Se a sua vida passa por e-mails, logins e videochamadas, “Desaparecida” cutuca um ponto frágil: quanto da nossa rotina digital pode ser usado a favor — ou contra — a gente.
O filme segue June (Storm Reid) tentando achar a mãe, Grace (Nia Long), que some durante uma viagem. O detalhe que move tudo: a investigação acontece com o que cabe numa tela. Senhas, histórico, câmeras públicas, backups.
Cada clique empurra a história alguns passos à frente… ou abre uma cilada. É o tipo de thriller que transforma cursor em pista e notificação em alarme.
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O roteiro começa com um gesto simples: conferir se a mãe chegou bem à Colômbia com o novo namorado, Kevin (Ken Leung).
O atraso no retorno troca cortesia por protocolo. Entram polícia, embaixada, prazos e formulários — e a percepção de que respostas oficiais demoram. Diante desse relógio burocrático, June decide agir por conta própria.
O que, inicialmente, seria acompanhar um voo vira montar uma linha do tempo com hora, endereço e pessoas lastreadas por dados verificáveis.
Daí vêm as táticas. June recupera senhas, varre e-mails, cruza agendas, rastreia aparelhos, consulta imagens de rua, lê metadados de fotos e checa nomes em cadastros públicos. A cada cruzamento bem-sucedido, o objetivo muda: deixar de “achar” para provar — e provar para quem.
Quando os dados ligados a Kevin começam a apresentar inconsistências (pagamentos estranhos, alias, lacunas no passado), surge a dúvida de ouro: e se parte das “pistas” foi plantada? A reação de June é dobrar a verificação por uma segunda fonte.
Para reduzir a distância, ela contrata Javi (Joaquim de Almeida), um faz-tudo na Colômbia que vira olhos e mãos no terreno: confere recibos, conversa com funcionários, revisita lugares.
A presença dele muda o ritmo da busca. Um detalhe em câmera de segurança derruba um comprovante anterior; um CPF abre uma rota que ninguém tinha visto; um nome antigo reescreve uma lembrança. A narrativa mantém a causalidade firme: entrou dado novo, muda risco, objetivo ou prazo.

Quando parece que o mapa está claro, a história faz o primeiro giro. Uma peça do passado familiar — Heather (Amy Landecker) — devolve perguntas no lugar de respostas.
June percebe que não procura só o paradeiro da mãe; precisa entender por que aquela viagem existiu e o que ficou fora das conversas em casa. O filme amarra essa virada às ações da protagonista: nada cai do céu, tudo nasce do trabalho de mineração digital que ela mesmo iniciou.
A escalada chega quando a investigação deixa rastros. Ao acessar várias contas e cutucar conversas arquivadas, June chama atenção de quem preferia silêncio. A partir daí, o “clique seguro” dá lugar a risco físico.
Uma isca bem armada estreita a margem de erro e empurra a personagem para fora do quarto. Menos abas, mais consequência imediata: uma decisão errada não trava o app, compromete gente.

O desenho formal não é enfeite; é linguagem. Direção e montagem (Will Merrick e Nicholas D. Johnson) usam o formato de telas para transformar informação em ação. O cursor que hesita antes de enviar uma mensagem indica receio verdadeiro.
Time-lapse de abas abertas comunica noite virada pesquisando. Troca de fonte de vídeo muda ponto de vista e reposiciona o público na investigação. Quando notificações empilham, o filme acelera porque o prazo encurtou — sem truques artificiais.
Os coadjuvantes têm função concreta no encadeamento. Kevin é a variável de confiança: se mente, tudo ligado a ele exige tripla checagem. Javi equilibra a história com evidência física num caso tocado a distância.
Veena (Megan Suri) sustenta June técnica e emocionalmente quando a fadiga bate. O agente Park (Daniel Henney) delimita risco legal e o alcance do que uma pessoa comum consegue fazer sem sair do limite. Cada um entra em cena para mexer na equação, nunca para preencher espaço.
Há também um pano de fundo que enriquece a experiência: “Desaparecida” herda e atualiza o formato “screenlife” popularizado em “Buscando…” (“Searching”), trocando o pai desesperado pela filha autodidata no uso de ferramentas digitais.
O filme sabe que tecnologia não resolve tudo — mas revela. À medida que June costura dados, as certezas mudam de lugar e o espectador passa a desconfiar do Wi-Fi, sim, mas principalmente das versões que parecem convenientes demais.
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