Só ando em boa companhia

Só ando em boa companhia
Data da foto: 2010 Julia Roberts no filme "Comer, Rezar e Amar", do diretor Ryan Murphy.

Será que estar só é melhor do que estar mal acompanhado? Em alguns casos estar por nossa conta é o maior desafio. Principalmente por aqueles que estão acostumados a ter o outro como referência para suas escolhas.

Por outro lado, aqueles que encaram a solidão com dignidade não rejeitam a companhia dos outros. Ao sentir prazer na própria companhia, acabam enxergando o outro como opção. Se quiserem ir ao cinema e não encontrarem alguém para acompanhá-los, vão bem sós. Mesmo no folclórico sábado à noite.

A vertigem aumenta quando os desacompanhados são mulheres. Os desafios são outros. Enfrentar uma multidão com a segurança de quem se basta requer uma dose extra de coragem. Quem sabe uma pitada de despreocupação com a opinião alheia. E acredite, não é nada fácil.

O interessante é a pressão sofrida mesmo quando nos encontramos dentro da “zona de conforto” da sociedade, ou seja, quando temos um parceiro fixo e por algum motivo resolvemos sair desacompanhados. Quem já não ouviu a frase:

– Você foi sozinho (a)?

O que há de tão ameaçador em alguém estar sozinho? Será que a nossa necessidade de julgamento é tão imperiosa que não sossegamos até classificar o outro pelos nossos valores pessoais? Colocá-lo em uma de nossas caixinhas internas nos deixam mais confortáveis, claro.

Cabe aí uma reflexão: Estar sem companhia não significa ser solitário. São duas situações distintas. Podemos estar acompanhados há anos por um parceiro indiferente à nossa presença ou que não assume a relação. A famosa “solidão a dois”.

Swami Dayananda Saraswati, em seu livro “O Valor dos Valores”, ressalta que uma mente tranquila gosta de si mesma. Não foge da companhia de outras pessoas, nem se sente perturbada pela ausência dela. Essa seria a atitude de uma mente contemplativa, centrada no autoconhecimento.

Quem se conhece o suficiente para perceber os seus limites não maltrata a si nem aos outros por companhia alguma. Busca o amor dentro de si mesmo. Isso é compaixão em seu sentido pleno.

Toquinho já alertava aos desavisados que encontrava pelo caminho: “Eu não ando só. Só ando em boa companhia. Com meu violão, minha canção e a poesia”.

Quem sabe, da próxima vez que encontrar uma pessoa desacompanhada, vale lembrar que todos temos o direito de apreciar as coisas boas que a vida oferece. Afinal, quem conhece o próprio valor não se sente ameaçado por ninguém (acompanhado ou não).

Por essas e outras que só ando em boa companhia. Com meu tapetinho de yoga, minha meditação e a escrita.

“Naquele tempo…” – O mito do antigamente

“Naquele tempo…” – O mito do antigamente

Houve um período da modernidade em que as pessoas viviam com a mente no futuro. Era no por vir que estava a esperança, era o futuro que seria melhor, eram no futuro as apostas e para ele se voltavam as ações. Talvez pela desilusão e com o fim das velhas utopias, agora ter a mente no passado é a nova mania. Temos a geração dos nostálgicos por excelência, que paradoxalmente aposta no passado, porque antigamente era melhor… melhor pra quem? Há nesse pensamento que tende para trás uma fragilidade que tende a passar despercebida.

Não é que devêssemos desvalorizar o passado, pelo contrário, não existe fonte mais segura de aprendizado do que aquilo que já foi vivido. Mas ficar suspirando por tempos supostamente melhores é uma atitude ingênua, senão infantil e negligente, pois pelo passado não se tem qualquer responsabilidade, não há possibilidade de ação pelo que já foi feito, não há perspectiva de mudança do que já passou. Se há algo de realmente importante no passado é resgatar ou perpetuar o que ele teve de melhor e estar atento ao que “deu errado” para evitar repetições. Ainda assim, a cautela nunca é demais, é preciso ter algo de perspectiva, afinal, outros tempos são outros tempos.

Velhas alternativas não funcionam para novas situações sem passar antes por adaptações. Para que o passado seja de fato uma fonte de conhecimento é preciso ter algo da ação, da percepção ampla do presente de modo a transpor as barreiras do tempo. É preciso ter algo de uma visão de futuro para tentar antever consequências. É preciso pensar fundo, respirar fundo, sentir fundo, é preciso ter atitude e estar presente.

É muito fácil pensar que algo antigamente foi melhor e lidar com falsas estatísticas ou constatações generalistas. Pensar, por exemplo, que as pessoas se relacionavam melhor por não haver tecnologias. Obviamente, quem não viveu naquele tempo, não sentiu dele as mazelas na pele. Mas qualquer um que tenha se dedicado um pouco aos livros históricos, de literatura que sejam, sabe que haviam outros tipos de opressão e obstáculos para as relações genuínas, como uma divisão mais rígida nas relações pessoais devido à classe social, para apenas citar um exemplo.

Outra ilusão é pensar que os relacionamentos “amorosos” eram mais profundos e duráveis. Claro! O casamento foi por muito tempo uma ferramenta de negociação onde a mulher era o produto, por muito tempo não se tratava sequer de uma escolha, e, como em uma empresa, havia uma hierarquia clara a ser respeitada. Duravam sim, de fato, pela repressão social ou pelas imposições da lei, onde, inclusive, o adultério feminino era passível de punição legal, ou o homicídio passional era passível de perdão. Mesmo que separar-se e seguir com as próprias vidas fosse um desejo do casal, ambos estavam presos a uma convecção. Onde está o amor nisso? Onde está o melhor?

Alguns acreditam ainda que as regras de civilidade eram mais respeitadas e consequentemente a sociedade era mais gentil e solidária. Sério mesmo? Nunca ouviram falar das humilhações públicas e gratuitas, que poderiam perseguir uma pessoa por toda vida? Dos maus tratos aos servos, da primazia da aparência nas classes abastadas? Mas, “peraí”, isso se parece bastante com “hoje em dia”, com a pequena diferença de que, atualmente é possível denunciar esse tipo de atitude e discuti-la, onde antes, qualquer um que contra elas se colocasse corria o risco de ser tão ridicularizado quanto os que sofriam tais perseguições.

Já se pensou queimar na fogueira por fazer um chazinho para gripe? E ser apedrejada por ser denunciada por seu marido psiquicamente comprometido que tem delírios com traição? Não poder sair na rua sozinha, não por medo da violência, mas por uma convenção social instransponível, que tal? E se você ficasse desempregado por seis meses e nunca mais conseguisse se recolocar pela má fama adquirida por ter, uma vez, perdido o emprego? Ter nascido em uma família de classe econômica precária e ser obrigado a seguir a profissão dos seus pais, com pouca ou nenhuma perspectiva de mudança? Ser apaixonado por uma moça e ter que casar-se com outra por esta ter um melhor dote ou, caso contrário, arruinar-se socialmente e consequentemente financeiramente? E não seria maravilhoso viver num período de guerra mundial? É desse antigamente que as pessoas falam?

