Por Claudia Antunes

Estou mal. Vítima de 26 dias vindouros, denominados ‘Inferno Astral’, que antecedem o meu aniversário. É uma espécie de TPM sem hormônios, que nos leva a crer que o melhor lugar do mundo fica numa caverna, no Himalaia. E sem monges por perto. Até eles me incomodariam. Sem qualquer som, até que viessem de flautas doces e harmônicas.
Preciso de um lugar que não conheço. Só sei que há uma chaminé, por onde sai a fumaça do café quentinho, adoçado no próprio bule. E que as toras de madeira estão empilhadas à espera do corte, direto para o fogão de lenha.
Não existe nada que me lembre o que tenho em volta. É um cenário de pintura campestre. O lado de fora de casinha é em tijolos aparentes. Uma pequena varanda tem apenas uma cadeira de palha, com uma mesa cambeta e três andorinhas de cerâmica azul-marinho, pregadas na parede. A sala é repleta de paninhos de crochê redondos, retangulares, que ficam sob bibelôs de gosto duvidoso. Mas era assim o passado e nele estou.

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Folheio revistas como o ‘Anuário das Senhoras’, para as moças casadoiras e as já ditas mulheres. Nada é objetivo. Uma freira ensina às leitoras como desvendar-se ao marido da noite de núpcias. Sob luz apagada, a noiva deverá deitar e cobrir-se até o pescoço, mantendo a respiração bem baixa. O esposo deitará, em seguida, removendo o lençol vagarosamente, para que a amada não se sinta amedrontada com o amor que ainda não conhece. Beijos? Carícias preliminares? Nada disso! Fechando os olhos e pedindo a Deus que esteja presente na junção carnal, a pobre coitada é, literalmente, invadida. E ainda deve permanecer controlando a respiração, sem poder ofegar. Após o ato consumado, retira debaixo do travesseiro um robe de chambre e caminha-se para o banheiro. Putz, que trauma! E tem que voltar asseada e deitar-se junto ao esposo, que não precisa cumprir nenhum ritual.
Mesmo assim, essas mulheres entregavam-se de corpo e alma a seus companheiros. Tinham muitos filhos e não se importavam com pequenas traições. Diante da morte de seu parceiro, usavam luto fechado por um ano e se enviuvassem muito cedo, iam para a berlinda outra vez.

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Mas estavam melhores do que eu. Diante do ‘inferno astral’, talvez chamado de crise neurastênica na época, ficavam deitadas com as cortinas fechadas, desmaiando, seguidamente, como camélias que caíam dos galhos.

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Claudia Antunes é carioca, jornalista e já trabalhou em jornais como Jornal da Tarde (SP), O Estado de S. Paulo, Jornal do Commercio e Tribuna da Imprensa e nas Revistas Manchete, Fatos & Fotos e Visão (atual Isto É). Jardim Botânico do Rio de Janeiro e INEA.







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