa da Fräulein e beijando a sua pele…

Mas era apenas um sonho. Olhava para seu corpo atarracado, para sua roupa rude de jardineiro, para suas mãos sujas de terra, para seus dedos ásperos como pedras. A Fräulein pertencia a um outro mundo distante do seu mundo de jardineiro.

Seu amor nunca saiu da fantasia. Ninguém nunca soube.

Os anos passaram. Ele ficou velho. A Fräulein também envelheceu. Mas o amor não diminui. Para ele, era como se os anos não tivessem passado. Ela continuava a ser a meninota sardenta. O amor não satisfeito ignora a passagem do tempo. É eterno.

Chegou, finalmente, o momento inevitável: velho, ele não mais conseguia dar conta do seu trabalho. Seus patrões, que o amavam profundamente, pensaram que o melhor, talvez, fosse que ele passasse seus últimos anos num lar para japoneses idosos, uma grande área de dez alqueires, bem cultivada, com pássaros, flores e um lago com carpas e tilápias. Ele concordou. Visitou o lar mas, por razões desconhecidas, não quis viver lá. Achou preferível viver com parentes, numa cidade do interior. Mas o fato é que os velhos são sempre uma perturbação na vida dos mais novos. São, na melhor das hipóteses, tolerados. E a sua velhice se encheu de tristeza.

Um dia, movido pela saudade, resolveu visitar a casa onde passara toda a sua vida e onde vivia a Fräulein. Contaram-lhe que ela fora internada num lar para idosos alemães. Estava muito doente. Quis visitá-la. Encontrou-a numa cama, muito fraca, incapaz de andar.

E então ele fez uma coisa louca que somente um apaixonado pode fazer: resolveu ficar com ela. Recusou-se a sair. Passou a dormir ao seu lado, no chão. Cuidava dela como se cuida de uma criança. O extraordinário é que a enfermeira-chefe compreendeu e fez como se nada estivesse vendo… Desrespeitou o regulamento.

A Fräulein estava muito fraca. Não conseguia mastigar os alimentos. Não conseguia comer. Aconteceu, então, um ato assombroso de amor que os que não estão apaixonados jamais compreenderão: o jardineiro passou a mastigar a comida que então colocava na boca da agora “sua” Fräulein.

Nunca ninguém viu, nunca ninguém me contou. Imaginei. Imaginei que quando estavam sozinhos, sem ninguém que os visse, o jardineiro encostava seus lábios nos lábios da Fräulein, e assim lhe dava de comer… Assim o fazem os namorados apaixonados, lábios colados, brincando de passar a uva de uma boca para a outra…

E assim, ao final da vida, o jardineiro beijou sua Fräulein como nunca imaginara beijar…

Rubem Alves
Conheçam o Instituto Rubem Alves e participem de seus projetos.

Casal de dançarinos encanta ao apresentar-se em uma plataforma de metrô

Casal de dançarinos encanta ao apresentar-se em uma plataforma de metrô

Os bailarinos americanos Phillip Chbeeb e Renee Kester deram um espetáculo de beleza e sensibilidade ao realizar uma apresentação tendo como cenário uma plataforma de metrô.

Para Phillip “Todos dizem que é difícil superar a dor… e é mesmo. Desde que somos crianças, ouvimos que devemos nos agarrar ao melhor de nossas experiências e descartar as piores. Mas o que acontece quando nossas mais lindas memórias do passado prejudicam nosso futuro?”, conta o dançarino na descrição de seu vídeo no youtube.

Concept/Choreography:
Phillip Chbeeb
Renee Kester

Editing: Phillip Chbeeb
Música: “Slip” de Elliot Moss

Desejo de palco

Desejo de palco

A atriz Lorenna Mesquita estreia hoje, em São Paulo, o solo teatral Florbela Espanca – a hora que passa. O espetáculo é resultado de três anos de pesquisa da atriz sobre a vida e obra dessa grande poeta portuguesa, conhecida pela intensidade com que escrevia e por apresentar ideias muito avançadas para a década de 20 e ainda bastante atuais, sobretudo em relação ao comportamento feminino. Inclusive, pela postura que adotava em sua vida, Florbela é considerada uma das primeiras feministas. Mas a poeta não levantava nenhuma bandeira social ou política. Apenas queria ser respeitada e ter os mesmos direitos que os homens possuíam na época em que viveu.

