“Joaquim Sapé” poema espetacular de Manoel de Barros

Os ornamentos de trapo de Joaquim Sapé já estavam
criando cabelo de tão sujos.
Joaquim atravessava as ruelas da Aldeia como se fosse
um Príncipe.
Com aqueles ornamentos de trapo.
Quando entrava na Aldeia com o saco de lata às
costas
Crianças o arrodeavam.
Um dia me falou, esse andarilho (eu era criança):
– Quando chove nos braços de um formiga, o
horizonte diminui.
O menino ficou com a frase incomodando na cabeça.
Como é que esse Joaquim Sapé, que mora debaixo do
chapéu, e que nem tem aparelho de medir céu, pode
saber que os horizontes diminuem quando chove nos
braços de uma formiga?
Se nem quase formiga tem braço!
Igual quando ele me disse que do lado esquerdo do
sol voam mais andorinhas do que os outros pássaros?
Pois ele não tinha aparelho de medir o sol, como
podia saber!
Ele seria um ensaio de cientista?
Ele enxergava prenúncios!

Manoel de Barros, no livro “Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo”, Editora Record

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