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Trabalhe mais, atrapalhe menos. Quem gosta de gente pesando é balança.

Não, o mundo não vai estacionar ali na esquina para você descer, não. Ele segue de qualquer jeito. Atropela quem estiver na frente. Evolui aqui, regride ali. Vira e mexe desanda. Mas parar, assim, de vez, não para, não.

Juro, eu juro que faço uma força danada para ouvir acordado o seu discurso da lamentação, “porque a humanidade caminha para o nada e nós vamos todos morrer e a mega sena não sai para ninguém e blá blá blá…”. Eu juro que tento, eu tento, sim. Mas não dá. Eu não consigo passar dois segundos atento ao seu sermãozinho de sempre. Logo me ponho a compor mentalmente listas de compras no supermercado, repassar a cena do filme que vi ontem, cantarolar baixinho aquela canção do Roberto.

Olha, os especialistas em doenças do sono deviam descobrir e pesquisar você. A sua conversa mole é capaz de fazer cair no sono o mais vigilante dos guardas noturnos. Adormecem o caminhoneiro mais viciado em rebite e outras drogas estimulantes. Suas teorias furadas e conspirações sem pé nem cabeça bem podiam ser usadas para fins médicos. Drogas por drogas, as suas decerto venderiam mais que clonazepam e ritalina.

Você não me leve a mal, não. Mas isso para mim é falta do que fazer, sabe? Choramingação de quem odeia trabalhar, não suporta assumir e encarar suas imperfeições, detesta olhar para dentro, resolver suas próprias questões. Então empaca na janela e se põe a cuspir suas frustrações em quem passa lá fora.

Desculpe dizer assim, na lata. Mas quem de fato tem feito alguma diferença para este mundo, este que você anuncia estar no fim, é aquela gente que prefere investir no trabalho o tempo que lhe foi conferido aqui embaixo. Gente que não perde um só instante com queixumes e lamúrias. Põe as mãos na massa, o pé na estrada, a cabeça pra pensar e faz alguma coisa.

É a menina que criou uma horta para alimentar quem não tem o que comer, o padre católico que emprestou sua capela para o culto de evangélicos cuja igreja fora destruída em Mariana. São os cidadãos que adotam crianças, animais abandonados, novos gestos. Os estudantes que foram ocupar as escolas em protesto contra um governo cínico, decidido a esculhambar mais um pouquinho um ensino público já tão apodrecido. Os voluntários que dedicam seu tempo livre para entreter crianças em hospitais e velhinhos em asilos.

Porque você sabe, né? Tem gente que dá do que tem, gente que dá do que fez e gente que dá do que é. Não importa o que de bom a gente dá. Importa que a gente o faça.

O mundo vai girando firme e forte. E a vida que acontece aqui só não é insuportável por conta do empenho dessa gente. É no amor de pessoas assim que o que há de bom se sustenta e se multiplica. Não no trololó boboca e na choradeira das quais você tanto se orgulha de ser adepto.

Faz o seguinte. Nem que seja por um só dia, arrume o que fazer. Trabalhe mais, reclame menos. Dedique-se com amor e fúria a uma coisa boa. Qualquer coisa boa. Apesar do trabalho pesado que isso vai dar, eu tenho a impressão de que você vai viver melhor e dormir mais leve. Logo, vai pesar menos na vida de quem é obrigado a viver perto de você. Se é que ainda existe alguém por perto.

André J. Gomes

Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.

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André J. Gomes

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