Há mais de um ano em cartaz, a montagem já foi vista duas vezes em Portugal, em temporadas de 40 e de 30 dias por 19 cidades; além dos Estados Unidos e Cabo Verde. No Brasil, o espetáculo esteve em três temporadas em São Paulo e também viajou para Belém do Pará, terra natal da atriz onde há uma grande colônia portuguesa.

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Lorenna Mesquita como Florbela – Foto Aline Serra

Desta vez, a reestreia do espetáculo terá um sabor especial. Lorenna Mesquita está grávida de oito meses e vai ficar em temporada até o fim de julho, quando entra no nono mês de gestação. Na sua gravidez, seu desejo é pelo palco.

“Apresentar Florbela grávida é muito mágico. Já passei por três etapas da gravidez e cada uma delas foi diferente. Quando apresentei o espetáculo nos Estados Unidos, no início de janeiro, eu desconfiava da gravidez, mas ainda não tinha certeza. Lembro de ter passado a mão na barriga durante uma cena. De volta ao Brasil reestreei Florbela em São Paulo e já sabia que estava grávida. Mas a barriga ainda não aparecia e o público nem desconfiou. Foi uma temporada difícil, pois no início da gestação sentia dores (por conta da expansão do útero) e algumas movimentações precisaram ser adaptadas. E agora, com essa barriga enorme, também tivemos que modificar algumas marcações que eram feitas no chão.”, comenta.

Para o público também será inusitado ver uma Florbela grávida. “Em Cabo Verde, o escritor português Rui Zink disse que iria ver pela primeira vez um monólogo com duas pessoas no palco. Até então, eu não tinha me dado conta que de fato o público iria ver um espetáculo diferente. É impossível ignorar que esta mulher está grávida. E tudo o que ela diz durante o espetáculo e com toda a força que possui, acaba sendo um contrasta com essa barriga aparente. O teatro é sempre único. Cada sessão é diferente da outra. E desta vez, é mais diferente ainda.”, reforça a atriz.  

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Lorenna Mesquita como Florbela – Foto Aline Serra

Com direção de Fabio Brandi Torres, o solo teatral apresenta Florbela Espanca como uma mulher angustiada e ao mesmo tempo forte, exigindo da atriz uma carga emocional muito grande. Lorenna Mesquita conta que numa das primeiras sessões em São Paulo, chegou a sair do teatro com dores no peito que só passaram após alguns dias. “Mexemos com sentimentos muito fortes. Além da angústia, tem a tristeza da Florbela por ter sido tão incompreendida e se sentir abandonada e esquecida por sua família e rodas sociais”, conta. A montagem também apresenta uma Florbela apaixonada, querendo amar a tudo e a todos; uma Florbela irônica, debochando da vida, altiva. “Procuramos mostrar as várias faces dessa mulher, que é contraditória em suas ações e suas palavras de acordo com cada momento da vida. Ela, como cada um de nós, muda de pensamento segundo suas nossas experiências. E é justamente essa a grande riqueza do espetáculo: mostrar a pessoa por detrás daqueles versos”, comenta a atriz.

É por isso que mesmo quem não conhece a poeta portuguesa e assiste o espetáculo também se emociona. A peça não é um recital de poesia, são as ideias de Florbela Espanca apresentadas num fluxo de pensamento, durante a hora que antecede a sua morte. Ela fala de destino, amores, dores, sonhos, desilusões, paixões. É um espetáculo para quem quer ouvir sobre vida e se emocionar.

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Florbela Espanca – A Hora que Passa – Fotografia Vagner Click

Florbela Espanca – a hora que passa

Temporada: 2 a 30/7

Sempre às quintas-feiras

Hora: 21h

Local: TOP Teatro – Rua Rui Barbosa, 201. Bela Vista – São Paulo

Ingressos: 30 reais

50% de desconto para os seguidores das páginas CONTI outra, artes e afin e Mia Couto

Abaixo, a CONTI outra, artes e afins traz uma entrevista exclusiva com a atriz, feita por Nara Rúbia Ribeiro.

