A arte de não saber aproveitar as férias

Sonho com elas. Sonho muito. Faço planos, consigo ver o tempo passar vagarosamente de dentro de uma rede, balançando indolente.

E eis que vem chegando o dia tão sonhado, e, por mais organizada e programada que seja a temporada, tudo começa a sair do controle. A geladeira pifa, o zelador vem avisar que tem um vazamento “dos grandes” lá na garagem e que tem toda a pinta de ser do nosso apartamento, o tempo muda, o cartão é clonado, o gato adoece… Uma semana ou mais para resolver tudo e ainda há férias para desfrutar. Nada de pânico!

Então, num olhar daqueles de relance, bem rápido, quase ignorado, a parede da sala salta! A parede que está um pouco manchada, que tem umas marcas de coisas que não estão mais penduradas lá. – Ah, eu podia pintar essa parede. Em um dia faço isso. Nem vou lixar, está lisinha… Pronto, quem já pintou uma parede sequer, sabe onde isso vai dar. Mais uma semana entre massas corridas, texturas para as partes que não foram lixadas, as outras paredes porque ficaram feias perto da recém pintada e muita reclamação e arrependimento, enquanto os respingos do chão são tirados, um a um.

Mas sobraram uns dias e vou aproveitar loucamente. O plano é rever amigos queridos, rodopiar pela cidade, acordar tarde, almoçar tarde, dormir a tarde…
Mas os amigos não estão de férias, não consigo decidir se é melhor ir ao novo museu ou ao cinema, o relógio biológico urra às sete da manhã, ao meio dia já estou louca de fome e, entre uma indecisão e outra, vejo que chegou um e-mail de trabalho. Claro que não darei atenção, estou de férias, vejo isso no retorno. Mas, quem sabe dá para adiantar e então a volta não será tão atarefada. Deixa eu ver…

E no domingo, véspera do retorno à rotina de trabalho, meio que sem querer, recebo mensagem de uns amigos convidando para um vinho e papo furado. A verdade é que agora só quero que chegue logo a segunda-feira, já tenho todas as tensões do trabalho alinhadas e marchando na cabeça, mas meio de má vontade, aceito.

E despertador toca às sete da manhã e eu volto das férias com uma tremenda ressaca!







Administradora, dona de casa e da própria vida, gateira, escreve com muito prazer e pretende somente se (des)cobrir com palavras. As ditas, as escritas, as cantadas e até as caladas.