Sabedoria, por Rubem Alves

Segundo Nietzsche, a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. É através dos olhos que as crianças tomam contato com a beleza e o fascínio do mundo. Os olhos têm de ser educados para que a nossa alegria aumente. As crianças não vêem “a fim de”. Seu olhar não tem nenhum objetivo prático. Vêem porque é divertido ver.

Educar é mostrar a vida a quem ainda não viu. O educador diz:”Veja!” – e, ao falar, aponta. O aluno olha na direção apontada e vê o que nunca viu. O seu mundo se expande. Ele fica mais rico interiormente. E, ficando mais rico interiormente, ele pode sentir mais alegria e dar mais alegria – que é a razão pela qual vivemos.

Já li muitos livros sobre Psicologia da Educação, Sociologia da Educação, Filosofia da Educação, Didática – mas, por mais que me esforce, não consigo me lembrar de qualquer referência à educação do olhar, ou à importância do olhar na Educação, em qualquer um deles.
A palavra amor se tornou maldita entre os educadores. Envergonham-se de que a Educação seja coisa do amor – piegas. Mas o amor – Platão, Nietzsche e Freud o sabiam – nada tem de piegas. O amor marca o impreciso e forte círculo de prazer que liga os corpos aos objetos. Sem o amor tudo nos seria indiferente – indigno de ser aprendido, inclusive a ciência. Não teríamos sentido de direção ou não teríamos prioridades.

Prova de inteligência não é possuir todas as ferramentas. É possuir as ferramentas de que se vai necessitar. Sabedoria oriental: “O tolo soma ferramentas. O sábio diminui as ferramentas.” O importante não é ter. É saber onde encontrar.
A Educação se divide em duas partes: Educação das habilidades e Educação da sensibilidade. Sem a educação da sensibilidade, todas as habilidades são tolas e sem sentido.

Os saberes – que os professores ensinam – nos dão meios para viver.

Os sabores – que os educadores despertam – nos dão razões para viver.

Nunca houve tanta possibilidade de felicidade quanto agora. Aquilo que já sabemos chega para a gente fazer um paraíso na terra. E por que é que não o fazemos? Porque o conhecimento não basta. Sabedoria não se consegue com a soma de conhecimentos.

“Formatura”: “formar” é colocar na fôrma, fechar. Um ser humano “formado” é um ser humano fechado, emburrecido. Educar é abrir. Educar é “desformar”. Uma festa de “desformatura”…

Educação não é a transmissão de uma soma de conhecimentos. Conhecimentos podem ser mortos e inertes: uma carga que se carrega sem saber sua utilidade e sem que ela dê alegria. Educar é ensinar a pensar, isto é, brincar com os conhecimentos.

A memória não carrega peso inútil em suas malas. Viaja leve. Leva sempre duas malas. Numa, estão os objetos úteis. Noutra, estão os objetos que dão prazer.

Se o conhecimento científico fosse condição para se fazer amor, os professores de anatomia seriam amantes insuperáveis. Se o conhecimento acadêmico de gramática fosse condição para se fazer literatura, os gramáticos seriam escritores insuperáveis.

Texto de Rubem Alves.
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Dica de livro: Sete Vezes Rubem (Fruto do trabalho de uma década, esta obra reúne sete livros de Rubem Alves publicados pela Papirus entre 1996 e 2005.)







Foi um psicanalista, educador, teólogo e escritor brasileiro, é autor de livros religiosos, educacionais , existenciais e infantis. É considerado um dos maiores pedagogos brasileiros de todos os tempos, um dos fundadores da Teologia da Libertação e intelectual polivalente nos debates sociais no Brasil. Foi professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Conheça o Instituto e a página oficial do autor no Facebook pelos links indicados.