O antigamente é uma espécie de romance utópico no qual tudo parece melhor simplesmente porque não precisa ser encarado de frente. Segundo a regra do “antigamente”, todos pensam em si mesmos vivendo em uma família nobre, abastada, liberal e carinhosa, que simplesmente não existe nem nunca existiu como regra geral. Viver o agora e lidar com a responsabilidade de torna-lo melhor é um desafio constante e cansativo, e os braços sedutores de um passado inventado nos convida a adormecer em seu seio quente, mantendo-nos inertes e cegos às qualidades do nosso próprio tempo. Na verdade, é a amargura que nos cerceia e nos impede de viver. Refugiamo-nos no túmulo do tempo sem usufruir nem mesmo dele.

É difícil enxergar no meio caos, e o caos é sempre o momento vivido, onde tudo acontece e é preciso colocar-se ali, para ver e viver o pior ou o melhor. Creio eu que esses adoradores do passado, vivessem no tempo que aclamam e consideram foram melhores, ao lidar com a realidade, queixar-se-iam novamente, invocariam tempos ainda mais remotos, até que retornassem aos períodos anteriores à invenção da roda e não pudessem mais pensar ou imaginar um antigamente para o qual retornar.

Se for para aclamar o antigamente, que sejamos atores em resgatar dele o melhor sem o temor de ser ridicularizado pelo nosso anacronismo. Temos o benefício de um acervo gigantesco e disponível das maravilhas que foram produzidas em tantos outros tempos. Recuperemos as artes, as músicas, as filosofias, alguns modos, palavras e modas. Temos a liberdade de trazer do passado os benefícios revistos, relidos, reinterpretados. Temos o potencial do bricoleur, para fazer da nossa vida um mosaico com o melhor de todos os tempos e reinventarmos o nosso próprio.

Mas para isso é preciso substituir os suspiros por aspirações, a inércia por ações. Se for para suspirar, que seja pela emoção em poder acessar todas essas belezas e inventar belezas outras, e lamentar apenas que no passado tantas mentes brilhantes e insaciáveis não pudessem desfrutar de toda essa fonte que nós temos disponível, mas que infelizmente não utilizamos em todo o seu potencial, por nos submetermos a uma falsa lógica de que o homem contemporâneo não tem mais o que inventar. Talvez hoje, a nossa urgência mais latente seja reinventar a própria vida, que anda dispersa entre as promessas do passado do futuro, enquanto o presente escoa pelos ralos dos delírios de grandeza e da lamentação.

No perfume da educação; Escola é essencial, mas não substitui a essência dos pais.

No perfume da educação; Escola é essencial, mas não substitui a essência dos pais.

As aulas começaram e as mamães estão livres! Se você concorda com essa frase, sinto lhe informar que vou acabar com a sua alegria.

Com o passar dos anos, a confusão que se formou em torno das funções da escola e da família piorou muito. A criação dos filhos está sendo terceirizada para escolas, babás e avós. Mães e pais dedicam pouquíssimo tempo aos seus filhos, e têm deixado de lado o acompanhamento da aprendizagem deles – acreditando que a escola é responsável não só por isso, mas pela transmissão de valores.

Em primeiro lugar é importante deixar claro que, a caminhada por todo o ensino fundamental e o ensino médio, dura doze anos, e nesse tempo, quase todo o processo de desenvolvimento global vai acontecer. A qualidade do aprendizado do seu filho durante esse tempo vai depender muito do respaldo que ele tem fora dos muros da escola e disso vai depender todo o resto da vida dele.

Não adianta achar que, com o início das aulas, você pai e você mãe estão tranquilos até julho. Se não houver uma infraestrutura para embasar o processo de aprendizagem, ela ficará deficitária e essa infraestrutura deve ser embasada por algo imprescindível: ROTINA.

Ao levar meu filho ao pediatra aqui em São Paulo, ele me perguntou sobre limites e rotina e terminou sua orientação com uma sábia frase que divido com vocês: “as crianças precisam saber o que vai acontecer ao longo do dia”.

Para poder aprender e se desenvolver as crianças e adolescentes precisam de dias que transcorram com tranquilidade, aliás, todos nós precisamos. Os dias devem ter horários estabelecidos para acordar, ir à escola, se alimentar, descansar, estudar, praticar outras atividades, cuidar da higiene pessoal e dormir. Não se deve fugir muito disso, ou haverá muita dificuldade na aprendizagem. Dias atribulados, corridos, sem horários para as necessidades básicas nos deixam estressados e isso vale também para as crianças. Ninguém aprende nada em meio ao caos.

Outro item importante é o local onde a criança e/ou adolescente vai fazer as tarefas de casa. È imprescindível que esse ambiente exista, e que seja silencioso e organizado. Os pais, durante o início do ensino fundamental devem acompanhar e supervisionar essas atividades. Isso vai se tornando menos necessário com o passar dos anos, mas o lar e o ambiente devem ser propícios ao aprender.

O terceiro item a ser seguido é o de obedecer rigorosamente ao horário de dormir. Estudos apontam altos níveis de déficit de atenção em crianças que dormem menos do que oito horas por dia. A meu ver, o horário limite para ficarem acordados até os dez anos de idade é vinte e uma horas, isso porque somos um país tropical e de clima muito quente. Na Europa e nos Estados Unidos, crianças vão para a cama no máximo às dezenove e trinta horas. Se for preciso ir se deitar mais cedo até que seu filho estabeleça a rotina, faça-o.

Crianças imitam o comportamento dos pais. Se você quer que seu filho leia, comece a ler, se quer que ele ouça boa música, comece adequando o seu gosto musical. Analise a rotina da sua própria vida e os seus hábitos de sono e alimentação, por exemplo.

Temos vivido um tempo onde muitas crianças são diagnosticadas sem muitos critérios com  portadoras de TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade) e muitas vezes, o que há de fato é uma criança se comportando de modo desatento e hiperativo por pura influência do ambiente. Estudos recentes apontam que o uso de certa medicação indicada para esses casos, foi feito de forma desordenada nos últimos anos e causou vários problemas por isso. Antes de sair correndo com seu filho para o neuropediatra quando começarem a perceber problemas na aprendizagem faça uma avaliação se essa criança está tendo respaldo ambiental e presencial dos pais para aprender. Parem de terceirizar as suas responsabilidades!

A tecnologia disponível para pesquisa em casa e a tendência a deixarem as crianças na escola em período integral não nos desresponsabiliza, como pais, de sermos parte do processo. Para ilustrar que o que lhes escrevo não é exagero, as escolas costumam realizar no mínimo duas reuniões pedagógicas com os pais durante o ano letivo. Tenho algumas amigas que dirigem escolas públicas e privadas – e pasmem – em ambas, mais de trinta por cento dos pais não comparecem às reuniões! Esses pais não dedicam duas horas no semestre aos seus filhos e á instituição que escolheram para a tarefa e ensiná-los.

Ser pai e ser mãe se tornou papel coadjuvante na vida do indivíduo e por isso é preciso muito mais jogo de cintura e muito mais critério antes de tomar essa decisão. Quando eu decidi que teria um filho só, me lembro de ter ouvido muitos questionamentos, principalmente sobre o fato de que ele não teria irmãos. Acho engraçado que tenham essa preocupação sabendo o quanto é preciso em dedicação, tempo e recurso financeiro para se oferecer uma vida digna a um filho. E, antes que digam, não, hoje não vale mais a regra de que quem cria um cria dois!

