Lembranças de um espanador

Ao ler, Regina Machado, encontrei esta pergunta: “Você acha que seria capaz de conversar com um espanador”?
Imediatamente respondi que sim, pois, afinal, conheci e convivi com ele quase em toda a minha infância.

Ele era um assíduo frequentador de minha casa, ou melhor, residia no quarto de despejo e todos os dias vasculhava tudo o que tínhamos.

Lembro-me de agarrar nas pernas de minha mãe e implorar para que ela me deixasse espanar nossos móveis.

Naquela época, o espanador era muito solicitado, como é hoje o Bombril.

Somente não tomou o lugar da vassoura e do rodinho por achar – quem sabe – a limpeza do chão algo de menor valor.

Aparentava ser altivo e vaidoso com aquelas cerdas de fio de naylon e, confesso, sentia uma “invejinha”, porque sonhava em ter cabelos lisos como suas cerdas.

Nas mãos das funcionárias, virava um furacão! Espanava tudo, levantando rapidamente toda poeira que desejasse permanecer escondida. No fim de semana, davam-lhe um banho e o colocavam para secar ao sol, e quando começava a ficar careca era trocado por um novo.

Sempre achei isso uma maldade dos adultos!

Agora, confiante, faço uma confissão: sentia um intenso medo de ser trocada por outra filha, caso ficasse careca. Desta forma, chorava baixinho, quando minha mãe queria me pentear.

Para agradá-la e evitar essa possível catástrofe, elaborava um plano que me parecia infalível: iria cortar o rabo do peru que vivia no quintal da casa de minha avó, o qual seria saboreado com farofa na “Ceia de Natal” e…

Todavia como o tempo não para, fui crescendo, o mundo transformando-se e o infeliz espanador foi perdendo sua majestade!

Um belo dia, meu pai chegou do trabalho com uma caixa enorme dizendo que era um presente para minha mãe.Todo orgulhoso abriu o pacote e a mamãe deslumbrada apaixonou-se por um potente aspirador de pó.

O velho espanador foi, definitivamente, aposentado transformando-se em brinquedo. Às vezes, era um cavalo alazão, outras um belo príncipe encantado e, assim, tínhamos longas conversas…

Mas sobre o quê conversávamos? Ah! Não me lembro mais!

Imagem de capa: Solomiya Malovana/shutterstock







Psicóloga , escritora e avó apaixonada pelo seu neto e pela vida. Autora do livro "Varal de sonhos" e feliz demais com os novos horizontes literários que se abrem.