Carta a uma amiga que não acredita em si mesma

Amiga querida,

Por mais que me esforce, eu não consigo compreender sua necessidade de sofrer.

Você não é dessas pessoas pessimistas que vivem com uma nuvem negra pairando sobre a cabeça; dessas que reclamam de tudo e de todos e que nunca está satisfeita com nada. Pelo contrário! Você tem o riso mais frouxo e lindo que conheço. É capaz de ficar horas olhando para o zanzar de um passarinho entre um galho e outro, consciente de que está diante de um presente. Você pode não escrever versos, mas é do tipo que vê beleza em tudo o que vê.

Você deixa um rastro de beleza por onde passa: seja nos laços que faz para embrulhar presentes, nas histórias divertidas que conta, no bom gosto para arrumar a mesa para um brunch, no olho certeiro que tem para captar a melhor luz para uma fotografia – e deixar, com isso, todas as amigas bonitas (e felizes) na foto -, na maquiagem deslumbrante que só você sabe fazer, na indicação certeira de bons livros, filmes e restaurantes, no ouvido paciente que sempre empresta para quem está com algum problema.

Você é inteligente sem ser arrogante, sabe conversar sobre todos os assuntos. Você consegue visitar uma exposição de pintores franceses e, na sequência, fazer um programinha bem besta: comprar bijuterias em lojinhas de R$ 1,99 com as amigas, falando sobre o Sex and the city.

Você é uma filha querida e dedicada, está sempre ajudando a família, tentando harmonizar o ambiente, buscando o melhor caminho para todos.

Você alegra os ambientes! Você alegra as pessoas! Você é um ponto de luz na escuridão de muita gente e seus amigos, os amigos de verdade, lhe devotam amor, respeito, carinho, lealdade.

Quando está namorando é carinhosa, atenciosa, compreensiva, sensual. Tenho a mais absoluta certeza de que todos os seus ex-namorados foram transformados positivamente pelo seu amor – ainda que alguns não saibam disso, nem reconheçam.

Não conheço uma única pessoa que não goste de você! Ou melhor, conheço: você mesma!

Por que, amiga? Por que você não consegue enxergar o que todos nós que te rodeamos enxergamos?

Se você tivesse apenas 19 anos, ou se nunca tivesse sentado num divã para entender suas dores ou sofrido um trauma terrível e avassalador na infância, talvez eu conseguisse compreender por que diabos você, que hoje é mulher feita, não conseguiu aprender o essencial: se amar.

Eu sei, amiga! Eu sei que eu deveria saber que entre o coração de uma mulher e um divã existem mais mistérios do que sonha a nossa vã filosofia. Mas não consigo deixar de me perguntar: até quando? Até quando ela vai se maltratar desse jeito?

Que prazer você extrai da condição de miserável que muitas vezes busca para si mesma? Por que, mil vezes por que, você não consegue jogar no seu time? O que você encontra de tão confortável no sofrimento e na dor?

Sim, amiga! Você busca situações de dor para sua vida! Você sabe exatamente o que precisa fazer para resgatar sua autoestima que está no chão, mas não faz o que tem que ser feito com afinco. Fica se enrolando. Fica fingindo que está fazendo algo. Fica fazendo as coisas pela metade para depois se frustrar com os resultados e poder dizer para si mesma: “Fracassei de novo, sou um lixo”. O nome disso é má-fé.

E você também sabe exatamente o que precisa parar urgentemente de fazer!

Quem foi o maldito, ou, a maldita, que te convenceu de que você não vale nada? Pai, mãe, irmãos, irmãs, primas, tias, namorados de adolescência, invejosas da época da escola? Abandone o que essa gente (possivelmente) pode ter ensinado errado a você! Você pode ter cometido alguns erros, sim, todos nós cometemos, mas você não é mais a mesma pessoa, você mudou, cresceu, aprendeu uma porção de coisas; se é que um dia você achou que merecia esse julgamento de menos valia, lembre-se: você não é a mesma de ontem. Portanto, apague de uma vez por todas essa mensagem encardida que deixaram na secretária eletrônica da sua memória.

Às vezes eu fico me perguntando se você não se acostumou com o papel de vítima. Sim, amiga, talvez você não esteja percebendo e odeio ter que dizer isso a você assim, de forma tão direta, mas você se colocou no papel de vítima e, pior, faz tempo!

Fico me perguntando: é por que você gosta da atenção que recebe dos amigos quando está na merda?! É por que no fundo acredita que só merece atenção, carinho e afeto quando está na merda?! Melhor dizendo: é por que acredita que somente estando merda terá todo o amor e carinho de que necessita?!

Não, amiga! Você não precisa estar na merda para ser amada. As pessoas que te cercam estão ao seu lado segurando sua mão, ouvindo suas dores, ofertando colo, conselhos, te convidando para sair, não porque você está na merda, mas porque você é simplesmente linda e ilumina a vida das pessoas. Sua companhia torna qualquer lugar melhor. Você é generosa, amorosa, divertida, sensível, perspicaz, carinhosa, engraçada, cheirosa, graciosa, inteligente, meiga, entusiasmada, solar.

Se você não quiser falar comigo nunca mais depois de ler esta carta, peço, apenas, que me prometa uma coisa! Que vai ao menos tentar ser para você o que você é para todos nós!

Já que você não consegue se enxergar como todos nós que a cercamos, peço, gentilmente, que passe a ser menos crítica, menos dura, menos punitiva, menos masoquista consigo mesma.

Você é capaz de perdoar os deslizes de todas as pessoas! Nunca conheci coração mais mole! Pois bem! Eis o que peço: perdoe a você mesma! Por favor, amiga! Perdoe a você mesma como você perdoa a todos à sua volta. Pare de se punir buscando situações que só te levam à frustração e a autossabotagem.

E, por favor, não se abandone! Faça o que tem que ser feito. Faça com afinco, com sangue nos olhos. Pare, simplesmente pare de dar desculpas, pare de fazer as coisas pela metade. Não se abandone, amiga! Pare, simplesmente pare de lamber velhas feridas, de tomar pequenas doses diárias de veneno que te intoxica.

Meu colo, meu amor, meu carinho, meu respeito, minha lealdade, estão aqui e sempre estarão. É só chamar! Não importa a hora, não importa se de madrugada, se na hora do almoço, se na hora da novela.

E, caso você desista mesmo de você; caso escolha se agarrar ao papel de vítima das circunstâncias em que se encontra; caso acredite que não tem coragem ou força suficiente para virar esse jogo (eu sei que você tem!), saiba que vou lamentar muitíssimo, mas vou continuar te amando, te respeitando e te apoiando. Sobretudo, vou continuar torcendo, torcendo muito, para que você acorde um belo dia, se olhe no espelho, perceba o quanto é linda e amada e o quanto merece mais, muito mais do que está oferecendo a si mesma.

Com muito, muito açúcar e muito, muito afeto,

da amiga que te ama de infinito amor!

(imagem: google)







Mônica Montone é formada em Psicologia pela PUC-RJ e escritora. Autora dos livros Mulher de minutos, Sexo, champanhe e tchau e A louca do castelo.