Uma guerra mundial chamada educar nossos filhos

Uma guerra mundial chamada educar nossos filhos

Educar é muito difícil. Fácil é dizer sempre sim e deixar que se faça tudo que se quer. Um dia uma paciente me disse ao justificar a bronca que levou do endocrinologista do filho: “Eu deixo ele comer o que quiser porque já cansei de explicar. Eu quero paz, sabe?” Sei. Este foi meu pensamento na hora, e então eu disse a ela e lhes repito: educar um filho é difícil, é um risco que poucos querem correr exatamente porque “tira a nossa paz”.

Percebo todos os dias o risco que decidi correr ao ter um filho e passar então a educá-lo. Às vezes, me sinto nadando contra a correnteza, formada por uma série de estímulos externos que me questionam e até me punem por educar e impor limites.

Eu estava numa festa infantil, meu filho e os amigos da classe brincavam em um gira-gira. Um deles empurrava o brinquedo em alta velocidade, correndo e segurando no cano onde os demais também apoiavam as mãos; enquanto os outros, sentados no brinquedo, gritavam felizes pela sensação, jogando a cabeça para trás. Os pais se entreolhavam amedrontados, até porque se um deles caísse, era óbvio que se machucaria. Ninguém tomava atitude alguma, mas falavam entre si: “nossa, que perigo”, ou verbalizavam um “mais devagar”, “cuidado”. Eu, então, decidi agir. . A minha vontade de levar o meu filho para dar pontos na testa era zero, e a de ver outras crianças na mesma situação também. Cheguei perto do brinquedo, falei primeiro com o meu filho e depois com os demais. Disse que a brincadeira estava perigosa e que já bastava. Pedi que parassem e sugeri que fossem para outros brinquedos ou para outras atividades disponíveis. Todas as crianças me olharam feio, claro, eu as frustrei e sabia disso, não esperava nada diferente. Eles fingiram não me ouvir, resistiram e tentaram argumentar. Fiquei firme no comando até que todos descessem do brinquedo. Eis que uma das meninas vem até mim e me diz: “Você não pode me mandar descer. Sabe por quê? Porque você não manda em mim”. Ela, assim como meu filho, tem quatro anos, e era a primeira vez que ela me via na vida. Fiquei pensando se meu filho está agindo assim com pais de colegas em situações semelhantes, e isso me deu medo; mas o pior foi ver alguns pais pegarem seus filhos, oferecer outras brincadeiras, porém deixando no ar um clima evidente de que “a ruim era eu”.

Que medo é esse que temos de educar? O que há de arriscado em impor regras e sustentá-las quando necessário? Nossos filhos não podem sofrer? Não podem ser frustrados? Temos que ser pais idealizados, perfeitos aos olhos de uma criança de quatro anos que nada entende sobre os riscos que corre na vida? Pais com medo da imagem que os filhos possam ter deles? Eu odiei meus pais todas às vezes nas quais eles me impuseram regras e limites; fui frustrada muitas vezes e não me lembro de eles se importarem se eu estava gostando ou não; naquele momento o foco era educar e talvez por isso eu os ame tanto. Lembrem-se do que sempre digo: liberdade demais é interpretada pela criança como falta de afeto.

Eu mando no meu filho sim, e espero que ele obedeça aos professores, aos familiares, aos pais de colegas e aos demais adultos que possam o orientar e o proteger. Eu vou desagrada-lo sempre que for preciso sem medo algum e vou abrir mão da minha “paz” dizendo sempre sim para não ter que ouvir suas argumentações. Terei que ser mais forte do que ele para que ele entenda que não se pode e nem se vai ganhar sempre.

Talvez estejamos preocupados demais com a nossa autoimagem e por isso, deixando de educar, de correr o risco, de agir. Enquanto pais decidem ficar na zona de conforto, desistindo de seus filhos por medo de errar e pela praticidade de terceirizar a educação, crescem as menininhas de quatro anos que, ao discursarem que “ninguém manda nelas”, tornam-se mulheres egocêntricas e intolerantes a qualquer tipo de relação na idade adulta.

O jardim em frente, por Carlos Drummond de Andrade

O jardim em frente, por Carlos Drummond de Andrade

contioutra.com - O jardim em frente, por Carlos Drummond de Andrade

Os big shots da empresa estavam reunidos em conferência. Assunto importante, desses que exigem atenção, objetividade. O presidente recomendara:
– Não estamos para ninguém. Esta porta fica trancada. Avisem à telefonista que não atenda nenhum chamado. Nem do Papa.
Começou-se por dividir o assunto em partes, como quem divide um leitão. Cada parte era examinada pelo direito e pelo avesso, avaliada, esquadrinhada, radiografada. Cartesianamente.
– Você aí, quer fazer o favor de parar com essa caricatura?- O presidente não admitia alienação. Por sua vez, foi advertido pelo vice:
– E você, meu caro, podia deixar de bater com esse lápis, toc, toc, toc, na mesa?
Estavam tensos, à véspera de uma decisão que envolveria grandes interesses. Alguém bateu à porta.
– Não respeitam! Não respeitam o trabalho da gente! Isso não é país!
– Seja ou não seja país, quando batem à porta a solução é abrir, para evitar novas batidas, ou, mesmo, que a porta venha abaixo. Pois ninguém deixa de bater, e sabe que tem gente do outro lado.
O director secretário abriu, de óculos fuzilantes. O chefe da portaria, cheio de dedos, balbuciou:
– Essa senhora… essa senhora aí. Veio pedir uma coisa.
O primeiro impulso do diretor secretário foi demitir imediatamente o chefe da portaria, servidor antigo, conceituadíssimo, mas viu ao mesmo diante de si a imagem consternada do homem, e a lei trabalhista: duas razões de clemência. Pensou ainda em mandar a senhora àquele lugar de Roberto Carlos, ou a outro pior. Dominou-se: ela ostentava no rosto aquela marca de tristeza, que amolece até directoria.
– A senhora me desculpe, mas estou tão ocupado.
– Eu sei, eu é que peço desculpas. Estou perturbando, mas não tinha outro jeito. Moro do outro lado da rua, no edifício em frente. Meu canário…
– Fugiu e entrou aqui no escritório? Eu mando pegar. Fique tranquila.
– Antes tivesse fugido. Morreu.
– E daí?
– Viveu quinze anos conosco. Era uma graça… pousava no dedo…
– E daí, minha senhora?
– O senhor vai estranhar meu pedido? Eu estava sem coragem de vir aqui. Por favor, não ria de mim.
– Não estou rindo. Pode falar.
– Os senhores tem um jardim tão lindo na cobertura. Da minha janela, fico apreciando. Então agora está uma coisa: posso fazer um pedido?
– Pode.
– Eu queria enterrar meu canário no seu jardim. Lá é que é lugar bom para ele descansar. O senhor vê, nós temos aquele terrenão ao lado do edifício, com três palmeiras, um pé de fruta-pão, mas é grande demais para um passarinho, falta intimidade. Se o senhor consente, eu mesma abro a covinha. Não dou o menor trabalho, não sujo nada.
O director secretário esqueceu que tinha pressa, que havia um problema sério a discutir. Que problema? Naquele momento, o importante, o real era um canarinho morto, e amado.
– Pois não, minha senhora, disponha do jardim. Eu mesmo vou levar a senhora lá em cima, para escolher o lugar.
Subiram, escolheram o canteiro mais apropriado, onde bate o sol pela manhã, e à tarde as plantas balançam levemente, à brisa do mar.
– Não é abuso eu fazer mais um pedido? Queria que o jardineiro não revolvesse a terra neste ponto, durante três meses. O tempo de os ossinhos dele se desfazerem… Volto daqui há meia hora para o enterro.
Meia hora depois, voltava com uma caixinha forrada de veludo azul claro, e a reunião dos big shots, que ainda durava, foi suspensa para que todos, com o presidente muito compenetrado, assistissem ao sepultamento.