Lorenna, você consegue se lembrar da primeira vez em que teve contato com a poesia de Florbela? Como foi? Quando surgiu o interesse na séria pesquisa sobre Florbela e sua obra?

Quando descobri as poesias da Florbela Espanca, eu me apaixonei perdidamente. Eu queria saber quem era aquela mulher que escrevia com tanta intensidade, às vezes por meio de metáforas que transmitiam cores, cheiros, imagens capazes de nos fazer sentir exatamente o que ela estava sentindo; outras vezes de forma crua e dura. Na época, eu estava procurando um monólogo, mas não encontrava nenhum texto que me tocasse de verdade. Eu queria alguma coisa profunda, que pudesse emocionar o público. E quando me deparei com os poemas de Florbela, eu senti que realmente havia encontrado o que eu tanto procurava. E pressentia que esse trabalho iria mudar a minha vida.

O monólogo “Florbela Espanca – A hora que passa” é muito festejado pela crítica e aplaudido por aqueles que tiveram o privilégio de assistir. Diga-nos como foi escrito o monólogo. Você mesmo o escreveu? Ele virou livro?

Eu comecei a pesquisa da obra de Florbela Espanca em 2011 e dois anos depois eu tinha em mãos um texto dramatúrgico de 3 horas de espetáculo. Eu sentia que ainda não seria o texto final, que faltava lapidá-lo. E decidi viajar a Portugal para conhecer as principais cidades em que ela viveu: Vila Viçosa (nascimento), Évora (juventude) e Matosinhos (morte). Eu tinha que respirar os mesmos ares, olhar para as ruas onde ela havia andado, ver as casas em que ela morou, mesmo que não conservadas. Em Matosinhos, consegui entrar na casa em que ela viveu com o terceiro marido. Visitei todos os cômodos, inclusive, o quarto onde ela teria cometido o suicídio. Todas essa imagens foram muito enriquecedoras para a minha pesquisa e para o meu trabalho como atriz. De volta ao Brasil, conheci o diretor e dramaturgo Fabio Brandi Torres e o convidei para o projeto. E juntos fizemos experimentações em sala de ensaio e construímos uma nova dramaturgia, a que o público conhece hoje e que também virou livro. Inclusive, o livro traz fotos do Vagner Click, com a primeira experimentação pública da peça.

Diga-nos sobre a sua experiência internacional com esse espetáculo. Como tem sido levar a emoção de Florbela a outros países? Como foi participar das festividades de aniversário de Florbela em sua terra natal?

A receptividade do público nos outros países tem sido um grande presente. Sempre vemos pessoas muito comovidas na platéia, com os olhos marejados. Isso ocorre porque no espetáculo falamos sobre vida e esse é um assunto universal. Em Portugal, ainda foi mais especial, porque ouvimos dos portugueses que mostramos a eles uma Florbela que eles não conheciam, que “precisou vir uma brasileirinha apresentar Florbela pra gente”. Saber disso foi tão gratificante. E voltar com esse espetáculo nos 120 anos de nascimento da poeta, foi ainda mais especial. No dia do aniversário dela, em 8 de dezembro, em Vila Viçosa, fui convidada para declamar em praça pública, na frente do seu busto, o poema “Amar!”. Nessa hora passou um filme na minha cabeça. Eu havia estado naquele mesmo local, em 2013, para pesquisar sobre sua vida e pouco mais de um ano depois, eu estava declamando um poema de Florbela para a comunidade no dia do aniversário dela. Não agüentei a emoção e recitei o poema chorando.    

E, para finalizar, Lorenna Mesquita tem muito de Florbela? Se você pudesse definir essa sua experiência com a poesia de Florbela em uma só palavra, que palavra seria?

O que eu tenho de Florbela é a intensidade. Quando eu me entrego a alguma coisa ou a alguém, é com minha alma que eu faço isso. É por isso que viver Florbela Espanca em cena é sempre muito forte. Eu não consigo fingir. Tudo o que eu faço ou falo, como Florbela, é de verdade. E também tem uma mistura de sentimentos. Florbela mudou a minha vida. Transformou minha carreira como atriz e me deu a família que eu tenho hoje. Esse filho que tenho na barriga é fruto desse projeto, da minha união com o Fabio Brandi Torres, resultado de um grande encontro que vida e Florbela me deram de presente. Se for para resumir em uma só palavra essa experiência, a palavra é GRATIDÃO.

