Por Claudia Antunes

contioutra.com - 'A inconsistência do mito'

Aquele cara com jeito de intelectual doidão entrou na minha vida já faz tempo: em 1966, concorrendo com uma música interpretada por Nana Caymmi, no Festival Internacional da Canção, sediado aqui no Maracanãzinho. Cabelos pretos e lisos, com divisão do lado, olhos levemente puxadinhos, complementados por um sorriso largo e dentes meio desalinhados. A voz animada, às vezes entremeada por um pigarro, estava de acordo com as mãos, que exibiam um gestual em exagero. Os palpites engraçados e inteligentes só poderiam gerar ideias fantásticas, uma até com jeito de Broadway, mas totalmente adaptável para o Rio de Janeiro.

Era a cara de uma juventude que estava sem referencial musical, principalmente, pelas perseguições dos censores da ditadura. Uma de suas maiores curtições foi contratar cinco garçonetes que serviam no ‘Dancin Days’, discoteca instalada no Shopping da Gávea, na Zona Sul do Rio. Rolava o ano de 1976. A casa noturna era pintada de preto e rosa em seu interior, algo que remete à sensualidade feminina. As garçonetes eram o máximo, super maquiadas, com aventais curtíssimos em renda, complementados por meias fumê.

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Por volta de 1 hora da madrugada, abandonavam as bandejas e voltavam exuberantes, soltando a voz entre urros da plateia, de se ouvir na rua Marquês de São Vicente, tranquila àquela hora. Sandra Pera, então cunhada do cara, foi a primeira convidada para o posto de garçonete. Arrebanhou Regina Chaves, Leiloca e Lidoca, egressas do Dzi Croquettes. Em seguida, a cantora Dhu Moraes passou a bater o ponto e o sexteto foi fechado com Edyr de Castro, que participou do musical Hair (‘a tigresa de unhas negras e íris cor de mel’, com que Caetano nos presenteou). Estava criado um dos grupos mais originais e talentosos daquela década. ‘As Frenéticas’ tinham, ainda, o suporte técnico de Roberto de Carvalho, então namorado de Rita Lee. Estouraram nas rádios, com trilha sonora e música de abertura de novelas, em todas as discotecas possíveis e inimagináveis. Fizeram a maior peça publicitária da TV brasileira, em horário nobre para todo o país, com 25 minutos no ar: era o lançamento do Barra Shopping, um empreendimento de peso que iria sacudir a Zona Oeste da cidade, captando moradores das Zonas Sul e Norte.

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É desse Nelsinho Motta que eu falo hoje. Compositor, jornalista, escritor, roteirista, produtor musical e um grande letrista.
Que surpresa boa assistir ao primeiro capítulo da minissérie ‘O canto da sereia’, transportada para a TV do livro homônimo dele.

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Isis Valverde linda como baiana, tinhosa e venerada por um povo que se pudesse, passava a vida rondando um trio elétrico. Nenhum exagero. Situações cabíveis no cotidiano de Salvador. Atores escolhidos a dedo, diálogo forte, política arranhada, deboche, mistério, tragédia e suspeitas. Perfeito!

Claudia Antunes é carioca, jornalista e já trabalhou em jornais como Jornal da Tarde (SP), O Estado de S. Paulo, Jornal do Commercio e Tribuna da Imprensa e nas Revistas Manchete, Fatos & Fotos e Visão (atual Isto É). Jardim Botânico do Rio de Janeiro e INEA.







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