Carlos Drummond de Andrade

2016: O ano da presença

2016: O ano da presença

Estamos no começo de um novo ano, um tempo em que mesmo que a vida continue a mesma, mesmo que a gente esteja no meio de um ciclo, mesmo que nada pareça estar se renovando para nós, mesmo que a rotina siga, e a única coisa que tenha mudado foi os últimos dois dígitos no calendário, este é um tempo que me traz um aviso, uma lembrança e faz despertar a pergunta: que intenções eu coloco neste novo ano? E esta pergunta poderia me acompanhar durante todo o ano (se eu me lembrasse de olhar pra ela) e ela talvez signifique simplesmente algo do tipo: como eu quero sentir a vida? Como eu estou encarando o mundo?

Me lembro que no começo de 2015, ao me fazer essa pergunta, de coração aberto eu disse: neste ano novo eu quero menos! Quero menos correria, menos coisas, menos bagunças de sentimentos, menos grandes mudanças, menos pesos.

Tinha uma vontade de leveza nessa intenção, era o desejo de que a vida fosse mais calma, mais bonita, num ritmo mais lento. Eu queria desacelerar para poder deixar outros ritmos e verdades fluírem.

Ainda acho essa intenção bonita e válida, às vezes a gente precisa disso mesmo.

Mas, neste começo de 2016 a minha intenção é outra:

Neste ano novo eu quero tudo! Quero tudo o que a vida tem para me oferecer e quero estar aberta e inteira. Não quero prever nada, planejar, me prevenir, me pautar nos medos para assegurar minha alma, para evitar quedas e danos. Quero estar aberta para o que der e vier, pronta ou não, mas cheia de vontade de sentir, aprender, evoluir, chorar, sorrir, viver. Aberta para olhar nos olhos das levezas e dos pesos. E cheia de entusiasmo para receber as surpresas que me esperam, mas também cheia de serenidade ao imaginar os momentos de alívio e calmaria.

O que eu quero me propor é que independentemente das dores, dos percalços, dos sustos, dos cansaços, dos excessos, das dúvidas, das frustrações, da solidão, que eu saiba lidar com amor sempre.

 

Que eu saiba olhar com doçura e absolvição para as pessoas, sabendo que elas são antes de tudo humanas e não heróis ou vilões. Que eu saiba receber as dificuldades com paciência, força e otimismo, e consiga olhar de fora e entender o sentido maior de tudo.

Que eu saiba não me culpar e não culpar ninguém, nem mesmo o destino. Que eu encontre alento nos meus próprios braços e que eu saiba me dar um banho morno, uma tarde de sono, um choro derramado. Que eu saiba também deitar num peito, entregue, sem me preocupar que horas são.

Que eu consiga ouvir uma música sem fazer mais nada ao mesmo tempo, talvez apenas cantar junto. Que eu saiba identificar e aproveitar ao máximo as belezas e as alegrias que me pousam. Que eu mate as saudades nas presenças sem o medo do que será ou deixará de ser o futuro.

Que eu solte as risadas mais livres, mesmo com aquela lista de problemas a serem resolvidos no dia seguinte. Que eu aprecie uma boa companhia, um prato de comida, um livro de poesia, e enquanto faça isso, que eu me esqueça do mundo.

Que eu solte minhas feras num banho de mar e volte a encontrar meus passarinhos.

Porque tudo flui melhor e a vida faz mais sentido quando a gente aprende a ser sensível à flor da pele, aberto para o mundo e ao mesmo tempo desenvolve suavidade no olhar.

Que eu me reconecte com a amplitude da vida e que essa seja minha alegria, porque não há delícia maior do que estar pronta para querer tudo e ao mesmo tempo não saber de nada.

Que assim seja! 🙂

ORGULHO: AQUELE QUE DEVORA A SI MESMO

ORGULHO: AQUELE QUE DEVORA A SI MESMO

O significado da palavra orgulho tem origem no termo catalão orgull que é uma característica de pessoa com um conceito muito elevado de si. Também significa altivez, brio, amor próprio exagerado e soberba.

O orgulho ou a soberba é também considerado um dos 7 Pecados Capitais. Para Tomás de Aquino, a soberba é um pecado tão grandioso que pode ser considerado fora de série, devendo ter um tratamento especial.

Não só Tomás de Aquino pensava assim. Para muitos, a soberba diz respeito à aversão a Deus, cujo preceito da humildade o homem recusa aceitar. É por isso que a soberba é chamada o início, “porque é pela aversão que começa a razão de todo o mal.”

A base do pensamento acima pode ter sido extraída do Eclesiástico 10,15: “Pois o princípio de todo pecado é a soberba (…).”

Na verdade, o orgulho não é de fácil definição: em excesso fere, pois não sabe pedir desculpas, não sabe perdoar, nem ser humilde, mas também machuca e corrói quem o alimenta. Teme a negativa e não quer perder. Enfim, é um veneno em doses homeopáticas.

O orgulhoso é importante demais para ir atrás do outro, é vaidoso demais para reconhecer que errou e, principalmente, para perdoar. Errar com ele é um ultraje que não cabe desculpas, mas quando é ele quem erra o problema é menor. Ele joga e nunca paga para ver. É uma pena!

Falam que quem opta pelo orgulho precisa aprender a lidar com a saudade. Aprender a lidar com a saudade é fácil diante de questões maiores. Orgulho em excesso deixa um rastro de palavras não ditas, sentimentos não vividos, mágoas não apaziguadas, ressentimentos não resolvidos, situações não esclarecidas. Frustrações de equações não solucionadas.

É fato que o orgulho, a vaidade e a arrogância caminham juntos, mas não estaria o orgulho também associado à covardia? A palavra covarde vem do latim coda que significa “cauda”, metaforicamente seria a pessoa que tem o rabo entre as pernas, ou seja, a que deixa de enfrentar as mais diversas situações por medo.

Logo, deixar de enfrentar um fato por medo de ter o orgulho ferido é também uma forma de covardia. Viver é risco e exige coragem!

Quem não arrisca deixar o excesso de orgulho de lado pode não perder nada, mas pode também perder tudo. E, quando envolve pessoas, é difícil não ferir e ser ferido, como o velho ditado que diz “quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Benjamim Franklin já falava: “O orgulho que almoça vaidade janta desprezo.” Tudo tem seu preço!

O que mais escutamos por aí são as pessoas afirmando que não vão fazer isso ou aquilo por puro orgulho, mas ao mesmo tempo se corroem por dentro, esperando que o tempo resolva as suas inquietações. Para o orgulhoso, a iniciativa deve ser sempre do outro e nunca dele. Aí mora o perigo!