Sobre Marietas, Jôs & Rouanet

Sobre Marietas, Jôs & Rouanet

“Somente quem mama na teta do governo pode falar bem como ela. Os brasileiros que se dane. Até um teatro ela construiu no Rio. Espero que como eu ninguém mais vá prestigiar esta mulher que não ama o pais”

“Vaca igual ao safado do ex marido!”

“Vendida!”

 “Só podia, agora é moda só fala e elogia se receber, que pais é esse?”

“Eu tinha um apreço por esta senhora mas perdeu toda credibilidade com o Brasil ela e o gordo sem caráter”

Muita gente já viu aquele vídeo em que o Chico Buarque morre de rir, contando como foi quando ele descobriu que a internet é um poço de ódio. Só espero que a Marieta Severo tenha a mesma reação que ele, já que tudo o que tá escrito aí em cima foi dirigido a ela, em uma página do Facebook. Da última vez que dei uma olhada lá, tinha mais umas centenas de comentários desse mesmo teor, que publicou esse post aí embaixo.

contioutra.com - Sobre Marietas, Jôs & Rouanet

         Não existe nada que faça perder mais a fé na espécie humana do que ler os comentários de um sites de notícias. Opiniões raivosas baseadas em falsas premissas sempre existiram, claro, não foram inventadas pela internet. Dizem que eram os comentários de mesa de bar, que antes só podiam atingir três ou quatro pessoas, e agora são expostos para milhões. Outra coisa que também não é invenção da web é usar mentiras e desinformação para dirigir o ódio de um grupo. Mas o que é a grande contribuição desse meio, é o poder e a intensidade com que ele atinge um número enorme de pessoas.

         E tudo é possível. Alguém resolveu criar um post, dizendo que a combinação de camarão e vitamina C causa envenenamento por arsênico. Se você parar dois segundos pra pensar – ou se quiser economizar neurônios e só se lembrar de alguma vez em que tenha espremido um limãozinho em cima do camarão em alguma praia – vai perceber que a notícia é absurda. Mas milhares de pessoas compartilharam essa notícia. Vez por outra, ela volta a aparecer na timeline, assim como notícias de sites de humor, postadas como se fossem verdadeiras.

         Esses comentários que eu separei aí em cima foram postados no Facebook, em resposta a uma suposta denúncia. Uma acusação, na verdade. Todo esse carinho foi motivado por uma postagem que acusa Marieta de ter defendido o PT pela simples razão de ter recebido dois milhões de reais do governo.

         No meio dos comentários, tem gente que tenta argumentar que Marieta não defendeu o PT, só fez uma afirmação que pode ser medida por qualquer pessoa que se disponha a fazer uma pesquisa séria. E que muito menos recebeu dois milhões de reais do governo, no máximo teve um projeto com esse valor aprovado na Lei Rouanet, se é que isso é verdade. (O site usou uma imagem ilegível, de definição bem baixa – como tudo o mais – nesse post.) Mas existe um prazer enorme em poder exercitar a maldade quando se acha que se está com a razão. Se alguém contestar o seu comportamento, sempre dá pra dizer que você fazia o que achava que era certo. E é com isso que contam esses sites que se especializam em espalhar boatos, destruir reputações e incitar o ódio: a sua participação bem-intencionada.

         Claro que ninguém é inocente. Em termos de internet, só acreditamos naquilo que já estamos predispostos a acreditar. Quem odeia um partido, vai acreditar em qualquer boato que sirva para desmoralizá-lo, por mais duvidoso que seja o boato. Na verdade, tanto faz se a pessoa acredita ou não, o importante é passar a desinformação pra frente. Tenho amigos virtuais que bradam contra a corrupção, mas sempre que podem, compartilham um boato, uma mentira, qualquer coisa que ajude a provar que estão certos em seu ódio.

