A era da incomunicação

Rubem Alves certa feita disse que mais do que cursos de oratória, nós precisamos de cursos de “escutatória”, porque todo mundo quer aprender a falar, mas ninguém quer aprender a ouvir. O problema do ouvir e, mais apropriadamente dito, o da comunicação, vem se tornando um dos grandes problemas da nossa sociedade, o que lhe garante a alcunha de “Era da Incomunicação”, muito embora se viva na época de ouro dos meios de comunicação.

É fato que a rede mundial de computadores deu voz a todos com um smartphone na mão, mas, parece-me, que o ouvir não acompanhou o mesmo processo de desenvolvimento do falar. Entretanto, para que o que seja dito por alguém possua significado, é preciso que haja do outro lado, um interlocutor, capaz de ouvir, absorver a mensagem e, somente depois disso, falar alguma coisa em resposta ao que ouviu. Ou seja, na comunicação existe um processo no qual deve haver necessariamente no mínimo duas pessoas. A partir do momento em que passamos a desconsiderar o interlocutor, o ouvinte, o outro, da nossa fala, passamos a descaracterizar o próprio ato de se comunicar e, assim, nos tornamos autofalantes.

Dessa maneira, desenvolvemos extraordinariamente a capacidade de falar, mas não, necessariamente, a de se comunicar. Falamos, falamos e falamos, porém, não somos escutados, bem como, não conseguimos escutar o que os outros falam. Essa incomunicabilidade se dá justamente por estarmos preocupados tão somente em nos expressar. É como se andássemos todos na rua, ao mesmo tempo, da mesma forma, mas ninguém conseguisse perceber ninguém. E, sim, podem fazer essa relação, porque ela ocorre inevitavelmente: a incapacidade do ouvir leva à incapacidade de enxergar.

Assim sendo, tornamo-nos surdos, cegos, mas com a fala enormemente potencializada. Podemos gritar, espernear, tentar chamar a atenção de diferentes modos (e constantemente fazemos isso), mas continuaremos autofalantes, porque esse comportamento apenas ratifica o egoísmo e o narcisismo que nos impedem de deixar a nossa voz (ego) um pouco de lado e tentar escutar, perceber o que o outro está dizendo ou tentando dizer.

Ainda que cercados de fios, que – via de regra – devem promover a comunicação, o que se constata é o falar solitário, como se fôssemos início, meio e fim de um mesmo ato. E por mais que viver em grandes cidades, sejam reais ou “cidades.com”, aparente demonstrar que estamos conectados e que estamos próximos, no fundo sabemos que estamos sozinhos em nossos pensamentos, seja por não encontrarmos pessoas capazes de ouvir, seja porque nós mesmos já não conseguimos escutar, sendo apenas mais um autofalante com número e série.

Nessa Torre de Babel que construímos, a comunicação não evoluiu, pelo contrário, se tornou ainda mais primitiva, pois em meio a uma confusão de línguas, raramente se encontra pessoas que se esforçam para entender o dialeto que forma o outro, já que a comunicação, acima de qualquer coisa, é sair de si e adentrar em outro universo particular, não seu, mas do outro.
O que talvez ainda não tenhamos compreendido, apesar disso tudo, é que as palavras e, consequentemente, o sentir, só possuem significado em mão dupla, quando há um significante. Do contrário, elas morrem sozinhas, dentro de nós, sem que possam crescer e criar vida. Morrem no silêncio perturbador de quem grita, mas só escuta o próprio eco (ego) como resposta, até que ele também cansa e, então, já não se escuta nada, a não ser o silêncio pleno da era da incomunicação.

Imagem de capa: VGstockstudio/shutterstock







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