Foi arrogante, não pediu desculpas e ainda esperou a ligação do outro! Esse é um pequeno exemplo do que as pessoas orgulhosas fazem. Acontece que, se o orgulho for uma via de mão dupla, essa ligação pode nunca vir. E aí? E aí que a pessoa jogou errado e perdeu. Por essas e outras é que a frase de Shakespeare é tão pertinente: “o orgulho devora a si mesmo”.

Um ótimo romance que retrata muito bem o tema é o “Orgulho e Preconceito” da escritora inglesa Jane Austen, adaptado para o cinema, em que os protagonistas não se entendem pelos motivos que dão nome ao livro. Vale a pena ler o romance ou ver o filme para refletir.

O bom mesmo seria deixar o amor prevalecer sobre o orgulho, a vaidade, o preconceito e o medo, na exata forma descrita pelo grande poeta Pablo Neruda: “Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde, amo-te simplesmente sem problemas nem orgulho: amo-te assim porque não sei amar de outra maneira.”

Que o amor sempre prevaleça, não apenas sobre o orgulho, mas sobre todos os sentimentos que de alguma forma apequenam a alma.

O que seus sonhos estão fazendo com você?

O que seus sonhos estão fazendo com você?

“Nós somos do tecido de que são feitos os sonhos.” (William Shakespeare).

Ah os nossos sonhos!

Não me refiro aos que acontecem quase todas as noites quando estamos dormindo e que manifestam os nossos desejos e as nossas angústias. Estes sonhos são objeto de estudo e interpretação para a psicanálise e eu, particularmente acho primorosa a obra de Carl Jung sobre os sonhos e acho muito bonito o olhar que ele deu para esta nossa manifestação.

Eu poderia escrever para sempre sobre os sonhos aqui, mas hoje quero refletir com vocês sobre os nossos desejos, muitas vezes chamados de sonhos. Quero olhar para os sonhos que sonhamos acordados, para os devaneios que nos roubam a atenção, para as nossas vontades muitas vezes secretas, para o que parece impossível e inalcançável. Quem não tem um, ou melhor, vários sonhos? Uma viagem, um filho, um amor impossível… (se é que isso existe. Na minha insignificante opinião, amor só acontece quando é possível). Talvez uns mais e outros menos, mas a verdade é que todos nós sonhamos, ou melhor, desejamos.

E então, o que fazer com tudo isso?

Não há quem não sonhe, dormindo ou acordado; e não há quem vá realizar todos os seus sonhos. Sonhar é preciso e talvez por isso nós, psicólogos insistimos tanto para que os pais não realizem todos os desejos de seus filhos. Se tudo que queremos pudesse vir como em um passe de mágica às nossas mãos a vida perderia o sentido e então talvez nós adoeceríamos. A motivação é o que nos impulsiona; é o que nos faz levantar da cama todos os dias e seguir em busca da sobrevivência e em busca de algo que podemos conceituar como um sonho a ser realizado. Não se deve apenas viver – é preciso sonhar e quem sabe realizar algum dos nossos desejos durante a caminhada.

Mas e os que ficam? Os sonhos não realizados? Os desejos inatingíveis? O que fazer com eles?

Existem muitas utilidades para os sonhos que não se realizam. A primeira delas é exatamente a percepção e a aceitação de que não se pode ter tudo que se deseja e que o mundo não está aí para nos satisfazer. Crianças muito novas, ainda em fase de egocentrismo, acreditam que o mundo gira em torno delas e o natural é que, com o passar do tempo percebam que não é assim que as coisas acontecem. Todavia alguns adultos, cujas vidas foram muito abastadas ou que tiveram pais que cometeram o grave erro de satisfazer todas as suas vontades, crescem acreditando que todos os sonhos – que todos os desejos – são realizáveis. As consequências disso são horríveis visto que se tornam pessoas cronicamente insatisfeitas e que perdem a capacidade de sonhar.

Não ter tudo o que queremos nos leva ao contato com um importante sentimento: o da frustração; e é provável que esta seja a principal função dos sonhos não realizados: nos frustrar. Aprender a lidar com a frustração é uma questão de sobrevivência e é um dos caminhos para a felicidade. Indivíduos tolerantes à frustração são mais felizes.

Outra função dos nossos desejos ainda não alcançados é nos motivar e dar tempero à nossa vida. Aquele doce sabor da espera por um brinquedo no natal, vivido na nossa infância na qual tudo era mais difícil e menos descartável é um dos maiores prazeres na vida. O “esperar pela festa” é algo que deixa nossos dias preenchidos. Quando então o dia chega ele acaba por nos mostrar que esperar, desejar, sonhar coloriu aqueles nossos dias e que fomos então felizes.

Carreguemos então conosco todos os nossos sonhos, trancados numa caixinha de joias ou soltos numa sacolinha. Façamos dele combustível para a nossa vida, alimentando-os com a esperança do verbo esperançar muito bem citado pelo professor Cortella. Vamos correr atrás deles sabendo que nem todos serão alcançados e entendendo que se eles deixarem de existir nós passaremos apenas à chatice de sobreviver. Vamos dedicar parte do nosso dia aos devaneios, a ser o diretor das cenas que fabricamos nas nossas mentes e a se relacionar com elas, experimentando “naquela outra dimensão” a realização das nossas mais secretas vontades. Os sonhos também servem para voarmos pelo imenso universo da nossa imaginação. Quando sonho eu exercito a minha fé e percebo que talvez nada seja mesmo impossível.

O mais bacana em ter muitos sonhos é exatamente não saber nem quantos e nem quais deles vamos realizar. É perceber que nas incertezas da vida é que está o caminho para que um sonho se torne realidade. Guarde todos os seus sonhos para que nenhum deles se perca da possibilidade de se realizar.

 

 

Escolha o tipo errado de cara certo

Escolha o tipo errado de cara certo

Não, ele não se veste bem. Ele mal sabe combinar uma camiseta básica com uma calça. Ele não é bom em reparar em alguns detalhes, principalmente em um corte de cabelo novo ou na maquiagem do momento.  Não, ele nunca se lembra de algumas datas, pois ele é péssimo em marcar o tempo. Ele não é de falar muito, pelo contrário, ele prefere ficar na dele. Não, ele não é rico, na verdade ele vive com o dinheiro contado. Ele não conhece os restaurantes da moda. Ele não é ligado em música tanto quanto você gostaria e tão pouco é o deus de beleza com o qual você um dia sonhou, mas ele é o cara que fará seus pés saírem do chão.

Ele veste qualquer coisa, sai de pijama, coloca as roupas do avesso, mas ele também é o cara que certamente não vai ligar se você sujar a camiseta surrada dele com o seu batom mais vermelho. Ele nunca vai estar nem ai para roupas, com ou sem elas o mundo continuará o mesmo, desde que vocês estejam um ao lado do outro. Ele também não se importará em ficar completamente nu em sua frente e não reparará em rasgos, rendas e etiquetas. Contudo prestará atenção em você, buscando te entender nos seus melhores e piores dias.

Ele é cego para cortes de cabelo, ele mesmo corta o dele, tão pouco sabe distinguir a cor de qualquer maquiagem, mas isso não importa, pois você não tardará em descobrir nele um especialista em tirar o batom de sua boca com os beijos mais quentes e ousados do mundo. Ele se perderá em você com frequência, te amando desnuda de roupas e de qualquer outro artifício que oculte tudo o que você é.

