Baixar a guarda

Essa semana tive a honra de conhecer de perto uma das atrizes brasileiras que mais admiro: Maria Alice Vergueiro. Você deve conhece-la daquele vídeo divertido, o “Tapa na Pantera”, mas posso te garantir que ela é muito mais do que isso. Ela é uma das mentes mais geniais do teatro nacional. Sou fã mesmo de carteirinha.

Perguntaram para Maria Alice como era refletir sobre a própria morte, tema central da peça pela qual tem sido ovacionada nos últimos anos – Eu parei de duvidar. Quando alguém chega e diz pra mim que gosta de mim, eu decidi não duvidar mais. Tem sido incrível isso – explicou, com a fala já mais ralentada pelo Alzheimer e pela idade avançada. A genialidade de Maria Alice se estende para além dos palcos e inunda a vida de mais vida.

Temos sido condicionados a temer o outro, duvidar do próximo, para nos mantermos sempre com os dois pés atrás, quando não distantes. A cada decepção nos fechamos um pouquinho mais, aumentamos nosso muro, nos retiramos das relações para observá-las com mais desconfiança. Em quantas pessoas você pode dizer que pode confiar? Poucas, bem poucas – muita gente repete. E isso é mérito? Sei não.

A gente duvida do afeto, põe à prova os elogios de quem nos adora, trucamos o amor de quem está sempre lá por nós. Nos acostumamos a temer as tentativas dos desconhecidos de se aproximar, dificultamos as tentativas de quem nos feriu de se reaproximar. Seguimos implodindo as estradas que nos ligam até os países fronteiriços. A ordem é fechar e perguntar depois. Duvidar e tentar depois. Dizer ‘não’ e ‘talvez’ só depois.

Talvez pudéssemos aprender um pouquinho com alguém que já viveu tanto e certamente se decepcionou na mesma proporção. No final das contas, baixar a guarda, ter um tantinho de fé, aceitar a mão estendida e o sorriso aberto, talvez possa nos levar de volta até aquele ponto do caminho do qual temos sentido falta. Eu pelo menos sinto.

Você lembra? Quando as relações eram mais honestas, próximas e descomplicadas? O mundo mudou tanto assim ou foi a gente que se trancou pra dentro de casa? É o medo que nos divide, que nos separa e que impede a gente de viver a verdade. Da próxima vez que alguém disser que te adora, faça esse exercício, apenas não duvide logo de cara. Vale o risco. E, Maria Alice, te admiro muito. Jamais duvide disso.

Diego Engenho Novo

Escritor, publicitário e filho da dona Betânia. Criador do blog Palavra Crônica, vive em São Paulo de onde escreve sobre relacionamentos e cotidiano.

Recent Posts

Novidade na Netflix: Glen Close e Mila Kunis arrancam lágrimas e aplausos em filme arrebatador

É impossível não se emocionar com a história profundamente humana e as atuações fenomenais que…

1 dia ago

Viúvo de Walewska quer que pais da jogadora paguem aluguel para morar em apartamento deixado pela filha

"Ele mandou uma notificação sem autorização judicial informando que os pais dela ou pagarão a…

1 dia ago

Desaparecimento de Madeleine McCann completa 17 anos e pais fazem declaração: ‘Vivendo no limbo’

Dezessete anos se passaram desde que Madeleine McCann desapareceu do quarto de um resort na…

2 dias ago

Pai é acusado pela morte do filho após obrigá-lo a correr em esteira em alta velocidade

O pai alegou que obrigava seu filho de 6 anos a correr em uma esteira…

2 dias ago

Mecânica de jogo: O coração da emoção de Aviator

Na nossa análise exaustiva, mergulhamos na mecânica do Spribe's Aviator, analisando como o seu formato…

2 dias ago

Show da Mandonna: Fiscais encontram facas enterradas na areia de Copacabana

Na madrugada desta sexta-feira (3), a Secretaria de Ordem Pública (Seop) do Rio de Janeiro…

2 dias ago