Por que ainda queremos nos casar?

A série Divorce, que acaba de estrear na HBO, marca o retorno da parceria entre a atriz Sarah Jéssica Parker (protagonista de Sex and the City) e o canal.

Em Divorce a atriz aparece como uma cinquentinha contemporânea: mãe de família, cansada do casamento, desiludida com o amante, rejeitada pelos filhos adolescentes, desejosa de realizar um antigo sonho (abrir uma galeria de arte).

A nova série da HBO contará com 10 capítulos de 30 minutos cada. Com humor irônico e generosas pitadas de drama, Divorce apresenta os desafios do casamento nos dias de hoje: rotina, sexo arrefecido, traição e o desgaste emocional que uma separação provoca.

Sobre o tabu da monogamia, falei aqui. Por esse motivo, escolho uma questão sobre a qual a série lança luz:

Por que ainda queremos nos casar? Por que insistimos em juntar as escovas de dente e depois reclamamos da rotina e do desgaste que é dividir o mesmo teto com alguém que possui hábitos tão diferentes dos nossos?

Será, mesmo, que queremos nos casar por amor? O que o amor tem a ver com isso?

O casamento foi inventado muito antes de o amor ser um bem imprescindível, muito antes de Tristão e Isolda – primeiro grande clássico da literatura mundial a narrar aventuras e desventuras do amor romântico.

A contração do matrimônio, nos primórdios, se dava por questões políticas (e financeiras).

Será que não optamos por dividir o mesmo teto, ainda hoje, por necessidade de segurança, sentimento de posse, convenção social e/ou necessidade de ter um filho (é preciso se casar para ter um filho no século XXI?)? Será que algumas mocinhas não desejam apenas vestir um vestido de princesa e ser a rainha da noite?

O problema é que depois da festa, além da conta, vem a realidade: dividir o mesmo espaço.

Será que estamos preparados?

O amor precisa de cama, não de teto compartilhado para se consumar. E cama pode ser chão, grama, sofá, chuveiro, abraço, sorriso, colo, conchinha, cafuné.

Mais que teto! O amor precisa da partilha de lealdade, respeito, admiração, alegria, tesão, entusiasmo e escolha.

São tantos os casais que dividem a mesma casa, mas não são leais, nem respeitosos; que vivem reclamando dos hábitos do parceiro para terceiros.

Vivemos tempos devassados, onde é cada vez mais raro ter privacidade e tempo para nós mesmos. Nossa casa, em princípio, seria o único espaço onde podemos nos despir inclusive de nós mesmos.

São tempos em que o individualismo é cultuado. Se o metrô está vazio, por exemplo, e alguém senta ao nosso lado, mudamos de lugar. Se o restaurante está vazio e alguém senta próximo a nossa mesa, ficamos incomodados.

Acaso questionem nossos gostos e vontades; acaso especulem aonde fomos, o que fizemos, o que deixamos de fazer – nos sentimos invadidos e irritadiços.

Detestamos dividir o controle remoto e a pia do banheiro. Detestamos chegar em casa e perceber que a última fatia de bolo que estava na geladeira foi comida.

Por mais que tenhamos afinidades com a nossa cara metade, por mais que amemos a nossa metade da laranja, dificilmente a divisão de teto será tranquila, simplesmente porque – salvo raras exceções! –  não fomos educados para a partilha, mas para a competitividade e o individualismo.

Não se trata de uma apologia à não contração do matrimônio. Cada um sabe o que é melhor para si e existem, sim, casais leais, apaixonados e companheiros que dividem o mesmo teto com alegria e prazer. Assim como existem casais leais, apaixonados e companheiros que optaram por morar em casas separadas.

Trata-se de refletir, ser honesto consigo mesmo e se perguntar: será que tenho habilidade para dividir o mesmo teto? Qual o meu grau de competitividade e individualismo? Qual a minha necessidade real de privacidade? Eu gosto de ter razão ou de ser feliz?

Caso contrário, corremos o risco de viver – tão logo nos casemos – as mesmas agruras que os personagens da nova série da HBO.







Mônica Montone é formada em Psicologia pela PUC-RJ e escritora. Autora dos livros Mulher de minutos, Sexo, champanhe e tchau e A louca do castelo.