Ele é um pouco desligado com o tempo. Ele não saberá dizer quando se conheceram, quando deram o primeiro beijo ou foram para a cama. Mas ele também não vai ligar para as horas que você gastar se arrumando para um simples passeio no parque. Ele também não vai se estressar com seus atrasos, pois o amor entende que mais valioso que um minuto perdido, é aquele que ganhamos na companhia de quem nos faz bem.

Ele não vai te contar toda a vida dele, todas as viagens e proezas pelas quais passou, a menos que você queira saber. Ele não vai se alongar ao seu lado em monólogos egoístas e egocêntricos. Ele não vai se lembrar de falar das ex-namoradas, tão pouco te dará sermões ou te dirá como tem que se portar ou se vestir. Ele vai deixar que você seja o que é, da forma como se sentir melhor. Ele não vai te interromper com comentários banais, ele saberá te ouvir com clareza e saberá colocar as palavras certas entre um silêncio e outro. Ele te ensinará que o silêncio guarda em si uma intimidade gritante.

Ele não tem muito dinheiro. Não tem o carro do ano. Vocês não passarão as férias em Cancún, mas incrivelmente, ao lado dele, você não vai sentir necessidade de ir para um lugar diferente e longínquo para se sentir excitada. Basta que vocês se tenham para a magia acontecer. Ao lado dele aquele hotelzinho simples na beira da estrada vai se tornar inesquecível e aquela cidade turística e próxima que você achava enfadonha vai se revelar um ótimo refúgio para dois.

Ele não sabe quais são os restaurantes mais cotados do guia Michelin, mas sabe fazer um bife com batatas e arroz como ninguém. Ele não sabe o nome do chef mais premiado da cidade, mas vai adorar te ajudar quando resolverem preparar um jantar corriqueiro depois de um dia cansativo de trabalho.

Ele não consegue distinguir a Adele da Amy Winehouse, mas saberá cantar as mais belas palavras aos seus ouvidos antes de se entregarem ao sono.

Não, ele não é o Zac Efron, mas tem o sorriso mais extraordinário do mundo. Não, ele não é o Ashton Kutcher, mas tem um olhar tão sedutor que você não conseguirá se mover quando suas íris se encontrarem.

Ele não é o cara que o mundo venera, ele não é o homem que aparece nas propagandas da tv ou nas revistas, mas ele é aquele que te completará na medida certa. Aquele que não andará na frente, nem atrás, mas ao seu lado, te amando na cumplicidade única que só o amor verdadeiro ou o tipo errado de cara certo pode oferecer.

E sabe de uma coisa? Esse cara provavelmente está bem perto. Está naqueles lugares os quais você costuma frequentar, esperando apenas que você se dê uma chance para ser imensamente feliz.

Acompanhe a autora no Facebook pela sua comunidade Vanelli Doratioto – Alcova Moderna.

Gerenciar bem a vida pessoal é uma medida necessária

Gerenciar bem a vida pessoal é uma medida necessária

Dificilmente se atinge o sucesso profissional sem pagar um alto preço por isso, mas quando o preço é o fracasso total na vida pessoal, está na hora de repensar as prioridades.

Como bem disse o poeta Fabrício Carpinejar: “O preço do sucesso não pode ser o fracasso na vida pessoal”. Quando pagamos tal preço, assumimos também as suas consequências: amores perdidos, filhos infelizes, amizades superficiais, saúde comprometida, pequenos prazeres ignorados, solidão e outras mazelas.

Claro que o sucesso profissional deve ser buscado com esforço e dedicação, porém as pessoas não devem se tornar escravas do dinheiro, do poder, da vaidade, do status e da fama. O equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal é fundamental!

Em recente artigo intitulado “A meia maratona de Amsterdã”, no Jornal do Comércio de Porto Alegre, o empresário Nizan Guanaes cita o livro “On Managing Yourself”, publicado pela Harvard Business School, em que Clayton Christensen, conhecido como o guru da inovação, defende que a melhor medida empresarial é a gestão da própria vida pessoal.

Nizan afirma que: “A vida empresarial é um moedor de carne. Se você não a domina, ela engole você. Ela engole seu corpo, sua família, suas relações. Ela come tudo.” E, continua: “Muitas vezes o sucesso não consegue ser sustentado porque o corpo, e a alma, a cabeça, são destruídos antes por toda essa pressão profissional”.

São muitos os exemplos de pessoas famosas que destruíram suas carreiras ou as interromperam precocemente porque não conseguiram administrar suas vidas pessoais.

Inclusive, são inúmeros os estudos e artigos de especialistas que defendem que a satisfação na vida pessoal é um propulsor para o sucesso na vida profissional, pois melhora a criatividade, ajuda nas relações interpessoais, faz líderes melhores e aumenta a produtividade.

A reflexão não vale apenas para os que já atingiram o sucesso, mas também para aqueles que ainda o buscam a qualquer preço. Trabalham exaustivamente e não se desligam nem nos raros momentos de prazer, comprometendo a família, a vida social e a própria saúde.

Sim, a saúde, física e emocional, comprometida pelo excesso de estresse, ansiedade, distúrbios do sono e alimentação, pressão arterial alta, irritabilidade etc. É o sinal vermelho dado pelo corpo avisando que chegou a hora de diminuir a velocidade ou colocar o pé no freio.

Na verdade, chegou mesmo foi a hora de arrumar tempo para brincar com os filhos, viajar, sair para dançar, pisar na areia da praia, admirar a natureza, assistir a um bom filme, ler os livros que estão na prateleira há meses, cozinhar, rir das piadas dos amigos, levar seus pais para jantar, enfim dar atenção a si mesmo e às pessoas amadas.

É fácil desacelerar? Claro que não, mas as vezes é necessário!

Felizes são os que não negligenciam suas vidas pessoais, porque quando a crise econômica chega, o câmbio aumenta e os negócios não vão bem, ainda restam motivos para sorrir.

As mulheres são mais fortes, por José Saramago.

As mulheres são mais fortes, por José Saramago.

Para começar, gosto das mulheres. Acho que elas são mais fortes, mais sensíveis e que têm mais bom senso que os homens. Nem todas as mulheres do mundo são assim, mas digamos que é mais fácil encontrar qualidades humanas nelas do que no gênero masculino. Todos os poderes políticos, econômicos, militares são assunto de homens. Durante séculos, a mulher teve de pedir autorização ao seu marido ou ao seu pai para fazer fosse o que fosse. Como é que pudemos viver assim tanto tempo condenando metade da humanidade à subordinação e à humilhação?

