Mal humorada? Eu? O desabafo de uma distímica

Por LÍVIA RODRIGUES MACHADO

Novembro de 2014: foi o mês em que eu recebi o diagnóstico de Distimia, após dois meses frequentando a psicoterapia. Por recomendação da psicóloga, procurei também a ajuda de uma psiquiatra, que chegou à conclusão do mesmo diagnóstico.

Depois desse dia, foi como se os últimos anos de minha vida finalmente fizessem sentido para mim: o mau humor constante e a falta de disposição para realizar atividades banais do dia-a-dia se contrastavam muito com a minha imensa vontade de viver a vida.

Mas afinal, o que é Distimia? Segundo a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA), ela “é um tipo de depressão que faz parte do grupo dos transtornos mentais que interferem com o humor das pessoas”. Por isso, os psiquiatras a chamam de “Transtorno do Humor”. Ela se difere dos outros tipos de depressão porque seus sintomas são mais leves, porém, com longa duração, o que dificulta o diagnóstico (já que a convivência com os sintomas acaba se tornando “normal” ao longo dos anos).

De acordo com a ABRATA, somente no Brasil, 5 a 11 milhões de pessoas sofrem desse mal, representando 3 a 6 por cento da população mundial. Esses dados também são, muitas vezes, sinônimo de faltas no trabalho, obesidade e suicídio. Isso porque os distímicos muitas vezes não conseguem sentir prazer em atividades que antes se interessavam, têm dificuldades com o sono e o apetite, problemas de concentração, fadiga e, muitas vezes, pensamentos recorrentes de morte ou suicídio. Portanto, apesar dos sintomas de depressão menos acentuados, o transtorno acarreta um prejuízo muito grande para o indivíduo que sofre com a Distimia. No meu caso, ele favoreceu o meu desligamento de um estágio recentemente pois, em uma semana de crise, era impossível cumprir o horário do início do expediente.

Na época, eu estava tentando desenvolver o meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), e o estresse trouxe todos os sintomas à tona – de uma só vez. Porém, é desde o colégio que eu me lembro de me sentir assim: dormia na sala de aula, procrastinava trabalhos e obrigações, me atrasava para TODOS os compromissos (inclusive aqueles que me davam prazer) e tinha uma dificuldade imensa para simplesmente me levantar da cama. Era como se o peso do meu corpo se multiplicasse por dez e não me deixasse sair do lugar. Tais sintomas me acompanharam – e se intensificaram – durante os quatro anos de faculdade. Muitas vezes eles eram vistos como um descompromisso ou uma irresponsabilidade, algo que até eu comecei a questionar.

Chegar atrasada em reuniões e aulas da faculdade foram, muitas vezes, motivo de chacota para os colegas e alvo de críticas pela família, fazendo com que eu me sentisse cada vez menos estimulada a enfrentar as atividades diárias. Por mais que eu tentasse mudar esse ciclo, era quase impossível. Toda noite eu ia dormir pensando “amanhã vai ser diferente”, mas não era. Então uma dose de baixa autoestima me tomava por completo, e a minha única reação era chorar, sentir decepção e raiva de mim mesma. Afinal, na minha cabeça, eu era a causadora de todo esse estresse. E mudar só dependia de um único fator: eu mesma.

Naturalmente exigente, eu, nos meus 21 anos, não estava satisfeita com a vida que levava e finalmente procurei ajuda. Tive vontade de “sumir”, morrer e me isolar diversas vezes. O choro era constante e angustiante. Hoje, quase um ano depois, a vida segue mais leve.

Alguns medicamentos – todos prescritos pela minha psiquiatra – têm ajudado. Mas, principalmente, a psicoterapia, que me fez imergir em uma viagem dentro de mim mesma para buscar a solução dos meus problemas e ver a vida de outra forma, com olhos de esperança e de alguém que pode sim viver sem o “véu da Distimia” – como diz minha terapeuta.

Prova disso é que levantar às 7h da manhã, o que antes era impossível, tem se tornado mais fácil. Tomar a iniciativa para fazer uma atividade física finalmente é uma realidade, e o aspecto facial ao acordar é mais leve e alegre. Não que tudo seja as mil maravilhas: ainda assim, alguns dias são de mau humor, levantar tarde e querer evaporar. Isso porque o processo de melhora tem os seus altos e baixos. E além disso, quem disse que lidar com o acaso é fácil?

Mas a pergunta que não quer calar é: por quê? Já ouvi da minha dentista que isso é “falta de Deus no coração”, e já ouvi de pessoas próximas que isso era uma desculpa para não encarar a vida de frente. Todo mundo tem uma opinião para dar. Mas a verdade é que pode ser um fator bioquímico, genético ou ambiental. Ou os três juntos – talvez eu nunca saiba. O que eu sei é que o autoconhecimento, promovido durante a psicoterapia, tem me ajudado a enfrentar as lutas diárias. É um longo processo, nem sempre muito agradável, mas que vale a pena tentar. Se você se identificou com esse texto, não hesite em procurar ajuda. Converse com a sua família, amigos ou alguém de confiança e fale o que está sentindo. Acredite: quanto mais o tempo passa, maior é a sensação de ver a vida passando diante dos seus olhos enquanto você apenas observa, imóvel. Não adie a sua felicidade. A vida é muito bela – e curta – para ser postergada.

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