         A Lei Rouanet tem sido usada sempre que se quer desqualificar alguém por um suposto apoio dado ao governo, como aconteceu nesse caso da Marieta e com Jô Soares. Pra funcionar, é preciso contar com a ignorância das pessoas sobre os mecanismos da Lei, mas eu tenho visto gente da área artística, gente que sabe como funciona a Rouanet, passando esse tipo de postagem pra frente. Não tá na hora de parar pra pensar se esse tipo de comportamento também não é uma forma de corrupção? Talvez esteja mesmo na hora de pensar. Pensar, por exemplo, se vale a pena destruir a reputação de uma pessoa pra se afirmar uma ideia. De um dia pro outro, Marieta Severo se tornou um ser desprezível, sem caráter, pra pessoas que antes a admiravam,. A gente tem que pensar no que significa esse poder todo. E pra ajudar a pensar, mais alguns comentários dirigidos pra Marieta, na forma como foram escritos:

         “Deve está recebendo dinheiro do roubo do governa deve fazer parte da quadrilha de safados ladrão”

         “Mais uma pro meu caderninho, vai se juntar com Toni ramos.zecuamargo, josoares ….”

         “Decrpcionante magouo os fãs.”

“O animal satisfeito dorme”, texto de Mário Sérgio Cortella

“O animal satisfeito dorme”, texto de Mário Sérgio Cortella

O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia: “o animal satisfeito dorme”. Por trás dessa aparente obviedade está um dos mais fundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância afetiva e na indigência intelectual. O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão, rendendo-se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.

A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação acalma, limita, amortece.

Por isso, quando alguém diz “fiquei muito satisfeito com você” ou “estou muito satisfeita com teu trabalho”, é assustador. O que se quer dizer com isso? Que nada mais de mim se deseja? Que o ponto atual é meu limite e, portanto, minha possibilidade? Que de mim nada mais além se pode esperar? Que está bom como está? Assim seria apavorante; passaria a idéia de que desse jeito já basta. Ora, o agradável é quando alguém diz: “teu trabalho (ou carinho, ou comida, ou aula, ou texto, ou música etc.) é bom, fiquei muito insatisfeito e, portanto, quero mais, quero continuar, quero conhecer outras coisas.

Um bom filme não é exatamente aquele que, quando termina, ficamos insatisfeitos, parados, olhando, quietos, para a tela, enquanto passam os letreiros, desejando que não cesse? Um bom livro não é aquele que, quando encerramos a leitura, o deixamos um pouco apoiado no colo, absortos e distantes, pensando que não poderia terminar? Uma boa festa, um bom jogo, um bom passeio, uma boa cerimônia não é aquela que queremos que se prolongue?

Com a vida de cada um e de cada uma também tem de ser assim; afinal de contas, não nascemos prontos e acabados. Ainda bem, pois estar satisfeito consigo mesmo é considerar-se terminado e constrangido ao possível da condição do momento.

Quando crianças (só as crianças?), muitas vezes, diante da tensão provocada por algum desafio que exigia esforço (estudar, treinar,EMAGRECER etc.) ficávamos preocupados e irritados, sonhando e pensando: por que a gente já não nasce pronto, sabendo todas as coisas? Bela e ingênua perspectiva. É fundamental não nascermos sabendo e nem prontos; o ser que nasce sabendo não terá novidades, só reiterações. Somos seres de insatisfação e precisamos ter nisso alguma dose de ambição; todavia, ambição é diferente de ganância, dado que o ambicioso quer mais e melhor, enquanto que o ganancioso quer só para si próprio.

Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer, modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos enfrentar.

Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na idéia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha fica; para que alguém quanto mais vivesse mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando…

Isso não ocorre com gente, e sim com fogão, sapato, geladeira. Gente não nasce pronta e vai se gastando; gente nasce não-pronta, e vai se fazendo. Eu, no ano que estamos, sou a minha mais nova edição (revista e, às vezes, um pouco ampliada); o mais velho de mim (se é o tempo a medida) está no meu passado e não no presente.

Demora um pouco para entender tudo isso; aliás, como falou o mesmo Guimarães, “não convém fazer escândalo de começo; só aos poucos é que o escuro é claro”…

Excerto do livro “Não nascemos prontos! – provocações filosóficas”. De Mário Sérgio Cortella

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