A era do medo crônico

Imagem de capa: Everett Collection, Shutterstock

Tenho me deparado nos últimos tempos com pessoas que sofrem de medo crônico:

Medo de andar sozinho na rua, medo de dormir de janela aberta e algum bicho entrar; medo de perder a carteira, medo de se atrasar, medo de comer algo e passar mal, medo de perder algum prazo, medo de perder o (a) namorado (a), medo de ser incompreendido, medo de não realizar os próprios sonhos.

É claro que a falta de segurança nos grandes centros urbanos, bem como o aumento da violência, contribuem para o crescimento desse tipo de sentimento, e é claro também que devemos nos manter alertas para evitar certos perigos reais. Caminhar na orla do Rio de Janeiro ou na Avenida Paulista às onze da noite falando distraidamente num iPhone, por exemplo,  é dar sopa para o azar. Uma pena que seja assim, mas…

Uma pessoa que já foi assaltada diversas vezes, logicamente terá medo de passar pelo desconforto novamente. Como diz o velho ditado, “gato escaldado tem medo de água fria”. A instabilidade econômica também gera um medo real de perdermos nossos empregos, isso é natural.

Mas será que todos os nossos medos são reais?

Desconfio seriamente que não. E desconfio, também, que se não lutamos contra esses fantasmas eles acabam proliferando e se tornando um modo de ver a vida e, portanto, de estar no mundo.

Isso não seria um problema, se a mente condicionada no medo não gerasse tanto desconforto e sofrimento e não impedisse avanços e conquistas.

Para quê serve o medo, afinal? Numa primeira instância, para nos proteger. Ok. Porém ele nos protege de quê, exatamente?

Talvez de nós mesmos. Talvez da surra que daremos em nós mesmos se cometermos algum erro, se dermos mole em algo.

Tenho notado que as pessoas mais condicionadas na energia do medo são aquelas que exigem muito de si e não se permitem errar; pessoas que se preocupam demais com o que os outros possam falar ou pensar delas, que se maltratam em demasia quando cometem um pequeno deslize e que são, portanto, extremamente vaidosas.

O que pode nos levar a crer que o medo talvez possa ser um efeito colateral da vaidade, não?

O vaidoso não é aquele que cuida da aparência ou que se julga acima do bem e do mal. O vaidoso é aquele que não suporta a ideia de não ser bem quisto e bem visto por todos –  o que é impossível, nem Jesus Cristo e o brigadeiro de panela conseguiram essa façanha.

O contrário do medo não é a coragem. Corajosos são os que sentem medo e prosseguem apesar do medo.

O contrário do medo é a humildade. A humildade de reconhecer os próprios limites, de saber-se falho por natureza, de não querer agradar a todos, de não esmorecer diante de uma crítica, de saber-se impotente diante do grande mistério chamado “vida”.

Todavia ninguém padece de vaidade porque quer, trata-se de um mecanismo de defesa como qualquer outro, e, como qualquer outro mecanismo de defesa, acaba ativando emoções nada gratas, como o medo.

Sente medo quem não quer perder a admiração de alguém. Sente medo quem não conhece a própria força. Sente medo quem finge ser o que não é. Sente medo quem precisa desesperadamente de amor – não o amor das carnes, o amor do meio-dia, mas o amor pelo que se é; o amor que aceita e conforta, que dá sentido às coisas e que, ao invés de despir, oferta a melhor das roupas: a nossa própria pele.

É quando estamos nus de nossas vaidades e vontades que os medos se transformam no que realmente são: pequenos brincos perdidos no chão.







Mônica Montone é formada em Psicologia pela PUC-RJ e escritora. Autora dos livros Mulher de minutos, Sexo, champanhe e tchau e A louca do castelo.