José Saramago, in ‘L’Orient le Jour (2007)’
Texto retirado de O mundo como ele é

Um novo feminismo

Um novo feminismo

 

Tudo indica que as mulheres estão fartas da desigualdade e da violência física ou verbal que ainda rondam seus passos. O novo feminismo está no sangue, não mais na cabeça. Por solicitação do movimento #AgoraÉQueSãoElas, contra o projeto de lei que dificulta o aborto em caso de estupro, cedo hoje, com prazer, o espaço à professora Heloisa Buarque de Hollanda, personagem ícone da revolução comportamental dos Anos Rebeldes. Quase 50 anos depois de lutar contra tabus e preconceitos, Helô, a “musa de 68”, fala do novo feminismo e participa da atual campanha contra o retrocesso arrogante em plena democracia:

Vai que Eduardo Cunha esteja fazendo bem ao feminismo. O fato é que a truculência conservadora e o cinismo inabalável do presidente da Câmara, ao declarar que qualquer projeto sobre o aborto teria que passar sobre seu cadáver, ao lado de declarações não menos truculentas sobre a homoafetividade, levaram centenas de mulheres, homens e crianças à rua nestes últimos dias no Rio, São Paulo, Brasília, Salvador e Recife — sem falar na performance da atriz Luciana Pedroso que, nua em pelo, desfilou em frente à Câmara rejeitando o PL 5.069/13 e os estereótipos da beleza feminina.
A palavra de ordem “tire seus rosários dos meus óvarios”, repetida e pichada pelas “Mulheres do Cunha”, quase vira meme semana passada. Ainda na esteira do clima intempestivo que vem sendo criado pelo deputado, o último Enem abriu espaço para a discussão sobre a discriminação contra a mulher.
Na sequência, depoimentos assolaram as redes com a hashtag #primeiroassedio. Tudo indica que as mulheres estão fartas da desigualdade e da violência física ou verbal que ainda rondam seus passos. O novo feminismo está no sangue, não mais na cabeça. É alegre, agressivo e visceral. Recebi um e-mail de minha amiga Marcia Tiburi dizendo: “Sabe o que eu inventei?
O Partido Feminista Democrático”, baseado na evidência de que o modelo político tradicional esgotou sua potência. Dizia o convite para a primeira reunião na sede da OAB: “Está na hora de uma política dialógica, criativa e participativa..”. Novidade à vista.
Na universidade, um dos temas top para pesquisas e teses é a princesamania entre crianças de 0 a 10 (essa é uma luta feminista que, com a vivência que tenho do caso, acho das mais difíceis de serem vencidas). Já a “Capitolina”, (a nova Capitu customizada) chega como uma publicação jovem on-line, meio diário, meio facebook, mas cheia de opiniões, desenhos e tags conscientes dos direitos femininos. Na edição com o título “Respeita as mina!”,  as adolescentes botaram pra quebrar:
“Sério, imagino que todas estamos exaustas de sofrer a opressão dia a dia, do jeito que só nós sabemos como é, e chegar o 8 de março para sermos ‘cultuadas’ da pior maneira possível”.
Descobrindo que 98,5% dos termos são desconhecidos de suas amigas, a editoria de “Capitolina” publicou um glossário sensacional para que todas possam se engajar, com mais conhecimento de causa. Sucesso teen na internet.
E, para terminar, as meninas estão mais lindas do que nunca. Exemplo disso são minhas quatro netas Dora, Catarina, Julinha e Violeta, com a permissão de Zu e Alice.
Zuenir Ventura
Do Blog do Noblat
Texto retirado do blog O mundo como ele é

Você precisa conhecer mais sobre Hannah Arendt

Você precisa conhecer mais sobre Hannah Arendt

Hannah Arendt, filósofa que dá nome ao filme de Margarethe von Trotta, é autora de uma das obras filósoficas mais importantes do século 20. A diretora opta por retrarar a filósofa como uma pessoa comum, a professora envolvida com seu trabalho acadêmico, suas aulas e pesquisas. Fixa o enredo do filme no período em que Hannah Arendt escreveu seu polêmico Eichmann em Jerusalém. Tenta mostrar o que se passava com a filósofa, o cenário que a motivou a escrever o livro cujo conteúdo foi tomado por muitos como um escândalo. O motivo era a análise desmistificatória de Adolf Eichmann, o carrasco nazista capturado na Argentina e julgado em Jerusalém em 1962. Esperava–se desse homem que fosse um monstro, um ser maligno, um louco, cruel e perverso. A percepção de Arendt acerca do caráter desse personagem histórico, de sua postura comum que o fazia igual à tanta gente, causou mal estar.

contioutra.com - Você precisa conhecer mais sobre Hannah ArendtFoi justamente a postura de Eichmann que permitiu a Arendt cunhar a ideia tão curiosa quanto crítica relativa à “banalidade do mal”. Por banalidade do mal, ela se referia ao mal praticado no cotidiano como um ato qualquer. Muitas pessoas interpretaram a visão de Arendt como uma afronta à desgraça judaica, enquanto ela – filósofa descomprometida com qualquer tipo de facção, religião, partido ou ideologia – tentava entender o que
realmente se passava com a subjetividade de um homem como Eichmann.

 

Arendt não tomava sua condição de judia como superior à sua posição como pensadora comprometida com a compreensão de seu tempo. A condição judaica era, para ela, condição humana. Não menos, não mais. O problema da subjetividade, das escolhas éticas que implicam liberdade e responsabilidade, era a questão central no momento em que se tratava de pensar e realizar a política.
A performatividade da tese
No filme, fica claro que aqueles que se manifestaram furiosos ou ofendidos contra a tese de Arendt de fato não a compreenderam. Isso porque a tese da banalidade do mal é uma tese difícil, não por sua lógica, mas por seu caráter performativo. Aquele que é confrontado com ela precisa fazer um exame de sua consciência particular em relação ao geral e, portanto, de seus atos enquanto participante da condição humana. A banalidade do mal significa que o mal não é praticado como atitude deliberadamente maligna.  O praticante do mal banal é o ser humano comum, aquele que ao receber ordens não se responsabiliza pelo que faz, não reflete, não pensa. Eichmann foi caracterizado por Arendt como uma pessoa tomada pelo “vazio do pensamento”, como um imbecil que não pensava, que repetia clichês e era incapaz de um exame de consciência. Heidegger, o filósofo nazista que diz ter se arrependido de aderir ao regime, era, no entanto, um gênio da filosofia e, contudo, não era diferente de Eichmann.
Aterrador, no entanto, é que entre Eichmann, o imbecil, e Heidegger, o gênio, esteja o ser humano comum. Eichmann não era diferente de qualquer pessoa, era um simples burocrata que recebia ordens e que punha em funcionamento a “máquina” do sistema, do mesmo modo que cada um de nós pode fazê-lo a cada momento em que, liberado da reflexão que une, em nossa capacidade de discernimento e julgamento, a teoria e a prática, seguimos as “tendências dominantes” como escravos livres, contudo, de si mesmos.  Sair da banalidade do mal é fazer a opção ética e responsável na contramão da tendência à destruição que convida constantemente cada um a aderir.
A banalidade do mal é, portanto, uma característica de uma cultura carente de pensamento crítico, em que qualquer um – seja judeu, cristão, alemão, brasileiro, mulher, homem, não importa – pode exercer a negação do outro e de si mesmo.
Em um país como o Brasil, em que a banalidade do mal realiza-se na corrupção autorizada, na homofobia, no consumismo e no assassinato de todos aqueles que não têm poder, seja Amarildo de Souza, seja Celso Rodrigues Guarani–Kaiowá, uma parada para pensar pode significar o bom começo de um crime a menos na sociedade e no Estado transformados em máquina mortífera.
Márcia Tiburi
Publicado originalmente na Revista Cult
texto retirado do blog O mundo como ele é

Os que amam de verdade odeiam viver de mentira.

Os que amam de verdade odeiam viver de mentira.

