Loucura mesmo é não ter coragem de perder a razão.

Enlouqueça, sim! Você pode. Quem disse que não? Grite. Chore. Esperneie. Desequilibre-se. Jogue os pratos no chão. Desligue o telefone. Cancele seus compromissos. Suma dos olhos do mundo. Por favor, só não machuque ninguém nem atente contra a própria segurança! O resto pode. Está tudo certo. Você tem o direito de enlouquecer.

Quem nunca perdeu a razão na vida não é exatamente uma pessoa sã. É uma pessoa difícil de encontrar por aí. A maioria de nós já enlouqueceu, enlouquece e há de enlouquecer quando precisar. No entanto, mesmo nestes tempos insanos nos convidando a enlouquecer, os loucos não são bem-vindos.

Tanta pressão por perfeição nos obriga a fingir sanidade quando estamos à beira de um ataque de nervos e nem todo mundo é capaz de fazer uma loucura. Nem todos têm coragem de rasgar a roupa, tocar fogo na alma, mandar às favas pessoas intragáveis, espetar pontos finais no chão e escancarar o que já não pode mais sufocar lá dentro. Então a gente engole as próprias reações, suporta o insuportável, estica nossos limites em nome de uma falsa impressão de sobriedade e vai assim até não aguentar mais.

Definitivamente, é preciso perder a razão!

Vê quanta gente cheia de lucidez por aí? Vê quantos donos da verdade empurrando, batendo, insultando? Quantos seres perfeitos berrando sua visão pessoal e estreita das coisas, levando no grito, impondo sua vontade, sua força, sua versão dos fatos! Estão todos tão certos de sua sanidade mental, da perfeição de suas intenções, da infalibilidade de seus métodos que nem percebem o quanto parecem perfeitos idiotas.

Todos tão impecáveis! Tão crentes de que a única saída é aquela que eles já escolheram. Tão definitivos em acreditar naquilo que elegeram como verdade. Tão seguros em julgar a loucura do outro e defender sua absoluta sanidade.

Atacam com a fúria de um lobo cego, mentem, roubam, mascaram, manipulam. E o louco é sempre “o outro”. Afinal, enlouquecer é para poucos. A maioria prefere julgar os loucos fingindo que é sã.

Vê essa gente toda surtando de ódio e, ao mesmo tempo, reprovando os excêntricos, criticando os desequilibrados, julgando quem tiver a ousadia de pensar diferente? Estão todos sãos. Absolutamente sensatos, lúcidos, racionais. Explodindo consciência, babando entendimento dos problemas do mundo.

Você sabe. Há sempre uma multidão de equilibrados senhores sagazes apontando os dedos para meia dúzia de loucos inconsequentes. Já percebeu? Tudo quanto dá errado no mundo é culpa de um “maluco”. O que dá certo, por sua vez, é sempre consequência do trabalho sério, lúcido e ajuizado de circunspectos homens de negócios e pensadores intocáveis mergulhados em seriedade.

Na concepção pequena dos irrepreensíveis donos da razão, enlouquecer é coisa de gente irresponsável e leviana. Como se eles tivessem comprado o direito supremo e sagrado a todo bom senso que há no mundo. Assim, o louco é sempre o outro. E isso, você há de concordar, é de fazer qualquer santo perder a razão. Deixemos de coisa, então. Se precisar, aperte o botão e enlouqueça!







Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.