Meme foi pesadelo para jovem de Curitiba, mas se tornou conforto antes de seu falecimento

É possível que você não a conheça pelo nome, Stephany Rosa, mas certamente se lembre dela pelo vídeo que viralizou nas redes sociais em 2012. Nas imagens que viraram meme, a jovem curitibana tem um ataque de riso enquanto é entrevistada em um viatura da polícia após trr exagerado na bebida. Na época, a repercussão da entrevista foi tão grande que rendeu a Stephany uma alcunha que a acompanharia por toda a sua vida: “A bêbada de Curitiba”.

O reconhecimento pelo episódio que a tornou famosa na internet era uma constante cna vida de Stephany e, quase sempre, causava constrangimento para ela, que se envergonhava pela situação. Ela chegou até a buscar formas para tentar apagar o vídeo da internet.

No entanto, no fim da vida, quando Stephany descobriu um câncer de ovário, o meme acabou se tornando um apoio importante enquanto ela lutava contra a doença.

Nil Silva, a mãe de Stephany, publicou em 2022 o livro intitulado ‘Nosso Processo de Cura da Alma’. Na obra, que foi iniciada pela jovem no estágio inicial do tratamento contra a doença, Stephany reflete sobre a própria vida.

O surgimento do meme

Em seu aniversário de 22 anos, Stephany resolveu comemorar com colegas de trabalho em um restaurante da cidade de Curitiba (PR), onde morava. Quando estava saindo do estabelecimento, seguiu cambaleando em direção ao seu carro. Os policiais imediatamente  a abordaram.

A jovem, que estava bastante embriagada, acabou sendo detida. Equipes da imprensa local acompanharam o caso e registraram o momento.

Dentro do veículo da polícia, Stephany concedeu uma entrevista na qual proferiu palavras desencontradas e conversou de modo arrastado, evidenciando o seu estado.

A reação da jovem à sua detenção provocou risos em muitas pessoas e o vídeo se espalhou por toda a internet. Assim, ela se tornou a “bêbada de Curitiba”.

Após a detenção, Stephany foi conduzida a uma delegacia e liberada naquela mesma noite. Os pais dela só souberam dio ocorrido no dia seguinte.

Segundo Nil silva, a jovem chegou a fazer serviços comunitários após ser detida.

“Ela fez isso por um ano aos sábados. Não me recordo o local, mas lembro que ela até gostava de ir”, disse a mãe de Stephany à BBC News Brasil.

A repercussão do caso

Quando o vídeo viralizou na internet, Stephany estudava Direito – curso no qual ela se formou anos mais tarde. Então ela via o meme como um erro que poderia ser tornar um empecilho na sua futura carreira no meio jurídico.

“No início foi bem complicado. Ela sentiu vergonha e muitas vezes deixou de sair, porque sempre era abordada por alguém. Muitas vezes, ela queria se divertir e não lembrar do acontecido”, diz Nil Silva.

O que mais incomodava a jovem em toda essa história era o rótulo de “bêbada”, como ela mesma explicou em um vídeo compartilhado em seu perfil no Instagram: “Ninguém gosta de ser reduzida a uma coisa só. Parece que você passou oito anos da sua vida bebendo, a ‘bêbada de Curitiba’. Mas não foi isso que aconteceu, eu fiz muita coisa”, disse ela na postagem.

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A Doença

Em 2018, meses após ter empreendido uma tentativa infrutífera de banir da internet o vídeo da sua entrevista, Stephany passou a ter uma preocupação ainda maior do que a repercusssão de um episódio de anos atrás. Na época, ela estava estudando intensamente para o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) quando passou a sentir dores abdominais. Ela buscou atendimento médico, se submeteu a uma série de exames e acabou recebendo o diagnóstico: câncer de ovário.

O câncer de ovário é uma condição caracterizada pelo crescimento descontrolado de células malignas nos ovários, órgãos reprodutores femininos. É um dos tipos mais comuns de câncer entre as mulheres e, frequentemente, se desenvolve rapidamente, dificultando sua detecção em estágios iniciais.

