Quando o amor vira só uma ideia mal feita

Eu sei que dói mais do que eu possivelmente conseguiria imaginar. Você diria: “você não entende”. E ninguém entende. Ninguém vai entender o que é gostar de alguém por tanto tempo, esperar alguém por tanto tempo nesse misto de esperança e desespero. Eu não sei pelo que vocês passaram, mas ouvi dizer que ele conseguia quase ler seus pensamentos. Devolvia toda afirmação com uma pergunta e era sempre sagaz demais para você provar o quanto você também é inteligente. No fundo, ele sabe o quanto você é foda também, mas, mesmo assim, ele não a quis. Ele podia escolhê-la entre todas elas, mas não escolheu.

Não foi por falta de aviso. Por mais que ninguém tenha falado nada, ele sabia que você estava lá. Você acha que não foi clara, mas foi. Ele sabe de tudo. Mas o amor é uma semente que você planta esperando que nasça um pé de feijão no algodão e, de repente, ele vira uma árvore, com raízes fortes, que lhe fazem abrir as janelas e arrancar o telhado, para ele se fixar no seu peito. E, depois que ele vira árvore, fica difícil mesmo tirá-lo de lá. Ele não é amor mais, é uma erva daninha, que vai se fixando nas entranhas e fazendo você ficar fraco, fraco, fraco.

Mas a culpa não é do amor. A culpa é sua, que não foi forte o suficiente para conseguir arrancar as raízes quando elas ainda eram fracas, mas você nem se lembra em que momento elas foram fracas, né? Você acha que ele sempre foi esse tsunami gigante que a afogava toda vez que os olhos se cruzavam.

E talvez nem tenha mais nada para ser dito. Já foi tudo dito aquele dia, mas você insiste em continuar parafraseando a história de vocês, como se ninguém soubesse de nada. Você não sabe disfarçar muito bem. Desculpa falar isso assim, na lata, mas você precisa saber. Não vou dizer que ele não é tudo isso, porque não estou aqui para convencê-la de que você é melhor do que ninguém. Mas, talvez, essa sua angústia já tenha se transformado quase numa obsessão, não acha, não? Já passou tanto tempo. A pessoa de que você gostava nem existe mais. Ele mudou muito. Com você, talvez ele ainda seja o mesmo e você acha que conhece o interior dele melhor do que ninguém, porque passaram umas tardes juntos e vararam a noite conversando sobre como as pessoas são vazias. Mas isso não quer dizer nada. Ele já está em outra e você aí. Eu sei, parece que ele a provoca, às vezes. Fica de olhando de rabo de olho, manda umas mensagens no meio do nada.

Sabe, ele também é inseguro. E ele gosta de saber que você gosta dele. Mas isso não quer dizer que ele goste de você. Ele gosta de se sentir gostado. Quem não? Mas acontece que nem você sabe mais o que sente por ele. Um misto de ódio, de amor, de paixão, de saudade. De ter alguém que a entenda tão bem. Você nunca encontrou alguém assim. E nem vai, porque a gente condiciona nossa própria realidade. Uma ideia é um ser vivo que você coloca na cabeça e ele vai crescendo e dominando todos os seus pensamentos, todo o seu coração e fica quase impossível tirar aquilo de lá. Mas a verdade é que esse amor é só uma ideia que se instaurou por todos os poros e agora você não consegue ver nada e nem ninguém além.

Eu posso estar viajando, mas eu a conheço bem para saber que você tem muito medo de se machucar. Talvez você esteja assim, porque tem medo de descobrir que realmente existe alguém melhor do que ele. Você tem medo de destruir essa fantasia que, de tanto incomodar, já a deixa confortável.

Em todos os relacionamentos, você sempre queria se sentir no controle de tudo, como se a gente fosse capaz de controlar as pessoas. A gente não controla as pessoas, a gente não tem poder nenhum sobre elas, mas dá para controlar nossas escolhas. Eu sei que o que vocês viveram foi incrível e tal, mas não precisa ficar inventando fantasias pra o que poderia ter sido ou que poderia ser. O amor é bom quando ele é fácil, encaixa-se, embola-se, não precisa de prova e nem de história. E, se existir alguma possibilidade de vocês ainda viverem algo juntos, você vai estar tão imersa nessa sua confusão, que vai deixar essa chance passar.

Tem que fazer um exercício diário de esquecer o outro, não tem outro jeito. É igual aprender uma atividade nova. Dá trabalho esquecer, porque você precisa estar no controle do que você sente. Mas a verdade é que ele não é amor. Nem sentimento ele é mais e é por isso que é tão mais difícil arrancá-lo de lá. Ele virou só uma ideia. E, se uma ideia pode destruir civilizações, imagina sua cabeça? O amor morreu, por mais que você queira acreditar que esse é o sentimento mais puro e honesto que você já sentiu, hoje ele é só uma invenção. Uma projeção daquilo que um dia você achou que era ele. O tempo passou e você ficou presa nessa história que já acabou. Vire essa página, dá um reset na mente e olha quantas oportunidades você pode deixar passar por escolher fechar os olhos. O mundo é cheio de camadas. Não escolha ficar na sua superfície.

Imagem de capa: Pintura por Casey Weldon







Atriz, roteirista, formada em comunicação social e autora do Blog De Repente dá Certo. Pira em artes e tecnologia e acredita que as histórias são as coisas mais valiosas que temos.