Nessas coisas de amor, você há de concordar comigo que quantidade e qualidade nunca se deram lá muito bem. Aliás, é bem certo que tudo aquilo que é demais cansa. Não sei você, mas eu não aguento essa história de que o amor “só é bom se for muito e transbordar e isso e aquilo…”

Não é possível! Será influência da tecnologia? A gente compra um celular com a tela enorme, logo exige um amor maior que seja páreo para o gigantismo da nossa sanha de posse. Ou tanto se orgulha do computador com a maior memória do mundo que obriga a criatura humana ao nosso lado a fazer upgrades impossíveis em suas qualidades amorosas. Aonde é que isso vai dar?

Sim, porque essa confusão só pode piorar e nos tornar piores. Quem disse que a fórmula “amor bom é amor demais” vale para todo mundo? E desde quando existe “amor ruim”? Amor é amor e amor é uma coisa boa. Ponto. Se não fizer bem, mal não pode fazer. Porque amor que faz mal não é amor. É outra coisa que a gente, por desespero ou pura falta de imaginação, apelida de “amor”. E isso é nada senão uma baita e vergonhosa mentira.

Já viu quanta gente aceitando mentir a si mesma? Sem sentir nada lá no fundo além de um vazio imenso e uma ânsia insuportável por preenchê-lo, o sujeito levanta os braços e grita “pronto, eu encontrei! É com esse que eu vou. Paixão louca, Meu Deus do Céu! Vou amar muito nesta vida e vai ser agora! Vou amar que nem louco, amar até virar um disco do Roberto Carlos. É isso… eu estou sentindo. Estou sentindo, sim. Estou sentindo amor!”

Ai de nós! Como se fosse possível, num estalo, escolher por quem, quando e onde se enlevar de amor verdadeiro, cometemos seguidos equívocos. Escolhemos um cristo e nele despejamos todas as nossas carências de uma só vez. Toma aí! Segura essa! Sem perceber, nos tornamos capazes de olhar a cara do outro e dizer: “você está me amando pouco! Assim eu não quero! Prefiro ficar só. Buáá!!!!”

E saímos berrando, os pés de criança birrenta pisoteando o chão em pirraça, insistindo na existência esquizofrênica do nosso mundo de mentira, cobrando de nossos pares perfeição amorosa, pró-atividade romântica, poderes premonitórios e outras proezas de super-herói. Cegos para o fato de que eles, pobrezinhos, são tão somente seres falhos, tão perdidos quanto nós mesmos e o cachorro que caiu do caminhão da mudança.

Criamos parâmetros impossíveis, sedimentamos exigências inviáveis e nos acomodamos na crença de que aceitar o que o outro nos tem a dar, ainda que o outro nos entregue tudo, é “se contentar com pouco”.

Quem somos nós para determinar o tamanho do amor alheio? Cada um dá o amor que tem e aceita quem quer! Além do mais, se não estiver bom para nós e chegarmos à conclusão de que já não é mais possível melhorar, que sigamos para outra.

Que história é essa de obrigar o amor? O amor não é obrigado a nada! Que tipo de maníaco, de maldito tarado há de achar que se pode amar na marra?

“Olha! Você deve me adorar assim, tá? É desse jeito que eu quero, sob o risco de eu achar que você está me amando pela metade, ou me amando um terço ou só um tiquinho e aí, já viu, vou enfiar minhocas enormes na minha cabeça, cobras peçonhentas, aranhas caranguejeiras e achar que sou pessoa mal acompanhada e essas coisas. Abre o olho! Você precisa me amar mais ou eu prefiro ficar só. É você quem sabe!”

E então nos tornamos isso. Chantagistas emocionais baratíssimos, atentando contra nossa própria dignidade, jogando baixo com aqueles que deveríamos compreender ou simplesmente largar o osso e deixá-los ir.

Sabe, eu tenho a impressão de que amor é coisa que a gente procura, sim, vai buscar, faz por merecer, mas que no fundo vem porque quer, quando quer, onde quase sempre a gente não espera. Uma vez chegado, a gente cuida. Amor se vive, se faz. Não se cobra como as parcelas do carro e da casa.

É amor ou não é. Pronto. Pavorosamente simples assim.

Verdade é que até agora não se pode enfiar amor à força no coração de ninguém. Eu sinto muito, mas os prodígios da ciência ainda não inventaram inseminação artificial para isso.

Repare bem. O mundo anda cheio de criaturas apregoando com a maior cara de santas, sob uma auréola luminosa: “eu não peço demais, só quero respeito e cumplicidade…” enquanto por dentro esgoelam “EU EXIJO QUE VOCÊ PARE TUDO QUE ESTÁ FAZENDO AGORA E RESPONDA JÁ A MINHA MENSAGEM OU VOU ACHAR QUE VOCÊ NÃO ME AMA MAIS!!”

E se isso não acontecer, se a tal reciprocidade fantasiada não se concretizar feito a fada madrinha empunhando uma vara enorme e amarela, a pessoa vai se achar preterida e mal amada. Vai dizer isso com os olhos lacrimejando e um tom de voz de gente esclarecida, compreensiva e evoluída enquanto represa em seu lá dentro uma fúria troglodita, um tacape em punho, pronta a largar uma porretada na cabeça de seu alvo amoroso e arrastá-lo para casa, onde irá amá-lo e respeitá-lo até que a morte ou uma vontade estranha de ir ao banheiro sozinha os separe.

Deus me livre, mas eu tenho a impressão de que a escassez enorme de amor que nos acomete também vem dessa mania bitolada de categorizar e racionalizar e rotular um sentimento nobre que, acossado por uma multidão de carentes ensandecidos o pressionando, desaparece e dá lugar a seu irmão gêmeo: o ódio de quem acha que amar e ser amado é mera responsabilidade alheia.

Falta amor, sim. Mas sua falta começa é aqui dentro de cada um de nós. Não na pobre da outra pessoa que escolhemos “amar”. É muito fácil acusar o outro de amar pela metade sem se dar conta de que nós lhe damos menos ainda. Tão simples reivindicar da vida “mais amor, por favor”, enquanto nos escondemos em trincheiras de ódio e desconfiança e preconceito.

Se é possível falar em culpa, ela é nossa. Muito nossa. Não das redes sociais e dos aplicativos de relacionamento como querem os gênios de plantão, vomitando o óbvio como se fossem descobertas incríveis.

Passou da hora de descermos do trono ridículo de especialistas da alma humana e assumir nossa imperfeição dolorosa de bichos carentes, famintos, fuçando as frestas à procura de um amor que nos valha, nos justifique e nos eleve.

Não tem fórmula mágica. Decerto, o amor do outro só começa quando encontramos o nosso aqui dentro e o cultivamos mais tarde, em algum lugar entre a desordem das paixões loucas e a vida ordinária. Cada um descobre o seu. E quando inventarem um mapa que nos leve até lá, será outra mentira deslavada.

Agora, se você me permite um tantinho de esperança, eu ainda sinto alegria de imaginar que amor de verdade é coisa que a gente alcança no caminho, quando aceita viver um dia depois do outro com menos frescura e mais leveza, menos má vontade e mais sentimentos honestos, menos indiferença e mais empenho. Menos balela e muito, mas muito mais vergonha na cara, por favor.

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