“O chão se abriu mais uma vez, meus problemas referentes ao Exame da Ordem (porque estava estudando como uma louca e nunca estava satisfeita com meu desempenho) acabaram na hora, pois encontrei outra questão maior”, disse Stephany em um post nas redes sociais na época.

Durante o período da descoberta da doença, ela começou a escrever um livro. Na obra, Stephany colocou por escrito os seus sentimentos diante do câncer.

“Eu desejo que você não precise passar por um processo tão doloroso quanto um tratamento de câncer para se dar conta que você pode se tratar assim, com compaixão e flexibilidade. Você pode ouvir seu coração e ser guiado por ele”, escreveu Stephany em trecho do livro.

No hospital onde fazia seu tratamento, Stephany fez algumas amizades, incluindo o psicólogo Sidnei Evangelista. Ele define Stephany como uma pessoa alegre e que tinha muita vontade de viver.

“Eu a conheci na internação, durante os últimos seis meses dela. Ela tinha muita energia e gostava de contar sobre a história de vida dela. Dizia que os 30 anos (que ela tinha na época) pareciam breves, mas era um tempo em que ela viveu muitas alegrias, arrependimentos e conquistas”, conta o psicólogo.

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“Ela me disse: hoje você conhece esta Stephany, mas não essa do passado e me mostrou o meme. Nós rimos daquela situação. Ela falou que havia se transformado muito nos últimos anos e amadurecido bastante, principalmente após o diagnóstico de câncer”, comenta.

Mas os tratamentos de Stephany começaram a não fazer mais efeito. Ela se tornou uma paciente paliativa, ou seja, passou a receber apenas tratamento para amenizar as dores e ter mais conforto.

Nessa época, ela resolveu buscar uma qualidade de vida melhor. Com esse objetivo, criou uma vaquinha virtual com uma meta de arrecadação de R$ 20 mil.

Ela pretendia usar o dinheiro para custear itens como terapia, alimentação saudável e fazer adaptações na casa da família para quando fosse liberada pelo hospital.

Durante a vaquinha, o vídeo de Stephany voltou a viralizar. Mas dessa vez, de maneira positiva.

“Quando a Ste compartilhou a vaquinha, não comentou nada sobre ser a menina do meme. Mas aí alguns conhecidos começaram a compartilhar, contando que a menina do meme estava pedindo ajuda. E aí isso começou a ser muito divulgado e compartilhado”, contou a advogada e escritora Carol Gaertner, que era amiga de Stephany.

Segundo a família da jovem, o vídeo foi fundamental para a vaquinha e acabou ajudando na arrecadação. Ela conseguiu R$ 123 mil, seis vezes mais do que tinha inicialmente estipulado.

A vaquinha serviu como uma ajuda emocional muito importante para Stephany, porque inúmeras pessoas se lembraram do meme de 2012 e enviaram mensagens de apoio. Ela e a mãe passavam horas lendo as mensagens. “Isso, com certeza, alegrou muito os dias dela no hospital”, conta Nil.

Infelizmente, Stephany nunca conseguiu desfrutar dos benefícios do dinheiro que arrecadou, pois faleceu logo depois, em julho de 2020.

“É impossível medir a dimensão da dor da perda de um filho. É sentir que a vida nos jogou para o lixo. Não conseguimos mensurá-la, é uma dor única, intensa, egoísta e gigante. A perda de um filho é ferida que não cicatriza. É conhecer a decepção mais profunda. É para toda a vida”, escreveu Nil no livro.

O falecimento de Stephany causou forte comoção nas redes sociais e repercutiu na imprensa. Muitas pessoas lamentaram o fato e relembraram o meme.

Hoje, a família da jovem já não pensa mais em buscar formas para banir o vídeo da internet.

“Se retirar o vídeo da internet não era mais o objetivo dela (no fim da vida), também não vai ser o nosso. E isso, que um dia incomodou, não incomoda mais, pois conseguimos ver um lado bom nisso no período em que ela estava doente”, comentou Nil.

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Redação Conti Outra, com informações da BBC News.
Fotos: Reprodução/Arquivo Pessoal/Redes sociais.







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