Amar só é bom se trouxer paz

Caio F Abreu dizia que “amar só é bom se doer”, e insistia que precisava machucar um pouco mais seu coração, doer mais um pouco seu corpo e fatigar mais seus olhos. Talvez isso lhe trouxesse calmaria, talvez não. Eu gosto de pensar que amar só é bom se trouxer paz. Se promover dentro de mim uma sensação de certeza, de ter feito a escolha correta, de acolhimento e reciprocidade.

Gosto muito da música “Tocando em frente”, de Almir Sater. Gosto especialmente do trecho que diz: “é preciso paz pra poder sorrir”. Como é que a gente consegue tocar em frente tendo dentro da gente um amor que nos rouba a paz? Como é que a gente descobre o próprio dom de “ser capaz e ser feliz” se permanece atado à inconstância, ao silêncio, à indiferença e à falta de reciprocidade que só uma relação ruim é capaz de proporcionar?

Tem gente que nos deixa com a “pulga atrás da orelha”. Viver com a “pulga atrás da orelha” tumultua nosso equilíbrio interior e nos impede de ser como somos, livres de manias de controle, ciúmes, insegurança, inquietação e carência. Tem gente que não vale a nossa paz. Gente que nos provoca desconfiança, diminui nossa leveza e desperta uma versão de nós mesmos mais apreensiva, angustiada e ansiosa.

Amar só é bom se trouxer paz. Se nos ajudar a atravessar a vida e suas imperfeições, se despertar nossa coragem e amor próprio, se permitir que possamos revelar nossa doçura, alegria e, vez ou outra, alguma loucura.

O amor não é tábua de salvação para todas as nossas angústias e inquietações, mas pode nos aproximar da cura. Pode nos trazer um tipo de paz e certeza que valida e justifica a existência, e nos autoriza a acreditar em nós mesmos, buscando ser melhores conosco e com os que nos cercam.

É preciso acreditar que existem amores assim, que contribuem para nossa evolução e nos trazem paz. Isso nos dá a certeza de que o mundo ainda é um lugar bom, e que é possível ser feliz na companhia de alguém.

Viver é um exercício de aceitação, perdão e paciência diante das demoras e esperas. Encontrar alguém disposto a atravessar os desertos conosco, sabendo que haverá sede e pedras, silêncios e ausências, com o mesmo ânimo com que compartilha nossos momentos de alegria, música boa, café quentinho e lençóis cheirosos é descobrir que também somos merecedores de consideração, bem-querer ilimitado e ligação plena, simplesmente por sermos quem somos.

Querer estar ao lado de alguém que só nos faz mal e nos machuca repetidas vezes é escolher perpetuar uma história de dor. Não sabemos onde essa história teve origem, mas sabe-se que quando uma pessoa se cura, ela ajuda as gerações vindouras a se curarem também. Então, se você não faz por você, faça por aqueles que virão depois de você. Rompa esse ciclo de autopunições e aprenda a reconhecer o que é bom, o que lhe torna uma pessoa melhor, o que lhe traz paz e certeza de estar no lugar certo.

“É preciso paz pra poder sorrir”. Que hoje haja paz dentro de você, e que, mesmo enfrentando dificuldades, ausências e impossibilidades descubra que uma mente sossegada e uma alma tranquila são mais importantes e trazem mais benefícios à saúde que qualquer desejo não satisfeito de seu coração. Que as coisas que lhe despertam, instigam e movimentam não sejam as esperas nem as faltas, mas a certeza de que o amor pode ser leve, manso, equilibrado… e capaz de lhe fazer sorrir todos os dias…

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Photo by Pablo Heimplatz on Unsplash







Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.