“Menina não pode brincar disso, menino tem que jogar aquilo”: a poda e encaixotamento de pessoas que ainda hoje vivemos

Uma das lembranças mais antigas que tenho é a de brincar com meu primeiro amigo, com meus 4, 5 anos, no pátio com os carrinhos dele.

Lembro-me do dia em que as professoras não aguentaram mais e me vieram com a “proposta” de ir brincar com as outras meninas. Fui, mas fui chateada. As brincadeiras das meninas eram sem graça! Eu queria mesmo era brincar com os carrinhos do meu amigo. Que droga!

Outra cena interessante. Nessa época eu já tinha 8 ou 9 anos de idade: estou eu, a única (ou uma das únicas) menina que jogava futsal com os guris da minha sala preparada para bater o pênalti. Mateus no gol. Momento de tensão. Bati! […]

GOL!

Todos os garotos correm para dar tapas na cabeça de Mateus, gritando que ele “levou gol de mulher”. Fica Mateus humilhado e Mísia confusa, sem entender porque seria humilhante levar um gol de uma menina.

E são a angústia e confusão que tomam conta das crianças que não se encaixam exatamente nas regras que lhes são impostas com relação a gênero mesmo.

Menina não pode brincar disso, menino tem que jogar aquilo. Os garotos precisam se vestir assim, garotas não podem se vestir assado. Homem ter que ser DESTE jeito, mulher ter que ser DAQUELE. Uma ditadura que só serve para podar e encaixotar pessoas, personalidades, subjetividades. Algo que nunca fez sentido. Hoje com tanta informação, faz menos ainda.

É óbvio, tal discussão engloba milhares de subtópicos como o machismo, relações de poder, as dicotomias (oposições) da sociedade atual, os conceitos que temos de masculino e feminino e por aí vai, mas o ponto aqui é: precisamos conversar mais sobre gênero em nossas salas de aula.

Isso não é ideologia. Isso é informação, isso é conteúdo, isso é educação, isso é, por mais que você não perceba, promoção de saúde. Saúde para mais Mísias que não precisam necessariamente serem Barbies 24h por dia, para Mateus que não são homens fortes, viris e invencíveis (nem precisam ser) o tempo todo e tantos outros, fulanos e cicranas que estão hoje em sofrimento simplesmente porque fogem um pouco ou muito à regra.

Ideologia é, na verdade, o que nos leva a proferir discursos de ódio contra quem pede por mais destas discussões na escola, é que nos leva a ser ignorantes o suficiente para pensar que é desnecessário abordar o assunto no meio educacional.

Os exemplos aqui dados são mínimos, mas a realidade nem sempre é “piedosa” o bastante. Às vezes, o diferente, o desviante, leva muito mais que só tapinhas na cabeça, e é justamente aí onde temos errado. Vale a pena continuar a excluir, a marginalizar tudo e todos que fogem as “leis” por nós impostas?

Imagem de capa: PAKULA PIOTR/shutterstock

Mísia Morais

Paraibana (Campinense) estudante de Psicologia que tem a cabeça nas nuvens, pés no chão e um fraco por causas perdidas.

Recent Posts

Amor, interesse e jogo psicológico: o filme da Netflix que incomoda sem pedir licença — e acerta onde dói

Parece comédia romântica, mas este filme da Netflix joga sujo com amor e dinheiro ❤️‍🔥💸

4 horas ago

Nova técnica criada no Brasil contra o câncer de mama, que congela tumor com nitrogênio líquido, atinge 100% de eficácia

🎗️ Tumor congelado a −140 °C: técnica contra câncer de mama tem 100% de eficácia…

4 horas ago

Após eliminar 75 kg, Thais Carla impressiona seguidores com transformação das curvas do corpo; veja antes x depois

Thais Carla mostra novo corpo após eliminar 75 kg e antes x depois deixa a…

4 horas ago

Olhe para seus dedos agora: o formato deles pode revelar traços da sua personalidade que você nunca percebeu

🖐️ Faça o teste: o formato dos seus dedos pode revelar traços da sua personalidade…

5 horas ago

SBT explica por que episódio de Chaves ficou quase 50 anos inédito na TV

Episódio especial de Natal de “Chaves” nunca tinha passado na TV aberta (até ontem!) —…

11 horas ago

Saiba como o SBT se saiu no Ibope após trocar Zezé di Camargo por episódio inédito de Chaves

⚠️ Após polêmica, SBT trocou Zezé por Chaves de última hora — e o Ibope…

11 horas ago